Actualizado até à Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro
incorprorando Declaração de Rectificação 24/2006, de 17/04
LIVRO I
PARTE GERAL
TÍTULO I
DAS LEIS, SUA INTERPRETAÇÃO E
APLICAÇÃO
CAPÍTULO I
Fontes do direito
ARTIGO 1º
(Fontes imediatas)
1.
São fontes imediatas do direito as leis e as normas corporativas.
2.
Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos
estaduais competentes; são normas corporativas as regras ditadas pelos
organismos representativos das diferentes categorias morais, culturais,
económicas ou profissionais, no domínio das suas atribuições, bem como os
respectivos estatutos e regulamentos internos.
3.
As normas corporativas não podem contrariar as disposições legais de carácter
imperativo.
ARTIGO 2º - Revogado pelo Dec.-Lei 329-A/95, de 12-12
(Assentos)
Nos
casos declarados na lei, podem os tribunais fixar, por meio de assentos,
doutrina com força obrigatória geral.
ARTIGO 3º
(Valor jurídico dos usos)
1.
Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente
atendíveis quando a lei o determine.
2.
As normas corporativas prevalecem sobre os usos.
ARTIGO 4º
(Valor da equidade)
Os
tribunais só podem resolver segundo a equidade:
a)
Quando haja disposição legal que o permita;
b)
Quando haja acordo das partes e a relação jurídica não seja indisponível;
c)
Quando as partes tenham previamente convencionado o recurso à equidade, nos
termos aplicáveis à cláusula compromissória.
CAPÍTULO II
Vigência, interpretação e aplicação
das leis
ARTIGO 5º
(Começo da vigência da lei)
1.
A lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal oficial.
2.
Entre a publicação e a vigência da lei decorrerá o tempo que a própria lei
fixar ou, na falta de fixação, o que for determinado em legislação especial.
ARTIGO 6º
(Ignorância ou má interpretação da lei)
A
ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento
nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.
ARTIGO 7º
(Cessação da vigência da lei)
1.
Quando se não destine a ter vigência temporária, a lei só deixa de vigorar se
for revogada por outra lei.
2.
A revogação pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as
novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei
regular toda a matéria da lei anterior.
3.
A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção
inequívoca do legislador.
4.
A revogação da lei revogatória não importa o renascimento da lei que esta
revogara.
ARTIGO 8º
(Obrigação de julgar e dever de obediência à lei)
1.
O tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da
lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio.
2.
O dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto
ou imoral o conteúdo do preceito legislativo.
3.
Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que
mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação
uniformes do direito.
ARTIGO 9º
(Interpretação da lei)
1.
A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir
dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do
sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições
específicas do tempo em que é aplicada.
2.
Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que
não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que
imperfeitamente expresso.
3.
Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador
consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em
termos adequados.
ARTIGO 10º
(Integração das lacunas da lei)
1.
Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos
casos análogos.
2.
Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da
regulamentação do caso previsto na lei.
3.
Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio
intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.
ARTIGO 11º
(Normas excepcionais)
As
normas excepcionais não comportam aplicação analógica, mas admitem
interpretação extensiva.
ARTIGO 12º
(Aplicação das leis no tempo. Princípio geral)
1.
A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia
retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos
factos que a lei se destina a regular.
2.
Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de
quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que
só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de
certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem,
entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que
subsistam à data da sua entrada em vigor.
ARTIGO 13º
(Aplicação das leis no tempo.Leis interpretativas)
1.
A lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os
efeitos já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em
julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de análoga
natureza.
2.
A desistência e a confissão não homologadas pelo tribunal podem ser revogadas
pelo desistente ou confitente a quem a lei interpretativa for favorável.
CAPÍTULO III
Direitos dos estrangeiros e
conflitos de leis
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 14º
(Condição jurídica dos estrangeiros)
1.
Os estrangeiros são equiparados aos nacionais quanto ao gozo de direitos civis,
salvo disposição legal em contrário.
2.
Não são, porém, reconhecidos aos estrangeiros os direitos que, sendo atribuídos
pelo respectivo Estado aos seus nacionais, o não sejam aos portugueses em
igualdade de circunstâncias.
ARTIGO 15º
(Qualificações)
A
competência atribuída a uma lei abrange somente as normas que, pelo seu
conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado
na regra de conflitos.
ARTIGO 16º
(Referência à lei estrangeira. Princípio geral)
A
referência das normas de conflitos a qualquer lei estrangeira determina apenas,
na falta de preceito em contrário, a aplicação do direito interno dessa lei.
ARTIGO 17º
(Reenvio para a lei de um terceiro Estado)
1.
Se, porém, o direito internacional privado da lei referida pela norma de
conflitos portuguesa remeter para outra legislação e esta se considerar
competente para regular o caso, é o direito interno desta legislação que deve
ser aplicado.
2.
Cessa o disposto no número anterior, se a lei referida pela norma de conflitos
portuguesa for a lei pessoal e o interessado residir habitualmente em
território português ou em país cujas normas de conflitos considerem competente
o direito interno do Estado da sua nacionalidade.
3.
Ficam, todavia, unicamente sujeitos à regra do nº 1 os casos da tutela e
curatela, relações patrimoniais entre os cônjuges, poder paternal, relações entre
adoptante e adoptado e sucessão por morte, se a lei nacional indicada pela
norma de conflitos devolver para a lei da situação dos bens imóveis e esta se
considerar competente.
ARTIGO 18º
(Reenvio para a lei portuguesa)
1.
Se o direito internacional privado da lei designada pela norma de conflitos
devolver para o direito interno português, é este o direito aplicável.
2.
Quando, porém, se trate de matéria compreendida no estatuto pessoal, a lei
portuguesa só é aplicável se o interessado tiver em território português a sua
residência habitual ou se a lei do país desta residência considerar igualmente
competente o direito interno português.
ARTIGO 19º
(Casos em que não é admitido o reenvio)
1.
Cessa o disposto nos dois artigos anteriores, quando da aplicação deles resulte
a invalidade ou ineficácia de um negócio jurídico que seria válido ou eficaz
segundo a regra fixada no artigo 16º, ou a ilegitimidade de um estado que de
outro modo seria legítimo.
2.
Cessa igualmente o disposto nos mesmos artigos, se a lei estrangeira tiver sido
designada pelos interessados, nos casos em que a designação é permitida.
ARTIGO 20º
(Ordenamentos jurídicos plurilegislativos)
1.
Quando, em razão da nacionalidade de certa pessoa, for competente a lei de um
Estado em que coexistam diferentes sistemas legislativos locais, é o direito
interno desse Estado que fixa em cada caso o sistema aplicável.
2.
Na falta de normas de direito interlocal, recorre-se ao direito internacional
privado do mesmo Estado; e, se este não bastar, considera-se como lei pessoal
do interessado a lei da sua residência habitual.
3.
Se a legislação competente constituir uma ordem jurídica territorialmente
unitária, mas nela vigorarem diversos sistemas de normas para diferentes
categorias de pessoas, observar-se-á sempre o estabelecido nessa legislação
quanto ao conflito de sistemas.
ARTIGO 21º
(Fraude à lei)
Na
aplicação das normas de conflitos são irrelevantes as situações de facto ou de
direito criadas com o intuito fraudulento de evitar a aplicabilidade da lei
que, noutras circunstâncias, seria competente.
ARTIGO 22º
(Ordem pública)
1.
Não são aplicáveis os preceitos da lei estrangeira indicados pela norma de
conflitos, quando essa aplicação envolva ofensa dos princípios fundamentais da
ordem pública internacional do Estado português.
2.
São aplicáveis, neste caso, as normas mais apropriadas da legislação
estrangeira competente ou, subsidiariamente, as regras do direito interno
português.
ARTIGO 23º
(Interpretação e averiguação do direito estrangeiro)
1.
A lei estrangeira é interpretada dentro do sistema a que pertence e de acordo
com as regras interpretativas nele fixadas.
2.
Na impossibilidade de averiguar o conteúdo da lei estrangeira aplicável,
recorrer-se-á à lei que for subsidiariamente competente, devendo adoptar-se
igual procedimento sempre que não for possível determinar os elementos de facto
ou de direito de que dependa a designação da lei aplicável.
ARTIGO 24º
(Actos realizados a bordo)
1.
Aos actos realizados a bordo de navios ou aeronaves, fora dos portos ou
aeródromos, é aplicável a lei do lugar da respectiva matrícula, sempre que for
competente a lei territorial.
2.
Os navios e aeronaves militares consideram-se como parte do território do
Estado a que pertencem.
SECÇÃO II
Normas de conflitos
SUBSECÇÃO I
Âmbito e determinação da lei pessoal
ARTIGO 25º
(Âmbito da lei pessoal)
O
estado dos indivíduos, a capacidade das pessoas, as relações de família e as
sucessões por morte são regulados pela lei pessoal dos respectivos sujeitos,
salvas as restrições estabelecidas na presente secção.
ARTIGO 26º
(Início e termo da personalidade jurídica)
1.
O início e termo da personalidade jurídica são fixados igualmente pela lei
pessoal de cada indivíduo.
2.
Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra pessoa e
estas tiverem leis pessoais diferentes, se as presunções de sobrevivência
dessas leis forem inconciliáveis, é aplicável o disposto no nº 2 do artigo 68º.
ARTIGO 27º
(Direitos de personalidade)
1.
Aos direitos de personalidade, no que respeita à sua existência e tutela e às
restrições impostas ao seu exercício, é também aplicável a lei pessoal.
2.
O estrangeiro ou apátrida não goza, porém, de qualquer forma de tutela jurídica
que não seja reconhecida na lei portuguesa.
ARTIGO 28º
(Desvios quanto às consequências da incapacidade)
1.
O negócio jurídico celebrado em Portugal por pessoa que seja incapaz segundo a
lei pessoal competente não pode ser anulado com fundamento na incapacidade no
caso de a lei interna portuguesa, se fosse aplicável, considerar essa pessoa
como capaz.
2.
Esta excepção cessa, quando a outra parte tinha conhecimento da incapacidade,
ou quando o negócio jurídico for unilateral, pertencer ao domínio do direito da
família ou das sucessões ou respeitar à disposição de imóveis situados no
estrangeiro.
3.
Se o negócio jurídico for celebrado pelo incapaz em país estrangeiro, será
observada a lei desse país, que consagrar regras idênticas às fixadas nos
números anteriores.
ARTIGO 29º
(Maioridade)
A
mudança da lei pessoal não prejudica a maioridade adquirida segundo a lei
pessoal anterior.
ARTIGO 30º
(Tutela e institutos análogos)
À
tutela e institutos análogos de protecção aos incapazes é aplicável a lei
pessoal do incapaz.
ARTIGO 31º
(Determinação da lei pessoal)
1.
A lei pessoal é a da nacionalidade do indivíduo.
2.
São, porém, reconhecidos em Portugal os negócios jurídicos celebrados no país
da residência habitual do declarante, em conformidade com a lei desse país,
desde que esta se considere competente.
ARTIGO 32º
(Apátridas)
1.
A lei pessoal do apátrida é a do lugar onde ele tiver a sua residência habitual
ou, sendo menor ou interdito, o seu domicílio legal.
2.
Na falta de residência habitual, é aplicável o disposto no nº 2 do artigo 82º.
ARTIGO 33º
(Pessoas colectivas)
1.
A pessoa colectiva tem como lei pessoal a lei do Estado onde se encontra
situada a sede principal e efectiva da sua administração.
2.
À lei pessoal compete especialmente regular: a capacidade da
pessoa colectiva;
a constitutição, funcionamento e competência dos
seus órgãos; os modos de
aquisição e perda da qualidade de associado e os
correspondentes direitos e
deveres; a responsabilidade da pessoa colectiva, bem como a dos
respectivos
órgãos e membros, perante terceiros; a
transformação, dissolução e
extinção da
pessoa colectiva.
3.
A transferência, de um Estado para outro, da sede da pessoa colectiva não
extingue a personalidade jurídica desta, se nisso convierem as leis de uma e
outra sede.
4.
A fusão de entidades com lei pessoal diferente é apreciada em face de ambas as
leis pessoais.
ARTIGO 34º
(Pessoas colectivas internacionais)
A
lei pessoal das pessoas colectivas internacionais é a designada na convenção
que as criou ou nos respectivos estatutos e, na falta de designação, a do país
onde estiver a sede principal.
SUBSECÇÃO II
Lei reguladora dos negócios
jurídicos
ARTIGO 35º
(Declaração negocial)
1.
A perfeição, interpretação e
integração da declaração negocial
são reguladas
pela lei aplicável à substância do negócio,
a qual é igualmente aplicável à
falta e vícios da vontade.
2.
O valor de um comportamento como declaração negocial é determinado pela lei da
residência habitual comum do declarante e do destinatário e, na falta desta,
pela lei do lugar onde o comportamento de verificou.
3.
O valor do silêncio como meio declaratório é igualmente determinado pela lei da
residência habitual comum e, na falta desta, pela lei do lugar onde a proposta
foi recebida.
ARTIGO 36º
(Forma da declaração)
1.
A forma da declaração negocial é regulada pela lei aplicável à substância do
negócio; é, porém, suficiente a observância da lei em vigor no lugar em que é
feita a declaração, salvo se a lei reguladora da substância do negócio exigir,
sob pena de nulidade ou ineficácia, a observância de determinada forma, ainda
que o negócio seja celebrado no estrangeiro.
2.
A declaração negocial é ainda formalmente válida se, em vez da forma prescrita
na lei local, tiver sido observada a forma prescrita pelo Estado para que
remete a norma de conflitos daquela lei, sem prejuízo do disposto na última
parte do número anterior.
ARTIGO 37º
(Representação legal)
A
representação legal está sujeita à lei reguladora da relação jurídica de que
nasce o poder representativo.
ARTIGO 38º
(Representação orgânica)
A
representação da pessoa colectiva por intermédio dos seus órgãos é regulada
pela respectiva lei pessoal.
ARTIGO 39º
(Representação voluntária)
1.
A representação voluntária é regulada, quanto à existência, extensão,
modificação, efeitos e extinção dos poderes representativos, pela lei do Estado
em que os poderes são exercidos.
2.
Porém, se o representante exercer os poderes representativos em país diferente
daquele que o representado indicou e o facto for conhecido do terceiro com quem
contrate, é aplicável a lei do país da residência habitual do representado.
3.
Se o representante exercer profissionalmente a representação e o facto for
conhecido do terceiro contratante, é aplicável a lei do domicílio profissional.
4.
Quando a representação se refira à
disposição ou administração de bens
imóveis,
é aplicável a lei do país da
situação desses bens.
ARTIGO 40º
(Prescrição e caducidade)
A
prescrição e a caducidade são reguladas pela lei aplicável ao direito a que uma
ou outra se refere.
SUBSECÇÃO III
Lei reguladora das obrigações
ARTIGO 41º
(Obrigações provenientes de negócios jurídicos)
1.
As obrigações provenientes de negócio jurídico, assim como a própria substância
dele, são reguladas pela lei que os respectivos sujeitos tiverem designado ou
houverem tido em vista.
2.
A designação ou referência das partes só pode, todavia, recair sobre lei cuja
aplicabilidade corresponda a um interesse sério dos declarantes ou esteja em
conexão com algum dos elementos do negócio jurídico atendíveis no domínio do
direito internacional privado.
ARTIGO 42º
(Critério supletivo)
1.
Na falta de determinação da lei competente, atende-se, nos negócios jurídicos
unilaterais, à lei da residência habitual do declarante e, nos contratos, à lei
da residência habitual comum das partes.
2.
Na falta de residência comum, é aplicável, nos contratos gratuitos, a lei da
residência habitual daquele que atribui o benefício e, nos restantes contratos,
a lei do lugar da celebração.
ARTIGO 43º
(Gestão de negócios)
À
gestão de negócios é aplicável a lei do lugar em que decorre a principal
actividade do gestor.
ARTIGO 44º
(Enriquecimento sem causa)
O
enriquecimento sem causa é regulado pela lei com base na qual se verificou a
transferência do valor patrimonial a favor do enriquecido.
ARTIGO 45º
(Responsabilidade extracontratual)
1.
A responsabilidade extracontratual fundada, quer em acto ilícito, quer no risco
ou em qualquer conduta lícita, é regulada pela lei do Estado onde decorreu a
principal actividade causadora do prejuízo; em caso de responsabilidade por
omissão, é aplicável a lei do lugar onde o responsável deveria ter agido.
2.
Se a lei do Estado onde se produziu o efeito lesivo considerar responsável o
agente, mas não o considerar como tal a lei do país onde decorreu a sua
actividade, é aplicável a primeira lei, desde que o agente devesse prever a
produção de um dano, naquele país, como consequência do seu acto ou omissão.
3.
Se, porém, o agente e o lesado tiverem a mesma nacionalidade ou, na falta dela,
a mesma residência habitual, e se encontrarem ocasionalmente em país
estrangeiro, a lei aplicável será a da nacionalidade ou a da residência comum,
sem prejuízo das disposições do Estado local que devam ser aplicadas
indistintamente a todas as pessoas.
SUBSECÇÃO IV
Lei reguladora das coisas
ARTIGO 46º
(Direitos reais)
1.
O regime da posse, propriedade e demais direitos reais, é definido pela lei do
Estado em cujo território as coisas se encontrem situadas.
2.
Em tudo quanto respeita à constituição ou transferência de direitos reais sobre
coisas em trânsito, são estas havidas como situadas no país do destino.
3.
A constituição e transferência de direitos sobre os meios de transportes
submetidos a um regime de matrícula são reguladas pela lei do país onde a
matrícula tiver sido efectuada.
ARTIGO 47º
(Capacidade para constituir direitos reais
sobre coisas imóveis ou dispor deles)
É
igualmente definida pela lei da situação da coisa a capacidade para constituir
direitos reais sobre coisas imóveis ou para dispor deles, desde que essa lei
assim o determine; de contrário, é aplicável a lei pessoal.
ARTIGO 48º
(Propriedade intelectual)
1.
Os direitos de autor são regulados pela lei do lugar da primeira publicação da
obra e, não estando esta publicada, pela lei pessoal do autor, sem prejuízo do
disposto em legislação especial.
2.
A propriedade industrial é regulada pela lei do país da sua criação.
SUBSECÇÃO V
Lei reguladora das relações de
família
ARTIGO 49º
(Capacidade para contrair casamento
ou celebrar convenções antenupciais)
A
capacidade para contrair casamento ou celebrar a convenção antenupcial é
regulada, em relação a cada nubente, pela respectiva lei pessoal, à qual compete
ainda definir o regime da falta e dos vícios da vontade dos contraentes.
ARTIGO 50º
(Forma do casamento)
A
forma do casamento é regulada pela lei do Estado em que o acto é celebrado,
salvo o disposto no artigo seguinte.
ARTIGO 51º
(Desvios)
1.
O casamento de dois estrangeiros em Portugal pode ser celebrado segundo a forma
prescrita na lei nacional de qualquer dos contraentes, perante os respectivos
agentes diplomáticos ou consulares, desde que igual competência seja
reconhecida por essa lei aos agentes diplomáticos e consulares portugueses.
2.
O casamento no estrangeiro de dois portugueses ou de português e estrangeiro
pode ser celebrado perante o agente diplomático ou consular do Estado português
ou perante os ministros do culto católico; em qualquer caso, o casamento deve
ser precedido do processo de publicações, organizado pela entidade competente,
a menos que ele seja dispensado nos termos do artigo 1599º.
3.
O casamento no estrangeiro de dois portugueses ou de português e estrangeiro, em
harmonia com as leis canónicas, é havido como casamento católico, seja qual for
a forma legal da celebração do acto segundo a lei local, e à sua transcrição
servirá de base o assento do registo paroquial.
ARTIGO 52º
(Relações entre os cônjuges)
1.
Salvo o disposto no artigo seguinte, as relações entre os cônjuges são
reguladas pela lei nacional comum.
2.
Não tendo os cônjuges a mesma nacionalidade, é aplicável a lei da sua
residência habitual comum e, na falta desta, a lei do país com o qual a vida familiar
se ache mais estreitamente conexa.
(Redacção do Dec.-Lei 497/77, de 25-11)
ARTIGO 53º
(Convenções antenupciais e regime de bens)
1.
A substância e efeitos das convenções antenupciais e do regime de bens, legal
ou convencional, são definidos pela lei nacional dos nubentes ao tempo da
celebração do casamento.
2.
Não tendo os nubentes a mesma nacionalidade é aplicável a lei da sua residência
habitual comum à data do casamento e, se esta faltar também, a lei da primeira
residência conjugal.
3.
Se for estrangeira a lei aplicável e um dos nubentes tiver a sua residência
habitual em território português, pode ser convencionado um dos regimes
admitidos neste código.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 54º
(Modificações do regime de bens)
1.
Aos cônjuges é permitido modificar o regime de bens, legal ou convencional, se
a tal forem autorizados pela lei competente nos termos do artigo 52º.
2.
A nova convenção em caso nenhum terá efeito retroactivo em prejuízo de
terceiro.
ARTIGO 55º
(Separação judicial de pessoas e bens e divórcio)
1.
À separação judicial de pessoas e bens e ao divórcio é aplicável o disposto no
artigo 52º.
2.
Se, porém, na constância do matrimónio houver mudança da lei competente, só
pode fundamentar a separação ou o divórcio algum facto relevante ao tempo da
sua verificação.
ARTIGO 56º
(Constituição da filiação)
1.
À constituição da filiação é
aplicável a lei pessoal do progenitor à data do
estabelecimento da relação.
2.
Tratando-se de filho de mulher casada, a constituição da filiação relativamente
ao pai é regulada pela lei nacional comum da mãe e do marido; na falta desta, é
aplicável a lei da residência habitual comum dos cônjuges e, se esta também
faltar, a lei pessoal do filho.
3.
Para os efeitos do número anterior, atender-se-á ao momento do nascimento do
filho ou ao momento da dissolução do casamento, se for anterior ao nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 57º
(Relações entre pais e filhos)
1.
As relações entre pais e filhos são reguladas pela lei nacional comum dos pais
e, na falta desta, pela lei da sua residência habitual comum; se os pais
residirem habitualmente em Estados diferentes, é aplicável a lei pessoal do
filho.
2.
Se a filiação apenas se achar estabelecida relativamente a um dos progenitores,
aplica-se a lei pessoal deste; se um dos progenitores tiver falecido, é
competente a lei pessoal do sobrevivo.
(Redacção
do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 58º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
ARTIGO 59º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
ARTIGO 60º
(Filiação adoptiva)
1.
À constituição da filiação adoptiva é aplicável a lei pessoal do adoptante, sem
prejuízo do disposto no número seguinte.
2.
Se a adopção for realizada por marido e mulher ou o adoptando for filho do
cônjuge do adoptante, é competente a lei nacional comum dos cônjuges e, na
falta desta, a lei da sua residência habitual comum; se também esta faltar,
será aplicável a lei do país com o qual a vida familiar dos adoptantes se ache
mais estreitamente conexa.
3.
As relações entre adoptante e adoptado, e entre este e a família de origem,
estão sujeitas à lei pessoal do adoptante; no caso previsto no número anterior
é aplicável o disposto no artigo 57º.
4.
Se a lei competente para regular as relações entre o adoptando e os seus
progenitores não conhecer o instituto da adopção, ou não o admitir em relação a
quem se encontre na situação familiar do adoptando, a adopção não é permitida.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 61º
(Requisitos especiais da perfilhação ou adopção)
1.
Se, como requisito da perfilhação ou adopção, a lei pessoal do perfilhando ou
adoptando exigir o consentimento deste, será a exigência respeitada.
2.
Será igualmente respeitada a exigência do consentimento de terceiro a quem o
interessado esteja ligado por qualquer relação jurídica de natureza familiar ou
tutelar, se porvier da lei reguladora desta relação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO VI
Lei reguladora das sucessões
ARTIGO 62º
(Lei competente)
A
sucessão por morte é regulada pela lei pessoal do autor da sucessão ao tempo do
falecimento deste, competindo-lhe também definir os poderes do administrador da
herança e do executor testamentário.
ARTIGO 63º
(Capacidade de disposição)
1.
A capacidade para fazer, modificar ou revogar uma disposição por morte, bem
como as exigências da forma especial das disposições por virtude da idade do
disponente, são reguladas pela lei pessoal do autor ao tempo da declaração.
2.
Aquele que, depois de ter feito a disposição, adquirir nova lei pessoal
conserva a capacidade necessária para revogar a disposição nos termos da lei
anterior.
ARTIGO 64º
(Interpretação das disposições;
falta e vícios da vontade)
É
a lei pessoal do autor da herança ao tempo da declaração que regula:
a)
A interpretação das respectivas cláusulas e disposições, salvo se houver
referência expressa ou implícita a outra lei;
b)
A falta e vícios da vontade;
c)
A admissibilidade de testamentos de mão comum ou de pactos sucessórios, sem
prejuízo, quanto a estes, do disposto no artigo 53º.
ARTIGO 65º
(Forma)
1.
As disposições por morte, bem como a sua revogação ou modificação, serão
válidas, quanto à forma, se corresponderem às prescrições da lei do lugar onde
o acto for celebrado, ou às da lei pessoal do autor da herança, quer no momento
da declaração, quer no momento da morte, ou ainda às prescrições da lei para
que remeta a norma de conflitos da lei local.
2.
Se, porém, a lei pessoal do autor da herança no momento da declaração exigir,
sob pena de nulidade ou ineficácia, a observância de determinada forma, ainda
que o acto seja praticado no estrangeiro, será a exigência respeitada.
TÍTULO II
DAS RELAÇÕES JURÍDICAS
SUBTÍTULO I
DAS PESSOAS
CAPÍTULO I
Pessoas singulares
SECÇÃO I
Personalidade e capacidade jurídica
ARTIGO 66º
(Começo da personalidade)
1.
A personalidade adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.
2.
Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento.
ARTIGO 67º
(Capacidade jurídica)
As
pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição
legal em contrário; nisto consiste a sua capacidade jurídica.
ARTIGO 68º
(Termo da personalidade)
1.
A personalidade cessa com a morte.
2.
Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra pessoa,
presume-se, em caso de dúvida, que uma e outra faleceram ao mesmo tempo.
3.
Tem-se por falecida a pessoa cujo cadáver não foi encontrado ou reconhecido,
quando o desaparecimento se tiver dado em circunstâncias que não permitam
duvidar da morte dela.
ARTIGO 69º
(Renúncia à capacidade jurídica)
Ninguém
pode renunciar, no todo ou em parte, à sua capacidade jurídica.
SECÇÃO II
Direitos de personalidade
ARTIGO 70º
(Tutela geral da personalidade)
1.
A lei protege os indíviduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa
à sua personalidade física ou moral.
2.
Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada
ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso,
com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já
cometida.
ARTIGO 71º
(Ofensa a pessoas já falecidas)
1.
Os direitos de personalidade gozam igualmente de protecção depois da morte do
respectivo titular.
2.
Tem legitimidade, neste caso, para requerer as providências previstas no nº 2
do artigo anterior o cônjuge sobrevivo ou qualquer descendente, ascendente,
irmão, sobrinho ou herdeiro do falecido.
3.
Se a ilicitude da ofensa resultar da falta de consentimento, só as pessoas que
o deveriam prestar têm legitimidade, conjunta ou separadamente, para requerer
as providências a que o número anterior se refere.
ARTIGO 72º
(Direito ao nome)
1.
Toda a pessoa tem direito a usar o seu nome, completo ou abreviado, e a opor-se
a que outrem o use ilicitamente para sua identificação ou outros fins.
2.
O titular do nome não pode, todavia, especialmente no exercício de uma
actividade profissional, usá-lo de modo a prejudicar os interesses de quem
tiver nome total ou parcialmente idêntico; nestes casos, o tribunal decretará
as providências que, segundo juízos de equidade, melhor conciliem os interesse
em conflito.
ARTIGO 73º
(Legitimidade)
As
acções relativas à defesa do nome podem ser exercidas não só pelo respectivo
titular, como, depois da morte dele pelas pessoas referidas no número 2 do
artigo 71º
ARTIGO 74º
(Pseudónimo)
O
pseudónimo, quando tenha notoriedade, goza da protecção conferida ao próprio
nome.
ARTIGO 75º
(Cartas-missivas confidenciais)
1.
O destinatário de carta-missiva de natureza confidencial deve guardar reserva
sobre o seu conteúdo, não lhe sendo lícito aproveitar os elementos de
informação que ela tenha levado ao seu conhecimento.
2.
Morto o destinatário, pode a restituição da carta confidencial ser ordenada
pelo tribunal, a requerimento do autor dela ou, se este já tiver falecido, das
pessoas indicadas no nº 2 do artigo 71º; pode também ser ordenada a destruição
da carta, o seu depósito em mão de pessoa idónea ou qualquer outra medida
apropriada.
ARTIGO 76º
(Publicação de cartas confidenciais)
1.
As cartas-missivas confidenciais só podem ser publicadas com o consentimento do
seu autor ou com o suprimento judicial desse consentimento; mas não há lugar ao
suprimento quando se trate de utilizar as cartas como documento literário,
histórico ou biográfico.
2.
Depois da morte do autor, a autorização compete às pessoas designadas no nº 2
do artigo 71º, segundo a ordem nele indicada.
ARTIGO 77º
(Memórias familiares e outros escritos confidenciais)
O
disposto no artigo anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, às
memórias familiares e pessoais e a outros escritos que tenham carácter
confidencial ou se refiram à intimidade da vida privada.
ARTIGO 78º
(Cartas-missivas não confidenciais)
O
destinatário de carta não confidencial só pode usar dela em termos que não
contrariem a expectativa do autor.
ARTIGO 79º
(Direito à imagem)
1.
O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no
comércio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa retratada, a
autorização compete às pessoas designadas no nº 2 do artigo 71º, segundo a
ordem nele indicada.
2.
Não é necessário o consentimento da pessoa retratada quando assim o justifiquem
a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, exigências de polícia ou de justiça,
finalidades científicas, didácticas ou culturais, ou quando a reprodução da
imagem vier enquadrada na de lugares públicos, ou na de factos de interesse
público ou que hajam decorrido publicamente.
3.
O retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no comércio, se
do facto resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa
retratada.
ARTIGO 80º
(Direito à reserva sobre a intimidade da vida
privada)
1.
Todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem.
2.
A extensão da reserva é definida conforme a natureza do caso e a condição das
pessoas.
ARTIGO 81º
(Limitação voluntária dos direitos de personalidade)
1.
Toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade é nula,
se for contrária aos princípios da ordem pública.
2.
A limitação voluntária, quando legal, é sempre revogável, ainda que com
obrigação de indemnizar os prejuízos causados às legítimas expectativas da
outra parte.
SECÇÃO III
Domicílio
ARTIGO 82º
(Domicílio voluntário geral)
1.
A pessoa tem domicílio no lugar da sua residência habitual; se residir
alternadamente em diversos lugares, tem-se por domiciliada em qualquer deles.
2.
Na falta de residência habitual, considera-se domiciliada no lugar da sua
residência ocasional ou, se esta não puder ser determinada, no lugar onde se
encontrar.
ARTIGO 83º
(Domicílio profissional)
1.
A pessoa que exerce uma profissão tem, quanto às relações a que esta se refere,
domicílio profissional no lugar onde a profissão é exercida.
2.
Se exercer a profissão em lugares diversos, cada um deles constitui domicílio
para as relações que lhe correspondem.
ARTIGO 84º
(Domicílio electivo)
É
permitido estipular domicílio particular para determinados negócios, contanto
que a estipulação seja reduzida a escrito.
ARTIGO 85º
(Domicílio legal dos menores e interditos)
1.
O menor tem domicílio no lugar da residência da família; se ela não existir,
tem por domicílio o do progenitor a cuja guarda estiver.
2.
O domicílio do menor que em virtude de decisão judicial foi confiado a terceira
pessoa ou a estabelecimento de educação ou assistência é o do progenitor que
exerce o poder paternal.
3.
O domicílio do menor sujeito a tutela e do interdito é o do respectivo tutor.
4.
Quando tenha sido instituído o regime de administração de bens, o domicílio do
menor ou do interdito é o do administrador, nas relações a que essa
administração se refere.
5.
Não são aplicáveis as regras dos números anteriores se delas resultar que o
menor ou interdito não tem domicílio em território nacional.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 86º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
ARTIGO 87º
(Domicílio legal dos empregados públicos)
1.
Os empregados públicos, civis ou militares, quando haja lugar certo para o
exercício dos seus empregos, têm nele domicílio necessário, sem prejuízo do seu
domicílio voluntário no lugar da residência habitual.
2.
O domicílio necessário é determinado pela posse do cargo ou pelo exercício das
respectivas funções.
ARTIGO 88º
(Domicílio legal dos agentes diplomáticos
portugueses)
Os
agentes diplomáticos portugueses, quando invoquem extraterritorialidade,
consideram-se domiciliados em Lisboa.
SECÇÃO IV
Ausência
SUBSECÇÃO I
Curadoria provisória
ARTIGO 89º
(Nomeação de curador provisório)
1.
Quando haja necessidade de prover acerca da administração dos bens de quem
desapareceu sem que dele se saiba parte e sem ter deixado representante legal ou
procurador, deve o tribunal nomear-lhe curador provisório.
2.
Deve igualmente ser nomeado curador ao ausente, se o procurador não quiser ou
não puder exercer as suas funções.
3.
Pode ser designado para certos negócios, sempre que as circunstâncias o exijam,
um curador especial.
ARTIGO 90º
(Providências cautelares)
A
possibilidade de nomeação do curador provisório não obsta às providências
cautelares que se mostrem indispensáveis em relação a quaisquer bens do
ausente.
ARTIGO 91º
(Legitimidade)
A
curadoria provisória e as providências cautelares a que se refere o artigo
anterior podem ser requeridas pelo Ministério Público ou por qualquer
interessado.
ARTIGO 92º
(A quem deve ser deferida a curadoria provisória)
1.
O curador provisório será escolhido de entre as pessoas seguintes: o cônjuge do
ausente, algum ou alguns dos herdeiros presumidos, ou algum ou alguns dos
interessados na conservação dos bens.
2.
Havendo conflito de interesses entre o ausente e o curador ou entre o ausente e
o cônjuge, ascendentes ou descendentes do curador, deve ser designado um
curador especial, nos termos do número 3 do artigo 89º.
ARTIGO 93º
(Relação dos bens e caução)
1.
Os bens do ausente serão relacionados e só depois entregues ao curador
provisório, ao qual será fixada caução pelo tribunal.
2.
Em caso de urgência, pode ser autorizada a entrega dos bens antes de estes
serem relacionados ou de o curador prestar a caução exigida.
3.
Se o curador não prestar a caução, será nomeado outro em lugar dele.
ARTIGO 94º
(Direitos e obrigações do curador provisório)
1.
O curador fica sujeito ao regime do mandato geral em tudo o que não contrariar
as disposições desta subsecção.
2.
Compete ao curador provisório requerer os procedimentos cautelares necessários
e intentar as acções que não possam ser retardadas sem prejuízo dos interesses
do ausente; cabe-lhe ainda representar o ausente em todas as acções contra este
propostas.
3.
Só com autorização judicial pode o curador alienar ou onerar bens imóveis,
objectos preciosos, títulos de crédito, estabelecimentos comerciais e quaisquer
outros bens cuja alienação ou oneração não constitua acto de administração.
4.
A autorização judicial só será concedida quando o acto se justifique para
evitar a deterioração ou ruína dos bens, solver dívidas do ausente, custear
benfeitorias necessárias ou úteis ou ocorrer a outra necessidade urgente.
ARTIGO 95º
(Prestação de contas)
1.
O curador provisório deve prestar contas do seu mandato perante o tribunal,
anualmente ou quando este o exigir.
2.
Deferida a curadoria definitiva nos termos da subsecção seguinte, as contas do
curador provisório são prestadas aos curadores definitivos.
ARTIGO 96º
(Remuneração do curador)
O
curador haverá dez por cento da receita líquida que realizar.
ARTIGO 97º
(Substituição do curador provisório)
O
curador pode ser substituído, a requerimento do Ministério Público ou de
qualquer interessado, logo que se mostre inconveniente a sua permanência no
cargo.
ARTIGO 98º
(Termo da curadoria)
A
curadoria provisória termina:
a)
Pelo regresso do ausente;
b)
Se o ausente providenciar acerca da administração dos bens;
c)
Pela comparência de pessoa que legalmente represente o ausente ou de procurador
bastante;
d)
Pela entrega dos bens aos curadores definitivos ou ao cabeça-de-casal, nos
termos do artigo 103º;
e)
Pela certeza da morte do ausente.
SUBSECÇÃO I
Curadoria definitiva
ARTIGO 99º
(Justificação da ausência)
Decorridos
dois anos sem se saber do ausente, se este não tiver deixado representante
legal nem procurador bastante, ou cinco anos, no caso contrário, pode o
Ministério Público ou algum dos interessados requerer a justificação da
ausência.
ARTIGO 100º
(Legitimidade)
São
interessados na justificação da ausência o cônjuge não separado judicialmente
de pessoas e bens, os herdeiros do ausente e todos os que tiverem sobre os bens
do ausente direito dependente da condição da sua morte.
ARTIGO 101º
(Abertura de testamentos)
Justificada
a ausência, o tribunal requisitará certidões dos testamentos públicos e mandará
proceder à abertura dos testamentos cerrados que existirem, a fim de serem
tomados em conta na partilha e no deferimento da curadoria definitiva.
ARTIGO 102º
(Entrega de bens aos legatários e outros
interessados)
Os
legatários, como todos aqueles que por morte do ausente teriam direito a bens
determinados, podem requerer, logo que a ausência esteja justificada,
independentemente da partilha, que esses bens lhes sejam entregues.
ARTIGO 103º
(Entrega dos bens aos herdeiros)
1.
A entrega dos bens aos herdeiros do ausente à data das últimas notícias, ou aos
herdeiros dos que depois tiverem falecido, só tem lugar depois da partilha.
2.
Enquanto não forem entregues os bens, a administração deles pertence ao
cabeça-de-casal, designado nos termos dos artigos 2080º e seguintes.
ARTIGO 104º
(Curadores definitivos)
Os
herdeiros e demais interessados a quem tenham sido entregues os bens do ausente
são havidos como curadores definitivos.
ARTIGO 105º
(Aparecimento de novos interessados)
Se,
depois de nomeados os curadores definitivos, aparecer herdeiro ou interessado
que, em relação à data das últimas notícias do ausente, deva excluir algum
deles ou haja de concorrer à sucessão, ser-lhe-ão entregues os bens nos termos
dos artigos anteriores.
ARTIGO 106º
(Exigibilidade de obrigações)
A
exigibilidade das obrigações que se extinguiriam pela morte do ausente fica
suspensa.
ARTIGO 107º
(Caução)
1.
O tribunal pode exigir caução aos curadores definitivos ou a algum ou alguns deles,
tendo em conta a espécie e valor dos bens e rendimentos que eventualmente hajam
de restituir.
2.
Enquanto não prestar a caução fixada, o curador
está impedido de receber os
bens; estes são entregues, até ao termo da curadoria ou
até à prestação da caução,
a outro herdeiro ou interessado, que ocupará, em
relação a eles, a posição de
curador definitivo.
ARTIGO 108º
(Ausente casado)
Se
o ausente for casado, pode o cônjuge não separado judicialmente de pessoas e
bens requerer inventário e partilha, no seguimento do processo de justificação
da ausência, e exigir os alimentos a que tiver direito.
ARTIGO 109º
(Aceitação e repúdio da sucessão;
disposição dos direitos sucessórios)
1.
Justificada a ausência, é admitido o repúdio da sucessão do ausente ou a
disposição dos respectivos direitos sucessórios.
2.
A eficácia do repúdio ou da disposição, assim como a aceitação da herança ou de
legados, ficam, todavia, sujeitas à condição resolutiva da sobrevivência do
ausente.
ARTIGO 110º
(Direitos e obrigações dos curadores definitivos
e demais interessados)
Aos
curadores definitivos a quem os bens hajam sido entregues é aplicável o
disposto no artigo 94º, ficando extintos os poderes que anteriormente hajam
sido conferidos pelo ausente em relação aos mesmos bens.
ARTIGO 111º
(Fruição dos bens)
1.
Os ascendentes, os descendentes e o cônjuge que sejam nomeados curadores
definitivos têm direito, a contar da entrega dos bens, à totalidade dos frutos
percebidos.
2.
Os curadores definitivos não abrangidos pelo número anterior devem reservar
para o ausente um terço dos rendimentos líquidos dos bens que administrem.
ARTIGO 112º
(Termo da curadoria definitiva)
A
curadoria definitiva termina:
a)
Pelo regresso do ausente;
b)
Pela notícia da sua existência e do lugar onde reside;
c)
Pela certeza da sua morte;
d)
Pela declaração de morte presumida.
ARTIGO 113º
(Restituição dos bens ao ausente)
1.
Nos casos previstos nas alíneas a) e b) do artigo anterior, os bens do ausente
ser-lhe-ão entregues logo que ele o requeira.
2.
Enquanto não for requerida a entrega, mantém-se o regime da curadoria nos
termos desta subsecção.
SUBSECÇÃO III
Morte presumida
ARTIGO 114º
(Requisitos)
1.
Decorridos dez anos sobre a data das últimas notícias, ou passados cinco anos,
se entretanto o ausente houver completado oitenta anos de idade, podem os
interessados a que se refere o artigo 100º requerer a declaração de morte
presumida.
2.
A declaração de morte presumida não será proferida antes de haverem decorrido
cinco anos sobre a data em que o ausente, se fosse vivo, atingiria a
maioridade.
3.
A declaração de morte presumida do ausente não depende de prévia instalação da
curadoria provisória ou definitiva e referir-se-á ao fim do dia das últimas
notícias que dele houve.
ARTIGO 115º
(Efeitos)
A
declaração de morte presumida produz os mesmos efeitos que a morte, mas não
dissolve o casamento, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 116º
(Novo casamento do cônjuge do ausente)
O
cônjuge do ausente casado civilmente pode contrair novo casamento; neste caso,
se o ausente regressar, ou houver notícia de que era vivo quando foram
celebradas as novas núpcias, considera-se o primeiro matrimónio dissolvido por
divórcio à data da declaração de morte presumida.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 117º
(Entrega dos bens)
A
entrega dos bens aos sucessores do ausente é feita nos termos dos artigos 101º
e seguintes, com as necessárias adaptações, mas não há lugar a caução; se esta
tiver sido prestada, pode ser levantada.
ARTIGO 118º
(Óbito em data diversa)
1.
Quando se prove que o ausente morreu em data diversa da fixada na sentença de
declaração de morte presumida, o direito à herança compete aos que naquela data
lhe deveriam suceder, sem prejuízo das regras da usucapião.
2.
Os sucessores de novo designados gozam apenas, em relação aos antigos, dos
direitos que no artigo seguinte são atribuídos ao ausente.
ARTIGO 119º
(Regresso do ausente)
1.
Se o ausente regressar ou dele houver notícias, ser-lhe-á devolvido o
património no estado em que se encontrar, com o preço dos bens alienados ou com
os bens directamente sub-rogados, e bem assim com os bens adquiridos mediante o
preço dos alienados, quando no título de aquisição se declare expressamente a
proveniência do dinheiro.
2.
Havendo má-fé dos sucessores, o ausente tem direito a ser indemnizado do
prejuízo sofrido.
3.
A má-fé, neste caso, consiste no conhecimento de que o ausente sobreviveu à
data da morte presumida.
SUBSECÇÃO IV
Direitos eventuais do ausente
ARTIGO 120º
(Direitos que sobrevierem ao ausente)
Os
direitos que eventualmente sobrevierem ao ausente desde que desapareceu sem
dele haver notícias e que sejam dependentes da condição da sua existência passam
às pessoas que seriam chamadas à titularidade deles se o ausente fosse
falecido.
ARTIGO 121º
(Curadoria provisória e definitiva)
1.
O disposto no artigo anterior não altera o regime da curadoria provisória, à
qual ficam sujeitos os direitos nele referidos.
2.
Instaurada a curadoria definitiva, são havidos como curadores definitivos, para
todos os efeitos legais, aqueles que seriam chamados à titularidade dos
direitos nos termos do mesmo artigo.
SECÇÃO V
Incapacidades
SUBSECÇÃO I
Condição jurídica dos menores
ARTIGO 122º
(Menores)
É
menor quem não tiver ainda completado dezoito anos de idade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 123º
(Incapacidade dos menores)
Salvo
disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercício de
direitos.
ARTIGO 124º
(Suprimento da incapacidade dos menores)
A
incapacidade dos menores é suprida pelo poder paternal e, subsidiariamente,
pela tutela, conforme se dispõe nos lugares respectivos.
ARTIGO 125º
(Anulabilidade dos actos dos menores)
1.
Sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 287º, os negócios jurídicos
celebrados pelo menor podem ser anulados:
a)
A requerimento, conforme os casos, do progenitor que exerça o poder paternal,
do tutor ou do administrador de bens, desde que a acção seja proposta no prazo
de um ano a contar do conhecimento que o requerente haja tido do negócio
impugnado, mas nunca depois de o menor atingir a maioridade ou ser emancipado,
salvo o disposto no artigo 131º;
b)
A requerimento do próprio menor, no prazo de um ano a contar da sua maioridade
ou emancipação;
c)
A requerimento de qualquer herdeiro do menor, no prazo de um ano a contar da
morte deste, ocorrida antes de expirar o prazo referido na alínea anterior.
2.
A anulabilidade é sanável mediante confirmação do menor depois de atingir a
maioridade ou ser emancipado, ou por confirmação do progenitor que exerça o
poder paternal, tutor ou administrador de bens, tratando-se de acto que algum
deles pudesse celebrar como representante do menor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 126º
(Dolo do menor)
Não
tem o direito de invocar a anulabilidade o menor que para praticar o acto tenha
usado de dolo com o fim de se fazer passar por maior ou emancipado.
ARTIGO 127º
(Excepções à incapacidade dos menores)
1.
São excepcionalmente válidos, além de outros previstos na lei:
a)
Os actos de administração ou disposição de bens que o maior de dezasseis anos
haja adquirido por seu trabalho;
b)
Os negócios jurídicos próprios da vida corrente do menor que, estando ao
alcance da sua capacidade natural, só impliquem despesas, ou disposições de
bens, de pequena importância;
c)
Os negócios jurídicos relativos à profissão, arte ou ofício que o menor tenha
sido autorizado a exercer, ou os praticados no exercício dessa profissão, arte
ou ofício.
2.
Pelos actos relativos à profissão, arte ou ofício do menor e pelos actos
praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício só respondem os bens de
que o menor tiver a livre disposição.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 128º
(Dever de obediência)
Em
tudo o quanto não seja ilícito ou imoral, devem os menores não emancipados
obedecer a seus pais ou tutor e cumprir os seus preceitos.
ARTIGO 129º
(Termo da incapacidade dos menores)
A
incapacidade dos menores termina quando eles atingem a maioridade ou são
emancipados, salvas as restrições da lei.
SUBSECÇÃO II
Maioridade e emancipação
ARTIGO 130º
(Efeitos da maioridade)
Aquele
que perfizer dezoito anos de idade adquire plena capacidade de exercício de
direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 131º
(Pendência da acção de interdição ou inabilitação)
Estando,
porém, pendente contra o menor, ao atingir a maioridade, acção de interdição ou
inabilitação, manter-se-á o poder paternal ou a tutela até ao trânsito em
julgado da respectiva sentença.
ARTIGO 132º
(Emancipação)
O
menor é, de pleno direito, emancipado pelo casamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 133º
(Efeitos da emancipação)
A
emancipação atribui ao menor plena capacidade de exercício de direitos,
habilitando-o a reger a sua pessoa e a dispor livremente dos seus bens como se
fosse maior, salvo o disposto no artigo 1649º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 134º A 137º
(Revogados pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
SUBSECÇÃO III
Interdições
ARTIGO 138º
(Pessoas sujeitas a interdição)
1.
Podem ser interditos do exercício dos seus direitos todos aqueles que por
anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira se mostrem incapazes de governar
suas pessoas e bens.
2.
As interdições são aplicáveis a maiores; mas podem ser requeridas e decretadas
dentro do ano anterior à maioridade, para produzirem os seus efeitos a partir
do dia em que o menor se torne maior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 139º
(Capacidade do interdito e regime da interdição)
Sem
prejuízo do disposto nos artigos seguintes, o interdito é equiparado ao menor,
sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regulam
a incapacidade por menoridade e fixam os meios de suprir o poder paternal.
ARTIGO 140º
(Competência dos tribunais comuns)
Pertence
ao tribunal por onde corre o processo de interdição a competência atribuída ao
tribunal de menores nas disposições que regulam o suprimento do poder paternal.
ARTIGO 141º
(Legitimidade)
1.
A interdição pode ser requerida pelo cônjuge do interditando, pelo tutor ou
curador deste, por qualquer parente sucessível ou pelo Ministério Público.
2.
Se o interditando estiver sob o poder paternal, só têm legitimidade para
requerer a interdição os progenitores que exercerem aquele poder e o Ministério
Público.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 142º
(Providências provisórias)
1.
Em qualquer altura do processo pode ser nomeado um tutor provisório que celebre
em nome do interditando, com autorização do tribunal, os actos cujo adiamento
possa causar-lhe prejuízo.
2.
Pode também ser decretada a interdição provisória, se houver necessidade
urgente de providenciar quanto à pessoa e bens do interditando.
ARTIGO 143º
(A quem incumbe a tutela)
1.
A tutela é deferida pela ordem seguinte:
a)
Ao cônjuge do interdito, salvo se estiver separado judicialmente de pessoas e
bens ou separado de facto por culpa sua, ou se for por outra causa legalmente
incapaz;
b)
À pessoa designada pelos pais ou pelo progenitor que exercer o poder paternal,
em testamento ou documento autêntico ou autenticado;
c)
A qualquer dos progenitores do interdito que, de acordo com o interesse deste,
o tribunal designar;
d)
Aos filhos maiores, preferindo o mais velho, salvo se o tribunal, ouvido o
conselho de família, entender que algum dos outros dá maiores garantias de bom
desempenho do cargo.
2.
Quando não seja possível ou razões ponderosas desaconselham o deferimento da
tutela nos termos do número anterior, cabe ao tribunal designar tutor, ouvido o
conselho de família.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 144º
(Exercício do poder paternal)
Recaindo
a tutela no pai ou na mãe, exercem estes o poder paternal como se dispõe nos
artigos 1878º e seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 145º
(Dever especial de tutor)
O
tutor deve cuidar especialmente da saúde do interdito, podendo para esse efeito
alienar os bens deste, obtida a necessária autorização judicial.
ARTIGO 146º
(Escusa da tutela e exoneração do tutor)
1.
O cônjuge do interdito, bem como os descendentes ou ascendentes deste, não
podem escusar-se da tutela, nem ser dela exonerados, salvo se tiver havido
violação do disposto no artigo 143º.
2.
Os descendentes do interdito podem, contudo, ser exonerados a seu pedido ao fim
de cinco anos, se existirem outros dependentes igualmente idóneos para o
exercício do cargo.
ARTIGO 147º
(Publicidade da interdição)
À
sentença de interdição definitiva é
aplicável, com as necessárias adaptações, o
disposto nos artigos 1920º-B e 1920º-C.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 148º
(Actos do interdito posteriores ao registo da
sentença)
São
anuláveis os negócios jurídicos celebrados pelo interdito depois do registo da
sentença de interdição definitiva.
ARTIGO 149º
(Actos praticados no decurso da acção)
1.
São igualmente anuláveis os negócios jurídicos celebrados pelo incapaz depois
de anunciada a proposição da acção nos termos da lei de processo, contanto qua
a interdição venha a ser definitivamente decretada e se mostre que o negócio
causou prejuízo ao interdito.
2.
O prazo dentro do qual a acção de anulação deve ser proposta só começa a
contar-se a partir do registo da sentença.
ARTIGO 150º
(Actos anteriores à publicidade da acção)
Aos
negócios celebrados pelo incapaz antes de anunciada a proposição da acção é
aplicável o disposto acerca da incapacidade acidental.
ARTIGO 151º
(Levantamento da interdição)
Cessando
a causa que determinou a interdição, pode esta ser levantada a requerimento do
próprio interdito ou das pessoas mencionadas no nº 1 do artigo 141º.
SUBSECÇÃO IV
Inabilitações
Artigo 152º
(Pessoas sujeitas a inabilitação)
Podem
ser inabilitados os indivíduos cuja anomalia psíquica, surdez-mudez ou
cegueira, embora de carácter permanente, não seja de tal modo grave que
justifique a sua interdição, assim como aqueles que, pela sua habitual
prodigalidade ou pelo uso de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes, se
mostrem incapazes de reger convenientemente o seu património.
Artigo 153º
(Suprimento da inabilidade)
1.
Os inabilitados são assistidos por um curador, a cuja autorização estão
sujeitos os actos de disposição de bens entre vivos e todos os que, em atenção
às circunstâncias de cada caso, forem especificados na sentença.
2.
A autorização do curador pode ser judicialmente suprida.
ARTIGO 154º
(Administração dos bens do inabilitado)
1.
A administração do património do inabilitado pode ser entregue pelo tribunal,
no todo ou em parte, ao curador.
2.
Neste caso, haverá lugar à constituição do conselho de família e designação do
vogal que, como subcurador exerça as funções que na tutela cabem ao protutor.
3.
O curador deve prestar contas da sua administração.
ARTIGO 155º
(Levantamento da inabilitação)
Quando
a inabilitação tiver por causa a prodigalidade ou o abuso de bebidas alcoólicas
ou de estupefacientes, o seu levantamento não será deferido antes que decorram
cinco anos sobre o trânsito em julgado da sentença que a decretou ou da decisão
que haja desatendido um pedido anterior.
ARTIGO 156º
(Regime supletivo)
Em
tudo quanto se não ache especialmente regulado nesta subsecção é aplicável à
inabilitação, com as necessárias adaptações, o regime das interdições.
CAPÍTULO II
Pessoas colectivas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 157º
(Campo de aplicação)
As
disposições do presente capítulo são
aplicáveis às associações que não
tenham
por fim o lucro económico dos associados, às
fundações de interesse social, e
ainda às sociedades, quando a analogia das
situações o justifique.
ARTIGO 158º
(Aquisição da personalidade)
1.
As associações constituídas por escritura pública, com as especificações
referidas no nº 1 do artigo 167º, gozam de personalidade jurídica.
2.
As fundações adquirem personalidade jurídica pelo reconhecimento, o qual é
individual e da competência da autoridade administrativa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 158º-A
(Nulidade do acto de constituição ou instituição)
É
aplicável à constituição de pessoas colectivas o disposto no artigo 280º,
devendo o Ministério Público promover a declaração judicial da nulidade.
(Aditado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 159º
(Sede)
A
sede da pessoa colectiva é a que os respectivos estatutos fixarem ou, na falta
de designação estatutária, o lugar em que funciona normalmente a administração
principal.
ARTIGO 160º
(Capacidade)
1.
A capacidade das pessoas colectivas abrange todos os direitos e obrigações
necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins.
2.
Exceptuam-se os direitos e obrigações vedados por lei ou que sejam inseparáveis
da personalidade singular.
ARTIGO 161º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
ARTIGO 162º
(Órgãos)
Os
estatutos da pessoa colectiva designarão os respectivos órgãos, entre os quais
haverá um órgão colegial de administração e um conselho fiscal, ambos eles
constituídos por um número ímpar de titulares, dos quais um será o presidente.
ARTIGO 163º
(Representação)
1.
A representação da pessoa colectiva, em juízo e fora dele, cabe a quem os
estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração
ou a quem por ela for designado.
2.
A designação de representantes por parte da administração só é oponível a
terceiros quando se prove que estes a conheciam.
ARTIGO 164º
(Obrigações e responsabilidade dos titulares
dos órgãos da pessoa colectiva)
1.
As obrigações e a responsabilidade dos titulares dos órgãos das pessoas
colectivas para com estas são definidas nos respectivos estatutos,
aplicando-se, na falta de disposições estatutárias, as regras do mandato com as
necessárias adaptações.
2.
Os membros dos corpos gerentes não podem abster-se de votar nas deliberações
tomadas em reuniões a que estejam presentes, e são responsáveis pelos prejuízos
delas decorrentes, salvo se houverem manifestado a sua discordância.
ARTIGO 165º
(Responsabilidade civil das pessoas colectivas)
As
pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos seus
representantes, agentes ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes
respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários.
ARTIGO 166º
(Destino dos bens no caso de extinção)
1.
Extinta a pessoa colectiva, se existirem bens que lhe tenham sido doados ou
deixados com qualquer encargo ou que estejam afectados a um certo fim, o
tribunal, a requerimento do Ministério Público, dos liquidatários, de qualquer
associado ou interessado, ou ainda de herdeiros do doador ou do autor da deixa
testamentária, atribuí-los-á, com o mesmo encargo ou afectação, a outra pessoa
colectiva.
2.
Os bens não abrangidos pelo número anterior têm o destino que lhes for fixado
pelos estatutos ou por deliberação dos associados, sem prejuízo do disposto em
leis especiais; na falta de fixação ou de lei especial, o tribunal, a
requerimento do Ministério Público, dos liquidatários, ou de qualquer associado
ou interessado, determinará que sejam atribuídos a outra pessoa colectiva ou ao
Estado, assegurando, tanto quanto possível, a realização dos fins da pessoa
extinta.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Associações
ARTIGO 167º
(Acto de constituição e estatutos)
1.
O acto de constituição da associação especificará os bens ou serviços com que
os associados concorrem para o património social, a denominação, fim e sede da
pessoa colectiva, a forma do seu funcionamento, assim como a sua duração,
quando a associação se não constitua por tempo indeterminado.
2.
Os estatutos podem especificar ainda os direitos e obrigações dos associados,
as condições da sua admissão, saída e exclusão, bem como os termos da extinção
da pessoa colectiva e consequente devolução do seu património.
ARTIGO 168º
(Forma e publicidade)
1.
O acto de constituição da associação, os estatutos e as suas alterações devem
constar de escritura pública.
2.
O notário deve, oficiosamente, a expensas da associação, comunicar a
constituição e estatutos, bem como as alterações destes, à autoridade
administrativa e ao Ministério Público e remeter ao jornal oficial um extracto
para publicação.
3.
O acto de constituição, os estatutos e as suas alterações não produzem efeitos
em relação a terceiros, enquanto não forem publicados nos termos do número
anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 169º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
ARTIGO 170º
(Titulares dos órgãos da associação
e revogação dos seus poderes)
1.
É a assembleia geral que elege os titulares dos órgãos da associação, sempre
que os estatutos não estabeleçam outro processo de escolha.
2.
As funções dos titulares eleitos ou designados são revogáveis, mas a revogação
não prejudica os direitos fundados no acto de constituição.
3.
O direito de revogação pode ser condicionado pelos estatutos à existência de
justa causa.
ARTIGO 171º
(Convocação e funcionamento do órgão
da administração e do conselho fiscal)
1.
O órgão da administração e o conselho fiscal são convocados pelos respectivos
presidentes e só podem deliberar com a presença da maioria dos seus titulares.
2.
Salvo disposição legal ou estatutária em contrário, as deliberações são tomadas
por maioria de votos dos titulares presentes, tendo o presidente, além do seu
voto, direito a voto de desempate.
ARTIGO 172º
(Competência da assembleia geral)
1.
Competem à assembleia geral todas as deliberações não compreendidas nas
atribuições legais ou estatutárias de outros órgãos da pessoa colectiva.
2.
São, necessariamente, da competência da assembleia geral a
destituição dos
titulares dos órgãos da associação, a
aprovação do balanço, a alteração
dos
estatutos, a extinção da associação e a
autorização para esta demandar os
administradores por factos praticados no exercício do cargo.
ARTIGO 173º
(Convocação da assembleia)
1.
A assembleia geral deve ser convocada pela administração nas circunstâncias
fixadas pelos estatutos e, em qualquer caso, uma vez em cada ano para aprovação
do balanço.
2.
A assembleia será ainda convocada sempre que a convocação seja requerida, com
um fim legítimo, por um conjunto de associados não inferior à quinta parte da
sua totalidade, se outro número não for estabelecido nos estatutos.
3.
Se a administração não convocar a assembleia nos casos em que deve fazê-lo, a
qualquer associado é lícito efectuar a convocação.
ARTIGO 174º
(Forma de convocação)
1.
A assembleia geral é convocada por meio de aviso postal, expedido para cada um
dos associados com a antecedência mínima de oito dias; no aviso indicar-se-á o
dia, hora e local da reunião e a respectiva ordem do dia.
2.
São anuláveis as deliberações tomadas sobre matéria estranha à ordem do dia,
salvo se todos os associados comparecerem à reunião e todos concordarem com o
aditamento.
3.
A comparência de todos os associados sanciona quaisquer irregularidades da
convocação, desde que nenhum deles se oponha à realização da assembleia.
ARTIGO 175º
(Funcionamento)
1.
A assembleia não pode deliberar, em primeira convocação, sem a presença de
metade, pelo menos, dos seus associados.
2.
Salvo o disposto nos números seguintes, as deliberações são tomadas por maioria
absoluta dos associados presentes.
3.
As deliberações sobre alterações dos estatutos exigem o voto favorável de três
quartos do número dos associados presentes.
4.
As deliberações sobre a dissolução ou prorrogação da pessoa colectiva requerem
o voto favorável de três quartos do número de todos os associados.
5.
Os estatutos podem exigir um número de votos superior ao fixado nas regras
anteriores.
ARTIGO 176º
(Privação do direito de voto)
1.
O associado não pode votar, por si ou como representante de outrem, nas
matérias em que haja conflito de interesses entre a associação e ele, seu
cônjuge, ascendentes ou descendentes.
2.
As deliberações tomadas com infracção do disposto no número anterior são
anuláveis se o voto do associado impedido for essencial à existência da maioria
necessária.
ARTIGO 177º
(Deliberações contrárias à lei ou aos estatutos)
As
deliberações da assembleia geral contrárias à lei ou aos estatutos, seja pelo
seu objecto, seja por virtude de irregularidades havidas na convocação dos
associados ou no funcionamento da assembleia, são anuláveis.
ARTIGO 178º
(Regime da anulabilidade)
1.
A anulabilidade prevista nos artigos anteriores pode ser arguida, dentro do
prazo de seis meses, pelo órgão da administração ou por qualquer associado que
não tenha votado a deliberação.
2.
Tratando-se de associado que não foi convocado regularmente para a reunião da
assembleia, o prazo só começa a correr a partir da data em que ele teve
conhecimento da deliberação.
ARTIGO 179º
(Protecção dos direitos de terceiro)
A
anulação das deliberações da assembleia não prejudica os direitos que terceiro
de boa fé haja adquirido em execução das deliberações anuladas.
ARTIGO 180º
(Natureza pessoal da qualidade de associado)
Salvo
disposição estatutária em contrário, a qualidade de associado não é
transmissível, quer por acto entre vivos, quer por sucessão; o associado não
pode incumbir outrem de exercer os seus direitos pessoais.
ARTIGO 181º
(Efeitos da saída ou exclusão)
O
associado que por qualquer forma deixar de pertencer à associação não tem o
direito de repetir as quotizações que haja pago e perde o direito ao património
social, sem prejuízo da sua responsabilidade por todas as prestações relativas
ao tempo em que foi membro da associação.
ARTIGO 182º
(Causas de extinção)
1.
As associações extinguem-se:
a)
Por deliberação da assembleia geral;
b)
Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente;
c)
Pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no acto de
constituição ou nos estatutos;
d)
Pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados;
e)
Por decisão judicial que declare a sua insolvência.
2.
As associações extinguem-se ainda por decisão judicial:
a)
Quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b)
Quando o seu fim real não coincida com o fim expresso no acto de constituição
ou nos estatutos;
c)
Quando o seu fim seja sistematicamente prosseguido por meios ilícitos ou
imorais;
d)
Quando a sua existência se torne contrária à ordem pública.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 183º
(Declaração da extinção)
1.
Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo anterior, a extinção
só se produzirá se, nos trinta dias subsequentes à data em que devia operar-se,
a assembleia geral não decidir a prorrogação da associação ou a modificação dos
estatutos.
2.
Nos casos previstos no nº 2 do artigo precedente, a declaração da extinção pode
ser pedida em juízo pelo Ministério Público ou por qualquer interessado.
3.
A extinção por virtude da declaração de insolvência dá-se em consequência da
própria declaração.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 184º
(Efeitos da extinção)
1.
Extinta a associação, os poderes dos seus órgãos ficam limitados à prática dos
actos meramente conservatórios e dos necessários, quer à liquidação do
património social, quer à ultimação dos negócios pendentes; pelos actos
restantes e pelos danos que deles advenham à associação respondem
solidariamente os administradores que os praticarem.
2.
Pelas obrigações que os administradores contraírem, a associação só responde
perante terceiros se estes estavam de boa fé e à extinção não tiver sido dada a
devida publicidade.
SECÇÃO III
Fundações
ARTIGO 185º
(Instituição e sua revogação)
1.
As fundações podem ser instituídas por acto entre vivos ou por testamento,
valendo como aceitação dos bens a elas destinados, num caso ou noutro, o
reconhecimento respectivo.
2.
O reconhecimento pode ser requerido pelo instituidor, seus herdeiros ou
executores testamentários, ou ser oficiosamente promovido pela autoridade
competente.
3.
A instituição por actos entre vivos deve constar de escritura pública e torna-se
irrevogável logo que seja requerido o reconhecimento ou principie o respectivo
processo oficioso.
4.
Aos herdeiros do instituidor não é permitido revogar a instituição, sem
prejuízo do disposto acerca da sucessão legitimária.
5.
Ao acto de instituição da fundação, quando conste de escritura pública, bem
como, em qualquer caso, aos estatutos e suas alterações, é aplicável o disposto
na parte final do artigo 168º.
ARTIGO 186º
(Acto de instituição e estatutos)
1.
No acto de instituição deve o instituidor indicar o fim da fundação e
especificar os bens que lhe são destinados.
2.
No acto de instituição ou nos estatutos pode o instituidor providenciar ainda
sobre a sede, organização e funcionamento da fundação, regular os termos da sua
transformação ou extinção e fixar o destino dos respectivos bens.
ARTIGO 187º
(Estatutos lavrados por pessoa diversa do
instituidor)
1.
Na falta de estatutos lavrados pelo instituidor ou na insuficiência deles,
constando a instituição de testamento, é aos executadores deste que compete
elaborá-los ou completá-los.
2.
A elaboração total ou parcial dos estatutos incumbe à própria autoridade
competente para o reconhecimento da fundação, quando o instituidor os não tenha
feito e a instituição não conste de testamento, ou quando os executores
testamentários os não lavrem dentro do ano posterior à abertura da sucessão.
3.
Na elaboração dos estatutos ter-se-á em conta, na medida do possível, a vontade
real ou presumível do fundador.
ARTIGO 188º
(Reconhecimento)
1.
Não será reconhecida a fundação cujo fim não for considerado de interesse
social pela entidade competente.
2.
Será igualmente negado o reconhecimento, quando os bens afectados à fundação se
mostrem insuficientes para a prossecução do fim visado e não haja fundadas
expectativas de suprimento da insuficiência.
3.
Negado o reconhecimento por insuficiência do património, fica a instituição sem
efeito, se o institutidor for vivo; mas, se já houver falecido, serão os bens
entregues a uma associação ou fundação de fins análogos, que a entidade
competente designar, salvo disposição do instituidor em contrário.
ARTIGO 189º
(Modificação dos estatutos)
Os
estatutos da fundação podem a todo o tempo ser modificados pela autoridade
competente para o reconhecimento, sob proposta da respectiva administração,
contanto que não haja alteração essencial do fim da instituição e se não
contrarie a vontade do fundador.
ARTIGO 190º
(Transformação)
1.
Ouvida a administração, e também o fundador, se for vivo, a entidade competente
para o reconhecimento pode atribuir à fundação um fim diferente:
a)
Quando tiver sido inteiramente preenchido o fim para que foi instituída ou este
se tiver tornado impossível;
b)
Quando o fim da instituição deixar de revestir interesse social;
c)
Quando o património se tornar insuficiente para a realização do fim previsto.
2.
O novo fim deve aproximar-se, no que for possível, do fim fixado pelo fundador.
3.
Não há lugar à mudança de fim, se o acto de
instituição prescrever a extinção
da fundação.
ARTIGO 191º
(Encargo prejudicial aos fins da fundação)
1.
Estando o património da fundação onerado com encargos cujo cumprimento
impossibilite ou dificulte gravemente o preenchimento do fim institucional,
pode a entidade competente para o reconhecimento sob proposta da administração,
suprimir, reduzir ou comutar esses encargos, ouvido o fundador, se for vivo.
2.
Se, porém, o encargo tiver sido motivo essencial da instituição, pode a mesma
entidade considerar o seu cumprimento como fim da fundação, ou incorporar a
fundação noutra pessoa colectiva capaz de satisfazer o encargo à custa do
património incorporado, sem prejuízo dos seus próprios fins.
ARTIGO 192º
(Causas de extinção)
1.
As fundações extinguem-se:
a)
Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente;
b)
Pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no acto de
instituição;
c)
Por decisão judicial que declare a sua insolvência.
2.
As fundações podem ainda ser extintas pela entidade competente para o
reconhecimento:
a)
Quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b)
Quando o seu fim real não coincida com o fim expresso no acto de instituição;
c)
Quando o seu fim seja sistematicamente prosseguido por meios ilícitos ou
imorais;
d)
Quando a sua existência se torne contrária à ordem pública.
ARTIGO 193º
(Declaração da extinção)
Quando
ocorra alguma das causas extintivas previstas no nº 1 do artigo anterior, a
administração da fundação comunicará o facto à autoridade competente para o
reconhecimento, a fim de esta declarar a extinção e tomar as providências que
julgue convenientes para a liquidação do património.
ARTIGO 194º
(Efeitos da extinção)
Extinta
a fundação, na falta de providências especiais em contrário tomadas pela
autoridade competente, é aplicável o disposto no artigo 184º.
CAPÍTULO III
Associações sem personalidade
jurídica
e comissões especiais
ARTIGO 195º
(Organização e administração)
1.
À organização interna e administração das associações sem personalidade
jurídica são aplicáveis as regras estabelecidas pelos associados e, na sua
falta, as disposições legais relativas às associações, exceptuadas as que
pressupõem a personalidade destas.
2.
As limitações impostas aos poderes normais dos administradores só são oponíveis
a terceiro quando este as conhecia ou devia conhecer.
3.
À saída dos associados é aplicável o disposto no artigo 181º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 196º
(Fundo comum das associações)
1.
As contribuições dos associados e os bens com elas adquiridos constituem o
fundo comum da associação.
2.
Enquanto a associação subsistir, nenhum associado pode exigir a divisão do
fundo comum e nenhum credor dos associados tem o direito de o fazer excutir.
ARTIGO 197º
(Liberalidades)
1.
As liberalidades em favor de associações sem personalidade jurídica
consideram-se feitas aos respectivos associados, nessa qualidade, salvo se o
autor tiver condicionado a deixa ou doação à aquisição da personalidade
jurídica; neste caso, se tal aquisição se não verificar dentro do prazo de um
ano, fica a disposição sem efeito.
2.
Os bens deixados ou doados à associação sem personalidade jurídica acrescem ao
fundo comum, independentemente de outro acto de transmissão.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 198º
(Responsabilidade por dívidas)
1.
Pelas obrigações validamente assumidas em nome da associação responde o fundo
comum e, na falta ou insuficiência deste, o património daquele que as tiver
contraído; sendo o acto praticado por mais de uma pessoa, respondem todas
solidariamente.
2.
Na falta ou insuficiência do fundo comum e do património dos associados
directamente responsáveis, têm os credores acção contra os restantes
associados, que respondem proporcionalmente à sua entrada para o fundo comum.
3.
A representação em juízo do fundo comum cabe àqueles que tiverem assumido a
obrigação.
ARTIGO 199º
(Comissões especiais)
As
comissões constituídas para realizar qualquer plano de socorro ou
beneficiência, ou promover a execução de obras públicas, monumentos, festivais,
exposições, festejos e actos semelhantes, se não pedirem o reconhecimento da
personalidade da associação ou não a obtiverem, ficam sujeitas, na falta de lei
em contário, às disposições subsequentes.
ARTIGO 200º
(Responsabilidade dos organizadores e
administradores)
1.
Os membros da comissão e os encarregados de administrar os seus fundos são
pessoal e solidariamente responsáveis pela conservação dos fundos recolhidos e
pela sua afectação ao fim anunciado.
2.
Os membros da comissão respondem ainda, pessoal e solidariamente, pelas
obrigações contraídas em nome dela.
3.
Os subscritores só podem exigir o valor que tiverem subscrito quando se não
cumpra, por qualquer motivo, o fim para que a comissão foi constituída.
ARTIGO 201º
(Aplicação dos bens a outro fim)
1.
Se os fundos angariados forem insuficientes para o fim anunciado, ou este se
mostrar impossível, ou restar algum saldo depois de satisfeito o fim da
comissão, os bens terão a aplicação prevista no acto constitutivo da comissão
ou no programa anunciado.
2.
Se nenhuma aplicação tiver sido prevista e a comissão não quiser aplicar os
bens a um fim análogo, cabe à autoridade administrativa prover sobre o seu
destino, respeitando na medida do possível a intenção dos subscritores.
SUBTÍTULO II
Das coisas
ARTIGO 202º
(Noção)
1.
Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas.
2.
Consideram-se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser
objecto de direitos privados, tais como as que se encontram no domínio público
e as que são, por sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual.
ARTIGO 203º
(Classificação das coisas)
As
coisas são imóveis ou móveis, simples ou compostas, fungíveis ou não fungíveis,
consumíveis ou não consumíveis, divisíveis ou indivisíveis, principais ou
acessórias, presentes ou futuras.
ARTIGO 204º
(Coisas imóveis)
1.
São coisas imóveis:
a)
Os prédios rústicos e urbanos;
b)
As águas;
c)
As árvores, os arbustos e os frutos naturais, enquanto estiverem ligados ao
solo;
d)
Os direitos inerentes aos imóveis mencionados nas alíneas anteriores;
e)
As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos.
2.
Entende-se por prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções
nele existentes que não tenham autonomia económica, e por prédio urbano
qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de
logradouro.
3.
É parte integrante toda a coisa móvel ligada materialmente ao prédio com
carácter de permanência.
ARTIGO 205º
(Coisas móveis)
1.
São móveis todas as coisas não compreendidas no artigo anterior.
2.
Às coisas móveis sujeitas a registo público é aplicável o regime das coisas
móveis em tudo o que não seja especialmente regulado.
ARTIGO 206º
(Coisas compostas)
1.
É havida como coisa composta, ou universalidade de facto, a pluralidade de
coisas móveis que, pertencendo à mesma pessoa, têm um destino unitário.
2.
As coisas singulares que constituem a universalidade podem ser objecto de
relações jurídicas próprias.
ARTIGO 207º
(Coisas fungíveis)
São
fungíveis as coisas que se determinam pelo seu género, qualidade e quantidade,
quando constituam objecto de relações jurídicas.
ARTIGO 208º
(Coisas consumíveis)
São
consumíveis as coisas cujo uso regular importa a sua destruição ou a sua
alienação.
ARTIGO 209º
(Coisas divisíveis)
São
divisíveis as coisas que podem ser fraccionadas sem alteração da sua
substância, diminuição de valor ou prejuízo para o uso a que se destinam.
ARTIGO 210º
(Coisas acessórias)
1.
São coisas acessórias, ou pertenças, as coisas móveis que, não constituindo
partes integrantes, estão afectadas por forma duradoura ao serviço ou
ornamentação de uma outra.
2.
Os negócios jurídicos que têm por objecto a coisa principal não abrangem, salvo
declaração em contrário, as coisas acessórias.
ARTIGO 211º
(Coisas futuras)
São
coisas futuras as que não estão em poder do disponente, ou a que este não tem
direito, ao tempo da declaração negocial.
ARTIGO 212º
(Frutos)
1.
Diz-se fruto de uma coisa tudo o que ela produz periodicamente, sem prejuízo da
sua substância.
2.
Os frutos são naturais ou civis; dizem-se naturais os que provêm directamente
da coisa, e civis as rendas ou interesses que a coisa produz em consequência de
uma relação jurídica.
3.
Consideram-se frutos das universalidades de animais as crias não destinadas à
substituição das cabeças que por qualquer causa vierem a faltar, os despojos, e
todos os proventos auferidos, ainda que a título eventual.
ARTIGO 213º
(Partilha dos frutos)
1.
Os que têm direito aos frutos naturais até um momento determinado, ou a partir
de certo momento, fazem seus todos os frutos percebidos durante a vigência do
seu direito.
2.
Quanto a frutos civis, a partilha faz-se proporcionalmente à duração do
direito.
ARTIGO 214º
(Frutos colhidos prematuramente)
Quem
colher prematuramente frutos naturais é obrigado a restituí-los, se vier a
extinguir-se o seu direito antes da época normal das colheitas.
ARTIGO 215º
(Restituição de frutos)
1.
Quem for obrigado por lei à restituição de frutos percebidos tem direito a ser
indemnizado das despesas de cultura, sementes e matérias-primas e dos restantes
encargos de produção e colheita, desde que não sejam superiores ao valor desses
frutos.
2.
Quando se trate de frutos pendentes, o que é obrigado à entrega da coisa não
tem direito a qualquer indemnização, salvo nos casos especialmente previstos na
lei.
ARTIGO 216º
(Benfeitorias)
1.
Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar
a coisa.
2.
As benfeitorias são necessárias, úteis ou voluptuárias.
3.
São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou
deterioração da coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua
conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo
indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas
para recreio do benfeitorizante.
SUBTÍTULO III
DOS FACTOS JURÍDICOS
CAPÍTULO I
Negócio jurídico
SECÇÃO I
Declaração negocial
SUBSECÇÃO I
Modalidades da declaração
ARTIGO 217º
(Declaração expressa e declaração tácita)
1.
A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por
palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e
tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam.
2.
O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente,
desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se
deduz.
ARTIGO 218º
(O silêncio como meio declarativo)
O
silêncio vale como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído
por lei, uso ou convenção.
SUBSECÇÃO II
Forma
ARTIGO 219º
(Liberdade de forma)
A
validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial,
salvo quando a lei a exigir.
ARTIGO 220º
(Inobservância da forma legal)
A
declaração negocial que careça da forma legalmente prescrita é nula, quando
outra não seja a sanção especialmente prevista na lei.
ARTIGO 221º
(Âmbito da forma legal)
1.
As estipulações verbais acessórias anteriores ao documento legalmente exigido
para a declaração negocial, ou contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a
razão determinante da forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem
à vontade do autor da declaração.
2.
As estipulações posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal
prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhe forem
aplicáveis.
ARTIGO 222º
(Âmbito da forma voluntária)
1.
Se a forma escrita não for exigida por lei, mas tiver sido adoptada pelo autor
da declaração, as estipulações verbais acessórias anteriores ao escrito, ou
contemporâneas dele, são válidas, quando se mostre que correspondem à vontade
do declarante e a lei as não sujeite à forma escrita.
2.
As estipulações verbais posteriores ao documento são válidas, excepto se, para
o efeito, a lei exigir a forma escrita.
ARTIGO 223º
(Forma convencional)
1.
Podem as partes estipular uma forma especial para a declaração; presume-se,
neste caso, que as partes se não querem vincular senão pela forma
convencionada.
2.
Se, porém, a forma só for convencionada depois de o negócio estar concluído ou
no momento da sua conclusão, e houver fundamento para admitir que as partes se
quiseram vincular desde logo, presume-se que a convenção teve em vista a
consolidação do negócio, ou qualquer outro efeito, mas não a sua substituição.
SUBSECÇÃO III
Perfeição da declaração negocial
ARTIGO 224º
(Eficácia da declaração negocial)
1.
A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao
seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se
manifesta na forma adequada.
2.
É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não
foi por ele oportunamente recebida.
3.
A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não
poder ser conhecida é ineficaz.
ARTIGO 225º
(Anúncio público da declaração)
A
declaração pode ser feita mediante anúncio publicado num dos jornais da
residência do declarante, quando se dirija a pessoa desconhecida ou cujo
paradeiro seja por aquele ignorado.
ARTIGO 226º
(Morte, incapacidade ou indisponibilidade
superveniente)
1.
A morte ou incapacidade do declarante, posterior à emissão da declaração, não
prejudica a eficácia desta, salvo se o contrário resultar da própria
declaração.
2.
A declaração é ineficaz, se o declarante, enquanto o destinatário não a receber
ou dela não tiver conhecimento, perder o poder de disposição do direito a que
ela se refere.
ARTIGO 227º
(Culpa na formação dos contratos)
1.
Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos
preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob
pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.
2.
A responsabilidade prescreve nos termos do artigo 498º.
ARTIGO 228º
(Duração da proposta contratual)
1.
A proposta do contrato obriga o proponente nos termos seguintes:
a)
Se for fixado pelo proponente ou convencionado pelas partes um prazo para a
aceitação, a proposta mantém-se até o prazo findar;
b)
Se não for fixado prazo, mas o proponente pedir resposta imediata, a proposta
mantém-se até que, em condições normais, esta e a aceitação cheguem ao seu
destino;
c)
Se não for fixado prazo e a proposta for feita a pessoa ausente ou, por
escrito, a pessoa presente, manter-se-á até cinco dias depois do prazo que
resulta do preceituado na alínea precedente.
2.
O disposto no número anterior não prejudica o direito de revogação da proposta
nos termos em que a revogação é admitida no artigo 230º.
ARTIGO 229º
(Recepção tardia)
1.
Se o proponente receber a aceitação tardiamente, mas não tiver razões para
admitir que ela foi expedida fora do tempo, deve avisar imediatamente o
aceitante de que o contrato se não concluiu, sob pena de responder pelo
prejuízo havido.
2.
O proponente pode, todavia, considerar eficaz a resposta tardia, desde que ela
tenha sido expedida em tempo oportuno; em qualquer outro caso, a formação do
contrato depende de nova proposta e nova aceitação.
ARTIGO 230º
(Irrevogabilidade da proposta)
1.
Salvo declaração em contrário, a proposta de contrato é irrevogável depois de
ser recebida pelo destinatário ou de ser dele conhecida.
2.
Se, porém, ao mesmo tempo que a proposta, ou antes dela, o destinatário receber
a retractação do proponente ou tiver por outro meio conhecimento dela, fica a
proposta sem efeito.
3.
A revogação da proposta, quando dirigida ao público, é eficaz, desde que seja
feita na forma da oferta ou em forma equivalente.
ARTIGO 231º
(Morte ou incapacidade do proponente
ou do destinatário)
1.
Não obsta à conclusão do contrato a morte ou incapacidade do proponente,
excepto se houver fundamento para presumir que outra teria sido a sua vontade.
2.
A morte ou incapacidade do destinatário determina a ineficácia da proposta.
ARTIGO 232º
(Âmbito do acordo de vontades)
O
contrato não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas
as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.
ARTIGO 233º
(Aceitação com modificações)
A
aceitação com aditamentos, limitações ou
outras modificações importa a rejeição
da proposta; mas, se a modificação for suficientemente
precisa, equivale a nova
proposta, contanto que outro sentido não resulte da
declaração.
Artigo 234º
(Dispensa da declaração de aceitação)
Quando
a proposta, a própria natureza ou circunstâncias do negócio, ou os usos tornem
dispensável a declaração de aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que
a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta.
Artigo 235º
(Revogação da aceitação ou da rejeição)
1.
Se o destinatário rejeitar a proposta, mas depois a aceitar, prevalece a
aceitação, desde que esta chegue ao poder do proponente, ou seja dele
conhecida, ao mesmo tempo que a rejeição, ou antes dela.
2.
A aceitação pode ser revogada mediante declaração que ao mesmo tempo, ou antes
dela, chegue ao poder do proponente ou seja dele conhecida.
SUBSECÇÃO IV
Interpretação e integração
ARTIGO 236º
(Sentido normal da declaração)
1.
A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado
na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante,
salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2.
Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com
ela que vale a declaração emitida.
ARTIGO 237º
(Casos duvidosos)
Em
caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos,
o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior
equilíbrio das prestações.
ARTIGO 238º
(Negócios formais)
1.
Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha
um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que
imperfeitamente expresso.
2.
Esse sentido pode, todavia, valer, se corresponder à vontade real das partes e
as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem a essa validade.
ARTIGO 239º
(Integração)
Na
falta de disposição especial, a declaração negocial deve ser integrada de
harmonia com a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto
omisso, ou de acordo com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por
eles imposta.
SUBSECÇÃO V
Falta e vícios da vontade
ARTIGO 240º
(Simulação)
1.
Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar
terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do
declarante, o negócio diz-se simulado.
2.
O negócio simulado é nulo.
ARTIGO 241º
(Simulação relativa)
1.
Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar,
é aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem
dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio
simulado.
2.
Se, porém, o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver
sido observada a forma exigida por lei.
ARTIGO 242º
(Legitimidade para arguir a simulação)
1.
Sem prejuízo do disposto no artigo 286º, a nulidade do negócio simulado pode
ser arguida pelos próprios simuladores entre si, ainda que a simulação seja
fraudulenta.
2.
A nulidade pode também ser invocada pelos herdeiros legitimários que pretendam
agir em vida do autor da sucessão contra os negócios por ele simuladamente
feitos com o intuito de os prejudicar.
ARTIGO 243º
(Inoponibilidade da simulação a terceiros de boa fé)
1.
A nulidade proveniente da simulação não pode ser arguida pelo simulador contra
terceiro de boa fé.
2.
A boa fé consiste na ignorância da simulação ao tempo em que foram constituídos
os respectivos direitos.
3.
Considera-se sempre de má fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente
ao registo da acção de simulação, quando a este haja lugar.
ARTIGO 244º
(Reserva mental)
1.
Há reserva mental, sempre que é emitida uma declaração contrária à vontade real
com o intuito de enganar o declaratário.
2.
A reserva não prejudica a validade da declaração, excepto se for conhecida do
declaratário; neste caso, a reserva tem os efeitos da simulação.
ARTIGO 245º
(Declarações não sérias)
1.
A declaração não séria, feita na expectativa de que a falta de seriedade não
seja desconhecida, carece de qualquer efeito.
2.
Se, porém, a declaração for feita em circunstâncias que induzam o declaratário
a aceitar justificadamente a sua seriedade, tem ele o direito de ser
indemnizado pelo prejuízo que sofrer.
ARTIGO 246º
(Falta de consciência da declaração e coacção física)
A
declaração não produz qualquer efeito, se o declarante não tiver a consciência
de fazer uma declaração negocial ou for coagido pela força física a emiti-la;
mas, se a falta de consciência da declaração foi devida a culpa, fica o
declarante obrigado a indemnizar o declaratário.
ARTIGO 247º
(Erro na declaração)
Quando,
em virtude de erro, a vontade declarada não corresponda à vontade real do
autor, a declaração negocial é anulável, desde que o declaratário conhecesse ou
não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que
incidiu o erro.
ARTIGO 248º
(Validação do negócio)
A
anulabilidade fundada em erro na declaração não procede, se o declaratário
aceitar o negócio como o declarante o queria.
ARTIGO 249º
(Erro de cálculo ou de escrita)
O
simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no
próprio contexto da
declaração ou através das circunstâncias em
que a declaração é feita, apenas dá
o direito à rectificação desta.
ARTIGO 250º
(Erro na transmissão da declaração)
1.
A declaração negocial inexactamente transmitida por quem seja incumbido da
transmissão pode ser anulada nos termos do artigo 247º.
2.
Quando, porém, a inexactidão for devida a dolo do intermediário, a declaração é
sempre anulável.
ARTIGO 251º
(Erro sobre a pessoa ou sobre o objecto do negócio)
O
erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa
do declaratário ou ao objecto do negócio, torna este anulável nos termos do
artigo 247º.
ARTIGO 252º
(Erro sobre os motivos)
1.
O erro que recaia nos motivos determinantes da vontade, mas se não refira à
pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as
partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo.
2.
Se, porém, recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, é
aplicável ao erro do declarante o disposto sobre a resolução ou modificação do
contrato por alteração das circunstâncias vigentes no momento em que o negócio
foi concluído.
ARTIGO 253º
(Dolo)
1.
Entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a
intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem
como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante.
2.
Não constituem dolo ilícito as sugestões ou artifícios usuais, considerados
legítimos segundo as concepções dominantes no comércio jurídico, nem a
dissimulação do erro, quando nenhum dever de elucidar o declarante resulte da
lei, de estipulação negocial ou daquelas concepções.
ARTIGO 254º
(Efeitos do dolo)
1.
O declarante cuja vontade tenha sido determinada por dolo pode anular a
declaração; a anulabilidade não é excluída pelo facto de o dolo ser bilateral.
2.
Quando o dolo provier de terceiro, a declaração só é anulável se o destinatário
tinha ou devia ter conhecimento dele; mas, se alguém tiver adquirido
directamente algum direito por virtude da declaração, esta é anulável em
relação ao beneficiário, se tiver sido ele o autor do dolo ou se o conhecia ou
devia ter conhecido.
ARTIGO 255º
(Coacção moral)
1.
Diz-se feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de
um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a
declaração.
2.
A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou
de terceiro.
3.
Não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples
temor reverencial.
ARTIGO 256º
(Efeitos da coacção)
A
declaração negocial extorquida por coacção é anulável, ainda que esta provenha
de terceiro; neste caso, porém, é necessário que seja grave o mal e justificado
o receio da sua consumação.
ARTIGO 257º
(Incapacidade acidental)
1.
A declaração negocial feita por quem, devido a qualquer causa, se encontrava
acidentalmente incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre
exercício da sua vontade é anulável, desde que o facto seja notório ou
conhecido do declaratário.
2.
O facto é notório, quando uma pessoa de normal diligência o teria podido notar.
SUBSECÇÃO VI
Representação
DIVISÃO I
Princípios gerais
ARTIGO 258º
(Efeitos da representação)
O
negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos
limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica
deste último.
ARTIGO 259º
(Falta ou vícios da vontade e
estados subjectivos relevantes)
1.
À excepção dos elementos em que tenha sido decisiva a vontade do representado,
é na pessoa do representante que deve verificar-se, para efeitos de nulidade ou
anulabilidade da declaração, a falta ou vício da vontade, bem como o
conhecimento ou ignorância dos factos que podem influir nos efeitos do negócio.
2.
Ao representado de má fé não aproveita a boa fé do representante.
ARTIGO 260º
(Justificação dos poderes do representante)
1.
Se uma pessoa dirigir em nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este
exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus
poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos.
2.
Se os poderes de representação constarem de documento, pode o terceiro exigir
uma cópia dele assinada pelo representante.
ARTIGO 261º
(Negócio consigo mesmo)
1.
É anulável o negócio celebrado pelo representante consigo mesmo, seja em nome
próprio, seja em representação de terceiro, a não ser que o representado tenha
especificadamente consentido na celebração, ou que o negócio excluía por sua
natureza a possibilidade de um conflito de interesses.
2.
Considera-se celebrado pelo representante, para o efeito do número precedente,
o negócio realizado por aquele em quem tiverem sido substabelecidos os poderes
de representação.
DIVISÃO II
Representação voluntária
ARTIGO 262º
(Procuração)
1.
Diz-se procuração o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente,
poderes representativos.
2.
Salvo disposição legal em contrário, a procuração revestirá a forma exigida
para o negócio que o procurador deva realizar.
ARTIGO 263º
(Capacidade do procurador)
O
procurador não necessita de ter mais do que a capacidade de entender e querer
exigida pela natureza do negócio que haja de efectuar.
ARTIGO 264º
(Substituição do procurador)
1.
O procurador só pode fazer-se substituir por outrem se o representado o
permitir ou se a faculdade de substituição resultar do conteúdo da procuração
ou da relação jurídica que a determina.
2.
A substituição não envolve exclusão do procurador primitivo, salvo declaração
em contrário.
3.
Sendo autorizada a substituição, o procurador só é responsável para com o
representado se tiver agido com culpa na escolha do substituto ou nas
instruções que lhe deu.
4.
O procurador pode servir-se de auxiliares na execução da procuração, se outra
coisa não resultar do negócio ou da natureza do acto que haja de praticar.
ARTIGO 265º
(Extinção da procuração)
1.
A procuração extingue-se quando o procurador a ela renuncia, ou quando cessa a
relação jurídica que lhe serve de base, excepto se outra for, neste caso, a
vontade do representado.
2.
A procuração é livremente revogável pelo representado, não obstante convenção
em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
3.
Mas, se a procuração tiver sido conferida também no interesse do procurador ou
de terceiro, não pode ser revogada sem acordo do interessado, salvo ocorrendo
justa causa.
ARTIGO 266º
(Protecção de terceiros)
1.
As modificações e a revogação da procuração devem ser levadas ao conhecimento
de terceiros por meios idóneos, sob pena de lhes não serem oponíveis senão
quando se mostre que delas tinham conhecimento no momento da conclusão do
negócio.
2.
As restantes causas extintivas da procuração não podem ser opostas a terceiro
que sem culpa, as tenha ignorado.
ARTIGO 267º
(Restituição do documento da representação)
1.
O representante deve restituir o documento de onde constem os seus poderes,
logo que a procuração tiver caducado.
2.
O representante não goza do direito de retenção do documento.
ARTIGO 268º
(Representação sem poderes)
1.
O negócio que uma pessoa, sem poderes de representação, celebre em nome de
outrem é ineficaz em relação a este, se não for por ele ratificado.
2.
A ratificação está sujeita à forma exigida para a procuração e tem eficácia
retroactiva, sem prejuízo dos direitos de terceiro.
3.
Considera-se negada a ratificação, se não for feita dentro do prazo que a outra
parte fixar para o efeito.
4.
Enquanto o negócio não for ratificado, tem a outra parte a faculdade de o
revogar ou rejeitar, salvo se, no momento da conclusão, conhecia a falta de
poderes do representante.
ARTIGO 269º
(Abuso da representação)
O
disposto no artigo anterior é aplicável ao caso de o representante ter abusado
dos seus poderes, se a outra parte conhecia ou devia conhecer o abuso.
SUBSECÇÃO VII
Condição e termo
ARTIGO 270º
(Noção de condição)
As
partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos
efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se
suspensiva a condição; no segundo, resolutiva.
ARTIGO 271º
(Condições ilícitas ou impossíveis)
1.
É nulo o negócio jurídico subordinado a uma
condição contrária à lei ou à ordem
pública, ou ofensiva dos bons costumes.
2.
É igualmente nulo o negócio sujeito a uma condição suspensiva que seja física
ou legalmente impossível; se for resolutiva, tem-se a condição por não escrita.
ARTIGO 272º
(Pendência da condição)
Aquele
que contrair uma obrigação ou alienar um direito sob condição suspensiva, ou
adquirir um direito sob condição resolutiva, deve agir, na pendência da
condição, segundo os ditames da boa fé, por forma que não comprometa a
integridade do direito da outra parte.
ARTIGO 273º
(Pendência da condição: actos conservatórios)
Na
pendência da condição suspensiva, o adquirente do direito pode praticar actos
conservatórios, e igualmente os pode realizar, na pendência da condição
resolutiva, o devedor ou o alienante condicional.
ARTIGO 274º
(Pendência da condição: actos dispositivos)
1.
Os actos de disposição dos bens ou direitos que constituem objecto do negócio
condicional, realizados na pendência da condição, ficam sujeitos à eficácia ou
ineficácia do próprio negócio, salvo estipulação em contrário.
2.
Se houver lugar à restituição do que tiver sido alienado, é aplicável,
directamente ou por analogia, o disposto nos artigos 1269º e seguintes em
relação ao possuidor de boa fé.
ARTIGO 275º
(Verificação e não verificação da condição)
1.
A certeza de que a condição se não pode verificar equivale à sua não
verificação.
2.
Se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por
aquele a quem prejudica, tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos
termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada.
ARTIGO 276º
(Retroactividade da condição)
Os
efeitos do preenchimento da condição retrotraem-se à data da conclusão do
negócio, a não ser que, pela vontade das partes ou pela natureza do acto, hajam
de ser reportados a outro momento.
ARTIGO 277º
(Não retroactividade)
1.
Sendo a condição resolutiva aposta a um contrato de execução continuada ou
periódica, é aplicável o disposto no nº 2 do art. 434º.
2.
O preenchimento da condição não prejudica a validade dos actos de administração
ordinária realizados, enquanto a condição estiver pendente, pela parte a quem
incumbir o exercício do direito.
3.
À aquisição de frutos pela parte a que se refere o número anterior são
aplicáveis as disposições relativas à aquisição de frutos pelo possuidor de boa
fé.
ARTIGO 278º
(Termo)
Se
for estipulado que os efeitos do negócio jurídico comecem
ou cessem a partir de
certo momento, é aplicável à
estipulação, com as necessárias
adaptações, o
disposto nos artigos 272º e 273º.
ARTIGO 279º
(Cômputo do termo)
À
fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras:
a)
Se o termo se referir ao princípio, meio ou fim do mês, entende-se como tal,
respectivamente, o primeiro dia, o dia 15 e o último dia do mês; se for fixado
no princípio, meio ou fim do ano, entende-se, respectivamente, o primeiro dia
do ano, o dia 30 de Junho e o dia 31 de Dezembro;
b)
Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for
de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr;
c)
O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24
horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data;
mas, se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último
dia desse mês;
d)
É havido, respectivamente, como prazo de uma ou duas semanas o designado por
oito ou quinze dias, sendo havido como prazo de um ou dois dias o designado por
24 ou 48 horas;
e)
O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia
útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o
acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo.
SECÇÃO II
Objecto negocial. Negócios usurários
ARTIGO 280º
(Requisitos do objecto negocial)
1.
É nulo o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legamente impossível,
contrário à lei ou indeterminável.
2.
É nulo o negócio contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes.
ARTIGO 281º
(Fim contrário à lei ou à ordem pública
ou ofensivo dos bons costumes)
Se
apenas o fim do negócio jurídico for contrário à lei ou à ordem pública, ou
ofensivo dos bons costumes, o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas
as partes.
ARTIGO 282º
(Negócios usurários)
1.
É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação
de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou
fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a
promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados.
2.
Fica ressalvado o regime especial estabelecido nos artigos 559º-A e 1146º.
(Redacção do Dec.-Lei 262/83, de 16-6)
ARTIGO 283º
(Modificação dos negócios usurários)
1.
Em lugar da anulação, o lesado pode requerer a modificação do negócio segundos
juízos de equidade.
2.
Requerida a anulação, a parte contrária tem a faculdade de opor-se ao pedido,
declarando aceitar a modificação do negócio nos termos do número anterior.
ARTIGO 284º
(Usura criminosa)
Quando
o negócio usurário constituir crime, o prazo para o exercício do direito de
anulação ou modificação não termina enquanto o crime não prescrever; e, se a
responsabilidade criminal se extinguir por causa diferente da prescrição ou no
juízo penal for proferida sentença que transite em julgado, aquele prazo
conta-se da data da extinção da responsabilidade criminal ou daquela em que a
sentença transitar em julgado, salvo se houver de contar-se a partir de momento
posterior, por força do disposto no nº 1 do artigo 287º.
SECÇÃO III
Nulidade e anulabilidade do negócio
jurídico
ARTIGO 285º
(Disposição geral)
Na
falta de regime especial, são aplicáveis à nulidade e à anulabilidade do
negócio jurídico as disposições dos artigos subsequentes.
ARTIGO 286º
(Nulidade)
A
nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser
declarada oficiosamente pelo tribunal.
ARTIGO 287º
(Anulabilidade)
1.
Só têm legitimidade para arguir a anulabilidade as pessoas em cujo interesse a
lei a estabelece, e só dentro do ano subsequente à cessação do vício que lhe
serve de fundamento.
2.
Enquanto, porém, o negócio não estiver cumprido, pode a anulabilidade ser
arguida, sem dependência de prazo, tanto por via de acção como por via de
excepção.
ARTIGO 288º
(Confirmação)
1.
A anulabilidade é sanável mediante confirmação.
2.
A confirmação compete à pessoa a quem pertencer o direito de anulação, e só é
eficaz quando for posterior à cessação do vício que serve de fundamento à
anulabilidade e o seu autor tiver conhecimento do vício e do direito à
anulação.
3.
A confirmação pode ser expressa ou tácita e não depende de forma especial.
4.
A confirmação tem eficácia retroactiva, mesmo em relação a terceiro.
ARTIGO 289º
(Efeitos da declaração de nulidade e da anulação)
1.
Tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito
retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a
restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
2.
Tendo alguma das partes alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, e
não podendo tornar-se efectiva contra o alienante a restituição do valor dela,
fica o adquirente obrigado em lugar daquele, mas só na medida do seu
enriquecimento.
3.
É aplicável em qualquer dos casos previstos nos números anteriores,
directamente ou por analogia, o disposto nos artigos 1269º e seguintes.
ARTIGO 290º
(Momento da restituição)
As
obrigações recíprocas de restituição que incumbem às partes por força da
nulidade ou anulação do negócio devem ser cumpridas simultaneamente, sendo
extensivas ao caso, na parte aplicável, as normas relativas à excepção de não
cumprimento do contrato.
ARTIGO 291º
(Inoponibilidade da nulidade e da anulação)
1.
A declaração de nulidade ou a anulação do negócio jurídico que respeite a bens
imóveis, ou a bens móveis sujeitos a registo, não prejudica os direitos
adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, por terceiro de boa fé, se o
registo da aquisição for anterior ao registo da acção de nulidade ou anulação
ou ao registo do acordo entre as partes acerca da invalidade do negócio.
2.
Os direitos de terceiro não são, todavia, reconhecidos, se a acção for proposta
e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio.
3.
É considerado de boa fé o terceiro adquirente que no momento da aquisição
desconhecia, sem culpa, o vício do negócio nulo ou anulável.
ARTIGO 292º
(Redução)
A
nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio,
salvo quando se mostre que este não teria sido concluído sem a parte viciada.
ARTIGO 293º
(Conversão)
O
negócio nulo ou anulado pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo
diferente, do qual contenha os requisitos essenciais de substância e de forma,
quando o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido,
se tivessem previsto a invalidade.
ARTIGO 294º
(Negócios celebrados contra a lei)
Os
negócios celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos,
salvo nos casos em que outra solução resulte da lei.
CAPÍTULO II
Actos jurídicos
ARTIGO 295º
(Disposições reguladoras)
Aos
actos jurídicos que não sejam negócios jurídicos são aplicáveis, na medida em
que a analogia das situações o justifique, as disposições do capítulo
precedente.
CAPÍTULO III
O tempo e a sua repercussão nas
relações jurídicas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 296º
(Contagem dos prazos)
As
regras constantes do artigo 279º são aplicáveis, na falta de disposição
especial em contrário, aos prazos e termos fixados por lei, pelos tribunais ou
por qualquer outra autoridade.
ARTIGO 297º
(Alteração de prazos)
1.
A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o
fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso,
mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser
que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
2.
A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já
estejam em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu
momento inicial.
3.
A doutrina dos números anteriores é extensiva, na parte aplicável, aos prazos
fixados pelos tribunais ou por qualquer autoridade.
ARTIGO 298º
(Prescrição, caducidade e não uso do direito)
1.
Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo
estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não
declare isentos de prescrição.
2.
Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser
exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos
que a lei se refira expressamente à prescrição.
3.
Os direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, enfiteuse, superfície e
servidão não prescrevem, mas podem extinguir-se pelo não uso nos casos
especialmente previstos na lei, sendo aplicáveis nesses casos, na falta de
disposição em contrário, as regras da caducidade.
ARTIGO 299º
(Alteração da qualificação)
1.
Se a lei considerar de caducidade um prazo que a lei anterior tratava como
prescricional, ou se, ao contrário, considerar como prazo de prescrição o que a
lei antiga tratava como caso de caducidade, a nova qualificação é também
aplicável aos prazos em curso.
2.
No primeiro caso, porém, se a prescrição estiver suspensa ou tiver sido
interrompida no domínio da lei antiga, nem a suspensão nem a interrupção serão
atingidas pela aplicação da nova lei; no segundo, o prazo passa a ser
susceptível de suspensão e interrupção nos termos gerais da prescrição.
SECÇÃO II
Prescrição
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 300º
(Inderrogabilidade do regime da prescrição)
São
nulos os negócios jurídicos destinados a modificar os prazos legais da
prescrição ou a facilitar ou dificultar por outro modo as condições em que a
prescrição opera os seus efeitos.
ARTIGO 301º
(A quem aproveita a prescrição)
A
prescrição aproveita a todos os que dela possam tirar benefício, sem excepção
dos incapazes.
ARTIGO 302º
(Renúncia da prescrição)
1.
A renúncia da prescrição só é admitida depois de haver decorrido o prazo
prescricional.
2.
A renúncia pode ser tácita e não necessita de ser aceita pelo beneficiário.
3.
Só tem legitimidade para renunciar à prescrição quem puder dispor do benefício
que a prescrição tenha criado.
ARTIGO 303º
(Invocação da prescrição)
O
tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser
eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem
aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério
Público.
ARTIGO 304º
(Efeitos da prescrição)
1.
Completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o
cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do
direito prescrito.
2.
Não pode, contudo, ser repetida a prestação realizada espontaneamente em
cumprimento de uma obrigação prescrita, ainda quando feita com ignorância da
prescrição; este regime é aplicável a quaisquer formas de satisfação do direito
prescrito, bem como ao seu reconhecimento ou à prestação de garantias.
3.
No caso de venda com reserva de propriedade até ao pagamento do preço, se
prescrever o crédito do preço, pode o vendedor, não obstante a prescrição,
exigir a restituição da coisa quando o preço não seja pago.
ARTIGO 305º
(Oponibilidade da prescrição por terceiros)
1.
A prescrição é invocável pelos credores e por terceiros com legítimo interesse
na sua declaração, ainda que o devedor a ela tenha renunciado.
2.
Se, porém, o devedor tiver renunciado, a prescrição só pode ser invocada pelos
credores desde que se verifiquem os requisitos exigidos para a impugnação
pauliana.
3.
Se, demandado o devedor, este não alegar a prescrição e for condenado, o caso
julgado não afecta o direito reconhecido aos seus credores.
ARTIGO 306º
(Início do curso da prescrição)
1.
O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se,
porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido
certo tempo sobre a interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo da
prescrição.
2.
A prescrição de direitos sujeitos a condição suspensiva ou termo inicial só
começa depois de a condição se verificar ou o termo se vencer.
3.
Se for estipulado que o devedor cumprirá quando puder, ou o prazo for deixado
ao arbítrio do devedor, a prescrição só começa a correr depois da morte dele.
4.
Se a dívida for ilíquida, a prescrição começa a correr desde que ao credor seja
lícito promover a liquidação; promovida a liquidação, a prescrição do resultado
líquido começa a correr desde que seja feito o seu apuramento por acordo ou
sentença passada em julgado.
ARTIGO 307º
(Prestações periódicas)
Tratando-se
de renda perpétua ou vitalícia ou de outras prestações periódicas análogas, a
prescrição do direito unitário do credor corre desde a exigibilidade da
primeira prestação que não for paga.
ARTIGO 308º
(Transmissão)
1.
Depois de iniciada, a prescrição continua a correr, ainda que o direito passe
para novo titular.
2.
Se a dívida for assumida por terceiro, a prescrição continua a correr em
benefício dele, a não ser que a assunção importe reconhecimento interruptivo da
prescrição.
SUBSECÇÃO II
Prazos da prescrição
ARTIGO 309º
(Prazo ordinário)
O
prazo ordinário da prescrição é de vinte anos.
ARTIGO 310º
(Prescrição de cinco anos)
Prescrevem
no prazo de cinco anos:
a)
As anuidades de rendas perpétuas ou vitalícias;
b)
As rendas e alugueres devidos pelo locatário, ainda que pagos por uma só vez;
c)
Os foros;
d)
Os juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos, e os dividendos das
sociedades;
e)
As quotas de amortização do capital pagáveis com os juros;
f)
As pensões alimentícias vencidas;
g)
Quaisquer outras prestações periodicamente renováveis.
ARTIGO 311º
(Direitos reconhecidos em sentença ou título
executivo)
1.
O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um
prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se
sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título
executivo.
2.
Quando, porém, a sentença ou outro título se referir a prestações ainda não
devidas, a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo.
SUBSECÇÃO III
Prescrições presuntivas
ARTIGO 312º
(Fundamento das prescrições presuntivas)
As
prescrições de que trata a presente subsecção fundam-se na presunção de
cumprimento.
ARTIGO 313º
(Confissão do devedor)
1.
A presunção de cumprimento pelo decurso do prazo só pode ser ilidida por
confissão do devedor originário ou daquele a quem a dívida tiver sido transmitida
por sucessão.
2.
A confissão extrajudicial só releva quando for realizada por escrito.
ARTIGO 314º
(Confissão tácita)
Considera-se
confessada a dívida se o devedor se recusar a depor ou a prestar juramento no
tribunal, ou praticar em juízo actos incompatíveis com a presunção de
cumprimento.
ARTIGO 315º
(Aplicação das regras gerais)
As
obrigações sujeitas a prescrição presuntiva estão subordinadas, nos termos
gerais, às regras da prescrição ordinária.
ARTIGO 316º
(Prescrição de seis meses)
Prescrevem
no prazo de seis meses os créditos de estabelecimentos de alojamento, comidas
ou bebidas, pelo alojamento, comidas ou bebidas que forneçam, sem prejuízo do
disposto na alínea a) do artigo seguinte.
ARTIGO 317º
(Prescrição de dois anos)
Prescrevem
no prazo de dois anos:
a)
Os créditos dos estabelecimentos que forneçam alojamento, ou alojamento e
alimentação, a estudantes, bem como os créditos dos estabelecimentos de ensino,
educação, assistência ou tratamento, relativamente aos serviços prestados;
b)
Os créditos dos comerciantes pelos objectos vendidos a quem não seja
comerciante ou os não destine ao seu comércio, e bem assim os créditos daqueles
que exerçam profissionalmente uma indústria, pelo fornecimento de mercadorias
ou produtos, execução de trabalhos ou gestão de negócios alheios, incluindo as
despesas que hajam efectuado, a menos que a prestação se destine ao exercício
industrial do devedor;
c)
Os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo
reembolso das despesas correspondentes.
SUBSECÇÃO IV
Suspensão da prescrição
ARTIGO 318º
(Causas bilaterais da suspensão)
A
prescrição não começa nem corre:
a)
Entre os cônjuges, ainda que separados judicialmente de pessoas e bens;
b)
Entre quem exerça o poder paternal e as pessoas a ele sujeitas, entre o tutor e
o tutelado ou entre o curador e o curatelado;
c)
Entre as pessoas cujos bens estejam sujeitos, por lei ou por determinação
judicial ou de terceiro, à administração de outrem e aquelas que exercem a administração,
até serem aprovadas as contas finais;
d)
Entre as pessoas colectivas e os respectivos administradores, relativamente à
responsabilidade destes pelo exercício dos seus cargos, enquanto neles se
mantiverem;
e)
Entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o
contrato durar;
f)
Enquanto o devedor for usufrutuário do crédito ou tiver direito de penhor sobre
ele.
ARTIGO 319º
(Suspensão a favor de militares e
pessoas adstritas às forças militares)
A
prescrição não começa nem corre contra militares em serviço, durante o tempo de
guerra ou mobilização, dentro ou fora do País, ou contra as pessoas que
estejam, por motivo de serviço, adstritas às forças militares.
ARTIGO 320º
(Suspensão a favor de menores,
interditos ou inabilitados)
1.
A prescrição não começa nem corre contra menores enquanto não tiverem quem os
represente ou administre seus bens, salvo se respeitar a actos para os quais o
menor tenha capacidade; e, ainda que o menor tenha representante legal ou quem
administre os seus bens, a prescrição contra ele não se completa sem ter
decorrido um ano a partir do termo da incapacidade.
2.
Tratando-se de prescrições presuntivas, a prescrição não se suspende, mas não
se completa sem ter decorrido um ano sobre a data em que o menor passou a ter
representante legal ou administrador dos seus bens ou adquiriu plena
capacidade.
3.
O disposto nos números anteriores é aplicável aos interditos e inabilitados que
não tenham capacidade para exercer o seu direito, com a diferença de que a
incapacidade se considera finda, caso não tenha cessado antes, passados três
anos sobre o termo do prazo que seria aplicável se a suspensão se não houvesse
verificado.
ARTIGO 321º
(Suspensão por motivo de força maior ou dolo do
obrigado)
1.
A prescrição suspende-se durante o tempo em que o titular estiver impedido de
fazer valer o seu direito, por motivo de força maior, no decurso dos últimos
três meses do prazo.
2.
Se o titular não tiver exercido o seu direito em consequência de dolo do obrigado,
é aplicável o disposto no número anterior.
ARTIGO 322º
(Prescrição dos direitos da herança ou contra ela)
A
prescrição de direitos da herança ou contra ela não se completa antes de
decorridos seis meses depois de haver pessoa por quem ou contra quem os
direitos possam ser invocados.
SUBSECÇÃO V
Interrupção da prescrição
ARTIGO 323º
(Interrupção promovida pelo titular)
1.
A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer
acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito,
seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja
incompetente.
2.
Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter
sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por
interrompida logo que decorram os cinco dias.
3.
A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto
nos números anteriores.
4.
É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer
outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o
direito pode ser exercido.
ARTIGO 324º
(Compromisso arbitral)
1.
O compromisso arbitral interrompe a prescrição relativamente ao direito que se
pretende tornar efectivo.
2.
Havendo cláusula compromissória ou sendo o julgamento arbitral determinado por
lei, a prescrição considera-se interrompida quando se verifique algum dos casos
previstos no artigo anterior.
ARTIGO 325º
(Reconhecimento)
1.
A prescrição é ainda interrompida pelo reconhecimento do direito, efectuado
perante o respectivo titular por aquele contra quem o direito pode ser
exercido.
2.
O reconhecimento tácito só é relevante quando resulte de factos que
inequivocamente o exprimam.
ARTIGO 326º
(Efeitos da interrupção)
1.
A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente,
começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do
disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte.
2.
A nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o
disposto no artigo 311º.
ARTIGO 327º
(Duração da interrupção)
1.
Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de
compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto
não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
2.
Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta
seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo
prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo.
3.
Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for
absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da
prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao
trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o
compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes
dois meses.
SECÇÃO III
Caducidade
ARTIGO 328º
(Suspensão e interrupção)
O
prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a
lei o determine.
ARTIGO 329º
(Começo do prazo)
O
prazo de caducidade, se a lei não fixar outra data, começa a correr no momento
em que o direito puder legalmente ser exercido.
ARTIGO 330º
(Estipulações válidas sobre a caducidade)
1.
São válidos os negócios pelos quais se criem casos especiais de caducidade, se
modifique o regime legal desta ou se renuncie a ela, contanto que não se trate
de matéria subtraída à disponibilidade das partes ou de fraude às regras legais
da prescrição.
2.
São aplicáveis aos casos convencionais de caducidade, na dúvida acerca da
vontade dos contraentes, as disposições relativas à suspensão da prescrição.
ARTIGO 331º
(Causas impeditivas da caducidade)
1.
Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do
acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.
2.
Quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal
relativa a direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do
direito por parte daquele contra quem deva ser exercido.
ARTIGO 332º
(Absolvição e interrupção da instância
e ineficácia do compromisso arbitral)
1.
Quando a caducidade se referir ao direito de propor certa acção em juízo e esta
tiver sido tempestivamente proposta, é aplicável o disposto no nº 3 do artigo
327º; mas, se o prazo fixado para a caducidade for inferior a dois meses, é
substituido por ele o designado nesse preceito.
2.
Nos casos previstos na primeira parte do artigo anterior, se a instância se
tiver interrompido, não se conta para efeitos de caducidade o prazo decorrido
entre a proposição da acção e a interrupção da instância.
ARTIGO 333º
(Apreciação oficiosa da caducidade)
1.
A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em
qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da
disponibilidade das partes.
2.
Se for estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, é
aplicável à caducidade o disposto no artigo 303º.
SUBTÍTULO IV
DO EXERCÍCIO E TUTELA DOS DIREITOS
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 334º
(Abuso do direito)
É
ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os
limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou
económico desse direito.
ARTIGO 335º
(Colisão de direitos)
1.
Havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares
ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito,
sem maior detrimento para qualquer das partes.
2.
Se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva
considerar-se superior.
ARTIGO 336º
(Acção directa)
1.
É lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio
direito, quando a acção directa for indispensável, pela impossibilidade de
recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais, para evitar a inutilização
prática desse direito, contanto que o agente não exceda o que for necessário
para evitar o prejuízo.
2.
A acção directa pode consistir na
apropriação, destruição ou
deterioração de
uma coisa,na eliminação da resistência
irregularmente oposta ao exercício do
direito, ou noutro acto análogo.
3.
A acção directa não é lícita, quando sacrifique interesses superiores aos que o
agente visa realizar ou assegurar.
ARTIGO 337º
(Legítima defesa)
1.
Considera-se justificado o acto destinado a afastar qualquer agressão actual e
contrária à lei contra a pessoa ou património do agente ou de terceiro, desde
que não seja possível fazê-lo pelos meios normais e o prejuízo causado pelo
acto não seja manifestamente superior ao que pode resultar da agressão.
2.
O acto considera-se igualmente justificado, ainda que haja excesso de legítima
defesa, se o excesso for devido a perturbação ou medo não culposo do agente.
ARTIGO 338º
(Erro acerca dos pressupostos da acção directa
ou da legítima defesa)
Se
o titular do direito agir na suposição errónea de se verificarem os
pressupostos que justificam a acção directa ou a legítima defesa, é obrigado a
indemnizar o prejuízo causado, salvo se o erro for desculpável.
ARTIGO 339º
(Estado de necessidade)
1.
É lícita a acção daquele que destruir ou danificar coisa alheia com o fim de
remover o perigo actual de um dano manifestamente superior, quer do agente,
quer de terceiro.
2.
O autor da destruição ou do dano é, todavia, obrigado a indemnizar o lesado
pelo prejuízo sofrido, se o perigo for provocado por sua culpa exclusiva; em
qualquer outro caso, o tribunal pode fixar uma indemnização equitativa e
condenar nela não só o agente, como aqueles que tiraram proveito do acto ou
contribuíram para o estado de necessidade.
ARTIGO 340º
(Consentimento do lesado)
1.
O acto lesivo dos direitos de outrem é lícito, desde que este tenha consentido
na lesão.
2.
O consentimento do lesado não exclui, porém, a ilicitude do acto, quando este
for contrário a uma proibição legal ou aos bons costumes.
3.
Tem-se por consentida a lesão, quando esta se deu no interesse do lesado e de
acordo com a sua vontade presumível.
CAPÍTULO II
Provas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 341º
(Função das provas)
As
provas têm por função a demonstração da realidade dos factos.
ARTIGO 342º
(Ónus da prova)
1.
Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do
direito alegado.
2.
A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado
compete àquele contra quem a invocação é feita.
3.
Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do
direito.
ARTIGO 343º
(Ónus da prova em casos especiais)
1.
Nas acções de simples apreciação ou declaração negativa, compete ao réu a prova
dos factos constitutivos do direito que se arroga.
2.
Nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em
que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o
prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução especialmente consignada
na lei.
3.
Se o direito invocado pelo autor estiver sujeito a condição suspensiva ou a
termo inicial, cabe-lhe a prova de que a condição se verificou ou o termo se
venceu; se o direito estiver sujeito a condição resolutiva ou a termo final,
cabe ao réu provar a verificação da condição ou o vencimento do prazo.
ARTIGO 344º
(Inversão do ónus da prova)
1.
As regras dos artigos anteriores invertem-se, quando haja presunção legal,
dispensa ou liberação do ónus da prova, ou convenção válida nesse sentido, e,
de um modo geral, sempre que a lei o determine.
2.
Há também inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver
culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções
que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas
declarações.
ARTIGO 345º
(Convenções sobre as provas)
1.
É nula a convenção que inverta o ónus da prova, quando se trate de direito
indisponível ou a inversão torne excessivamente difícil a uma das partes o
exercício do direito.
2.
É nula, nas mesmas condições, a convenção que excluir algum meio legal de prova
ou admitir um meio de prova diverso dos legais; mas, se as determinações legais
quanto à prova tiverem por fundamento razões de ordem pública, a convenção é
nula em quaisquer circunstâncias.
ARTIGO 346º
(Contraprova)
Salvo
o disposto no artigo seguinte, à prova que for produzida pela parte sobre quem
recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos
mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão
decidida contra a parte onerada com a prova.
ARTIGO 347º
(Modo de contrariar a prova legal plena)
A
prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser
verdadeiro o facto que dela for objecto, sem prejuízo de outras restrições
especialmente determinadas na lei.
ARTIGO 348º
(Direito consuetudinário, local, ou estrangeiro)
1.
Àquele que invocar direito consuetudinário, local ou estrangeiro, compete fazer
a prova da sua existência e conteúdo; mas o tribunal deve procurar,
oficiosamente, obter o respectivo conhecimento.
2.
O conhecimento oficioso incumbe também ao tribunal, sempre que este tenha de
decidir com base no direito consuetudinário, local ou estrangeiro, e nenhuma
das partes o tenha invocado, ou a parte contrária tenha reconhecido a sua
existência e conteúdo ou não haja deduzido oposição.
3.
Na impossibilidade de determinar o conteúdo do direito aplicável, o tribunal
recorrerá às regras do direito comum português.
SECÇÃO II
Presunções
ARTIGO 349º
(Noção)
Presunções
são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar
um facto desconhecido.
ARTIGO 350º
(Presunções legais)
1.
Quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela
conduz.
2.
As presunções legais podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário,
excepto nos casos em que a lei o proibir.
ARTIGO 351º
(Presunções judiciais)
As
presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a
prova testemunhal.
SECÇÃO III
Confissão
ARTIGO 352º
(Noção)
Confissão
é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é
desfavorável e favorece a parte contrária.
ARTIGO 353º
(Capacidade e legitimação)
1.
A confissão só é eficaz quando feita por pessoa com capacidade e poder para
dispor do direito a que o facto confessado se refira.
2.
A confissão feita pelo litisconsorte é eficaz, se o litisconsócio for
voluntário, embora o seu efeito se restrinja ao interesse do confitente; mas
não o é, se o litisconsórcio for necessário.
3.
A confissão feita por um substituto processual não é eficaz contra o
substituído.
ARTIGO 354º
(Inadmissibilidade da confissão)
A
confissão não faz prova contra o confitente:
a)
Se for declarada insuficiente por lei ou recair sobre facto cujo reconhecimento
ou investigação a lei proíba;
b)
Se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis;
c)
Se o facto confessado for impossível ou notoriamente inexistente.
ARTIGO 355º
(Modalidades)
1.
A confissão pode ser judicial ou extrajudicial.
2.
Confissão judicial é a feita em juízo, competente ou não, mesmo quando
arbitral, e ainda que o processo seja de jurisdição voluntária.
3.
A confissão feita num processo só vale como judicial nesse processo; a
realizada em qualquer procedimento preliminar ou incidental só vale como confissão
judicial na acção correspondente.
4.
Confissão extrajudicial é a feita por algum modo diferente da confissão
judicial.
ARTIGO 356º
(Formas da confissão judicial)
1.
A confissão judicial espontânea pode ser feita nos articulados, segundo as
prescrições da lei processual, ou em qualquer outro acto do processo, firmado
pela parte pessoalmente ou por procurador especialmente autorizado.
2.
A confissão judicial provocada pode ser feita em depoimento de parte ou em
prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
ARTIGO 357º
(Declaração confessória)
1.
A declaração confessória deve ser inequívoca, salvo se a lei o dispensar.
2.
Se for ordenado o depoimento de parte ou o comparecimento desta para prestação
de informações ou esclarecimento, mas ela não comparecer ou se recusar a depor
ou a prestar as informações ou esclarecimentos, sem provar justo impedimento,
ou responder que não se recorda ou nada sabe, o tribunal apreciará livremente o
valor da conduta da parte para efeitos probatórios.
ARTIGO 358º
(Força probatória da confissão)
1.
A confissão judicial escrita tem força probatória plena contra o confitente.
2.
A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se
provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte
contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena.
3.
A confissão extrajudicial não constante de documento não pode ser provada por
testemunhas nos casos em que não é admitida a prova testemunhal; quando esta
seja admitida, a força probatória da confissão é livremente apreciada pelo
tribunal.
4.
A confissão judicial que não seja escrita e a confissão extrajudicial feita a
terceiro ou contida em testamento são apreciadas livremente pelo tribunal.
ARTIGO 359º
(Nulidade e anulabilidade da confissão)
1.
A confissão, judicial ou extrajudicial, pode ser declarada nula ou anulada, nos
termos gerais, por falta ou vícios da vontade, mesmo depois do trânsito em
julgado da decisão, se ainda não tiver caducado o direito de pedir a sua
anulação.
2.
O erro, desde que seja essencial, não tem de satisfazer aos requisitos exigidos
para a anulação dos negócios jurídicos.
ARTIGO 360º
(Indivisibilidade da confissão)
Se
a declaração confessória, judicial ou extrajudicial, for acompanhada da
narração de outros factos ou circunstâncias tendentes a infirmar a eficácia do
facto confessado ou a modificar ou extinguir os seus efeitos, a parte que dela
quiser aproveitar-se como prova plena tem de aceitar também como verdadeiros os
outros factos ou circunstâncias, salvo se provar a sua inexactidão.
ARTIGO 361º
(Valor do reconhecimento não confessório)
O
reconhecimento de factos desfavoráveis, que não possa valer como confissão,
vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente.
SECÇÃO IV
Prova documental
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 362º
(Noção)
Prova
documental é a que resulta de documento; diz-se documento qualquer objecto
elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa
ou facto.
ARTIGO 363º
(Modalidades dos documentos escritos)
1.
Os documentos escritos podem ser autênticos ou particulares.
2.
Autênticos são os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas
autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do círculo de
actividades que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial público provido
de fé pública; todos os outros documentos são particulares.
3.
Os documentos particulares são havidos por autenticados, quando confirmados
pelas partes, perante notário, nos termos prescritos nas leis notariais.
ARTIGO 364º
(Exigência legal de documento escrito)
1.
Quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento autêntico,
autenticado ou particular, não pode este ser subtituído por outro meio de prova
ou por outro documento que não seja de força probatória superior.
2.
Se, porém, resultar claramente da lei que o documento é exigido apenas para
prova da declaração, pode ser substituído por confissão expressa, judicial ou
extrajudicial, contanto que, neste último caso, a confissão conste de documento
de igual ou superior valor probatório.
ARTIGO 365º
(Documentos passados em país estrangeiro)
1.
Os documentos autênticos ou particulares passados em país estrangeiro, na
conformidade da respectiva lei, fazem prova como o fariam os documentos da
mesma natureza exarados em Portugal.
2.
Se o documento não estiver legalizado, nos termos da lei processual, e houver
fundadas dúvidas acerca da sua autenticidade ou da autenticidade do
reconhecimento, pode ser exigida a sua legalização.
ARTIGO 366º
(Falta de requisitos legais)
A
força probatória do documento escrito a que falte algum dos requisitos exigidos
na lei é apreciada livremente pelo tribunal.
ARTIGO 367º
(Reforma de documentos escritos)
Podem
ser reformados judicialmente os documentos escritos que por qualquer modo
tiverem desaparecido.
ARTIGO 368º
(Reproduções mecânicas)
As
reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos fonográficos e, de um
modo geral, quaisquer outras reproduções mêcanicas de factos ou de coisas fazem
prova plena dos factos e das coisas que representam, se a parte contra quem os
documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão.
SUBSECÇÃO II
Documentos autênticos
ARTIGO 369º
(Competência da autoridade ou oficial público)
1.
O documento só é autêntico quando a autoridade ou oficial público que o exara
for competente, em razão da matéria e do lugar, e não estiver legalmente
impedido de o lavrar.
2.
Considera-se, porém, exarado por autoridade ou oficial público competente o
documento lavrado por quem exerça publicamente as respectivas funções, a não
ser que os intervenientes ou beneficiários conhecessem, no momento da sua
feitura, a falsa qualidade da autoridade ou oficial público, a sua incompetência
ou a irregularidade da sua investidura.
ARTIGO 370º
(Autenticidade)
1.
Presume-se que o documento provém da autoridade ou oficial público a quem é
atribuído, quando estiver subscrito pelo autor com assinatura reconhecida por
notário ou com o selo do respectivo serviço.
2.
A presunção de autenticidade pode ser ilidida mediante prova em contrário, e
pode ser excluída oficiosamente pelo tribunal quando seja manifesta pelos
sinais exteriores do documento a sua falta de autenticidade; em caso de dúvida,
pode ser ouvida a autoridade ou oficial público a quem o documento é atribuído.
3.
Quando o documento for anterior ao século XVIII, a sua autenticidade será
estabelecida por meio de exame feito na Torre do Tombo, desde que seja
contestada ou posta em dúvida por alguma das partes ou pela entidade a quem o
documento for apresentado.
ARTIGO 371º
(Força probatória)
1.
Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como
praticados pelo autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos
que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os
meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre
apreciação do julgador.
2.
Se o documento contiver palavras emendadas, truncadas ou escritas sobre rasuras
ou entrelinhas, sem a devida ressalva, determinará o julgador livremente a
medida em que os vícios externos do documentos excluem ou reduzem a sua força
probatória.
ARTIGO 372º
(Falsidade)
1.
A força probatória dos documentos autênticos só pode ser ilidida com base na
sua falsidade.
2.
O documento é falso, quando nele se atesta como tendo sido objecto da percepção
da autoridade ou oficial público qualquer facto que na realidade se não
verificou, ou como tendo sido praticado pela entidade responsável qualquer acto
que na realidade o não foi.
3.
Se a falsidade for evidente em face dos sinais exteriores do documento, pode o
tribunal, oficiosamente, declará-lo falso.
SUBSECÇÃO III
Documentos particulares
ARTIGO 373º
(Assinatura)
1.
Os documentos particulares devem ser assinados pelo seu autor, ou por outrem a
seu rogo, se o rogante não souber ou não puder assinar.
2.
Nos títulos emitidos em grande número ou nos demais casos em que o uso o
admita, pode a assinatura ser substituída por simples reprodução mecânica.
3.
Se o documento for subscrito por pessoa que não saiba ou não possa ler, a
subscrição só obriga quando feita ou confirmada perante notário, depois de lido
o documento ao subscritor.
4.
O rogo deve igualmente ser dado ou confirmado perante notário, depois de lido o
documento ao rogante.
ARTIGO 374º
(Autoria da letra e da assinatura)
1.
A letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular
consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas, pela parte
contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe
pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou
judicialmente como verdadeiras.
2.
Se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra
ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo
elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua
veracidade.
ARTIGO 375º
(Reconhecimento notarial)
1.
Se estiverem reconhecidas presencialmente, nos termos das leis notariais, a
letra e a assinatura do documento, ou só a assinatura, têm-se por verdadeiras.
2.
Se a parte contra quem o documento é apresentado arguir a falsidade do
reconhecimento presencial da letra e da assinatura, ou só da assinatura, a ela
incumbe a prova dessa falsidade.
3.
Salvo disposição legal em contrário, o reconhecimento por semelhança vale como
mero juízo pericial.
ARTIGO 376º
(Força probatória)
1.
O documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos
antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem
prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento.
2.
Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que
forem contrários aos interesses do declarante; mas a declaração é indivisível,
nos termos prescritos para a prova por confissão.
3.
Se o documento contiver notas marginais, palavras entrelinhadas, rasuras,
emendas ou outros vícios externos, sem a devida ressalva, cabe ao julgador
fixar livremente a medida em que esses vícios excluem ou reduzem a força
probatória do documento.
ARTIGO 377º
(Documentos autenticados)
Os
documentos particulares autenticados nos termos da lei notarial têm a força
probatória dos documentos autênticos, mas não os substituem quando a lei exija
documento desta natureza para a validade do acto.
ARTIGO 378º
(Assinatura em branco)
Se
o documento tiver sido assinado em branco, total ou parcialmente, o seu valor
probatório pode ser ilidido, mostrando-se que nele se inseriram declarações
divergentes do ajustado com o signatário ou que o documento lhe foi subtraído.
ARTIGO 379º
(Valor dos telegramas)
Os
telegramas cujos originais tenham sido escritos e assinados ou somente assinados,
pela pessoa em nome de quem são expedidos, ou por outrem a seu rogo, nos termos
do nº 4 do artigo 373º, são considerados para todos os efeitos como documentos
particulares e estão sujeitos, como tais, ao disposto nos artigos anteriores.
SUBSECÇÃO IV
Disposições especiais
ARTIGO 380º
(Registos e outros escritos)
1.
Os registos e outros escritos onde habitualmente alguém tome nota dos
pagamentos que lhe são efectuados fazem prova contra o seu autor, se indicarem
inequivocamente, posto que mediante um simples sinal, a recepção de algum
pagamento; mas o autor do escrito pode provar, por qualquer meio, que a nota
não corresponde à realidade.
2.
Têm igual força probatória os mesmos escritos, quando feitos e assinados por
outrem, segundo instruções do credor.
3.
É aplicável nestes casos a regra da indivisibilidade, nos termos prescritos
para a prova por confissão.
ARTIGO 381º
(Notas em seguimento, à margem
ou no verso do documento)
1.
A nota escrita pelo credor, ou por outrem segundo instruções dele, em
seguimento, à margem ou no verso do documento que ficou em poder do credor,
ainda que não esteja datada nem firmada, faz prova do facto anotado, se
favorecer a exoneração do devedor.
2.
Idêntico valor é atribuído à nota escrita pelo credor, ou segundo instruções
dele, em seguimento, à margem ou no verso de documento de quitação ou de título
de dívida em poder do devedor.
3.
A força probatória das notas pode ser contrariada por qualquer meio de prova;
mas, quando se trate de quitação no documento ou título em poder do devedor, se
a nota estiver assinada pelo credor, são aplicáveis as regras legais acerca dos
documentos particulares assinados pelo seu autor.
ARTIGO 382º
(Cancelamento dos escritos ou notas)
Se
forem cancelados pelo credor, os escritos a que se referem os dois artigos
anteriores perdem a força probatória que neles lhes é atribuída, ainda que o
cancelamento não prejudique a sua leitura, salvo quando forem feitos por
exigência do devedor ou de terceiro, nos termos do artigo 788º.
ARTIGO 383º
(Certidões)
1.
As certidões de teor extraídas de documentos arquivados nas repartições
notariais ou noutras repartições públicas, quando expedidas pelo notário ou por
outro depositário público autorizado, têm a força probatória dos originais.
2.
A prova resultante da certidão de teor parcial pode ser invalidada ou
modificada por meio da certidão de teor integral.
3.
Qualquer interessado, e bem assim a autoridade pública a quem for exibida, para
efeito de prova, uma certidão parcial, podem exigir do apresentante a exibição
da certidão integral correspondente.
ARTIGO 384º
(Certidões de certidões)
As
certidões de certidões, expedidas na conformidade da lei, têm a força
probatória das certidões de que forem extraídas.
ARTIGO 385º
(Invalidação da força probatória das certidões)
1.
A força probatória das certidões pode ser invalidada ou modificada por
confronto com o original ou com a certidão de que foram extraídas.
2.
A pessoa contra quem for apresentada a certidão pode exigir que o confronto seja
feito na sua presença.
ARTIGO 386º
(Públicas-formas)
1.
As cópias de teor, total ou parcial, expedidas por oficial público autorizado e
extraídas de documentos avulsos que lhe sejam apresentados para esse efeito têm
a força probatória do respectivo original, se a parte contra a qual forem
apresentadas não requerer a exibição desse original.
2.
Requerida a exibição, a pública-forma não tem a força probatória do original,
se este não for apresentado ou, sendo-o, se não mostrar conforme com ela.
ARTIGO 387º
(Fotocópias de documentos)
1.
As cópias fotográficas de documentos arquivados nas repartições notariais ou
noutras repartições públicas têm a força probatória das certidões de teor, se a
conformidade delas com o original for atestada pela entidade competente para
expedir estas últimas; é aplicável, neste caso, o disposto no artigo 385º.
2.
As cópias fotográficas de documentos estranhos aos arquivos mencionados no
número anterior têm o valor da pública-forma, se a sua conformidade com o
original for atestada por notário; é aplicável, neste caso, o disposto no
artigo 386º.
SECÇÃO V
Prova pericial
ARTIGO 388º
(Objecto)
A
prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de
peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não
possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de
inspecção judicial.
ARTIGO 389º
(Força probatória)
A
força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal.
SECÇÃO VI
Prova por inspecção
ARTIGO 390º
(Objecto)
A
prova por inspecção tem por fim a percepção directa de factos pelo tribunal.
ARTIGO 391º
(Força probatória)
O
resultado da inspecção é livremente apreciado pelo tribunal.
SECÇÃO VII
Prova testemunhal
ARTIGO 392º
(Admissibilidade)
A
prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou
indirectamente afastada.
ARTIGO 393º
(Inadmissibilidade da prova testemunhal)
1.
Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes,
houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não
é admitida prova testemunhal.
2.
Também não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente
provado por documento ou por outro meio com força probatória plena.
3.
As regras dos números anteriores não são aplicáveis à simples interpretação do
contexto do documento.
ARTIGO 394º
(Convenções contra o conteúdo
de documentos ou além dele)
1.
É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer
convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos
documentos particulares mencionados nos artigos 373º a 379º, quer as convenções
sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores.
2.
A proibição do número anterior aplica-se ao acordo simulatório e ao negócio
dissimulado, quando invocados pelos simuladores.
3.
O disposto nos números anteriores não é aplicável a terceiros.
ARTIGO 395º
(Factos extintivos da obrigação)
As
disposições dos artigos precedentes são aplicáveis ao cumprimento, remissão,
novação, compensação e, de um modo geral, aos contratos extintivos da relação
obrigacional, mas não aos factos extintivos da obrigação, quando invocados por
terceiro.
ARTIGO 396º
(Força probatória)
A
força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo
tribunal.
LIVRO II
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
TÍTULO I
DAS OBRIGAÇÕES EM GERAL
CAPÍTULO I
Disposições gerais
SECÇÃO I
Conteúdo da obrigação
ARTIGO 397º
(Noção)
Obrigação
é o vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita para com
outra à realização de uma prestação.
ARTIGO 398º
(Conteúdo da prestação)
1.
As partes podem fixar livremente, dentro dos limites da lei, o conteúdo positivo
ou negativo da prestação.
2.
A prestação não necessita de ter valor pecuniário; mas deve corresponder a um
interesse do credor, digno de protecção legal.
ARTIGO 399º
(Prestação de coisa futura)
É
admitida a prestação de coisa futura sempre que a lei não a proíba.
ARTIGO 400º
(Determinação da prestação)
1.
A determinação da prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes ou a
terceiro; em qualquer dos casos deve ser feita segundo juízos de equidade, se
outros critérios não tiverem sido estipulados.
2.
Se a determinação não puder ser feita ou não tiver sido feita no tempo devido,
sê-lo-á pelo tribunal, sem prejuízo do disposto acerca das obrigações genéricas
e alternativas.
ARTIGO 401º
(Impossibilidade originária da prestação)
1.
A impossibilidade originária da prestação produz a nulidade do negócio
jurídico.
2.
O negócio é, porém, válido, se a obrigação for assumida para o caso de a
prestação se tornar possível, ou se, estando o negócio dependente de condição
suspensiva ou de termo inicial, a prestação se tornar possível até à
verificação da condição ou até ao vencimento do termo.
3.
Só se considera impossível a prestação que o seja relativamente ao objecto, e
não apenas em relação à pessoa do devedor.
SECÇÃO II
Obrigações naturais
ARTIGO 402º
(Noção)
A
obrigação diz-se natural, quando se funda num mero dever de ordem moral ou
social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um
dever de justiça.
ARTIGO 403º
(Não repetição do indevido)
1.
Não pode ser repetido o que for prestado espontaneamente em cumprimento de
obrigação natural, excepto se o devedor não tiver capacidade para efectuar a
prestação.
2.
A prestação considera-se espontânea, quando é livre de toda a coacção.
ARTIGO 404º
(Regime)
As
obrigações naturais estão sujeitas ao regime das obrigações civis em tudo o que
não se relacione com a realização coactiva da prestação, salvas as disposições
especiais da lei.
CAPÍTULO II
Fontes das obrigações
SECÇÃO I
Contratos
SUBSECÇÃO I
Dispsosições gerais
ARTIGO 405º
(Liberdade contratual)
1.
Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o
conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste
código ou incluir nestes as claúsulas que lhes aprouver.
2.
As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios,
total ou parcialmente regulados na lei.
ARTIGO 406º
(Eficácia dos contratos)
1.
O contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou
extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na
lei.
2.
Em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos e termos
especialmente previstos na lei.
ARTIGO 407º
(Incompatibilidade entre direitos pessoais de gozo)
Quando,
por contratos sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas
sobre a mesma coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis entre si,
prevalece o direito mais antigo em data, sem prejuízo das regras próprias do
registo.
ARTIGO 408º
(Contratos com eficácia real)
1.
A constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se
por mero efeito do contrato, salvas as excepções previstas na lei.
2.
Se a transferência respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito
transfere-se quando a coisa for adquirida pelo alienante ou determinada com
conhecimento de ambas as partes, sem prejuízo do disposto em matéria de
obrigações genéricas e do contrato de empreitada; se, porém, respeitar a frutos
naturais ou a partes componentes ou integrantes, a transferência só se verifica
no momento da colheita ou separação.
ARTIGO 409º
(Reserva da propriedade)
1.
Nos contratos de alienação é lícito ao alienante reservar para si a propriedade
da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte ou
até à verificação de qualquer outro evento.
2.
Tratando-se de coisa imóvel, ou de coisa móvel sujeita a registo, só a cláusula
constante do registo é oponível a terceiros.
SUBSECÇÃO II
Contrato-promessa
ARTIGO 410º
(Regime aplicável)
1.
À convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis
as disposições legais relativas ao contrato prometido, exceptuadas as relativas
à forma e as que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao
contrato-promessa.
2.
Porém, a promessa respeitante à celebração de contrato para o qual a lei exija
documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento
assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa
seja unilateral ou bilateral.
3.
No caso de promessa relativa à celebração de contrato oneroso de transmissão ou
constituição de direito real sobre edifício, ou fracção autónoma dele, já
construído, em construção ou a construir, o documento referido no número
anterior deve conter o reconhecimento presencial da assinatura do promitente ou
promitentes e a certificação, pelo notário, da existência da licença respectiva
de utilização ou de construção; contudo, o contraente que promete transmitir ou
constituir o direito só pode invocar a omissão destes requisitos quando a mesma
tenha sido culposamente causada pela outra parte.
(Redacção do Dec.-Lei 379/86, de 11-11)
ARTIGO 411º
(Promessa unilateral)
Se
o contrato-promessa vincular apenas uma das partes e não se fixar o prazo
dentro do qual o vínculo é eficaz, pode o tribunal, a requerimento do
promitente, fixar à outra parte um prazo para o exercício do direito, findo o
qual este caducará.
ARTIGO 412º
(Transmissão dos direitos e obrigações das partes)
1.
Os direitos e obrigações resultantes do contrato-promessa que não sejam
exclusivamente pessoais transmitem-se aos sucessores das partes.
2.
A transmissão por acto entre vivos está sujeita às regras gerais.
(Redacção do Dec.-Lei 379/86, de 11-11)
ARTIGO 413º
(Eficácia real da promessa)
1.
À promessa de transmissão ou constituição de direitos reais sobre bens imóveis,
ou móveis sujeitos a registo, podem as partes atribuir eficácia real, mediante
declaração expressa e inscrição no registo.
2.
Deve constar de escritura pública a promessa a que as partes atribuam eficácia
real; porém, quando a lei não exija essa forma para o contrato prometido, é
bastante documento particular com reconhecimento da assinatura da parte que se
vincula ou de ambas, consoante se trate de contrato-promessa unilateral ou
bilateral.
(Redacção do Dec.-Lei 379/86, de 11-11)
SUBSECÇÃO III
Pactos de preferência
ARTIGO 414º
(Noção)
O
pacto de preferência consiste na convenção pela qual alguém assume a obrigação
de dar preferência a outrem na venda de determinada coisa.
ARTIGO 415º
(Forma)
É
aplicável ao pacto de preferência o disposto no nº 2 do artigo 410º.
ARTIGO 416º
(Conhecimento do preferente)
1.
Querendo vender a coisa que é objecto do pacto, o obrigado deve comunicar ao
titular do direito o projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato.
2.
Recebida a comunicação, deve o titular exercer o seu direito dentro do prazo de
oito dias, sob pena de caducidade, salvo se estiver vinculado a prazo mais
curto ou o obrigado lhe assinar prazo mais longo.
ARTIGO 417º
(Venda da coisa juntamente com outras)
1.
Se o obrigado quiser vender a coisa juntamente com outra ou outras, por um
preço global, pode o direito ser exercido em relação àquela pelo preço que
proporcionalmente lhe for atribuído, sendo lícito, porém, ao obrigado exigir
que a preferência abranja todas as restantes, se estas não forem separáveis sem
prejuízo apreciável.
2.
O disposto no número anterior é aplicável ao caso de o direito de preferência
ter eficácia real e a coisa ter sido vendida a terceiro juntamente com outra ou
outras.
ARTIGO 418º
(Prestação acessória)
1.
Se o obrigado receber de terceiro a promessa de uma prestação acessória que o
titular do direito de preferência não possa satisfazer, será essa prestação
compensada em dinheiro; não sendo avaliável em dinheiro, é excluída a
preferência, salvo se for lícito presumir que, mesmo sem a prestação
estipulada, a venda não deixaria de ser efectuada, ou que a prestação foi
convencionada para afastar a preferência.
2.
Se a prestação acessória tiver sido convencionada para afastar a preferência, o
preferente não é obrigado a satisfazê-la, mesmo que ela seja avaliável em
dinheiro.
ARTIGO 419º
(Pluralidade de titulares)
1.
Pertencendo simultaneamente a vários titulares, o direito de preferência só
pode ser exercido por todos em conjunto; mas, se o direito se extinguir em
relação a algum deles, ou algum declarar que não o quer exercer, acresce o seu
direito aos restantes.
2.
Se o direito pertencer a mais de um titular, mas houver de ser exercido apenas
por um deles, na falta de designação abrir-se-á licitação entre todos,
revertendo o excesso para o alienante.
ARTIGO 420º
(Transmissão do direito e da obrigação de
preferência)
O
direito e a obrigação de preferência não são transmissíveis em vida nem por
morte, salvo estipulação em contrário.
ARTIGO 421º
(Eficácia real)
1.
O direito de preferência pode, por convenção das partes, gozar de eficácia real
se, respeitando a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, forem
observados os requisitos de forma e de publicidade exigidos no artigo 413º.
2.
É aplicável neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo
1410º.
(Redacção do Dec.-Lei 379/86, de 11-11)
ARTIGO 422º
(Valor relativo do direito de preferência)
O
direito convencional de preferência não prevalece contra
os direitos legais de
preferência; e, se não gozar de eficácia real,
também não procede relativamente
à alienação efectuada em execução,
falência, insolvência ou casos análogos.
ARTIGO 423º
(Extensão das disposições anteriores a outros
contratos)
As
disposições dos artigos anteriores relativas à compra e venda são extensivas,
na parte aplicável, à obrigação de preferência que tiver por objecto outros
contratos com ela compatíveis.
SUBSECÇÃO IV
Cessão da posição contratual
ARTIGO 424º
(Noção. Requisitos)
1.
No contrato com prestações recíprocas, qualquer das partes tem a faculdade de
transmitir a terceiro a sua posição contratual, desde que o outro contraente,
antes ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão.
2.
Se o consentimento do outro contraente for anterior à cessão, esta só produz
efeitos a partir da sua notificação ou reconhecimento.
ARTIGO 425º
(Regime)
A
forma da transmissão, a capacidade de dispor e de receber, a falta e vícios da
vontade e as relações entre as partes definem-se em função do tipo de negócio
que serve de base à cessão.
ARTIGO 426º
(Garantia da existência da posição contratual)
1.
O cedente garante ao cessionário, no momento da cessão, a existência da posição
contratual transmitida, nos termos aplicáveis ao negócio, gratuito ou oneroso,
em que a cessão se integra.
2.
A garantia do cumprimento das obrigações só existe se for convencionada nos
termos gerais.
ARTIGO 427º
(Relações entre o outro contraente e o cessionário)
A
outra parte no contrato tem o direito de opor ao cessionário os meios de defesa
provenientes desse contrato, mas não os que provenham de outras relações com o
cedente, a não ser que os tenha reservado ao consentir na cessão.
SUBSECÇÃO V
Excepção de não cumprimento do
contrato
ARTIGO 428º
(Noção)
1.
Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das
prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação
enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento
simultâneo.
2.
A excepção não pode ser afastada mediante a prestação de garantias.
ARTIGO 429º
(Insolvência ou diminuição de garantias)
Ainda
que esteja obrigado a cumprir em primeiro lugar, tem o contraente a faculdade
de recusar a respectiva prestação enquanto o outro não cumprir ou não der
garantias de cumprimento, se, posteriormente ao contrato, se verificar alguma
das circunstâncias que importam a perda do benefício do prazo.
ARTIGO 430º
(Prescrição)
Prescrito
um dos direitos, o respectivo titular continua a gozar da excepção de não
cumprimento, excepto quando se trate de prescrição presuntiva.
ARTIGO 431º
(Eficácia em relação a terceiros)
A
excepção de não cumprimento é oponível aos que no contrato vierem a substituir
qualquer dos contraentes nos seus direitos e obrigações.
SUBSECÇÃO VI
Resolução do contrato
ARTIGO 432º
(Casos em que é admitida)
1.
É admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção.
2.
A parte, porém, que, por circunstâncias não imputáveis ao outro contraente, não
estiver em condições de restituir o que houver recebido não tem o direito de
resolver o contrato.
ARTIGO 433º
(Efeitos entre as partes)
Na
falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus
efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico, com ressalva do
disposto nos artigos seguintes.
ARTIGO 434º
(Retroactividade)
1.
A resolução tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a
vontade das partes ou a finalidade da resolução.
2.
Nos contratos de execução continuada ou periódica, a resolução não abrange as
prestações já efectuadas, excepto se entre estas e a causa de resolução existir
um vínculo que legitime a resolução de todas elas.
ARTIGO 435º
(Efeitos em relação a terceiros)
1.
A resolução, ainda que expressamente convencionada, não prejudica os direitos
adquiridos por terceiro.
2.
Porém, o registo da acção de resolução que respeite a bens imóveis, ou a móveis
sujeitos a registo, torna o direito de resolução oponível a terceiro que não
tenha registado o seu direito antes do registo da acção.
ARTIGO 436º
(Como e quando se efectiva a resolução)
1.
A resolução do contrato pode fazer-se mediante declaração à outra parte.
2.
Não havendo prazo convencionado para a resolução do contrato, pode a outra
parte fixar ao titular do direito de resolução um prazo razoável para que o
exerça, sob pena de caducidade.
SUBSECÇÃO VII
Resolução ou modificação do contrato
por alteração das circunstâncias
ARTIGO 437º
(Condições de admissibilidade)
1.
Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem
sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato,
ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das
obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não
esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.
2.
Requerida a resolução, a parte contrária pode opor-se ao pedido, declarando
aceitar a modificação do contrato nos termos do número anterior.
ARTIGO 438º
(Mora da parte lesada)
A
parte lesada não goza do direito de resolução ou modificação do contrato, se
estava em mora no momento em que a alteração das circunstâncias se verificou.
ARTIGO 439º
(Regime)
Resolvido
o contrato, são aplicáveis à
resolução as disposições da
subsecção anterior.
SUBSECÇÃO VIII
Antecipação do cumprimento. Sinal
ARTIGO 440º
(Antecipação do cumprimento)
Se,
ao celebrar-se o contrato ou em momento posterior, um dos contraentes entregar
ao outro coisa que coincida, no todo ou em parte, com a prestação a que fica
adstrito, é a entrega havida como antecipação total ou parcial do cumprimento,
salvo se as partes quiserem atribuir à coisa entregue o carácter de sinal.
ARTIGO 441º
(Contrato-promessa de compra e venda)
No
contrato-promessa de compra e venda presume-se que tem carácter de sinal toda a
quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a
título de antecipação ou princípio de pagamento do preço.
ARTIGO 442º
(Sinal)
1.
Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou
restituída quando a imputação não for possível.
2.
Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja
imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se
o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele a faculdade
de exigir o dobro do que prestou, ou, se houve tradição da coisa a que se
refere o contrato prometido, o seu valor, ou o do direito a transmitir ou a
constituir sobre ela, determinado objectivamente, à data do não cumprimento da
promessa, com dedução do preço convencionado, devendo ainda ser-lhe restituído o
sinal e a parte do preço que tenha pago.
3.
Em qualquer dos casos previstos no número anterior, o contraente não faltoso
pode, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, nos termos do
artigo 830º; se o contraente não faltoso optar pelo aumento do valor da coisa
ou do direito, como se estabelece no número anterior, pode a outra parte
opor-se ao exercício dessa faculdade, oferecendo-se para cumprir a promessa,
salvo o disposto no artigo 808º.
4.
Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do
contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de
pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data
do não cumprimento.
(Redacção do Dec.-Lei nº 379/86, de 11-11)
SUBSECÇÃO IX
Contrato a favor de terceiro
ARTIGO 443º
(Noção)
1.
Por meio de contrato, pode uma das partes assumir perante outra, que tenha na
promessa um interesse digno de protecção legal, a obrigação de efectuar uma
prestação a favor de terceiro, estranho ao negócio; diz-se promitente a parte
que assume a obrigação e promissário o contraente a quem a promessa é feita.
2.
Por contrato a favor de terceiro, têm as partes ainda a possibilidade de
remitir dívidas ou ceder créditos, e bem assim de constituir, modificar,
transmitir ou extinguir direitos reais.
ARTIGO 444º
(Direitos do terceiro e do promissário)
1.
O terceiro a favor de quem for convencionada a promessa adquire direito à
prestação, independentemente de aceitação.
2.
O promissário tem igualmente o direito de exigir do promitente o cumprimento da
promessa, a não ser que outra tenha sido a vontade dos contraentes.
3.
Quando se trate da promessa de exonerar o promissário de uma dívida para com
terceiro, só àquele é lícito exigir o cumprimento da promessa.
ARTIGO 445º
(Prestações em benefício de pessoa indeterminada)
Se
a prestação for estipulada em benefício de um conjunto indeterminado de pessoas
ou no interesse público, o direito de a reclamar pertence não só ao promissário
ou seus herdeiros, como às entidades competentes para defender os interesses em
causa.
ARTIGO 446º
(Direitos dos herdeiros do promissário)
1.
Nem os herdeiros do promissário, nem as entidades a que o artigo anterior se
refere, podem dispor do direito à prestação ou autorizar qualquer modificação
do seu objecto.
2.
Quando a prestação se torne impossível por causa imputável ao promitente, têm
os herdeiros do promissário, bem como as entidades competentes para reclamar o
cumprimento da prestação, o direito de exigir a correspondente indemnização,
para os fins convencionados.
ARTIGO 447º
(Rejeição ou adesão do terceiro beneficiário)
1.
O terceiro pode rejeitar a promessa ou aderir a ela.
2.
A rejeição faz-se mediante declaração ao promitente, o qual deve comunicá-la ao
promissário; se culposamente deixar de o fazer, é responsável em face deste.
3.
A adesão faz-se mediante declaração, tanto ao promitente como ao promissário.
ARTIGO 448º
(Revogação pelos contraentes)
1.
Salvo estipulação em contrário, a promessa é revogável enquanto o terceiro não
manifestar a sua adesão, ou enquanto o promissário for vivo, quando se trate de
promessa que haja de ser cumprida depois da morte deste.
2.
O direito de revogação pertence ao promissário; se, porém, a promessa foi feita
no interesse de ambos os outorgantes, a revogação depende do consentimento do
promitente.
ARTIGO 449º
(Meios de defesa oponíveis pelo promitente)
São
oponíveis ao terceiro, por parte do promitente, todos os meios de defesa
derivados do contrato, mas não aqueles que advenham de outra relação entre
promitente e promissário.
ARTIGO 450º
(Relações entre o promissário e
pessoas estranhas ao benefício)
1.
Só no que respeita à contribuição do
promissário para a prestação a terceiro
são aplicáveis as disposições relativas
à colação, imputação e
redução das
doações e à impugnação pauliana.
2.
Se a designação de terceiro for feita a título de
liberalidade, são aplicáveis,
com as necessárias adaptações, as normas relativas
à revogação das doações por
ingratidão do donatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 451º
(Promessa a cumprir depois da morte do promissário)
1.
Se a prestação a terceiro houver de ser efectuada após a morte do promissário,
presume-se que só depois do falecimento deste o terceiro adquire direito a ela.
2.
Se, porém, o terceiro morrer antes do promissário, os seus herdeiros são
chamados em lugar dele à titularidade da promessa.
SUBSECÇÃO X
Contrato para pessoa a nomear
ARTIGO 452º
(Noção)
1.
Ao celebrar o contrato, pode uma das partes reservar o direito de nomear um
terceiro que adquira os direitos e assuma as obrigações provenientes desse
contrato.
2.
A reserva de nomeação não é possível nos casos em que não é admitida a
representação ou é indispensável a determinação dos contraentes.
ARTIGO 453º
(Nomeação)
1.
A nomeação deve ser feita mediante declaração por escrito ao outro contraente,
dentro do prazo convencionado ou, na falta de convenção, dentro dos cinco dias
posteriores à celebração do contrato.
2.
A declaração de nomeação deve ser acompanhada, sob pena de ineficácia, do
instrumento de ratificação do contrato ou de procuração anterior à celebração
deste.
ARTIGO 454º
(Forma da ratificação)
1.
A ratificação deve constar de documento escrito.
2.
Se, porém, o contrato tiver sido celebrado por meio de documento de maior força
probatória, necessita a ratificação de revestir igual forma.
ARTIGO 455º
(Efeitos)
1.
Sendo a declaração de nomeação feita nos termos do art. 453º, a pessoa nomeada
adquire os direitos e assume as obrigações provenientes do contrato a partir da
celebração dele.
2.
Não sendo feita a declaração de nomeação nos termos legais, o contrato produz
os seus efeitos relativamente ao contraente originário, desde que não haja
estipulação em contrário.
ARTIGO 456º
(Publicidade)
1.
Se o contrato estiver sujeito a registo, pode este ser feito em nome do
contraente originário, com indicação da cláusula para pessoa a nomear,
fazendo-se posteriormente os necessários averbamentos.
2.
O disposto no número anterior é extensivo a qualquer outra forma de publicidade
a que o contrato esteja sujeito.
SECÇÃO II
Negócios unilaterais
ARTIGO 457º
(Princípio geral)
A
promessa unilateral de uma prestação só obriga nos casos previstos na lei.
ARTIGO 458º
(Promessa de cumprimento e reconhecimento de dívida)
1.
Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou
reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor
dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até
prova em contrário.
2.
A promessa ou reconhecimento deve, porém, constar de documento escrito, se
outras formalidades não forem exigidas para a prova da relação fundamental.
ARTIGO 459º
(Promessa pública)
1.
Aquele que, mediante anúncio público, prometer uma prestação a quem se encontre
em determinada situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo, fica
vinculado desde logo à promessa.
2.
Na falta de declaração em contrário, o promitente fica obrigado mesmo em relação
àqueles que se encontrem na situação prevista ou tenham praticado o facto sem
atender à promessa ou na ignorância dela.
ARTIGO 460º
(Prazo de validade)
A
promessa pública sem prazo de validade fixado pelo promitente ou imposto pela
natureza ou fim da promessa mantém-se enquanto não for revogada.
ARTIGO 461º
(Revogação)
1.
Não tendo prazo de validade, a promessa pública é revogável a todo o tempo pelo
promitente; se houver prazo, só é revogável ocorrendo justa causa.
2.
Em qualquer dos casos, a revogação não é eficaz, se não for feita na forma da
promessa ou em forma equivalente, ou se a situação prevista já se tiver
verificado ou o facto já tiver sido praticado.
ARTIGO 462º
(Cooperação de várias pessoas)
Se
na produção do resultado previsto tiverem cooperado várias pessoas, conjunta ou
separadamente, e todas tiverem direito à prestação, esta será dividida
equitativamente, atendendo-se à parte que cada uma delas teve nesse resultado.
ARTIGO 463º
(Concursos públicos)
1.
A oferta da prestação como prémio de um concurso só é válida quando se fixar no
anúncio público o prazo para a apresentação dos concorrentes.
2.
A decisão sobre a admissão dos concorrentes ou a concessão do prémio a qualquer
deles pertence exclusivamente às pessoas designadas no anúncio ou, se não
houver designação, ao promitente.
SECÇÃO III
Gestão de negócios
ARTIGO 464º
(Noção)
Dá-se
a gestão de negócios, quando uma pessoa assume a direcção de negócio alheio no
interesse e por conta do respectivo dono, sem para tal estar autorizada.
ARTIGO 465º
(Deveres do gestor)
O
gestor deve:
a)
Conformar-se com o interesse e a vontade, real ou presumível, do dono do
negócio, sempre que esta não seja contrária à lei ou à ordem pública, ou
ofensiva dos bons costumes;
b)
Avisar o dono do negócio, logo que seja possível, de que assumiu a gestão;
c)
Prestar contas, findo o negócio ou interrompida a gestão, ou quando o dono as
exigir;
d)
Prestar a este todas as informações relativas à gestão;
e)
Entregar-lhe tudo o que tenha recebido de terceiros no exercício da gestão ou o
saldo das respectivas contas, com os juros legais, relativamente às quantias em
dinheiro, a partir do momento em que a entrega haja de ser efectuada.
ARTIGO 466º
(Responsabilidade do gestor)
1.
O gestor responde perante o dono do negócio, tanto pelos danos a que der causa,
por culpa sua, no exercício da gestão, como por aqueles que causar com a
injustificada interrupção dela.
2.
Considera-se culposa a actuação do gestor, quando ele agir em desconformidade
com o interesse ou a vontade, real ou presumível, do dono do negócio.
ARTIGO 467º
(Solidariedade dos gestores)
Havendo
dois ou mais gestores que tenham agido conjuntamente, são solidárias as
obrigações deles para com o dono do negócio.
ARTIGO 468º
(Obrigações do dono do negócio)
1.
Se a gestão tiver sido exercida em conformidade com o interesse e a vontade,
real ou presumível, do dono do negócio, é este obrigado a reembolsar o gestor
das despesas que ele fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros
legais a contar do momento em que foram feitas, e a indemnizá-lo do prejuízo
que haja sofrido.
2.
Se a gestão não foi exercida nos termos do número anterior, o dono do negócio
responde apenas segundo as regras do enriquecimento sem causa, com ressalva do
disposto no artigo seguinte.
ARTIGO 469º
(Aprovação da gestão)
A
aprovação da gestão implica a renúncia ao direito de indemnização pelos danos
devidos a culpa do gestor e vale como reconhecimento dos direitos que a este
são conferidos no nº 1 do artigo anterior.
ARTIGO 470º
(Remuneração do gestor)
1.
A gestão não dá direito a qualquer remuneração, salvo se corresponder ao
exercício da actividade profissional do gestor.
2.
À fixação da remuneração é
aplicável, neste caso, o disposto no nº 2 do artigo
1158º.
ARTIGO 471º
(Representação sem poderes e mandato sem
representação)
Sem
prejuízo do que preceituam os artigos anteriores quando às relações entre o
gestor e o dono do negócio, é aplicável aos negócios jurídicos celebrados por
aquele em nome deste o disposto no artigo 268º; se o gestor os realizar em seu
próprio nome, são extensivas a esses negócios, na parte aplicável, as
disposições relativas ao mandato sem representação.
ARTIGO 472º
(Gestão de negócio alheio julgado próprio)
1.
Se alguém gerir negócio alheio, convencido de que ele lhe pertence, só é
aplicável o disposto nesta secção se houver aprovação da gestão; em quaisquer
outras circunstâncias, são aplicáveis à gestão as regras do enriquecimento sem
causa, sem prejuízo de outras que ao caso couberem.
2.
Se houver culpa do gestor na violação do direito alheio, são aplicáveis ao caso
as regras da responsabilidade civil.
SECÇÃO IV
Enriquecimento sem causa
ARTIGO 473º
(Princípio geral)
1.
Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a
restiuir aquilo com que injustamente se locupletou.
2.
A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial
por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude
de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se
verificou.
ARTIGO 474º
(Natureza subsidiária da obrigação)
Não
há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido
outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou
atribuir outros efeitos ao enriquecimento.
ARTIGO 475º
(Falta do resultado previsto)
Também
não há lugar à restituição se, ao efectuar a prestação, o autor sabia que o
efeito com ela previsto era impossível, ou se, agindo contra a boa fé, impediu
a sua verificação.
ARTIGO 476º
(Repetição do indevido)
1.
Sem prejuízo do disposto acerca das obrigações naturais, o que for prestado com
intenção de cumprir uma obrigação pode ser repetido, se esta não existia no momento
da prestação.
2.
A prestação feita a terceiro pode ser repetida pelo devedor enquanto não se
tornar liberatória nos termos do artigo 770º.
3.
A prestação feita por erro desculpável antes do vencimento da obrigação só dá
lugar à repetição daquilo com que o credor se enriqueceu por efeito do
cumprimento antecipado.
ARTIGO 477º
(Cumprimento de obrigação alheia
na convicção de que é própria)
1.
Aquele que, por erro desculpável, cumprir uma obrigação alheia, julgando-a
própria, goza de direito de repetição, excepto se o credor, desconhecendo o
erro do autor da prestação, se tiver privado do título ou das garantias do
crédito, tiver deixado prescrever ou caducar o seu direito, ou não o tiver
exercido contra o devedor ou contra o fiador enquanto solventes.
2.
Quando não existe o direito de repetição, fica o autor da prestação sub-rogado
nos direitos do credor.
ARTIGO 478º
(Cumprimento de obrigação alheia na
convicção de estar obrigado a cumpri-la)
Aquele
que cumprir obrigação alheia, na convicção errónea de estar obrigado para com o
devedor a cumpri-la, não tem o direito de repetição contra o credor, mas apenas
o direito de exigir do devedor exonerado aquilo com que este injustamento se
locupletou, excepto se o credor conhecia o erro ao receber a prestação.
ARTIGO 479º
(Objecto da obrigação de restituir)
1.
A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo
quando se tenha obtido à custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie
não for possível, o valor correspondente.
2.
A obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento à data da
verificação de algum dos factos referidos nas duas alíneas do artigo seguinte.
ARTIGO 480º
(Agravamento da obrigação)
O
enriquecido passa a responder também pelo perecimento ou deterioração culposa
da coisa, pelos frutos que por sua culpa deixem de ser percebidos e pelos juros
legais das quantias a que o empobrecido tiver direito, depois de se verificar
algumas das seguintes circunstâncias:
a)
Ter sido o enriquecido citado judicialmente para a restituição;
b)
Ter ele conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento ou da falta do
efeito que se pretendia obter com a prestação.
ARTIGO 481º
(Obrigação de restituir no caso de alienação
gratuita)
1.
Tendo o enriquecido alienado gratuitamente coisa que devesse restituir, fica o
adquirente obrigado em lugar dele, mas só na medida do seu próprio
enriquecimento.
2.
Se, porém, a transmissão teve lugar depois da verificação de algum dos factos
referidos no artigo anterior, o alienante è responsável nos termos desse
artigo, e o adquirente, se estiver de má fé, é responsável nos mesmos termos.
ARTIGO 482º
(Prescrição)
O
direito à restituição por enriquecimento prescreve no prazo de três anos, a
contar da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e
da pessoa do responsável, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver
decorrido o respectivo prazo a contar do enriquecimento.
SECÇÃO V
Responsabilidade civil
SUBSECÇÃO I
Responsabilidade por factos ilícitos
ARTIGO 483º
(Princípio geral)
1.
Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou
qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado
a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
2.
Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos
especificados na lei.
ARTIGO 484º
(Ofensa do crédito ou do bom nome)
Quem
afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de
qualquer pessoa, singular ou colectiva, responde pelos danos causados.
ARTIGO 485º
(Conselhos, recomendações ou informações)
1.
Os simples conselhos, recomendações ou informações não responsabilizam quem os
dá, ainda que haja negligência da sua parte.
2.
A obrigação de indemnizar existe, porém, quando se tenha assumido a
responsabilidade pelos danos, quando havia o dever jurídico de dar conselho,
recomendação ou informação e se tenha procedido com negligência ou intenção de
prejudicar, ou quando o procedimento do agente constitua facto punível.
ARTIGO 486º
(Omissões)
As
simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando,
independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou do
negócio jurídico, o dever de praticar o acto omitido.
ARTIGO 487º
(Culpa)
1.
É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo
presunção legal de culpa.
2.
A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um
bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.
ARTIGO 488º
(Imputabilidade)
1.
Não responde pelas consequências do facto danoso quem, no momento em que o
facto ocorreu, estava, por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer,
salvo se o agente se colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório.
2.
Presume-se falta de imputabilidade nos menores de sete anos e nos interditos
por anomalia psíquica.
ARTIGO 489º
(Indemnização por pessoa não impútavel)
1.
Se o acto causador dos danos tiver sido praticado por pessoa não imputável,
pode esta, por motivo de equidade, ser condenada a repará-los, total ou
parcialmente, desde que não seja possível obter a devida reparação das pessoas
a quem incumbe a sua vigilância.
2.
A indemnização será, todavia, calculada por forma a não privar a pessoa não
imputável dos alimentos necessários, conforme o seu estado e condição, nem dos
meios indispensáveis para cumprir os seus deveres legais de alimentos.
ARTIGO 490º
(Responsabilidade dos autores, instigadores e
auxiliares)
Se
forem vários os autores, instigadores ou auxiliares do acto ilícito, todos eles
respondem pelos danos que hajam causado.
ARTIGO 491º
(Responsabilidade das pessoas
obrigadas à vigilância de outrem)
As
pessoas que, por lei ou negócio jurídico, forem obrigadas a vigiar outras, por
virtude da incapacidade natural destas, são responsáveis pelos danos que elas
causem a terceiro, salvo se mostrarem que cumpriram o seu dever de vigilância
ou que os danos se teriam produzido ainda que o tivessem cumprido.
ARTIGO 492º
(Danos causados por edifícios ou outras obras)
1.
O proprietário ou possuidor de edifício ou de outra obra que ruir, no todo ou
em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos
danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo
com a diligência devida, se não teriam evitado os danos.
2.
A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra
responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos
exclusivamente a defeito de conservação.
ARTIGO 493º
(Danos causados por coisas, animais ou actividades)
1.
Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem
assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde
pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma
culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda
que não houvesse culpa sua.
2.
Quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua
própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a
repará-los, excepto se mostrar que empregou todas as providências exigidas
pelas circunstâncias com o fim de os prevenir.
ARTIGO 494º
(Limitação da indemnização no caso de mera culpa)
Quando
a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada,
equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados,
desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do
lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem.
ARTIGO 495º
(Indemnização a terceiros em caso de morte ou lesão
corporal)
1.
No caso de lesão de que proveio a morte, é o responsável obrigado a indemnizar
as despesas feitas para salvar o lesado e todas as demais, sem exceptuar as do
funeral.
2.
Neste caso, como em todos os outros de lesão corporal, têm direito a
indemnização aqueles que socorreram o lesado, bem como os estabelecimentos
hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído
para o tratamento ou assistência da vítima.
3.
Têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado
ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural.
ARTIGO 496º
(Danos não patrimoniais)
1.
Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela
sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
2.
Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe,
em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos
filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes;
e, por último aos irmãos ou sobrinhos que os representem.
3.
O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em
atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso
de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela
vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos
número anterior.
ARTIGO 497º
(Responsabilidade solidária)
1.
Se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua
responsabilidade.
2.
O direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas
culpas e das consequências que delas advieram, presumindo-se iguais as culpas
das pessoas responsáveis.
ARTIGO 498º
(Prescrição)
1.
O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em
que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com
desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem
prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar
do facto danoso.
2.
Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito
de regresso entre os responsáveis.
3.
Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição
sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.
4.
A prescrição do direito de indemnização
não importa prescrição da acção de
reivindicação nem da acção de
restituição por enriquecimento sem causa, se
houver lugar a uma ou a outra.
SUBSECÇÃO II
Responsabilidade pelo risco
ARTIGO 499º
(Disposições aplicáveis)
São
extensivas aos casos de responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na
falta de preceitos legais em contrário, as disposições que regulam a
responsabilidade por factos ilícitos.
ARTIGO 500º
(Responsabilidade do comitente)
1.
Aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de
culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também
a obrigação de indemnizar.
2.
A responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo
comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no
exercício da função que lhe foi confiada.
3.
O comitente que satisfizer a indemnização tem o direito de exigir do comissário
o reembolso de tudo quanto haja pago, excepto se houver também culpa da sua
parte; neste caso será aplicável o disposto no nº 2 do artigo 497º.
ARTIGO 501º
(Responsabilidade do Estado e de outras
pessoas colectivas públicas)
O
Estado e demais pessoas colectivas públicas, quando haja danos causados a
terceiro pelos seus órgãos, agentes ou representantes no exercício de
actividades de gestão privada, respondem civilmente por esses danos nos termos
em que os comitentes respondem pelos danos causados pelos seus comissários.
ARTIGO 502º
(Danos causados por animais)
Quem
no seu próprio interesse utilizar quaisquer animais responde pelos danos que eles
causarem, desde que os danos resultem do perigo especial que envolve a sua
utilização.
ARTIGO 503º
(Acidentes causados por veículos)
1.
Aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação
terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de
comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo,
mesmo que este não se encontre em circulação.
2.
As pessoas não imputáveis respondem nos termos do art. 489º.
3.
Aquele que conduzir o veículo por conta de outrem responde pelos danos que
causar, salvo se provar que não houve culpa da sua parte; se, porém, o conduzir
fora do exercício das suas funções de comissário, responde nos termos do nº 1.
ARTIGO 504º
(Beneficiários da responsabilidade)
1.
A responsabilidade pelos danos causados por veículos aproveita a terceiros, bem
como às pessoas transportadas.
2.
No caso de transporte por virtude de contrato, a responsabilidade abrange só os
danos que atinjam a própria pessoa e as coisas por ela transportadas.
3.
No caso de transporte gratuito, a responsabilidade abrange apenas os danos
pessoais da pessoa transportada.
4.
São nulas as cláusulas que excluam ou limitem a responsabilidade do
transportador pelos acidentes que atinjam a pessoa transportada.
(Redacção do Dec.-Lei 14/96, de 6-3)
ARTIGO 505º
(Exclusão da responsabilidade)
Sem
prejuízo do disposto no artigo 570º, a responsabilidade fixada pelo nº 1 do
artigo 503º só é excluída quando o acidente for imputável ao próprio lesado ou
a terceiro, ou quando resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento
do veículo.
ARTIGO 506º
(Colisão de veículos)
1.
Se da colisão entre dois veículos resultarem danos em relação aos dois ou em
relação a um deles, e nenhum dos condutores tiver culpa no acidente, a
responsabilidade é repartida na proporção em que o risco de cada um dos
veículos houver contribuído para os danos; se os danos forem causados somente
por um dos veículos, sem culpa de nenhum dos condutores, só a pessoa por eles
responsável é obrigada a indemnizar.
2.
Em caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos
veículos para os danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos
condutores.
ARTIGO 507º
(Responsabilidade solidária)
1.
Se a responsabilidade pelo risco recair sobre várias pessoas, todas respondem
solidariamente pelos danos, mesmo que haja culpa de alguma ou algumas.
2.
Nas relações entre os diferentes responsáveis, a obrigação de indemnizar
reparte-se de harmonia com o interesse de cada um na utilização do veículo;
mas, se houver culpa de algum ou de alguns, apenas os culpados respondem, sendo
aplicável quanto ao direito de regresso, entre eles, ou em relação a eles, o
disposto no nº 2 do artigo 497º.
ARTIGO 508º (*)
(Limites máximos)
1 - A indemnização fundada em acidente de viação, quando não haja culpa do
responsável, tem como limite máximo o capital
mínimo do
seguro
obrigatório de responsabilidade civil automóvel .
2 - Se o acidente for
causado por veículo utilizado em transporte colectivo, a indemnização tem como
limite máximo o capital
mínimo do seguro
obrigatório de responsabilidade civil automóvel estabelecido para os transportes
colectivos.
3 - Se o acidente for causado por veículo utilizado em
transporte ferroviário, a indemnização tem como limite máximo o capital mínimo
do seguro obrigatório de responsabilidade civil estabelecido para essa situação
em legislação especial.
(*) Redacção introduzida pelo Decreto-Lei Nº 59/2004 de 19 de Março.
ARTIGO 509º
(Danos causados por instalações
de energia eléctrica ou gás)
1.
Aquele que tiver a direcção efectiva de instalação destinada à condução ou
entrega da energia eléctrica ou do gás, e utilizar essa instalação no seu
interesse, responde tanto pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da
electricidade ou do gás, como pelos danos resultantes da própria instalação,
excepto se ao tempo do acidente esta estiver de acordo com as regras técnicas
em vigor e em perfeito estado de conservação.
2.
Não obrigam a reparação os danos devidos a causa de força maior; considera-se
de força maior toda a causa exterior independente do funcionamento e utilização
da coisa.
3.
Os danos causados por utensílios de uso de energia não são reparáveis nos
termos desta disposição.
ARTIGO 510º (*)
(Limites da responsabilidade)
A indemnização fundada na responsabilidade a que se refere o artigo
precedente ,
quando não haja culpa do responsável, tem, para cada acidente, como limite
máximo o estabelecido no Nº 1 do artigo
508º , salvo se,
havendoseguro obrigatório, diploma especial estabelecer um capital
mínimo de seguro , caso em que a indemnização
tem como limite máximo esse capital.
(*) Redacção introduzida pelo Decreto-Lei Nº 59/2004 de 19 de Março.
CAPÍTULO III
Modalidades das obrigações
SECÇÃO I
Obrigações de sujeito activo
indeterminado
ARTIGO 511º
(Determinação da pessoa do credor)
A
pessoa do credor pode não ficar determinada no momento em que a obrigação é
constituída; mas deve ser determinável, sob pena de ser nulo o negócio jurídico
do qual a obrigação resultaria.
SECÇÃO II
Obrigações solidárias
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 512º
(Noção)
1.
A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação
integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade
de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o devedor para com
todos eles.
2.
A obrigação não deixa de ser solidária pelo facto de os devedores estarem
obrigados em termos diversos ou com diversas garantias, ou de ser diferente o
conteúdo das prestações de cada um deles; igual diversidade se pode verificar
quanto à obrigação do devedor relativamente a cada um dos credores solidários.
ARTIGO 513º
(Fontes da solidariedade)
A
solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da
vontade das partes.
ARTIGO 514º
(Meios de defesa)
1.
O devedor solidário demandado pode defender-se por todos os meios que
pessoalmente lhe competem ou que são comuns a todos os condevedores.
2.
Ao credor solidário são oponíveis igualmente não só os meios de defesa comum,
como os que pessoalmente lhe respeitem.
ARTIGO 515º
(Herdeiros dos devedores ou credores solidários)
1.
Os herdeiros do devedor solidário respondem colectivamente pela totalidade da
dívida; efectuada a partilha, cada co-herdeiro responde nos termos do artigo
2098º.
2.
Os herdeiros do credor solidário só conjuntamente podem exonerar o devedor;
efectuada a partilha, se o crédito tiver sido adjudicado a dois ou mais
herdeiros, também só em conjunto estes podem exonerar o devedor.
ARTIGO 516º
(Participação nas dívidas e nos créditos)
Nas
relações entre si, presume-se que os devedores ou credores solidários
comparticipam em partes iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação
jurídica entre eles existente não resulte que são diferentes as suas partes, ou
que um só deles deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do
crédito.
ARTIGO 517º
(Litisconsórcio)
1.
A solidariedade não impede que os devedores solidários demandem conjuntamente o
credor ou sejam por ele conjuntamente demandados.
2.
De igual direito gozam os credores solidários relativamente ao devedor e este
em relação àqueles.
SUBSECÇÃO II
Solidariedade entre devedores
ARTIGO 518º
(Exclusão do benefício da divisão)
Ao
devedor solidário demandado não é lícito opor o benefício da divisão; e, ainda
que chame os outros devedores à demanda, nem por isso se libera da obrigação de
efectuar a prestação por inteiro.
ARTIGO 519º
(Direitos do credor)
1.
O credor tem o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou
parte dela, proporcional ou não à quota do interpelado; mas, se exigir
judicialmente a um deles a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de
proceder judicialmente contra os outros pelo que ao primeiro tenha exigido,
salvo se houver razão atendível, como a insolvência ou risco de insolvência do
demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação.
2.
Se um dos devedores tiver qualquer meio de defesa pessoal contra o credor, não
fica este inibido de reclamar dos outros a prestação integral, ainda que esse
meio já lhe tenha sido oposto.
ARTIGO 520º
(Impossibilidade da prestação)
Se
a prestação se tornar impossível por facto imputável a um dos devedores, todos
eles são solidariamente responsáveis pelo seu valor; mas só o devedor a quem o
facto é imputável responde pela reparação dos danos que excedam esse valor, e,
sendo vários, é solidária a sua responsabilidade.
ARTIGO 521º
(Prescrição)
1.
Se, por efeito da suspensão ou interrupção da prescrição, ou de outra causa, a
obrigação de um dos devedores se mantiver, apesar de prescritas as obrigações dos
outros, e aquele for obrigado a cumprir, cabe-lhe o direito de regresso contra
os seus condevedores.
2.
O devedor que não haja invocado a prescrição não goza do direito de regresso
contra os condevedores cujas obrigações tenham prescrito, desde que estes
aleguem a prescrição.
ARTIGO 522º
(Caso julgado)
O
caso julgado entre o credor e um dos devedores não é oponível aos restantes
devedores, mas pode ser oposto por estes, desde que não se baseie em fundamento
que respeite pessoalmente àquele devedor.
ARTIGO 523º
(Satisfação do direito do credor)
A
satisfação do direito do credor, por cumprimento,
dação em cumprimento,
novação, consignação em depósito ou
compensação, produz a extinção,
relativamente a ele, das obrigações de todos os devedores.
ARTIGO 524º
(Direito de regresso)
O
devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe competir tem
direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a estes
compete.
Artigo 525º
(Meios de defesa oponíveis pelos condevedores)
1.
Os condevedores podem opor ao que satisfaz o direito do credor a falta de
decurso do prazo que lhes tenha sido concedido para o cumprimento da obrigação,
bem como qualquer outro meio de defesa, quer este seja comum, quer respeite
pessoalmente ao demandado.
2.
A faculdade concedida no número anterior tem lugar, ainda que o condevedor
tenha deixado, sem culpa sua, de opor ao credor o meio comum de defesa, salvo
se a falta de oposição for imputável ao devedor que pretende valer-se do mesmo
meio.
ARTIGO 526º
(Insolvência dos devedores ou
impossibilidade de cumprimento)
1.
Se um dos devedores estiver insolvente ou não puder por outro motivo cumprir a
prestação a que está adstrito, é a sua quota-parte repartida proporcionalmente
entre todos os demais, incluíndo o credor de regresso e os devedores que pelo
credor hajam sido exonerados da obrigação ou apenas do vínculo da
solidariedade.
2.
Ao credor de regresso não aproveita o benefício da repartição na medida em que
só por negligência sua lhe não tenha sido possível cobrar a parte do seu
condevedor na obrigação solidária.
ARTIGO 527º
(Renúncia à solidariedade)
A
renúncia à solidariedade a favor de um ou alguns dos devedores não prejudica o
direito do credor relativamente aos restantes, contra os quais conserva o
direito à prestação por inteiro.
SUBSECÇÃO III
Solidariedade entre credores
ARTIGO 528º
(Escolha do credor)
1.
É permitido ao devedor escolher o credor solidário a quem satisfaça a
prestação, enquanto não tiver sido judicialmente citado para a respectiva acção
por outro credor cujo crédito se ache vencido.
2.
Se o devedor cumprir perante credor diferente daquele que judicialmente exigiu
a prestação, não fica dispensado de realizar a favor deste a prestação
integral; mas, quando a solidariedade entre os credores tiver sido estabelecida
em favor do devedor, este pode, renunciando total ou parcialmente ao benefício,
prestar a cada um dos credores a parte que lhe cabe no crédito comum ou
satisfazer a algum dos outros a prestação com dedução da parte do demandante.
ARTIGO 529º
(Impossibilidade da prestação)
1.
Se a prestação se tornar impossível por facto imputável ao devedor, subsiste a
solidariedade relativamente ao crédito da indemnização.
2.
Se a prestação se tornar impossível por facto imputável a um dos credores, fica
este obrigado a indemnizar os outros.
ARTIGO 530º
(Prescrição)
1.
Se o direito de um dos credores se mantiver devido a suspensão ou interrupção
da prescrição ou a outra causa, apesar de haverem prescrito os direitos dos
restantes credores, pode o devedor opor àquele credor a prescrição do crédito
na parte relativa a estes últimos.2. A renúncia à prescrição, feita pelo
devedor em benefício de um dos credores, não produz efeito relativamente aos
restantes.
ARTIGO 531º
(Caso julgado)
O
caso julgado entre um dos credores e o devedor não é oponível aos outros
credores; mas pode ser oposto por estes ao devedor, sem prejuízo das excepções
pessoais que o devedor tenha o direito de invocar em relação a cada um deles.
ARTIGO 532º
(Satisfação do direito de um dos credores)
A
satisfação do direito de um dos credores, por cumprimento, dação em
cumprimento, novação, consignação em depósito ou compensação, produz a
extinção, relativamente a todos os credores, da obrigação do devedor.
ARTIGO 533º
(Obrigação do credor que foi pago)
O
credor cujo direito foi satisfeito além da parte que lhe competia na relação
interna entre os credores tem de satisfazer aos outros a parte que lhes cabe no
crédito comum.
SECÇÃO III
Obrigações divisíveis e indivisíveis
ARTIGO 534º
(Obrigações divisíveis)
São
iguais as partes que têm na obrigação divisível os vários credores ou
devedores, se outra proporção não resultar da lei ou do negócio jurídico; mas
entre os herdeiros do devedor, depois da partilha, serão essas partes fixadas
proporcionalmente às suas quotas hereditárias, sem prejuízo do disposto nos nºs
2 e 3 do artigo 2098º.
ARTIGO 535º
(Obrigações indivisíveis com pluralidade de
devedores)
1.
Se a prestação for indivisível e vários os devedores, só de todos os obrigados
pode o credor exigir o cumprimento da prestação, salvo se tiver sido estipulada
a solidariedade ou esta resultar da lei.
2.
Quando ao primitivo devedor da prestação indivisível sucedam vários herdeiros,
também só de todos eles tem o credor a possibilidade de exigir o cumprimento da
prestação.
ARTIGO 536º
(Extinção relativamente a um dos devedores)
Se
a obrigação indivisível se extinguir apenas em relação a algum ou alguns dos
devedores, não fica o credor inibido de exigir a prestação dos restantes
obrigados, contanto que lhes entregue o valor da parte que cabia ao devedor ou
devedores exonerados.
ARTIGO 537º
(Impossibilidade da prestação)
Se
a prestação indivisível se tornar impossível por facto imputável a algum ou
alguns dos devedores, ficam os outros exonerados.
ARTIGO 538º
(Pluralidade de credores)
1.
Sendo vários os credores da prestação indivisível, qualquer deles tem o direito
de exigi-la por inteiro; mas o devedor, enquanto não for judicialmente citado,
só relativamente a todos, em conjunto, se pode exonerar.
2.
O caso julgado favorável a um dos credores aproveita aos outros, se o devedor
não tiver, contra estes, meios especiais de defesa
SECÇÃO IV
Obrigações genéricas
ARTIGO 539º
(Determinação do objecto)
Se
o objecto da prestação for determinado apenas quanto ao género, compete a sua
escolha ao devedor, na falta de estipulação em contrário.
ARTIGO 540º
(Não perecimento do género)
Enquanto
a prestação for possível com coisas do género estipulado, não fica o devedor
exonerado pelo facto de perecerem aquelas com que se dispunha a cumprir.
ARTIGO 541º
(Concentração da obrigação)
A
obrigação concentra-se, antes do cumprimento, quando isso resultar de acordo
das partes, quando o género se extinguir a ponto de restar apenas uma das
coisas nele compreendidas, quando o credor incorrer em mora, ou ainda nos
termos do artigo 797º.
ARTIGO 542º
(Concentração por facto do credor ou de terceiro)
1.
Se couber ao credor ou a terceiro, a escolha só é eficaz se for declarada,
respectivamente, ao devedor ou a ambas as partes, e é irrevogável.
2.
Se couber a escolha ao credor e este a não fizer dentro do prazo estabelecido
ou daquele que para o efeito lhe for fixado pelo devedor, é a este que a escolha
passa a competir.
SECÇÃO V
Obrigações alternativas
ARTIGO 543º
(Noção)
1.
É alternativa a obrigação que compreende duas ou mais prestações, mas em que o
devedor se exonera efectuando aquela que, por escolha, vier a ser designada.
2.
Na falta de determinação em contrário, a escolha pertence ao devedor.
ARTIGO 544º
(Indivisibilidade das prestações)
O
devedor não pode escolher parte de uma prestação e parte de outra ou outras,
nem ao credor ou a terceiro é lícito fazê-lo quando a escolha lhes pertencer.
ARTIGO 545º
(Impossibilidade não imputável às partes)
Se
uma ou algumas das prestações se tornarem impossíveis por causa não imputável
às partes, a obrigação considera-se limitada às prestações que forem possíveis.
ARTIGO 546º
(Impossibilidade imputável ao devedor)
Se
a impossibilidade de alguma das prestações for imputável ao devedor e a escolha
lhe pertencer, deve efectuar uma das prestações possíveis; se a escolha
pertencer ao credor, este poderá exigir uma das prestações possíveis, ou pedir
a indemnização pelos danos provenientes de não ter sido efectuada a prestação
que se tornou impossível, ou resolver o contrato nos termos gerais.
ARTIGO 547º
(Impossibilidade imputável ao credor)
Se
a impossibilidade de alguma das prestações for imputável ao credor e a escolha
lhe pertencer, considera-se cumprida a obrigação; se a escolha pertencer ao
devedor, também a obrigação se tem por cumprida, a menos que este prefira
efectuar outra prestação e ser indemnizado dos danos que houver sofrido.
ARTIGO 548º
(Falta de escolha pelo devedor)
O
credor, na execução, pode exigir que o devedor, dentro do prazo estipulado ou
do estabelecido na lei de processo, declare por qual das prestações quer optar,
sob pena de se devolver ao credor o direito de escolha.
Redacção introduzida pelo Dec.-Lei 38/2003.
Anterior redacção: “O credor, na execução, pode exigir que o
devedor, dentro do prazo que lhe for fixado pelo tribunal, declare por qual das
prestações quer optar, sob pena de se devolver ao credor o direito de escolha”.
ARTIGO 549º
(Escolha pelo credor ou por terceiro)
À
escolha que o credor ou terceiro deva efectuar é aplicável o disposto no artigo
542º.
SECÇÃO VI
Obrigações pecuniárias
SUBSECÇÃO I
Obrigações de quantidade
ARTIGO 550º
(Princípio nominalista)
O
cumprimento das obrigações pecuniárias faz-se em moeda que tenha curso legal no
País à data em que for efectuado e pelo valor nominal que a moeda nesse momento
tiver, salvo estipulação em contrário.
ARTIGO 551º
(Actualização das obrigações pecuniárias)
Quando
a lei permitir a actualização das prestações pecuniárias, por virtude das
flutuações do valor da moeda, atender-se-á, na falta de outro critério legal,
aos índices dos preços, de modo a restabelecer, entre a prestação e a
quantidade de mercadorias a que ela equivale, a relação existente na data em
que a obrigação se constituiu.
SUBSECÇÃO II
Obrigações de moeda específica
ARTIGO 552º
(Validade das obrigações de moeda específica)
O
curso legal ou forçado da nota de banco não prejudica a validade do acto pelo
qual alguém se comprometa a pagar em moeda metálica ou em valor dessa moeda.
ARTIGO 553º
(Obrigações de moeda específica sem
quantitativo expresso em moeda corrente)
Quando
for estipulado o pagamento em certa espécie monetária, o pagamento deve ser
feito na espécie estipulada, existindo ela legalmente, embora tenha variado de
valor após a data em que a obrigação foi constituída.
ARTIGO 554º
(Obrigações de moeda específica ou de certo metal
com quantitativo expresso em moeda corrente)
Quando
o quantitativo da obrigação é expresso em dinheiro corrente, mas se estipula
que o cumprimento será efectuado em certa espécie monetária ou em moedas de
certo metal, presume-se que as partes querem vincular-se ao valor corrente que a
moeda ou as moedas do metal escolhido tinham à data da estipulação.
ARTIGO 555º
(Falta da moeda estipulada)
1.
Quando se tiver estipulado o cumprimento em determinada espécie monetária, em
certo metal ou em moedas de certo metal, e se não encontrem as espécies ou as
moedas estipuladas em quantidade bastante, pode o pagamento ser feito, quanto à
parte da dívida que não for possível cumprir nos termos acordados, em moeda
corrente que perfaça o valor dela, segundo a cotação que a moeda escolhida ou
as moedas do metal indicado tiverem na bolsa no dia do cumprimento.
2.
Se as moedas estipuladas ou as moedas do metal indicado não tiverem cotação na
bolsa, atender-se-á ao valor corrente, ou, na falta deste, ao valor corrente do
metal; a esse mesmo valor se atenderá, quando a moeda, devido à sua raridade,
tenha atingido uma cotação ou preço corrente anormal, com que as partes não
hajam contado no momento em que a obrigação se constituiu.
ARTIGO 556º
(Moeda específica sem curso legal)
1.
Sempre que a espécie monetária estipulada ou as moedas do metal estipulado não
tenham já curso legal na data do cumprimento, deve a prestação ser feita em
moeda que tenha curso legal nessa data, de harmonia com a norma de redução que
a lei tiver estabelecido ou, na falta de determinação legal, segundo a relação
de valores correntes na data em que a nova moeda for introduzida.
2.
Quando o quantitativo da obrigação tiver sido expresso em moeda corrente,
estipulando-se o pagamento em espécies monetárias, em certo metal ou em moedas
de certo metal, e essas moedas carecerem de curso legal na data do cumprimento,
observar-se-á a doutrina do número anterior, uma vez determinada a quantidade
dessas moedas que constituía o montante da prestação em dívida.
ARTIGO 557º
(Cumprimento em moedas de dois ou mais
metais ou de um entre vários metais)
1.
No caso de se ter convencionado o cumprimento em moedas de um entre dois ou
mais metais, a determinação da pessoa a quem a escolha pertence é feita de
acordo com as regras das obrigações alternativas.
2.
Quando se estipular o cumprimento da obrigação em moedas de dois ou mais
metais, sem se fixar a proporção de umas e outras, cumprirá o devedor
entregando em partes iguais moedas dos metais especificados.
SUBSECÇÃO III
Obrigações em moeda estrangeira
ARTIGO 558º
(Termos do cumprimento)
1 - A estipulação do cumprimento em moeda
com curso legal apenas no estrangeiro não impede o devedor de pagar em moeda
com curso legal no País, segundo o câmbio do dia do cumprimento e do lugar para
este estabelecido, salvo se essa faculdade houver sido afastada pelos
interessados. *
2.
Se, porém, o credor estiver em mora, pode o devedor cumprir de acordo com o
câmbio da data em que a mora se deu.
* (Decreto-Lei n.º
343/98, de 6 de Novembro)
SECÇÃO VII
Obrigações de juros
ARTIGO 559º
(Taxa de juro)
1.
Os juros legais e os estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são
os fixados em portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do
Plano.
2.
A estipulação de juros a taxa superior à fixada nos termos do número anterior
deve ser feita por escrito, sob pena de serem apenas devidos na medida dos
juros legais.
(Redacção do Dec.-Lei 200-C/80, de 24-6)
Taxa anual de Juros Legais – Port. 263/99, de 12-04 – 7%
ARTIGO 559º-A
(Juros usurários)
É
aplicável o disposto no artigo 1146º a toda a estipulação de juros ou quaisquer
outras vantagens em negócios ou actos de concessão, outorga, renovação,
desconto ou prorrogação do prazo de pagamento de um crédito e em outros
análogos.
(Aditado pelo Dec.-Lei 262/83, de 16-6)
ARTIGO 560º
(Anatocismo)
1.
Para que os juros vencidos produzam juros é necessária convenção posterior ao
vencimento; pode haver também juros de juros, a partir da notificação judicial
feita ao devedor para capitalizar os juros vencidos ou proceder ao seu
pagamento sob pena de capitalização.
2.
Só podem ser capitalizados os juros correspondentes ao período mínimo de um
ano.
3.
Não são aplicáveis as restrições dos números anteriores, se forem contrárias a
regras ou usos particulares do comércio.
ARTIGO 561º
(Autonomia do crédito de juros)
Desde
que se constitui, o crédito de juros não fica necessariamente dependente do
crédito principal, podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o
outro.
SECÇÃO VIII
Obrigação de indemnização
ARTIGO 562º
(Princípio geral)
Quem
estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria,
se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
ARTIGO 563º
(Nexo de causalidade)
A
obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado
provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
ARTIGO 564º
(Cálculo da indemnização)
1.
O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios
que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.
2.
Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que
sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização
correspondente será remetida para decisão ulterior.
ARTIGO 565º
(Indemnização provisória)
Devendo
a indemnização ser fixada em liquidação posterior, pode o tribunal condenar
desde logo o devedor no pagamento de uma indemnização, dentro do quantitativo
que considere já provado.
Redacção introduzida pelo Dec.-Lei 38/2003, de 8/3.
Anterior redacção: “Devendo a indemnização ser fixada em
execução de sentença, pode o tribunal condenar desde logo o devedor no
pagamento de uma indemnização, dentro do quantitativo que considere já provado”.
ARTIGO 566º
(Indemnização em dinheiro)
1.
A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não
seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa
para o devedor.
2.
Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem
como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais
recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não
existissem danos.
3.
Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará
equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.
ARTIGO 567º
(Indemnização em renda)
1.
Atendendo à natureza continuada dos danos, pode o tribunal, a requerimento do
lesado, dar à indemnização, no todo ou em parte, a forma de renda vitalícia ou
temporária, determinando as providências necessárias para garantir o seu
pagamento.
2.
Quando sofram alteração sensível as circunstâncias em que assentou, quer o
estabelecimento da renda, quer o seu montante ou duração, quer a dispensa ou
imposição de garantias, a qualquer das partes é permitido exigir a
correspondente modificação da sentença ou acordo.
ARTIGO 568º
(Cessão dos direitos do lesado)
Quando
a indemnização resulte da perda de qualquer coisa ou direito, o responsável
pode exigir, no acto do pagamento ou em momento posterior, que o lesado lhe
ceda os seus direitos contra terceiros.
ARTIGO 569º
(Indicação do montante dos danos)
Quem
exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que
avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede,
no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a
revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.
ARTIGO 570º
(Culpa do lesado)
1.
Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou
agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das
culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a
indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.
2.
Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do
lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.
ARTIGO 571º
(Culpa dos representantes legais e auxiliares)
Ao
facto culposo do lesado é equiparado o facto culposo dos seus representantes
legais e das pessoas de quem ele se tenha utilizado.
ARTIGO 572º
(Prova da culpa do lesado)
Àquele
que alega a culpa do lesado incumbe a prova da sua verificação; mas o tribunal
conhecerá dela, ainda que não seja alegada.
SECÇÃO IX
Obrigação de informação e de
apresentação
de coisas ou documentos
ARTIGO 573º
(Obrigação de informação)
A
obrigação de informação existe, sempre que o titular de um direito tenha dúvida
fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em
condições de prestar as informações necessárias.
ARTIGO 574º
(Apresentação de coisas)
1.
Ao que invoca um direito, pessoal ou real, ainda que condicional ou a prazo,
relativo a certa coisa, móvel ou imóvel, é lícito exigir do possuidor ou
detentor a apresentação da coisa, desde que o exame seja necessário para apurar
a existência ou o conteúdo do direito e o demandado não tenha motivos para
fundadamente se opor à diligência.
2.
Quando aquele de quem se exige a apresentação da coisa a detiver em nome de
outrem, deve avisar a pessoa em cujo nome a detém, logo que seja exigida a
apresentação, a fim de ela, se quiser, usar os meios de defesa que no caso
couberem.
ARTIGO 575º
(Apresentação de documentos)
As
disposições do artigo anterior são, com as necessárias adaptações, extensivas
aos documentos, desde que o requerente tenha um interesse jurídico atendível no
exame deles.
ARTIGO 576º
(Reprodução das coisas e dos documentos)
Feita
a apresentação, o requerente tem a faculdade de tirar cópias ou fotografias, ou
usar de outros meios destinados a obter a reprodução da coisa ou documento,
desde que a reprodução se mostre necessária e se lhe não oponha motivo grave
alegado pelo requerido.
CAPÍTULO IV
Transmissão de créditos e de dívidas
SECÇÃO I
Cessão de créditos
ARTIGO 577º
(Admissibilidade da cessão)
1.
O credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito,
independentemente do consentimento do devedor, contanto que a cessão não seja
interdita por determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não
esteja, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor.
2.
A convenção pela qual se proíba ou restrinja a possibilidade da cessão não é
oponível ao cessionário, salvo se este a conhecia no momento da cessão.
ARTIGO 578º
(Regime aplicável)
1.
Os requisitos e efeitos da cessão entre as partes definem-se em função do tipo
de negócio que lhe serve de base.
2.
A cessão de créditos hipotecários, quando não seja feita em testamento e a
hipoteca recaia sobre bens imóveis, deve necessariamente constar de escritura
pública.
ARTIGO 579º
(Proibição da cessão de direitos litigiosos)
1.
A cessão de créditos ou outros direitos litigiosos feita, directamente ou por
interposta pessoa, a juízes ou magistrados do Ministério Público, funcionários
de justiça ou mandatários judiciais é nula, se o processo decorrer na área em
que exercem habitualmente a sua actividade ou profissão; é igualmente nula a
cessão desses créditos ou direitos feita a peritos ou outros auxiliares da
justiça que tenham intervenção no respectivo processo.
2.
Entende-se que a cessão é efectuada por interposta pessoa, quando é feita ao
cônjuge do inibido ou a pessoa de quem este seja herdeiro presumido, ou quando
é feita a terceiro, de acordo com o inibido, para o cessionário transmitir a
este a coisa ou direito cedido.
3.
Diz-se litigioso o direito que tiver sido contestado em juízo contencioso,
ainda que arbitral, por qualquer interessado.
ARTIGO 580º
(Sanções)
1.
A cessão feita com quebra do disposto no artigo anterior, além de nula, sujeita
o cessionário à obrigação de reparar os danos causados, nos termos gerais.
2.
A nulidade da cessão não pode ser invocada pelo cessionário.
ARTIGO 581º
(Excepções)
A
proibição da cessão dos créditos ou direitos litigiosos não tem lugar nos casos
seguintes:
a)
Quando a cessão for feita ao titular de um direito de preferência ou de remição
relativo ao direito cedido;
b)
Quando a cessão se realizar para defesa de bens possuídos pelo cessionário;
c)
Quando a cessão se fizer ao credor em cumprimento do que lhe é devido.
ARTIGO 582º
(Transmissão de garantias e outros acessórios)
1.
Na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão,
para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido,
que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente.
2.
A coisa empenhada que estiver na posse do cedente será entregue ao cessionário,
mas não a que estiver na posse de terceiro.
ARTIGO 583º
(Efeitos em relação ao devedor)
1.
A cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja notificada,
ainda que extrajudicialmente, ou desde que ele a aceite.
2.
Se, porém, antes da notificação ou aceitação, o devedor pagar ao cedente ou
celebrar com ele algum negócio jurídico relativo ao crédito, nem o pagamento
nem o negócio é oponível ao cessionário, se este provar que o devedor tinha
conhecimento da cessão.
ARTIGO 584º
(Cessão a várias pessoas)
Se
o mesmo crédito for cedido a várias pessoas, prevalece a cessão que primeiro
for notificada ao devedor ou que por este tiver sido aceita.
ARTIGO 585º
(Meios de defesa oponíveis pelo devedor)
O
devedor pode opor ao cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios
de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que
provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão.
ARTIGO 586º
(Documentos e outros meios probatórios)
O
cedente é obrigado a entregar ao cessionário os documentos e outros meios
probatórios do crédito, que estejam na sua posse e em cuja conservação não
tenha interesse legítimo.
ARTIGO 587º
(Garantia da existência do crédito e
da solvência do devedor)
1.
O cedente garante ao cessionário a existência e a exigibilidade do crédito ao
tempo da cessão, nos termos aplicáveis ao negócio, gratuito ou oneroso, em que
a cessão se integra.
2.
O cedente só garante a solvência do devedor se a tanto expressamente se tiver
obrigado.
ARTIGO 588º
(Aplicação das regras da cessão a outra figuras)
As
regras da cessão de créditos são extensivas, na parte aplicável, à cessão de
quaisquer outros direitos não exceptuados por lei, bem como à transferência
legal ou judicial de créditos.
SECÇÃO II
Sub-rogação
ARTIGO 589º
(Sub-rogação pelo credor)
O
credor que recebe a prestação de terceiro pode sub-rogá-lo nos seus direitos,
desde que o faça expressamente até ao momento do cumprimento da obrigação.
ARTIGO 590º
(Sub-rogação pelo devedor)
1.
O terceiro que cumpre a obrigação pode ser igualmente sub-rogado pelo devedor
até ao momento do cumprimento, sem necessidade do consentimento do credor.
2.
A vontade de sub-rogar deve ser expressamente manifestada.
ARTIGO 591º
(Sub-rogação em consequência de
empréstimo feito ao devedor)
1.
O devedor que cumpre a obrigação com dinheiro ou outra coisa fungível
emprestada por terceiro pode sub-rogar este nos direitos do credor.
2.
A sub-rogação não necessita do consentimento do credor, mas só se verifica
quando haja declaração expressa, no documento do empréstimo, de que a coisa se
destina ao cumprimento da obrigação e de que o mutuante fica sub-rogado nos
direitos do credor.
ARTIGO 592º
(Sub-rogação legal)
1.
Fora dos casos previstos nos artigos anteriores ou noutras disposições da lei,
o terceiro que cumpre a obrigação só fica sub-rogado nos direitos do credor
quando tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver
directamente interessado na satisfação do crédito.
2.
Ao cumprimento é equiparada a dação em cumprimento, a consignação em depósito,
a compensação ou outra causa de satisfação do crédito compatível com a
sub-rogação.
ARTIGO 593º
(Efeitos da sub-rogação)
1.
O sub-rogado adquire, na medida da satisfação dada ao direito do credor, os
poderes que a este competiam.
2.
No caso de satisfação parcial, a sub-rogação não prejudica os direitos do
credor ou do seu cessionário, quando outra coisa não for estipulada.
3.
Havendo vários sub-rogados, ainda que em momentos sucessivos, por satisfações
parciais do crédito, nenhum deles tem preferência sobre os demais.
ARTIGO 594º
(Disposições aplicáveis)
É
aplicável à sub-rogação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos
582º a 584º.
SECÇÃO III
Transmissão singular de dívidas
ARTIGO 595º
(Assunção de dívida)
1.
A transmissão a título singular de uma dívida pode verificar-se:
a)
Por contrato entre o antigo e o novo devedor, ratificado pelo credor;
b)
Por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do
antigo devedor.
2.
Em qualquer dos casos a transmissão só exonera o antigo devedor havendo
declaração expressa do credor; de contrário, o antigo devedor responde
solidariamente com o novo obrigado.
ARTIGO 596º
(Ratificação do credor)
1.
Enquanto não for ratificado pelo credor, podem as partes distratar o contrato a
que se refere a alínea a) do nº 1 do artigo anterior.
2.
Qualquer das partes tem o direito de fixar ao credor um prazo para a
ratificação, findo o qual esta se considera recusada.
ARTIGO 597º
(Invalidade da transmissão)
Se
o contrato de transmissão da dívida for declarado nulo ou anulado e o credor
tiver exonerado o anterior obrigado, renasce a obrigação deste, mas
consideram-se extintas as garantias prestadas por terceiro, excepto se este
conhecia o vício na altura em que teve notícia da transmissão.
ARTIGO 598º
(Meios de defesa)
Na
falta de convenção em contrário, o novo devedor não tem o direito de opor ao
credor os meios de defesa baseados nas relações entre ele e o antigo devedor,
mas pode opor-lhe os meios de defesa derivados das relações entre o antigo
devedor e o credor, desde que o seu fundamento seja anterior à assunção da
dívida e se não trate de meios de defesa pessoais do antigo devedor.
ARTIGO 599º
(Transmissão de garantias e acessórios)
1.
Com a dívida transmitem-se para o novo devedor, salvo convenção em contrário,
as obrigações acessórias do antigo devedor que não sejam inseparáveis da pessoa
deste.
2.
Mantêm-se nos mesmos termos as garantias do crédito, com excepção das que
tiverem sido constituídas por terceiro ou pelo antigo devedor, que não haja
consentido na transmissão da dívida.
ARTIGO 600º
(Insolvência do novo devedor)
O
credor que tiver exonerado o antigo devedor fica impedido de exercer contra ele
o seu direito de crédito ou qualquer direito de garantia, se o novo devedor se
mostrar insolvente, a não ser que expressamente haja ressalvado a
responsabilidade do primitivo obrigado.
CAPÍTULO V
Garantia geral das obrigações
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 601º
(Princípio geral)
Pelo
cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de
penhora, sem prejuízo dos regimes especialmente estabelecidos em consequência
da separação de patrimónios.
ARTIGO 602º
(Limitação da responsabilidade por convenção das
partes)
Salvo
quando se trate de matéria subtraída à disponibilidade das partes, é possível,
por convenção entre elas, limitar a responsabilidade do devedor a alguns dos
seus bens, no caso de a obrigação não ser voluntariamente cumprida.
ARTIGO 603º
(Limitação por determinação de terceiro)
1.
Os bens deixados ou doados com a cláusula de exclusão da responsabilidade por
dívidas do beneficiário respondem pelas obrigações posteriores à liberalidade,
e também pelas anteriores se for registada a penhora antes do registo daquela
cláusula.
2.
Se a liberalidade tiver por objecto bens não sujeitos a registo, a cláusula só
é oponível aos credores cujo direito seja anterior à liberalidade.
ARTIGO 604º
(Concurso de credores)
1.
Não existindo causas legítimas de preferência, os credores têm o direito de ser
pagos proporcionalmente pelo preço dos bens do devedor, quando ele não chegue
para integral satisfação dos débitos.
2.
São causas legítimas de preferência, além de outras admitidas na lei, a
consignação de rendimentos, o penhor, a hipoteca, o privilégio e o direito de
retenção.
SECÇÃO II
Conservação da garantia patrimonial
SUBSECÇÃO I
Declaração de nulidade
ARTIGO 605º
(Legitimidade dos credores)
1.
Os credores têm legitimidade para invocar a nulidade dos actos praticados pelo
devedor, quer estes sejam anteriores, quer posteriores à constituição do
crédito, desde que tenham interesse na declaração da nulidade, não sendo
necessário que o acto produza ou agrave a insolvência do devedor.
2.
A nulidade aproveita não só ao credor que a tenha invocado, como a todos os
demais.
SUBSECÇÃO II
Sub-rogação do credor ao devedor
ARTIGO 606º
(Direitos sujeitos à sub-rogação)
1.
Sempre que o devedor o não faça, tem o credor a faculdade de exercer, contra
terceiro, os direitos de conteúdo patrimonial que competem àquele, excepto se,
por sua própria natureza ou disposição da lei, só puderem ser exercidos pelo
respectivo titular.
2.
A sub-rogação, porém, só é permitida
quando seja essencial à satisfação ou
garantia do direito do credor.
ARTIGO 607º
(Credores sob condição suspensiva ou a prazo)
O
credor sob condição suspensiva e o credor a prazo apenas são admitidos a
exercer a sub-rogação quando mostrem ter interesse em não aguardar a
verificação da condição ou o vencimento do crédito.
ARTIGO 608º
(Citação do devedor)
Sendo
exercida judicialmente a sub-rogação, é necessária a citação do devedor.
ARTIGO 609º
(Efeitos da sub-rogação)
A
sub-rogação exercida por um dos credores aproveita a todos os demais.
SUBSECÇÃO III
Impugnação pauliana
ARTIGO 610º
(Requisitos gerais)
Os
actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de
natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as
circunstâncias seguintes:
a)
Ser o crédito anterior ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado
dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b)
Resultar do acto a imposibilidade, para o credor, de obter a satisfação
integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade.
ARTIGO 611º
(Prova)
Incumbe
ao credor a prova do montante das dívidas, e ao devedor ou a terceiro
interessado na manutenção do acto a prova de que o obrigado possui bens
penhoráveis de igual ou maior valor.
ARTIGO 612º
(Requisito da má fé)
1.
O acto oneroso só está sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro
tiverem agido de má fé; se o acto for gratuito, a impugnação procede, ainda que
um e outro agissem de boa fé.
2.
Entende-se por má fé a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor.
ARTIGO 613º
(Transmissões posteriores ou constituição
posterior de direitos)
1.
Para que a impugnação proceda contra as transmissões posteriores é necessário:
a)
Que, relativamente à primeira transmissão, se verifiquem os requisitos da impugnabilidade
referidos nos artigos anteriores;
b)
Que haja má fé tanto do alienante como do posterior adquirente, no caso de a
nova transmissão ser a título oneroso.
2.
O disposto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, à
constituição de direitos sobre os bens transmitidos em benefício de terceiro.
ARTIGO 614º
(Créditos não vencidos ou sob condição suspensiva)
1.
Não obsta ao exercício da impugnação o facto de o direito do credor não ser
ainda exigível.
2.
O credor sob condição suspensiva pode, durante a pendência da condição,
verificados os requisitos da impugnabilidade, exigir a prestação de caução.
ARTIGO 615º
(Actos impugnáveis)
1.
Não obsta à impugnação a nulidade do acto realizado pelo devedor.
2.
O cumprimento de obrigação vencida não está sujeito a impugnação; mas é
impugnável o cumprimento tanto da obrigação ainda não exigível como da
obrigação natural.
ARTIGO 616º
(Efeitos em relação ao credor)
1.
Julgada procedente a impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na
medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à
restituição e praticar os actos de conservação da garantia patrimonial
autorizados por lei.
2.
O adquirente de má fé é responsável pelo valor dos bens que tenha alienado, bem
como dos que tenham perecido ou se hajam deteriorado por caso fortuito, salvo
se provar que a perda ou deterioração se teriam igualmente verificado no caso
de os bens se encontrarem no poder do devedor.
3.
O adquirente de boa fé responde só na medida do seu enriquecimento.
4.
Os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido.
ARTIGO 617º
(Relações entre devedor e terceiro)
1.
Julgada procedente a impugnação, se o acto impugnado for de natureza gratuita,
o devedor só é responsável perante o adquirente nos termos do disposto em
matéria de doações; sendo o acto oneroso, o adquirente tem somente o direito de
exigir do devedor aquilo com que este se enriqueceu.
2.
Os direitos que terceiro adquira contra o devedor não prejudicam a satisfação
dos direitos do credor sobre os bens que são objecto da restituição.
ARTIGO 618º
(Caducidade)
O
direito de impugnação caduca ao fim de cinco anos, contados da data do acto
impugnável.
SUBSECÇÃO IV
Arresto
ARTIGO 619º
(Requisitos)
1.
O credor que tenha justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito
pode requerer o arresto de bens do devedor, nos termos da lei de processo.
2.
O credor tem o direito de requerer o arresto contra o adquirente dos bens do
devedor, se tiver sido judicialmente impugnada a transmissão.
ARTIGO 620º
(Caução)
O
requerente do arresto é obrigado a prestar caução, se esta lhe for exigida pelo
tribunal.
ARTIGO 621º
(Responsabilidade do credor)
Se
o arresto for julgado injustificado ou caducar, o requerente é responsável
pelos danos causados ao arrestado, quando não tenha agido com a prudência
normal.
ARTIGO 622º
(Efeitos)
1.
Os actos de disposição dos bens arrestados são ineficazes em relação ao
requerente do arresto, de acordo com as regras próprias da penhora.
2.
Ao arresto são extensivos, na parte aplicável, os demais efeitos da penhora.
CAPÍTULO VI
Garantias especiais das obrigações
SECÇÃO I
Prestação de caução
ARTIGO 623º
(Caução imposta ou autorizada por lei)
1.
Se alguém for obrigado ou autorizado por lei a prestar caução, sem se designar
a espécie que ela deve revestir, pode a garantia ser prestada por meio de
depósito de dinheiro, títulos de crédito, pedras ou metais preciosos, ou por
penhor, hipoteca ou fiança bancária.
2.
Se a caução não puder ser prestada por nenhum dos meios referidos, é lícita a
prestação de outra espécie de fiança, desde que o fiador renuncie ao benefício
da excussão.
3.
Cabe ao tribunal apreciar a idoneidade da caução, sempre que não haja acordo
dos interessados.
ARTIGO 624º
(Caução resultante de negócio jurídico ou
determinação do tribunal)
1.
Se alguém for obrigado ou autorizado por negócio jurídico a prestar caução, ou
esta for imposta pelo tribunal, é permitido prestá-la por meio de qualquer
garantia, real ou pessoal.
2.
É aplicável, nestes casos, o disposto no nº 3 do artigo anterior.
ARTIGO 625º
(Falta de prestação de caução)
1.
Se a pessoa obrigada à caução a não prestar, o credor tem o direito de requerer
o registo de hipoteca sobre os bens do devedor, ou outra cautela idónea, salvo
se for diferente a solução especialmente fixada na lei.
2.
A garantia limita-se aos bens suficientes para assegurar o direito do credor.
ARTIGO 626º
(Insuficiência ou impropriedade da caução)
Quando
a caução prestada se torne insuficiente ou imprópria, por causa não imputável
ao credor, tem este o direito de exigir que ela seja reforçada ou que seja
prestada outra forma de caução.
SECÇÃO II
Fiança
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 627º
(Noção. Acessoriedade)
1.
O fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente
obrigado perante o credor.
2.
A obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor.
ARTIGO 628º
(Requisitos)
1.
A vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida
para a obrigação principal.
2.
A fiança pode ser prestada sem conhecimento do devedor ou contra a vontade
dele, e à sua prestação não obsta o facto de a obrigação ser futura ou
condicional.
ARTIGO 629º
(Mandato de crédito)
1.
Aquele que encarrega outrem de dar crédito a terceiro, em nome e por conta do
encarregado, responde como fiador, se o encargo for aceito.
2.
O autor do encargo tem a faculdade de revogar o mandato enquanto o crédito não
for concedido, assim como a todo o momento o pode denunciar, sem prejuízo da
responsabilidade pelos danos que haja causado.
3.
É lícito ao encarregado recusar o cumprimento do encargo, sempre que a situação
patrimonial dos outros contraentes ponha em risco o seu futuro direito.
Artigo 630º
(Subfiança)
Subfiador
é aquele que afiança o fiador perante o credor.
ARTIGO 631º
(Âmbito da fiança)
1.
A fiança não pode exceder a dívida principal nem ser contraída em condições
mais onerosas, mas pode ser contraída por quantidade menor ou em menos onerosas
condições.
2.
Se exceder a dívida principal ou for contraída em condições mais onerosas, a
fiança não é nula, mas apenas redutível aos precisos termos da dívida
afiançada.
ARTIGO 632º
(Invalidade da obrigação principal)
1.
A fiança não é válida se o não for a obrigação principal.
2.
Sendo, porém, anulada a obrigação principal, por incapacidade ou por falta ou
vício da vontade do devedor, nem por isso a fiança deixa de ser válida, se o
fiador conhecia a causa da anulabilidade ao tempo em que a fiança foi prestada.
ARTIGO 633º
(Idoneidade do fiador. Reforço da fiança)
1.
Se algum devedor estiver obrigado a dar fiador, não é o credor forçado a
aceitar quem não tiver capacidade para se obrigar ou não tiver bens suficientes
para garantir a obrigação.
2.
Se o fiador nomeado mudar de fortuna, de modo que haja risco de insolvência,
tem o credor a faculdade de exigir o reforço da fiança.
3.
Se o devedor não reforçar a fiança ou não oferecer outra garantia idónea dentro
do prazo que lhe for fixado pelo tribunal, tem o credor o direito de exigir o
imediato cumprimento da obrigação.
SUBSECÇÃO II
Relações entre o credor e o fiador
ARTIGO 634º
(Obrigação do fiador)
A
fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e
contratuais da mora ou culpa do devedor.
ARTIGO 635º
(Caso julgado)
1.
O caso julgado entre credor e devedor não é oponível ao fiador, mas a este é
lícito invocá-lo em seu benefício, salvo se respeitar a circunstâncias pessoais
do devedor que não excluam a responsabilidade do fiador.
2.
O caso julgado entre credor e fiador aproveita ao devedor, desde que respeite à
obrigação principal, mas não o prejudica o caso julgado desfavorável.
ARTIGO 636º
(Prescrição: interrupção, suspensão e renúncia)
1.
A interrupção da prescrição relativamente ao devedor não produz efeito contra o
fiador, nem a interrupção relativa a este tem eficácia contra aquele; mas, se o
credor interromper a prescrição contra o devedor e der conhecimento do facto ao
fiador, considera-se a prescrição interrompida contra este na data da
comunicação.
2.
A suspensão da prescrição relativamente ao devedor não produz efeito em relação
ao fiador, nem a suspensão relativa a este se repercute naquele.
3.
A renúncia à prescrição por parte de um dos obrigados também não produz efeito
relativamente ao outro.
ARTIGO 637º
(Meios de defesa do fiador)
1.
Além dos meios de defesa que lhe são próprios, o fiador tem o direito de opor
ao credor aqueles que competem ao devedor, salvo se forem incompatíveis com a
obrigação do fiador.
2.
A renúncia do devedor a qualquer meio de defesa não produz efeito em relação ao
fiador.
ARTIGO 638º
(Benefício da excussão)
1.
Ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver excutido
todos os bens do devedor sem obter a satisfação do seu crédito.
2.
É lícita ainda a recusa, não obstante a excussão de todos os bens do devedor,
se o fiador provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor.
ARTIGO 639º
(Benefício da excussão, havendo garantias reais)
1.
Se, para segurança da mesma dívida, houver garantia real constituída por
terceiro, contemporânea da fiança ou anterior a ela, tem o fiador o direito de
exigir a execução prévia das coisas sobre que recai a garantia real.
2.
Quando as coisas oneradas garantam outros créditos do mesmo credor, o disposto
no número anterior só é aplicável se o valor delas for suficiente para
satisfazer a todos.
3.
O autor da garantia real, depois de executado, não fica sub-rogado nos direitos
do credor contra o fiador.
ARTIGO 640º
(Exclusão dos benefícios anteriores)
O
fiador não pode invocar os benefícios constantes dos artigos anteriores:
a)
Se houver renunciado ao benefício da excussão e, em especial, se tiver assumido
a obrigação de principal pagador;
b)
Se o devedor ou o dono dos bens onerados com a garantia não puder, em virtude
de facto posterior à constituição da fiança, ser demandado ou executado no
território continental ou das ilhas adjacentes.
ARTIGO 641º
(Chamamento do devedor à demanda)
1.
O credor, ainda que o fiador goze do benefício da excussão, pode demandá-lo só
ou juntamente com o devedor; se for demandado só, ainda que não goze do
benefício da excussão, o fiador tem a faculdade de chamar o devedor à demanda,
para com ele se defender ou ser conjuntamente condenado.
2.
Salvo declaração expressa em contrário no processo, a falta de chamamento do
devedor à demanda importa renúncia ao benefício da excussão.
ARTIGO 642º
(Outros meios de defesa do fiador)
1.
Ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o direito do credor puder ser
satisfeito por compensação com um crédito do devedor ou este tiver a
possibilidade de se valer da compensação com uma dívida do credor.
2.
Enquanto o devedor tiver o direito de impugnar o negócio donde provém a sua
obrigação, pode igualmente o fiador recusar o cumprimento.
ARTIGO 643º
(Subfiador)
O
subfiador goza do benefício da excussão, tanto em relação ao fiador como em
relação ao devedor.
SUBSECÇÃO III
Relações entre o devedor e o fiador
ARTIGO 644º
(Sub-rogação)
O
fiador que cumprir a obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, na
medida em que estes foram por ele satisfeitos.
ARTIGO 645º
(Aviso do cumprimento ao devedor)
1.
O fiador que cumprir a obrigação deve avisar do cumprimento o devedor, sob pena
de perder o seu direito contra este no caso de o devedor, por erro, efectuar de
novo a prestação.
2.
O fiador que, nos termos do número anterior, perder o seu direito contra o
devedor pode repetir do credor a prestação feita, como se fosse indevida.
ARTIGO 646º
(Aviso do cumprimento ao fiador)
O
devedor que cumprir a obrigação deve avisar o fiador, sob pena de responder
pelo prejuízo que causar se culposamente o não fizer.
ARTIGO 647º
(Meios de defesa)
O
devedor que consentir no cumprimento pelo fiador ou que, avisado por este, lhe
não der conhecimento, injustificadamente, dos meios de defesa que poderia opor
ao credor fica impedido de opor esses meios contra o fiador.
ARTIGO 648º
(Direito à liberação ou à prestação de caução)
É
permitido ao fiador exigir a sua liberação, ou a prestação de caução para
garantia do seu direito eventual contra o devedor, nos casos seguintes:
a)
Se o credor obtiver contra o fiador sentença exequível;
b)
Se os riscos da fiança se agravarem sensivelmente;
c)
Se, após a assunção da fiança, o devedor se houver colocado na situação
prevista na alínea b) do artigo 640º;
d)
Se o devedor se houver comprometido a desonerar o fiador dentro de certo prazo
ou verificado certo evento e já tiver decorrido o prazo ou se tiver verificado
o evento previsto;
e)
Se houverem decorrido cinco anos, não tendo a obrigação principal um termo, ou
se, tendo-o, houver prorrogação legal imposta a qualquer das partes.
SUBSECÇÃO IV
Pluralidade de fiadores
ARTIGO 649º
(Responsabilidade para com o credor)
1.
Se várias pessoas tiverem, isoladamente, afiançado o devedor pela mesma dívida,
responde cada uma delas pela satisfação integral do crédito, excepto se foi
convencionado o benefício da divisão; são aplicáveis, naquele caso, com as
ressalvas necessárias, as regras das obrigações solidárias.
2.
Se os fiadores se houverem obrigado conjuntamente, ainda que em momentos
diferentes, é lícito a qualquer deles invocar o benefício da divisão,
respondendo, porém, cada um deles, proporcionalmente, pela quota do confiador
que se encontre insolvente.
3.
É equiparado ao fiador insolvente aquele que não puder ser demandado, nos
termos da alínea b) do artigo 640º.
ARTIGO 650º
(Relações entre fiadores e subfiadores)
1.
Havendo vários fiadores, e respondendo cada um deles pela totalidade da
prestação, o que tiver cumprido fica sub-rogado nos direitos do credor contra o
devedor e, de harmonia com as regras das obrigações solidárias, contra os
outros fiadores.
2.
Se o fiador, judicialmente demandado, cumprir integralmente a obrigação ou uma
parte superior à sua quota, apesar de lhe ser lícito invocar o benefício da
divisão, tem o direito de reclamar dos outros as quotas deles, no que haja pago
a mais, ainda que o devedor não esteja insolvente.
3.
Se o fiador, podendo embora invocar o benefício da divisão, cumprir
voluntariamente a obrigação nas condições previstas no número anterior, o seu
regresso contra os outros fiadores só é admitido depois de excutidos todos os
bens do devedor.
4.
Se algum dos fiadores tiver um subfiador, este não responde, perante os outros
fiadores, pela quota do seu afiançado que se mostre insolvente, salvo se o
contrário resultar do acto da subfiança.
SUBSECÇÃO V
Extinção da fiança
ARTIGO 651º
(Extinção da obrigação principal)
A
extinção da obrigação principal determina a extinção da fiança.
ARTIGO 652º
(Vencimento da obrigação principal)
1.
Se a obrigação principal for a prazo, o fiador que gozar do benefício da
excussão pode exigir, vencida a obrigação, que o credor proceda contra o
devedor dentro de dois meses, a contar do vencimento, sob pena de a fiança
caducar; este prazo não termina sem decorrer um mês sobre a notificação feita
ao credor.
2.
Sob igual cominação pode o fiador que goze do benefício da excussão exigir a
interpelação do devedor, quando dela depender o vencimento da obrigação e
houver decorrido mais de um ano sobre a assunção da fiança.
ARTIGO 653º
(Liberação por impossibilidade de sub-rogação)
Os
fiadores, ainda que solidários, ficam desonerados da obrigação que contraíram,
na medida em que, por facto positivo ou negativo do credor, não puderem ficar
sub-rogados nos direitos que a este competem.
ARTIGO 654º
(Obrigação futura)
Sendo
a fiança prestada para garantia de obrigação futura, tem o fiador, enquanto a
obrigação se não constituir, a possibilidade de liberar-se da garantia, se a
situação patrimonial do devedor se agravar em termos de pôr em risco os seus
direitos eventuais contra este, ou se tiverem decorrido cinco anos sobre a
prestação da fiança, quando outro prazo não resulte da convenção.
ARTIGO 655º
Revogado pelo NRAU (Lei 6/2006, de 27/02)
(Fiança do locatário)
1.
A fiança pelas obrigações do locatário abrange apenas, salvo estipulação em
contrário, o período inicial de duração do contrato.
2.
Obrigando-se o fiador relativamente aos períodos de renovação, sem se limitar o
número destes, a fiança extingue-se, na falta de nova convenção, logo que haja
alteração da renda ou decorra o prazo de cinco anos sobre o início da primeira
prorrogação.
SECÇÃO III
Consignação de rendimentos
ARTIGO 656º
(Noção)
1.
O cumprimento da obrigação, ainda que condicional ou futura, pode ser garantido
mediante a consignação dos rendimentos de certos bens imóveis, ou de certos
bens móveis sujeitos a registo.
2.
A consignação de rendimentos pode garantir o cumprimento da obrigação e o
pagamento dos juros, ou apenas o cumprimento da obrigação ou só o pagamento dos
juros.
ARTIGO 657º
(Legitimidade.Consignação constituída por terceiro)
1.
Só tem legitimidade para constituir a consignação quem puder dispor dos
rendimentos consignados.
2.
É aplicável à consignação constituída por terceiro o disposto no artigo 717º.
ARTIGO 658º
(Espécies)
1.
A consignação é voluntária ou judicial.
2.
É voluntária a consignação constituída pelo devedor ou por terceiro, quer
mediante negócio entre vivos, quer por meio de testamento, e judicial a que
resulta de decisão do tribunal.
ARTIGO 659º
(Prazo)
1.
A consignação de rendimentos pode fazer-se por determinado número de anos ou
até ao pagamento da dívida garantida.
2.
Quando incida sobre os rendimentos de bens imóveis, a consignação nunca
excederá o prazo de quinze anos.
ARTIGO 660º
(Forma. Registo)
1.
O acto constitutivo da consignação voluntária deve constar de escritura pública
ou testamento, se respeitar a coisas imóveis, e de escrito particular, quando
recaia sobre móveis.
2.
A consignação está sujeita a registo, salvo se tiver por objecto os rendimentos
de títulos de crédito nominativos, devendo neste caso ser mencionada nos
títulos e averbada, nos termos da respectiva legislação.
ARTIGO 661º
(Modalidades)
1.
Na consignação é possível estipular:
a)
Que continuem em poder do concedente os bens cujos rendimentos são consignados;
b)
Que os bens passem para o poder do credor, o qual fica, na parte aplicável,
equiparado ao locatário, sem prejuízo da faculdade de por seu turno os locar;
c)
Que os bens passem para o poder de terceiro, por título de locação ou por
outro, ficando o credor com o direito de receber os respectivos frutos.
2.
Os frutos da coisa são imputados primeiro nos juros, e só depois no capital, se
a consignação garantir tanto o capital como os juros.
ARTIGO 662º
(Prestação de contas)
1.
Continuando os bens no poder do concedente, tem o credor o direito de exigir
dele a prestação anual de contas, se não houver de receber em cada período uma
importância fixa.
2.
De igual direito goza o concedente, em relação ao credor, nos demais casos
previstos no nº 1 do artigo anterior.
ARTIGO 663º
(Obrigações do credor. Renúncia à garantia)
1.
Se os bens cujos rendimentos são consignados passarem para o poder do credor,
deve este administrá-los como um proprietário diligente e pagar as
contribuições e demais encargos das coisas.
2.
O credor só pode liberar-se das obrigações referidas no número anterior
renunciando à garantia.
3.
À renúncia é aplicável o disposto no artigo 731º.
ARTIGO 664º
(Extinção)
A
consignação extingue-se pelo decurso do prazo estipulado, e ainda pelas mesmas
causas por que cessa o direito de hipoteca, com excepção da indicada na alínea
b) do artigo 730º.
ARTIGO 665º
(Remissão)
São
aplicáveis à consignação, com as
necessárias adaptações, os artigos 692º,
694º
a 696º, 701º e 702º.
SECÇÃO IV
Penhor
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 666º
(Noção)
1.
O penhor confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como dos
juros, se os houver, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de
certa coisa móvel, ou pelo valor de créditos ou outros direitos não
susceptíveis de hipoteca, pertencentes ao devedor ou a terceiro.
2.
É havido como penhor o depósito a que se refere o nº 1 do artigo 623º.
3.
A obrigação garantida pelo penhor pode ser futura ou condicional.
ARTIGO 667º
(Legitimidade para empenhar.
Penhor constituído por terceiro)
1.
Só tem legitimidade para dar bens em penhor quem os puder alienar.
2.
É aplicável ao penhor constituído por terceiro o disposto no artigo 717º.
ARTIGO 668º
(Regimes especiais)
As
disposições desta secção não prejudicam os regimes especiais estabelecidos por
lei para certas modalidades de penhor.
SUBSECÇÃO II
Penhor de coisas
ARTIGO 669º
(Constituição do penhor)
1.
O penhor só produz os seus efeitos pela entrega da coisa empenhada, ou de
documento que confira a exclusiva disponibilidade dela, ao credor ou a
terceiro.
2.
A entrega pode consistir na simples atribuição da composse ao credor, se essa
atribuição privar o autor do penhor da possibilidade de dispor materialmente da
coisa.
ARTIGO 670º
(Direitos do credor pignoratício)
Mediante
o penhor, o credor pignoratício adquire o direito:
a)
De usar, em relação à coisa empenhada, das acções destinadas à defesa da posse,
ainda que seja contra o próprio dono;
b)
De ser indemnizado das benfeitorias necessárias e úteis e de levantar estas
últimas, nos termos do artigo 1273º;
c)
De exigir a substituição ou o reforço do penhor ou o cumprimento imediato da
obrigação, se a coisa empenhada perecer ou se tornar insuficiente para segurança
da dívida, nos termos fixados para a garantia hipotecária.
ARTIGO 671º
(Deveres do credor pignoratício)
O
credor pignoratício é obrigado:
a)
A guardar e administrar como um proprietário diligente a coisa empenhada,
respondendo pela sua existência e conservação;
b)
A não usar dela sem consentimento do autor do penhor, excepto se o uso for
indispensável à conservação da coisa;
c)
A restituir a coisa, extinta a obrigação a que serve de garantia.
ARTIGO 672º
(Frutos da coisa empenhada)
1.
Os frutos da coisa empenhada serão encontrados nas despesas feitas com ela e
nos juros vencidos, devendo o excesso, na falta de convenção em contrário, ser
abatido no capital que for devido.
2.
Havendo lugar à restituição de frutos, não se consideram estes, salvo convenção
em contrário, abrangidos pelo penhor.
ARTIGO 673º
(Uso da coisa empenhada)
Se
o credor usar da coisa empenhada contra o disposto na alínea b) do artigo 671º,
ou proceder de forma a que a coisa corra o risco de perder-se ou deteriorar-se,
tem o autor do penhor o direito de exigir que ele preste caução idónea ou que a
coisa seja depositada em poder de terceiro.
ARTIGO 674º
(Venda antecipada)
1.
Sempre que haja receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore,
tem o credor, bem como o autor do penhor, a faculdade de proceder à venda
antecipada da coisa, mediante prévia autorização judicial.
2.
Sobre o produto da venda fica o credor com os direitos que lhe cabiam em
relação à coisa vendida, podendo o tribunal, no entanto, ordenar que o preço
seja depositado.
3.
O autor do penhor tem a faculdade de impedir a venda antecipada da coisa,
oferecendo outra garantia real idónea.
ARTIGO 675º
(Execução do penhor)
1.
Vencida a obrigação, adquire o credor o direito de se pagar pelo produto da
venda executiva da coisa empenhada, podendo a venda ser feita
extraprocessualmente, se as partes assim o tiverem convencionado.
2.
É lícito aos interessados convencionar que a coisa empenhada seja adjudicada ao
credor pelo valor que o tribunal fixar.
Redacção introduzida pelo Dec.-Lei 38/2003, de 8/3.
ARTIGO 676º
(Cessão da garantia)
1.
O direito de penhor pode ser transmitido independentemente da cessão do
crédito, sendo aplicável neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto
sobre a transmissão da hipoteca.
2.
À entrega da coisa empenhada ao cessionário é aplicável o disposto no nº 2 do
artigo 582º.
ARTIGO 677º
(Extinção do penhor)
O
penhor extingue-se pela restituição da coisa empenhada, ou do documento a que
se refere o nº 1 do artigo 669º, e ainda pelas mesmas causas por que cessa o
direito da hipoteca, com excepção da indicada na alínea b) do artigo 730º.
ARTIGO 678º
(Remissão)
São
aplicáveis ao penhor, com as necessárias adaptações, os artigos 692º, 694º a
699º, 701º e 702º.
SUBSECÇÃO III
Penhor de direitos
ARTIGO 679º
(Disposições aplicáveis)
São
extensivas ao penhor de direitos, com as necessárias adaptações, as disposições
da subsecção anterior, em tudo o que não seja contrariado pela natureza
especial desse penhor ou pelo preceituado nos artigos subsequentes.
ARTIGO 680º
(Objecto)
Só
é admitido o penhor de direitos quando estes tenham por objecto coisas móveis e
sejam susceptíveis de transmissão.
ARTIGO 681º
(Forma e publicidade)
1.
A constituição do penhor de direitos está sujeita à forma e publicidade
exigidas para a transmissão dos direitos empenhados.
2.
Se, porém, tiver por objecto um crédito, o penhor só produz os seus efeitos
desde que seja notificado ao respectivo devedor, ou desde que este o aceite,
salvo tratando-se de penhor sujeito a registo, pois neste caso produz os seus
efeitos a partir do registo.
3.
A ineficácia do penhor por falta de notificação ou registo não impede a
aplicação, com as necessárias correcções, do disposto no nº 2 do artigo 583º.
ARTIGO 682º
(Entrega de documentos)
O
titular do direito empenhado deve entregar ao credor pignoratício os documentos
comprovativos desse direito que estiverem na sua posse e em cuja conservação
não tenha interesse legítimo.
ARTIGO 683º
(Conservação do direito empenhado)
O
credor pignoratício é obrigado a praticar os actos indispensáveis à conservação
do direito empenhado e a cobrar os juros e mais prestações acessórias
compreendidas na garantia.
ARTIGO 684º
(Relações entre o obrigado e o credor pignoratício)
Dando
em penhor um direito por virtude do qual se possa exigir uma prestação, as
relações entre o obrigado e o credor pignoratício estão sujeitas às disposições
aplicáveis, na cessão de créditos, às relações entre o devedor e o cessionário.
ARTIGO 685º
(Cobrança de créditos empenhados)
1.
O credor pignoratício deve cobrar o crédito empenhado logo que este se torne
exigível, passando o penhor a incidir sobre a coisa prestada em satisfação
desse crédito.
2.
Se, porém, o crédito tiver por objecto a prestação de dinheiro ou de outra
coisa fungível, o devedor não pode fazê-la senão aos dois credores
conjuntamente; na falta de acordo entre os interessados, tem o obrigado a
faculdade de usar da consignação em depósito.
3.
Se o mesmo crédito for objecto de vários penhores, só o credor cujo direito
prefira aos demais tem legitimidade para cobrar o crédito empenhado; mas os
outros têm a faculdade de compelir o devedor a satisfazer a prestação ao credor
preferente.
4.
O titular do crédito empenhado só pode receber a respectiva prestação com o
consentimento do credor pignoratício, extinguindo-se neste caso o penhor.
SECÇÃO V
Hipoteca
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 686º
(Noção)
1.
A hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas
imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência
sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade
de registo.
2.
A obrigação garantida pela hipoteca pode ser futura ou condicional.
ARTIGO 687º
(Registo)
A
hipoteca deve ser registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação
às partes.
ARTIGO 688º
(Objecto)
1.
Só podem ser hipotecados:
a)
Os prédios rústicos e urbanos;
b)
O domínio directo e o domínio útil dos bens enfitêuticos;
c)
O direito de superfície;
d)
O direito resultante de concessões em bens do domínio público, observadas as
disposições legais relativas à transmissão dos direitos concedidos;
e)
O usufruto das coisas e direitos constantes das alíneas anteriores;
f)
As coisas móveis que, para este efeito, sejam por lei equiparadas às imóveis.
2.
As partes de um prédio susceptíveis de propriedade autónoma sem perda da sua
natureza imobiliária podem ser hipotecadas separadamente.
ARTIGO 689º
(Bens comuns)
1.
É também susceptível de hipoteca a quota de coisa ou direito comum.
2.
A divisão da coisa ou direito comum, feita com o consentimento do credor,
limita a hipoteca à parte que for atribuída ao devedor.
ARTIGO 690º
(Bens excluídos)
Não
pode ser hipotecada a meação dos bens comuns do casal, nem tão-pouco a quota de
herança indivisa.
ARTIGO 691º
(Extensão)
1.
A hipoteca abrange:
a)
As coisas imóveis referidas nas alíneas c) a e) do nº 1 do artigo 204º;
b)
As acessões naturais;
c)
As benfeitorias, salvo o direito de terceiros.
2.
Na hipoteca de fábricas, consideram-se abrangidos pela garantia os maquinismos
e demais móveis inventariados no título constitutivo, mesmo que não sejam parte
integrante dos respectivos imóveis.
3.
Os donos e possuidores de maquinismos, móveis e utensílios destinados à
exploração de fábricas, abrangidos no registo de hipoteca dos respectivos
imóveis, não os podem alienar ou retirar sem consentimento escrito do credor e
incorrem na responsabilidade própria dos fiéis depositários.
(Redacção do Dec.-Lei 225/84, de 6-7)
ARTIGO 692º
(Indemnizações devidas)
1.
Se a coisa ou direito hipotecado se perder, deteriorar ou diminuir de valor, e
o dono tiver direito a ser indemnizado, os titulares da garantia conservam,
sobre o crédito respectivo ou as quantias pagas a título de indemnização, as
preferências que lhes competiam em relação à coisa onerada.
2.
Depois de notificado da existência da hipoteca, o devedor da indemnização não
se libera pelo cumprimento da sua obrigação com prejuízo dos direitos
conferidos no número anterior.
3.
O disposto nos números precedentes é aplicável às indemnizações devidas por
expropriação ou requisição, bem como por extinção do direito de superfície, ao
preço da remição do foro e aos casos análogos.
ARTIGO 693º
(Acessórios do crédito)
1.
A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo.
2.
Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em
contrário, mais do que os relativos a três anos.
3.
O disposto no número anterior não impede o registo de nova hipoteca em relação
a juros em dívida.
ARTIGO 694º
(Pacto comissório)
É
nula, mesmo que seja anterior ou posterior à constituição da hipoteca, a
convenção pela qual o credor fará sua a coisa onerada no caso de o devedor não
cumprir.
ARTIGO 695º
(Cláusula de inalienabilidade dos bens hipotecados)
É
igualmente nula a convenção que proíba o respectivo dono de alienar ou onerar
os bens hipotecados, embora seja lícito convencionar que o crédito hipotecário
se vencerá logo que esses bens sejam alienados ou onerados.
ARTIGO 696º
(Indivisibilidade)
Salvo
convenção em contrário, a hipoteca é indivisível, subsistindo por inteiro sobre
cada uma das coisas oneradas e sobre cada uma das partes que as constituam,
ainda que a coisa ou o crédito seja dividido ou este se encontre parcialmente
satisfeito.
ARTIGO 697º
(Penhora dos bens)
O
devedor que for dono da coisa hipotecada tem o direito de se opor não só a que
outros bens sejam penhorados na execução enquanto se não reconhecer a
insuficiência da garantia, mas ainda a que, relativamente aos bens onerados, a
execução se estenda além do necessário à satisfação do direito do credor.
ARTIGO 698º
(Defesa do dono da coisa ou do titular do direito)
1.
Sempre que o dono da coisa ou o titular do direito hipotecado seja pessoa
diferente do devedor, é-lhe lícito opor ao credor, ainda que o devedor a eles
tenha renunciado, os meios de defesa que o devedor tiver contra o crédito, com
exclusão das excepções que são recusadas ao fiador.
2.
O dono ou o titular a que o número anterior se refere tem a faculdade de se
opor à execução enquanto o devedor puder impugnar o negócio donde provém a sua
obrigação, ou o credor puder ser satisfeito por compensação com um crédito do
devedor, ou este tiver a possibilidade de se valer da compensação com uma
dívida do credor.
ARTIGO 699º
(Hipoteca e usufruto)
1.
Extinguindo-se o usufruto constituído sobre a coisa hipotecada, o direito do
credor hipotecário passa a exercer-se sobre a coisa, como se o usufruto nunca
tivesse sido constituído.
2.
Se a hipoteca tiver por objecto o direito de usufruto, considera-se extinta com
a extinção deste direito.
3.
Porém, se a extinção do usufruto resultar de renúncia, ou da transferência dos
direitos do usufrutuário para o proprietário, ou da aquisição da propriedade
por parte daquele, a hipoteca subsiste, como se a extinção do direito se não
tivesse verificado.
ARTIGO 700º
(Administração da coisa hipotecada)
O
corte de árvores ou arbustos, a colheita de frutos naturais e a alienação de
partes integrantes ou coisas acessórias abrangidas pela hipoteca só são
eficazes em relação ao credor hipotecário se forem anteriores ao registo da
penhora e couberem nos poderes de administração ordinária.
ARTIGO 701º
(Substituição ou reforço da hipoteca)
1.
Quando, por causa não imputável ao credor, a coisa hipotecada perecer ou a
hipoteca se tornar insuficiente para segurança da obrigação, tem o credor o
direito de exigir que o devedor a substitua ou reforce; e, não o fazendo este
nos termos declarados na lei de processo, pode aquele exigir o imediato
cumprimento da obrigação ou, tratando-se de obrigação futura, registar hipoteca
sobre outros bens do devedor.
2.
Não obsta ao direito do credor o facto de a hipoteca ter sido constituída por
terceiro, salvo se o devedor for estranho à sua constituição; porém, mesmo
neste caso, se a diminuição da garantia for devida a culpa do terceiro, o
credor tem o direito de exigir deste a substituição ou o reforço, ficando o
mesmo sujeito à cominação do número anterior em lugar do devedor.
ARTIGO 702º
(Seguro)
1.
Quando o devedor se comprometa a segurar a coisa hipotecada e não a segure no
prazo devido ou deixe rescindir o contrato por falta de pagamento dos
respectivos prémios, tem o credor a faculdade de segurá-la à custa do devedor;
mas, se o fizer por um valor excessivo, pode o devedor exigir a redução do contrato
aos limites convenientes.
2.
Nos casos previstos no número anterior, pode o credor reclamar, em lugar do
seguro, o imediato cumprimento da obrigação.
ARTIGO 703º
(Espécies de hipoteca)
As
hipotecas são legais, judiciais ou voluntárias.
SUBSECÇÃO II
Hipotecas legais
ARTIGO 704º
(Noção)
As
hipotecas legais resultam imediatamente da lei, sem dependência da vontade das
partes, e podem constituir-se desde que exista a obrigação a que servem de
segurança.
ARTIGO 705º
(Credores com hipoteca legal)
Os
credores que têm hipoteca legal são:
a)
O Estado e as autarquias locais, sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos
à constituição predial, para garantia do pagamento desta contribuição;
b)
O Estado e as demais pessoas colectivas públicas, sobre os bens dos
encarregados da gestão de fundos públicos, para garantia do cumprimento das
obrigações por que se tornem responsáveis;
c)
O menor, o interdito e o inabilitado, sobre os bens do tutor, curador e
administrador legal, para assegurar a responsabilidade que nestas qualidades
vierem a assumir;
d)
O credor por alimentos;
e)
O co-herdeiro, sobre os bens adjudicados ao devedor de tornas, para garantir o
pagamento destas;
f)
O legatário de dinheiro ou outra coisa fungível, sobre os bens sujeitos ao encargo
do legado ou, na sua falta, sobre os bens que os herdeiros responsáveis
houverem do testador.
ARTIGO 706º
(Registo da hipoteca a favor de incapazes)
1.
A determinação do valor da hipoteca estabelecida a favor do menor, interdito ou
inabilitado, para efeito do registo, e a designação dos bens sobre que há-de
ser registada cabem ao conselho de família.
2.
Têm legitimidade para requerer o registo o tutor, curador ou administrador
legal, os vogais do conselho de família e qualquer dos parentes do incapaz.
ARTIGO 707º
(Substituição por outra caução)
1.
O tribunal pode autorizar, a requerimento do devedor, a substituição da
hipoteca legal por outra caução.
2.
Não tendo o devedor bens susceptíveis de hipoteca, suficientes para garantir o
crédito, pode o credor exigir outra caução, nos termos do artigo 625º, salvo
nos casos das hipotecas destinadas a garantir o pagamento das tornas ou do
legado de dinheiro ou outra coisa fungível.
ARTIGO 708º
(Bens sujeitos à hipoteca legal)
Sem
prejuízo do direito de redução, as hipotecas legais podem ser registadas em
relação a quaisquer bens do devedor, quando não forem especificados por lei ou
no título respectivo os bens sujeitos à garantia.
ARTIGO 709º
(Reforço)
O
credor só goza do direito de reforçar as hipotecas previstas nas alíneas e) e
f) do artigo 705º se a garantia puder continuar a incidir sobre os bens aí
especificados.
SUBSECÇÃO III
Hipotecas judiciais
ARTIGO 710º
(Constituição)
1.
A sentença que condenar o devedor à realização de uma prestação em dinheiro ou
outra coisa fungível é título bastante para o registo de hipoteca sobre
quaisquer bens do obrigado, mesmo que não haja transitado em julgado.
2.
Se a prestação for ilíquida, pode a hipoteca ser registada pelo quantitativo
provável do crédito.
3.
Se o devedor for condenado a entregar uma coisa ou a prestar um facto, só pode
ser registada a hipoteca havendo conversão da prestação numa indemnização
pecuniária.
ARTIGO 711º
(Sentenças estrangeiras)
As
sentenças dos tribunais estrangeiros, revistas e confirmadas em Portugal, podem
titular o registo da hipoteca judicial, na medida em que a lei do país onde
foram proferidas lhes reconheça igual valor.
SUBSECÇÃO IV
Hipotecas voluntárias
ARTIGO 712º
(Noção)
Hipoteca
voluntária é a que nasce de contrato ou declaração unilateral.
ARTIGO 713º
(Segunda hipoteca)
A
hipoteca não impede o dono dos bens de os hipotecar de novo; neste caso,
extinta uma das hipotecas, ficam os bens a garantir, na sua totalidade, as
restantes dívidas hipotecárias.
ARTIGO 714º
(Forma)
O
acto de constituição ou modificação da hipoteca voluntária, quando recaia sobre
bens imóveis, deve constar de escritura pública ou de testamento.
ARTIGO 715º
(Legitimidade para hipotecar)
Só
tem legitimidade para hipotecar quem puder alienar os respectivos bens.
ARTIGO 716º
(Hipotecas gerais)
1.
São nulas as hipotecas voluntárias que incidam sobre todos os bens do devedor
ou de terceiro sem os especificar.
2.
A especificação deve constar do título constitutivo da hipoteca.
ARTIGO 717º
(Hipoteca constituída por terceiro)
1.
A hipoteca constituída por terceiro extingue-se na medida em que, por facto
positivo ou negativo do credor, não possa dar-se a sub-rogação daquele nos
direitos deste.
2.
O caso julgado proferido em relação ao devedor produz efeitos relativamente a
terceiro que haja constituído a hipoteca, nos termos em que os produz em
relação ao fiador.
SUBSECÇÃO V
Redução da hipoteca
ARTIGO 718º
(Modalidades)
A
hipoteca pode ser reduzida voluntária ou judicialmente.
ARTIGO 719º
(Redução voluntária)
A
redução voluntária só pode ser consentida por quem puder dispor da hipoteca,
sendo aplicável à redução o regime estabelecido para a renúncia à garantia.
ARTIGO 720º
(Redução judicial)
1.
A redução judicial tem lugar, nas hipotecas legais e judiciais, a requerimento
de qualquer interessado, quer no que concerne aos bens, quer no que respeita à
quantia designada como montante do crédito, excepto se, por convenção ou
sentença, a coisa onerada ou a quantia assegurada tiver sido especialmente
indicada.
2.
No caso previsto na parte final do número anterior, ou no de hipoteca
voluntária, a redução judicial só é admitida:
a)
Se, em consequência do cumprimento parcial ou outra causa de extinção, a dívida
se encontrar reduzida a menos de dois terços do seu montante inicial;
b)
Se, por virtude de acessões naturais ou benfeitorias, a coisa ou o direito
hipotecado se tiver valorizado em mais de um terço do seu valor à data da
constituição da hipoteca.
3.
A redução é realizável, quanto aos bens, ainda que a hipoteca tenha por objecto
uma só coisa ou direito, desde que a coisa ou direito seja susceptível de
cómoda divisão.
SUBSECÇÃO VI
Transmissão dos bens hipotecados
ARTIGO 721º
(Expurgação da hipoteca)
Aquele
que adquiriu bens hipotecados, registou o título de aquisição e não é
pessoalmente responsável pelo cumprimento das obrigações garantidas tem o
direito de expurgar a hipoteca por qualquer dos modos seguintes:
a)
Pagando integralmente aos credores hipotecários as dívidas a que os bens estão
hipotecados;
b)
Declarando que está pronto a entregar aos credores, para pagamento dos seus
créditos, até à quantia pela qual obteve os bens, ou aquela em que os estima,
quando a aquisição tenha sido feita por título gratuito ou não tenha havido
fixação de preço.
ARTIGO 722º
(Expurgação no caso de revogação de doação)
O
direito de expurgação é extensivo ao doador ou aos seus herdeiros,
relativamente aos bens hipotecados pelo donatário que venham ao poder daqueles
em consequência da revogação da liberalidade por ingratidão do donatário, ou da
sua redução por inoficiosidade.
(Redacção do Dec.-Lei 497/77, de 25-11)
ARTIGO 723º
(Direitos dos credores quanto à expurgação)
1.
A sentença que declarar os bens livres de hipotecas em consequência de
expurgação não será proferida sem se mostrar que foram citados todos os
credores hipotecários.
2.
O credor que, tendo a hipoteca registada, não for citado nem comparecer
espontaneamente em juízo não perde os seus direitos de credor hipotecário, seja
qual for a sentença proferida em relação aos outros credores.
3.
Se o requerente da expurgação não depositar a importância devida, nos termos da
lei de processo, fica o requerimento sem efeito e não pode ser renovado, sem
prejuízo da responsabilidade do requerente pelos danos causados aos credores.
ARTIGO 724º
(Direitos reais que renascem pela venda judicial)
1.
Se o adquirente da coisa hipotecada tinha, anteriormente à aquisição, algum
direito real sobre ela, esse direito renasce no caso de venda em processo de
execução ou de expurgação da hipoteca e é atendido em harmonia com as regras
legais relativas a essa venda.
2.
Renascem do mesmo modo e são incluídas na venda as servidões que, à data do
registo da hipoteca, oneravam algum prédio do terceiro adquirente em benefício
do prédio hipotecado.
ARTIGO 725º
(Exercício antecipado do direito hipotecário contra o
adquirente)
O
credor hipotecário pode, antes do vencimento do prazo, exercer o seu direito
contra o adquirente da coisa ou direito hipotecado se, por culpa deste,
diminuir a segurança do crédito.
ARTIGO 726º
(Benfeitorias e frutos)
Para
os efeitos dos artigos 1269º, 1270º e 1275º, o terceiro adquirente é havido
como possuidor de boa fé, na execução, até ao registo da penhora, e, na
expurgação da hipoteca, até à venda judicial da coisa ou direito.
SUBSECÇÃO VII
Transmissão da hipoteca
ARTIGO 727º
(Cessão da hipoteca)
1.
A hipoteca que não for inseparável da pessoa do devedor pode ser cedida sem o
crédito assegurado, para garantia de crédito pertencente a outro credor do
mesmo devedor, com observância das regras próprias da cessão de créditos; se,
porém, a coisa ou direito hipotecado pertencer a terceiro, é necessário o
consentimento deste.
2.
O credor com hipoteca sobre mais de uma coisa ou direito só pode cedê-la à
mesma pessoa e na sua totalidade.
ARTIGO 728º
(Valor da hipoteca cedida)
1.
A hipoteca cedida garante o novo crédito nos limites do crédito originariamente
garantido.
2.
Registada a cessão, a extinção do crédito originário não afecta a subsistência
da hipoteca.
ARTIGO 729º
(Cessão do grau hipotecário)
É
também permitida a cessão do grau hipotecário a favor de qualquer outro credor
hipotecário posteriormente inscrito sobre os mesmos bens, observadas igualmente
as regras respeitantes à cessão do respectivo crédito.
SUBSECÇÃO VIII
Extinção da hipoteca
ARTIGO 730º
(Causas de extinção)
A
hipoteca extingue-se:
a)
Pela extinção da obrigação a que serve de garantia;
b)
Por prescrição, a favor de terceiro adquirente do prédio hipotecado, decorridos
vinte anos sobre o registo da aquisição e cinco sobre o vencimento da
obrigação;
c)
Pelo perecimento da coisa hipotecada, sem prejuízo do disposto nos artigos 692º
e 701º;
d)
Pela renúncia do credor.
ARTIGO 731º
(Renúncia à hipoteca)
1.
A renúncia à hipoteca deve ser expressa e exarada em documento autenticado, não
carecendo de aceitação do devedor ou do autor da hipoteca para produzir os seus
efeitos.
2.
Os administradores de patrimónios alheios não podem renunciar às hipotecas
constituídas em benefício das pessoas cujos patrimónios administram.
(Redacção do Dec.-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 732º
(Renascimento da hipoteca)
Se
a causa extintiva da obrigação ou a renúncia do credor à garantia for declarada
nula ou anulada, ou ficar por outro motivo sem efeito, a hipoteca, se a
inscrição tiver sido cancelada, renasce apenas desde a data da nova inscrição.
SECÇÃO VI
Privilégios creditórios
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 733º
(Noção)
Privilégio
creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a
certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a
outros.
ARTIGO 734º
(Acessórios do crédito)
O
privilégio creditório abrange os juros relativos aos últimos dois anos, se
forem devidos.
ARTIGO 735º
(Espécies)
1.
São de duas espécies os privilégios creditórios: mobiliários e imobiliários.
2.
Os privilégios mobiliários são gerais, se abrangem o valor de todos os bens
móveis existentes no património do devedor à data da penhora ou de acto
equivalente; são especiais, quando compreendem só o valor de determinados bens
móveis.
3.
Os privilégios imobiliários estabelecidos neste Código são sempre especiais.
N.º 3 com a redacção introduzida pelo Dec.-Lei 38/2003, de
08/03
SUBSECÇÃO II
Privilégios mobiliários gerais
ARTIGO 736º
(Créditos do Estado e das autarquias locais)
1.
O Estado e as autarquias locais têm privilégio mobiliário geral para garantia
dos créditos por impostos indirectos, e também pelos impostos directos
inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto
equivalente, e nos dois anos anteriores.
2.
Este privilégio não compreende a sisa ou o imposto sobre as sucessões e
doações, nem quaisquer outros impostos que gozem de privilégio especial.
ARTIGO 737º
(Outros créditos que gozam de privilégio mobiliário
geral)
1.
Gozam de privilégio geral sobre os móveis:
a)
O crédito por despesas do funeral do devedor, conforme a sua condição e costume
da terra;
b)
O crédito por despesas com doenças do devedor ou de pessoas a quem este deva
prestar alimentos, relativo aos últimos seis meses;
c)
O crédito por despesas indispensáveis para o sustento do devedor e das pessoas
a quem este tenha a obrigação de prestar alimentos, relativo aos últimos seis
meses;
d)
Os créditos emergentes do contrato de trabalho, ou da violação ou cessação
deste contrato, pertencentes ao trabalhador e relativos aos últimos seis meses.
2.
O prazo de seis meses referido nas alíneas b), c) e d) do número anterior
conta-se a partir da morte do devedor ou do pedido de pagamento.
SUBSECÇÃO III
Privilégios mobiliários especiais
ARTIGO 738º
(Despesas de justiça e imposto sobre sucessões e
doações)
1.
Os créditos por despesas de justiça feitas directamente no interesse comum dos
credores, para a conservação, execução ou liquidação de bens móveis, têm
privilégio sobre estes bens.
2.
Têm igualmente privilégio sobre os bens móveis transmitidos os créditos do
Estado resultantes do imposto sobre as sucessões e doações.
ARTIGO 739º
(Privilégio sobre os frutos de prédios rústicos)
Gozam
de privilégio sobre os frutos dos prédios rústicos respectivos:
a)
Os créditos pelos fornecimentos de sementes, plantas e adubos, e de água ou
energia para irrigação ou outros fins agrícolas;
b)
Os créditos por dívidas de foros relativos ao ano corrente na data da penhora,
ou acto equivalente, e ao ano anterior.
ARTIGO 740º
(Privilégio sobre as rendas dos prédios urbanos)
Os
créditos por dívidas de foros relativos ao ano corrente na data da penhora, ou
acto equivalente, e ao ano anterior, gozam de privilégio sobre as rendas dos
prédios urbanos respectivos.
ARTIGO 741º
(Crédito de indemnização)
O
crédito da vítima de um facto que implique responsabilidade civil tem
privilégio sobre a indemnização devida pelo segurador da responsabilidade em
que o lesante haja incorrido.
ARTIGO 742º
(Crédito do autor de obra intelectual)
O
crédito do autor de obra intelectual, fundado em contrato de edição, tem
privilégio sobre os exemplares da obra existentes em poder do editor.
SUBSECÇÃO IV
Privilégios imobiliários
ARTIGO 743º
(Despesas de justiça)
Os
créditos por despesas de justiça feitas directamente no
interesse comum dos
credores, para a conservação, execução ou
liquidação dos bens imóveis, têm
privilégio sobre estes bens.
ARTIGO 744º
(Contribuição predial e impostos de transmissão)
1.
Os créditos por contribuição predial devida ao Estado ou às autarquias locais,
inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto
equivalente, e nos dois anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos
rendimentos estão sujeitos àquela contribuição.
2.
Os créditos do Estado pela sisa e pelo imposto sobre as sucessões e doações têm
privilégio sobre os bens transmitidos.
SUBSECÇÃO V
Efeitos e extinção dos privilégios
ARTIGO 745º
(Concurso de créditos privilegiados)
1.
Os créditos privilegiados são pagos pela ordem segundo a qual vão indicados nas
disposições seguintes.
2.
Havendo créditos igualmente privilegiados, dar-se-á rateio entre eles, na
proporção dos respectivos montantes.
ARTIGO 746º
(Privilégios por despesas de justiça)
Os
privilégios por despesas de justiça, quer sejam mobiliários, quer imobiliários,
têm preferência não só sobre os demais privilégios,como sobre as outras
garantias, mesmo anteriores, que onerem os mesmos bens, e valem contra os
terceiros adquirentes.
ARTIGO 747º
(Ordem dos outros privilégios mobiliários)
1.
Os créditos com privilégio mobiliário graduam-se pela ordem seguinte:
a)
Os créditos por impostos, pagando-se em primeiro lugar o Estado e só depois as
autarquias locais;
b)
Os créditos por fornecimentos destinados à produção agrícola;
c)
Os créditos por dívidas de foros;
d)
Os créditos da vítima de um facto que dê lugar a responsabilidade civil;
e)
Os créditos do autor de obra intelectual;
f)
Os créditos com privilégio mobiliário geral, pela ordem segundo a qual são
enumerados no artigo 737º.
2.
O disposto no presente artigo é aplicável, ainda que os privilégios existam
contra proprietários sucessivos da coisa.
ARTIGO 748º
(Ordem dos outros privilégios imobiliários)
1.
Os créditos com privilégio imobiliário graduam-se pela ordem seguinte:
a)
Os créditos do Estado, pela contribuição predial, pela sisa e pelo imposto
sobre as sucessões e doações;
b)
Os créditos das autarquias locais, pela contribuição predial.
ARTIGO 749º
(Privilégio geral e direitos de terceiro)
1.
O privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que,
recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao
exequente.
2.
As leis de processo estabelecem os limites ao objecto e à
oponibilidade do
privilégio geral ao exequente e à massa falida, bem como
os casos em que ele
não é invocável ou se extingue na
execução ou perante a declaração da
falência.
N.º 2 aditado pelo Dec.-Lei n.º 38/2003, de 08/03.
ARTIGO 750º
(Privilégio mobiliário especial e direitos de
terceiro)
Salvo
disposição em contrário, no caso de conflito entre o privilégio mobiliário
especial e um direito de terceiro, prevalece o que mais cedo se houver
adquirido.
ARTIGO 751º
(Privilégio imobiliário e direitos de terceiro)
Os
privilégios imobiliários são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um
direito real sobre ele, e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou
ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores.
ARTIGO 752º
(Extinção)
Os
privilégios extinguem-se pelas mesmas causas por que se extingue o direito de
hipoteca.
ARTIGO 753º
(Remissão)
São
aplicáveis aos privilégios, com as necessárias adaptações, os artigos 692º e
694º a 699º.
SECÇÃO VII
Direito de retenção
ARTIGO 754º
(Quando existe)
O
devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de
retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de
despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
ARTIGO 755º
(Casos especiais)
1.
Gozam ainda do direito de retenção:
a)
O transportador, sobre as coisas transportadas, pelo crédito resultante do
transporte;
b)
O albergueiro, sobre as coisas que as pessoas albergadas hajam trazido para a
pousada ou acessórios dela, pelo crédito da hospedagem;
c)
O mandatário, sobre as coisas que lhe tiveram sido entregues para execução do
mandato, pelo crédito resultante da sua actividade;
d)
O gestor de negócios, sobre as coisas que tenha em seu poder para execução da
gestão, pelo crédito proveniente desta;
e)
O depositário e o comodatário, sobre as coisas que lhe tiverem sido entregues
em consequência dos respectivos contratos, pelos créditos deles resultantes;
f)
O beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que
obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa
coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos
termos do artigo 442º.
2.
Quando haja transportes sucessivos, mas todos os transportadores se tenham
obrigado em comum, entende-se que o último detém as coisas em nome próprio e em
nome dos outros.
(Redacção do Dec-Lei 379/86, de 11-11)
ARTIGO 756º
(Exclusão do direito de retenção)
Não
há direito de retenção:
a)
A favor dos que tenham obtido por meios ilícitos a coisa que devem entregar,
desde que, no momento da aquisição, conhecessem a ilicitude desta;
b)
A favor dos que tenham realizado de má fé as despesas de que proveio o seu
crédito;
c)
Relativamente a coisas impenhoráveis;
d)
Quando a outra parte preste caução suficiente.
ARTIGO 757º
(Inexigibilidade e iliquidez do crédito)
1.
O devedor goza do direito de retenção, mesmo antes do vencimento do seu
crédito, desde que entretanto se verifique alguma das circunstâncias que
importam a perda do benefício do prazo.
2.
O direito de retenção não depende da liquidez do crédito do respectivo titular.
ARTIGO 758º
(Retenção de coisas móveis)
Recaindo
o direito de retenção sobre coisa móvel, o respectivo titular goza dos direitos
e está sujeito às obrigações do credor pignoratício, salvo pelo que respeita à
substituição ou reforço da garantia.
ARTIGO 759º
(Retenção de coisas imóveis)
1.
Recaindo o direito de retenção sobre coisa imóvel, o respectivo titular,
enquanto não entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos
termos em que o pode fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência
aos demais credores do devedor.
2.
O direito de retenção prevelece neste caso sobre a hipoteca, ainda que esta
tenha sido registada anteriormente.
3.
Até à entrega da coisa são aplicáveis, quanto aos direitos e obrigações do
titular da retenção, as regras do penhor, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 760º
(Transmissão)
O
direito de retenção não é transmissível sem que seja transmitido o crédito que
ele garante.
ARTIGO 761º
(Extinção)
O
direito de retenção extingue-se pelas mesmas causas por que cessa o direito de
hipoteca, e ainda pela entrega da coisa.
CAPÍTULO VII
Cumprimento e não cumprimento das
obrigações
SECÇÃO I
Cumprimento
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 762º
(Princípio geral)
1.
O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado.
2.
No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente,
devem as partes proceder de boa fé.
ARTIGO 763º
(Realização integral da prestação)
1.
A prestação deve ser realizada integralmente e não por partes, excepto se outro
for o regime convencionado ou imposto por lei ou pelos usos.
2.
O credor tem, porém, a faculdade de exigir uma parte da prestação; a exigência
dessa parte não priva o devedor da possibilidade de oferecer a prestação por
inteiro.
ARTIGO 764º
(Capacidade do devedor e do credor)
1.
O devedor tem de ser capaz, se a prestação constituir um acto de disposição;
mas o credor que haja recebido do devedor incapaz pode opor-se ao pedido de
anulação se o devedor não tiver tido prejuízo com o cumprimento.
2.
O credor deve, pelo seu lado, ter capacidade para receber a prestação; mas, se
esta chegar ao poder do representante legal do incapaz ou o património deste
tiver enriquecido, pode o devedor opor-se ao pedido de anulação da prestação
realizada e de novo
cumprimento
da obrigação, na medida do que tiver sido recebido pelo representante ou do
enriquecimento do incapaz.
ARTIGO 765º
(Entrega da coisa de que o devedor não pode dispor)
1.
O credor que de boa fé receber a prestação de coisa que o devedor não pode
alhear tem o direito de impugnar o cumprimento, sem prejuízo da faculdade de se
ressarcir dos danos que haja sofrido.
2.
O devedor que, de boa ou má fé, prestar coisa de que lhe não é lícito dispor
não pode impugnar o cumprimento, a não ser que ofereça uma nova prestação.
ARTIGO 766º
(Declaração de nulidade ou anulação do
cumprimento e garantias prestadas por terceiro)
Se
o cumprimento for declarado nulo ou anulado por causa imputável ao credor, não
renascem as garantias prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício na
data em que teve notícia do cumprimento da obrigação.
SUBSECÇÃO II
Quem pode fazer e a quem pode ser feita
a prestação
ARTIGO 767º
(Quem pode fazer a prestação)
1.
A prestação pode ser feita tanto pelo devedor como por terceiro, interessado ou
não no cumprimento da obrigação.
2.
O credor não pode, todavia, ser constrangido a receber de terceiro a prestação,
quando se tenha acordado expressamente em que esta deve ser feita pelo devedor,
ou quando a substituição o prejudique.
ARTIGO 768º
(Recusa da prestação pelo credor)
1.
Quando a prestação puder ser efectuada por terceiro, o credor que a recuse incorre
em mora perante o devedor.
2.
É, porém, lícito ao credor recusá-la, desde que o devedor se oponha ao
cumprimento e o terceiro não possa ficar sub-rogado nos termos do artigo 592º;
a oposição do devedor não obsta a que o credor aceite validamente a prestação.
ARTIGO 769º
(A quem deve ser feita a prestação)
A
prestação deve ser feita ao credor ou ao seu representante.
ARTIGO 770º
(Prestação feita a terceiro)
A
prestação feita a terceiro não extingue a obrigação, excepto:
a)
Se assim foi estipulado ou consentido pelo credor;
b)
Se o credor a ratificar;
c)
Se quem a recebeu houver adquirido posteriormente o crédito;
d)
Se o credor vier a aproveitar-se do cumprimento e não tiver interesse fundado
em não a considerar como feita a si próprio;
e)
Se o credor for herdeiro de quem a recebeu e responder pelas obrigações do
autor da sucessão;
f)
Nos demais casos em que a lei o determinar.
ARTIGO 771º
(Oposição à indicação feita pelo credor)
O
devedor não é obrigado a satisfazer a prestação ao representante voluntário do
credor nem à pessoa por este autorizada a recebê-la, se não houver convenção
nesse sentido.
SUBSECÇÃO III
Lugar da prestação
ARTIGO 772º
(Princípio geral)
1.
Na falta de estipulação ou disposição especial da lei, a prestação deve ser
efectuada no lugar do domicílio do devedor.
2.
Se o devedor mudar de domicílio depois de constituída a obrigação, a prestação
será efectuada no novo domicílio, excepto se a mudança acarretar prejuízo para
o credor, pois, nesse caso, deve ser efectuada no lugar do domicílio primitivo.
ARTIGO 773º
(Entrega de coisa móvel)
1.
Se a prestação tiver por objecto coisa móvel determinada, a obrigação deve ser
cumprida no lugar onde a coisa se encontrava ao tempo da conclusão do negócio.
2.
A disposição do número anterior é ainda aplicável, quando se trate de coisa
genérica que deve ser escolhida de um conjunto determinado ou de coisa que deva
ser produzida em certo lugar.
ARTIGO 774º
(Obrigações pecuniárias)
Se
a obrigação tiver por objecto certa quantia em dinheiro, deve a prestação ser
efectuada no lugar do domicílio que o credor tiver ao tempo do cumprimento.
ARTIGO 775º
(Mudança do domicílio do credor)
Se
tiver sido estipulado, ou resultar da lei, que o cumprimento deve efectuar-se
no domicílio do credor, e este mudar de domicílio após a constituição da
obrigação, pode a prestação ser efectuada no domicílio do devedor, salvo se
aquele se comprometer a indemnizar este do prejuízo que sofrer com a mudança.
ARTIGO 776º
(Impossibilidade da prestação no lugar fixado)
Quando
a prestação for ou se tornar impossível no lugar fixado para o cumprimento e
não houver fundamento para considerar a obrigação nula ou extinta, são
aplicáveis as regras supletivas dos artigos 772º a 774º.
SUBSECÇÃO IV
Prazo da prestação
ARTIGO 777º
(Determinação do prazo)
1.
Na falta de estipulação ou disposição especial da lei, o credor tem o direito
de exigir a todo o tempo o cumprimento da obrigação, assim como o devedor pode
a todo o tempo exonerar-se dela.
2.
Se, porém, se tornar necessário o estabelecimento de um prazo, quer pela
própria natureza da prestação, quer por virtude das circunstâncias que a
determinaram, quer por força dos usos, e as partes não acordarem na sua
determinação, a fixação dele é deferida
ao
tribunal.
3.
Se a determinação do prazo for deixada ao credor e este não usar da faculdade
que lhe foi concedida, compete ao tribunal fixar o prazo, a requerimento do
devedor.
ARTIGO 778º
(Prazo dependente da possibilidade ou do arbítrio do
devedor)
1.
Se tiver sido estipulado que o devedor cumprirá quando puder, a prestação só é
exigível tendo este a possibilidade de cumprir; falecendo o devedor, é a
prestação exigível dos seus herdeiros, independentemente da prova dessa
possibilidade, mas sem prejuízo do disposto no artigo 2071º.
2.
Quando o prazo for deixado ao arbítrio do devedor, só dos seus herdeiros tem o
credor o direito de exigir que satisfaçam a prestação.
ARTIGO 779º
(Beneficiário do prazo)
O
prazo tem-se por estabelecido a favor do devedor, quando se não mostre que o
foi a favor do credor, ou do devedor e do credor conjuntamente.
ARTIGO 780º
(Perda do benefício do prazo)
1.
Estabelecido o prazo a favor do devedor, pode o credor, não obstante, exigir o
cumprimento imediato da obrigação, se o devedor se tornar insolvente, ainda que
a insolvência não tenha sido judicialmente declarada, ou se, por causa
imputável ao devedor, diminuírem as garantias do crédito ou não forem prestadas
as garantias prometidas.
2.
O credor tem o direito de exigir do devedor, em lugar do cumprimento imediato
da obrigação, a substituição ou reforço das garantias, se estas sofreram
diminuição.
ARTIGO 781º
(Dívida liquidável em prestações)
Se
a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de
realização de uma delas importa o vencimento de todas.
ARTIGO 782º
(Perda do benefício do prazo em
relação aos co-obrigados e terceiros)
A
perda do benefício do prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a
terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia.
SUBSECÇÃO V
Imputação do cumprimento
ARTIGO 783º
(Designação pelo devedor)
1.
Se o devedor, por diversas dívidas da mesma espécie ao mesmo credor, efectuar
uma prestação que não chegue para as extinguir a todas, fica à sua escolha
designar as dívidas a que o cumprimento se refere.
2.
O devedor, porém, não pode designar contra a vontade do credor uma dívida que
ainda não esteja vencida, se o prazo tiver sido estabelecido em benefício do
credor; e também não lhe é lícito designar contra a vontade do credor uma
dívida de montante superior ao da prestação efectuada, desde que o credor tenha
o direito de recusar a prestação parcial.
ARTIGO 784º
(Regras supletivas)
1.
Se o devedor não fizer a designação, deve o cumprimento imputar-se na dívida
vencida; entre várias dívidas vencidas, na que oferece menor garantia para o
credor; entre várias dívidas igualmente garantidas, na mais onerosa para o
devedor; entre várias dívidas igualmente onerosas, na que primeiro se tenha vencido;
se várias se tiverem vencido simultaneamente, na mais antiga em data.
2.
Não sendo possível aplicar as regras fixadas no número precedente, a prestação
presumir-se-á feita por conta de todas as dívidas, rateadamente, mesmo com
prejuízo, neste caso, do disposto no artigo 763º.
ARTIGO 785º
(Dívidas de juros, despesas e indemnização)
1.
Quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros,
ou a indemnizar o credor em consequência da mora, a prestação que não chegue
para cobrir tudo o que é devido presume-se feita por conta, sucessivamente, das
despesas, da indemnização, dos juros e do capital.
2.
A imputação no capital só pode fazer-se em último lugar, salvo se o credor
concordar em que se faça antes.
SUBSECÇÃO VI
Prova do cumprimento
ARTIGO 786º
(Presunções de cumprimento)
1.
Se o credor der quitação do capital sem reserva dos juros ou de outras
prestações acessórias, presume-se que estão pagos os juros ou prestações.
2.
Sendo devidos juros ou outras prestações periódicas e dando o credor quitação,
sem reserva, de uma dessas prestações, presumem-se realizadas as prestações
anteriores.
3.
A entrega voluntária, feita pelo credor ao devedor, do título original do
crédito faz presumir a liberação do devedor e dos seus condevedores, solidários
ou conjuntos, bem como do fiador e do devedor principal, se o título é entregue
a algum destes.
ARTIGO 787º
(Direito à quitação)
1.
Quem cumpre a obrigação tem o direito de exigir quitação daquele a quem a
prestação é feita, devendo a quitação constar de documento autêntico ou
autenticado ou ser provida de reconhecimento notarial, se aquele que cumpriu
tiver nisso interesse legítimo.
2.
O autor do cumprimento pode recusar a prestação enquanto a quitação não for
dada, assim como pode exigir a quitação depois do cumprimento.
SUBSECÇÃO VII
Direito à restituição do título
ou à menção do cumprimento
ARTIGO 788º
(Restituição do título. Menção do cumprimento)
1.
Extinta a dívida, tem o devedor o direito de exigir a restituição do título da
obrigação; se o cumprimento for parcial, ou o título conferir outros direitos
ao credor, ou este tiver, por outro motivo, interesse legítimo na conservação
dele, pode o devedor exigir que o credor mencione no título o cumprimento
efectuado.
2.
Goza dos mesmos direitos o terceiro que cumprir a obrigação, se ficar
sub-rogado nos direitos do credor.
3.
É aplicável à restituição do
título e à menção do cumprimento o disposto
no nº
2 do artigo anterior.
ARTIGO 789º
(Impossibilidade de restituição ou de menção)
Se
o credor invocar a impossibilidade, por qualquer causa, de restituir o título
ou de nele mencionar o cumprimento, pode o devedor exigir quitação passada em
documento autêntico ou autenticado ou com reconhecimento notarial, correndo o
encargo por conta do credor.
SECÇÃO II
Não cumprimento
SUBSECÇÃO I
Impossibilidade do cumprimento e
mora
não imputáveis ao devedor
ARTIGO 790º
(Impossibilidade objectiva)
1.
A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não
imputável ao devedor.
2.
Quando o negócio do qual a obrigação procede houver sido feito sob condição ou
a termo, e a prestação for possível na data da conclusão do negócio, mas se
tornar impossível antes da verificação da condição ou do vencimento do termo, é
a imposibilidade considerada superveniente e não afecta a validade do negócio.
ARTIGO 791º
(Impossibilidade subjectiva)
A
impossibilidade relativa à pessoa do devedor importa igualmente a extinção da
obrigação, se o devedor, no cumprimento desta, não puder fazer-se substituir
por terceiro.
ARTIGO 792º
(Impossibilidade temporária)
1.
Se a impossibilidade for temporária, o devedor não responde pela mora no
cumprimento.
2.
A impossibilidade só se considera temporária enquanto, atenta a finalidade da
obrigação, se mantiver o interesse do credor.
ARTIGO 793º
(Impossibilidade parcial)
1.
Se a prestação se tornar parcialmente impossível, o devedor exonera-se mediante
a prestação do que for possível, devendo, neste caso, ser proporcionalmente
reduzida a contraprestação a que a outra parte estiver vinculada.
2.
Porém, o credor que não tiver, justificadamente, interesse no cumprimento
parcial da obrigação pode resolver o negócio.
ARTIGO 794º
(«Commodum» de representação)
Se,
por virtude do facto que tornou impossível a prestação, o devedor adquirir
algum direito sobre certa coisa, ou contra terceiro, em substituição do objecto
da prestação, pode o credor exigir a prestação dessa coisa, ou substituir-se ao
devedor na titularidade do direito que este tiver adquirido contra terceiro.
ARTIGO 795º
(Contratos bilaterais)
1.
Quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o
credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado,
de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem
causa.
2.
Se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica
este desobrigado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício
com a exoneração, será o valor do benefício descontado na contraprestação.
ARTIGO 796º
(Risco)
1.
Nos contratos que importem a transferência do domínio sobre certa coisa ou que
constituam ou transfiram um direito real sobre ela, o perecimento ou
deterioração da coisa por causa não imputável ao alienante corre por conta do
adquirente.
2.
Se, porém, a coisa tiver continuado em poder do alienante em consequência de
termo constituído a seu favor, o risco só se transfere com o vencimento do
termo ou a entrega da coisa, sem prejuízo do disposto no artigo 807º.
3.
Quando o contrato estiver dependente de condição resolutiva, o risco do
perecimento durante a pendência da condição corre por conta do adquirente, se a
coisa lhe tiver sido entregue; quando for suspensiva a condição, o risco corre
por conta do alienante durante a pendência da condição.
ARTIGO 797º
(Promessa de envio)
Quando
se trate de coisa que, por força da convenção, o alienante deva enviar para
local diferente do lugar do cumprimento, a transferência do risco opera-se com
a entrega ao transportador ou expedidor da coisa ou à pessoa indicada para a
execução do envio.
SUBSECÇÃO II
Falta de cumprimento e mora
imputáveis ao devedor
Divisão I
Princípios gerais
ARTIGO 798º
(Responsabilidade do devedor)
O
devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável
pelo prejuízo que causa ao credor.
ARTIGO 799º
(Presunção de culpa e apreciação desta)
1.
Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento
defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
2.
A culpa é apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil.
ARTIGO 800º
(Actos dos representantes legais ou auxiliares)
1.
O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes
legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais
actos fossem praticados pelo próprio devedor.
2.
A responsabilidade pode ser convencionalmente excluída ou limitada, mediante
acordo prévio dos interessados, desde que a exclusão ou limitação não compreenda
actos que representem a violação de deveres impostos por normas de ordem
pública.
DIVISÃO II
Impossibilidade do cumprimento
ARTIGO 801º
(Impossibilidade culposa)
1.
Tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável
como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação.
2.
Tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente
do direito à indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a
sua prestação, exigir a restituição dela por inteiro.
ARTIGO 802º
(Impossibilidade parcial)
1.
Se a prestação se tornar parcialmente impossível, o credor tem a faculdade de
resolver o negócio ou de exigir o cumprimento do que for possível, reduzindo
neste caso a sua contraprestação, se for devida; em qualquer dos casos o credor
mantém o direito à indemnização.
2.
O credor não pode, todavia, resolver o negócio, se o não cumprimento parcial,
atendendo ao seu interesse, tiver escassa importância.
ARTIGO 803º
(«Commodum» de representação)
1.
É extensivo ao caso de impossibilidade imputável ao devedor o que dispõe o
artigo 794º.
2.
Se o credor fizer valer o direito conferido no número antecedente, o montante
da indemnização a que tenha direito será reduzido na medida correspondente.
DIVISÃO III
Mora do devedor
ARTIGO 804º
(Princípios gerais)
1.
A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao
credor.
2.
O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja
imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.
ARTIGO 805º
(Momento da constituição em mora)
1.
O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou
extrajudicialmente interpelado para cumprir.
2.
Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação:
a)
Se a obrigação tiver prazo certo;
b)
Se a obrigação provier de facto ilícito;
c)
Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste
caso, na data em que normalmente o teria sido.
3.
Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se
a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de
responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em
mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira
parte deste número.
(Redacção do Dec.-Lei 262/83, de 16-06)
ARTIGO 806º
(Obrigações pecuniárias)
1.
Na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da
constituição em mora.
2.
Os juros devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro
mais elevado ou as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do
legal.
3.
Pode, no entanto, o credor provar que a mora lhe causou dano superior aos juros
referidos no número anterior e exigir a indemnização suplementar
correspondente, quando se trate de responsabilidade por facto ilícito ou pelo
risco.
(Redacção do Dec.-Lei 262/83, de 16-06)
ARTIGO 807º
(Risco)
1.
Pelo facto de estar em mora, o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que o
credor tiver em consequência da perda ou deterioração daquilo que deveria
entregar, mesmo que estes factos lhe não sejam imputáveis.
2.
Fica, porém, salva ao devedor a possibilidade de provar que o credor teria
sofrido igualmente os danos se a obrigação tivesse sido cumprida em tempo.
ARTIGO 808º
(Perda do interesse do credor ou recusa do
cumprimento)
1.
Se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na
prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for
fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a
obrigação.
2.
A perda do interesse na prestação é apreciada objectivamente.
DIVISÃO IV
Fixação contratual dos direitos do
credor
ARTIGO 809º
(Renúncia do credor aos seus direitos)
É
nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a qualquer dos
direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não
cumprimento ou mora do devedor, salvo o disposto no nº 2 do artigo 800º.
ARTIGO 810º
(Cláusula penal)
1.
As partes podem, porém, fixar por acordo o montante da indemnização exigível: é
o que se chama cláusula penal.
2.
A cláusula penal está sujeita às formalidades exigidas para a obrigação
principal, e é nula se for nula esta obrigação.
ARTIGO 811º
(Funcionamento da cláusula penal)
1.
O credor não pode exigir cumulativamente, com base no contrato, o cumprimento
coercivo da obrigação principal e o pagamento da cláusula penal, salvo se esta
tiver sido estabelecida para o atraso da prestação; é nula qualquer estipulação
em contrário.
2.
O estabelecimento da cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização
pelo dano excedente, salvo se outra for a convenção das partes.
3.
O credor não pode em caso algum exigir uma indemnização que exceda o valor do
prejuízo resultante do incumprimento da obrigação principal.
(Redacção do Dec.-Lei 262/83, de 16-6)
ARTIGO 812º
(Redução equitativa da cláusula penal)
1.
A cláusula penal pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade,
quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula
qualquer estipulação em contrário.
2.
É admitida a redução nas mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido
parcialmente cumprida.
(Redacção do Dec.-Lei 262/83, de 16-6)
SUBSECÇÃO III
Mora do credor
ARTIGO 813º
(Requisitos)
O
credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação
que lhe é oferecida nos termos legais ou não pratica os actos necessários ao
cumprimento da obrigação.
ARTIGO 814º
(Responsabilidade do devedor)
1.
A partir da mora, o devedor apenas responde, quanto ao objecto da prestação,
pelo seu dolo; relativamente aos proventos da coisa, só responde pelos que
hajam sido percebidos.
2.
Durante a mora, a dívida deixa de vencer juros, quer legais, quer
convencionados.
ARTIGO 815º
(Risco)
1.
A mora faz recair sobre o credor o risco da impossibilidade superveniente da
prestação, que resulte de facto não imputável a dolo do devedor.
2.
Sendo o contrato bilateral, o credor que, estando em mora, perca total ou
parcialmente o seu crédito por impossibilidade superveniente da prestação não
fica exonerado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com
a extinção da sua obrigação, deve o valor do benefício ser descontado na
contraprestação.
ARTIGO 816º
(Indemnização)
O
credor em mora indemnizará o devedor das maiores despesas que este seja
obrigado a fazer com o oferecimento infrutífero da prestação e a guarda e
conservação do respectivo objecto.
SECÇÃO III
Realização coactiva da prestação
SUBSECÇÃO I
Acção de cumprimento e execução
ARTIGO 817º
(Princípio geral)
Não
sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir
judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor, nos
termos declarados neste código e nas leis de processo.
ARTIGO 818º
(Execução de bens de terceiro)
O
direito de execução pode incidir sobre bens de terceiro, quando estejam
vinculados à garantia do crédito, ou quando sejam objecto de acto praticado em
prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado.
ARTIGO 819º
(Disposição ou oneração dos bens penhorados)
Sem
prejuízo das regras do registo, são inoponíveis em
relação à execução os actos
de disposição, oneração ou arrendamento dos
bens penhorados.
Redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.º 38/2003
ARTIGO 820º
(Penhora de créditos)
Sendo penhorado algum crédito do devedor, a extinção dele por causa dependente
da vontade do executado ou do seu devedor, verificada depois da penhora, é
igualmente inoponível à execução. (*)
(*) Redacção introduzida pelo Decreto-Lei Nº 199/2003, de 10 de Setembro.
ARTIGO 821º
(Liberação ou cessão de rendas ou alugueres não
vencidos)
A
liberação ou cessão, antes da penhora, de rendas e alugueres não vencidos é
inoponível ao exequente, na medida em que tais rendas ou alugueres respeitem a
períodos de tempo não decorridos à data da penhora.
ARTIGO 822º
(Preferência resultante da penhora)
1.
Salvo nos casos especialmente previstos na lei, o exequente adquire pela
penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor que não
tenha garantia real anterior.
2.
Tendo os bens do executado sido previamente arrestados, a anterioridade da
penhora reporta-se à data do arresto.
ARTIGO 823º
(Perda, expropriação ou deterioração da coisa
penhorada)
Se
a coisa penhorada se perder, for expropriada ou sofrer diminuição de valor, e,
em qualquer dos casos, houver lugar a indemnização de terceiro, o exequente
conserva sobre os créditos respectivos, ou sobre as quantias pagas a título de
indemnização, o direito que tinha sobre a coisa.
ARTIGO 824º
(Venda em execução)
1.
A venda em execução transfere para o adquirente os direitos do executado sobre
a coisa vendida.
2.
Os bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os onerarem, bem
como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer
arresto, penhora ou garantia, com excepção dos que, constituídos em data
anterior, produzam efeitos em relação a terceiros independentemente de registo.
3.
Os direitos de terceiro que caducarem nos termos do número anterior
transferem-se para o produto da venda dos respectivos bens.
ARTIGO 825º
(Garantia no caso de execução de coisa alheia)
1.
O adquirente, no caso de execução de coisa alheia, pode exigir que o preço lhe
seja restituído por aqueles a quem foi atribuído e que os danos sejam reparados
pelos credores e pelo executado que hajam procedido com culpa; é aplicável à
restituição do preço o disposto no artigo 894º.
2.
Se o terceiro tiver protestado pelo seu direito no acto da venda, ou
anteriormente a ela, e o adquirente conhecer o protesto, não lhe é lícito pedir
a reparação dos danos, salvo se os credores ou o devedor se tiverem
responsabilizado pela indemnização.
3.
Em lugar de exigir dos credores a restituição do preço, o adquirente pode
exercer contra o devedor, por sub-rogação, os direitos desses credores.
ARTIGO 826º
(Adjudicação e remição)
As
disposições dos artigos antecedentes relativos à venda são aplicáveis, com as
necessárias adaptações, à adjudicação e à remição.
SUBSECÇÃO II
Execução específica
ARTIGO 827º
(Entrega de coisa determinada)
Se
a prestação consistir na entrega de coisa determinada, o credor tem a faculdade
de requerer, em execução, que a entrega lhe seja feita.
Redacção introduzida pelo Dec.-Lei 38/2003
ARTIGO 828º
(Prestação de facto fungível)
O
credor de prestação de facto fungível tem a faculdade de requerer, em execução,
que o facto seja prestado por outrem à custa do devedor.
ARTIGO 829º
(Prestação de facto negativo)
1.
Se o devedor estiver obrigado a não praticar algum acto e vier a praticá-lo,
tem o credor o direito de exigir que a obra, se obra feita houver, seja
demolida à custa do que se obrigou a não a fazer.
2.
Cessa o direito conferido no número anterior, havendo apenas lugar à
indemnização, nos termos gerais, se o prejuízo da demolição para o devedor for
consideravelmente superior ao prejuízo sofrido pelo credor.
ARTIGO 829º-A
(Sanção pecuniária compulsória)
1.
Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo
nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o
tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma
quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção,
conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2.
A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo
critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
3.
O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em parte iguais, ao
credor e ao Estado.
4.
Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em
dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde
a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais
acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização
a que houver lugar.
(Aditado pelo Dec.-Lei 262/83, de 16-6)
ARTIGO 830º
(Contrato-promessa)
1.
Se alguém se tiver obrigado a celebrar certo contrato e não cumprir a promessa,
pode a outra parte, na falta de convenção em contrário, obter sentença que
produza os efeitos da declaração negocial do faltoso, sempre que a isso não se
oponha a natureza da obrigação assumida.
2.
Entende-se haver convenção em contrário, se existir sinal ou tiver sido fixada
uma pena para o caso de não cumprimento da promessa.
3.
O direito à execução específica não pode ser afastado pelas partes nas promessas
a que se refere o nº 3 do artigo 410º; a requerimento do faltoso, porém, a
sentença que produza os efeitos da sua declaração negocial pode ordenar a
modificação do contrato nos termos do artigo 437º, ainda que a alteração das
circunstâncias seja posterior à mora.
4.
Tratando-se de promessa relativa à celebração de contrato oneroso de
transmissão ou constituição de direito real sobre edifício, ou fracção autónoma
dele, em que caiba ao adquirente, nos termos do artigo 721º, a faculdade de
expurgar hipoteca a que o mesmo se encontre sujeito, pode aquele, caso a
extinção de tal garantia não preceda a mencionada transmissão ou constituição,
ou não coincida com esta, requerer, para efeito da expurgação, que a sentença
referida no nº 1 condene também o promitente faltoso a entregar-lhe o montante
do débito garantido, ou o valor nele correspondente à fracção do edifício ou do
direito objecto do contrato e dos juros respectivos, vencidos e vincendos, até
pagamento integral.
5.
No caso de contrato em que ao obrigado seja lícito invocar a excepção de não
cumprimento, a acção improcede, se o requerente não consignar em depósito a sua
prestação no prazo que lhe for fixado pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei 379/86, de 11-11)
SECÇÃO IV
Cessão de bens aos credores
ARTIGO 831º
(Noção)
Dá-se
a cessão de bens aos credores quando estes, ou alguns deles, são encarregados
pelo devedor de liquidar o património deste, ou parte dele, e repartir entre si
o respectivo produto, para satisfação dos seus créditos.
ARTIGO 832º
(Forma)
1.
A cessão deve ser feita por escrito e está, além disso, sujeita à forma exigida
para a validade da transmissão dos bens nela compreendidos.
2.
A cessão deve ser registada sempre que abranja bens sujeitos a registo.
ARTIGO 833º
(Execução dos bens cedidos)
A
cessão não impede que os bens cedidos sejam executados pelos credores que dela
não participam, enquanto não tiverem sido alienados; não gozam de igual direito
os cessionários nem os credores posteriores à cessão.
ARTIGO 834º
(Poderes dos cessionários e do devedor)
1.
Enquanto a cessão se mantiver, os poderes de administração e disposição dos
respectivos bens pertencem exclusivamente aos cessionários.
2.
O devedor conserva, porém, o direito de fiscalizar a gestão dos credores, e tem
o direito à prestação de contas no fim da liquidação ou, se a cessão se
prolongar por mais de um ano, no termo de cada ano.
ARTIGO 835º
(Exoneração do devedor)
O
devedor só fica liberado em face dos credores a partir do recebimento da parte
que a estes compete no produto da liquidação, e na medida do que receberam.
ARTIGO 836º
(Desistência da cessão)
1.
É permitido ao devedor desistir a todo o tempo da cessão, cumprindo as
obrigações a que está adstrito para com os cessionários.
2.
A desistência não tem efeito retroactivo.
CAPÍTULO VIII
Causas de extinção das obrigações
além do cumprimento
SECÇÃO I
Dação em cumprimento
ARTIGO 837º
(Quando é admitida)
A
prestação de coisa diversa da que for devida, embora de valor superior, só
exonera o devedor se o credor der o seu assentimento.
ARTIGO 838º
(Vícios da coisa ou do direito)
O
credor a quem for feita a dação em cumprimento goza de garantia pelos vícios da
coisa ou do direito transmitido, nos termos prescritos para a compra e venda;
mas pode optar pela prestação primitiva e reparação dos danos sofridos.
ARTIGO 839º
(Nulidade ou anulabilidade da dação)
Sendo
a dação declarada nula ou anulada por causa imputável ao credor, não renascem
as garantias prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício na data
em que teve notícia da dação.
ARTIGO 840º
(Dação «pro solvendo»)
1.
Se o devedor efectuar uma prestação diferente da devida, para que o credor
obtenha mais facilmente, pela realização do valor dela, a satisfação do seu
crédito, este só se extingue quando for satisfeito, e na medida respectiva.
2.
Se a dação tiver por objecto a cessão de um crédito ou a assunção de uma
dívida, presume-se feita nos termos do número anterior.
SECÇÃO II
Consignação em depósito
ARTIGO 841º
(Quando tem lugar)
1.
O devedor pode livrar-se da obrigação mediante o depósito da coisa devida, nos
casos seguintes:
a)
Quando, sem culpa sua, não puder efectuar a prestação ou não puder fazê-lo com
segurança, por qualquer motivo relativo à pessoa do credor;
b)
Quando o credor estiver em mora.
2.
A consignação em depósito é facultativa.
ARTIGO 842º
(Consignação por terceiro)
A
consignação em depósito pode ser efectuada a requerimento de terceiro a quem
seja lícito efectuar a prestação.
ARTIGO 843º
(Dependência de outra prestação)
Se
o devedor tiver a faculdade de não cumprir senão contra uma prestação do
credor, é-lhe lícito exigir que a coisa consignada não seja entregue ao credor
enquanto este não efectuar aquela prestação.
ARTIGO 844º
(Entrega da coisa consignada)
Feita
a consignação, fica o consignatário obrigado a entregar ao credor a coisa
consignada, e o credor com o direito de exigir a sua entrega.
ARTIGO 845º
(Revogação da consignação)
1.
O devedor pode revogar a consignação, mediante declaração feita no processo, e
pedir a restituição da coisa consignada.
2.
Extingue-se o direito de revogação, se o credor, por declaração feita no
processo, aceitar a consignação, ou se esta for considerada válida por sentença
passada em julgado.
ARTIGO 846º
(Extinção da obrigação)
A
consignação aceita pelo credor ou declarada válida por decisão judicial libera
o devedor, como se ele tivesse feito a prestação ao credor na data do depósito.
SECÇÃO III
Compensação
ARTIGO 847º
(Requisitos)
1.
Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode
livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu
credor, verificados os seguintes requisitos:
a)
Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção,
peremptória ou dilatória, de direito material;
b)
Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e
qualidade.
2.
Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na
parte correspondente.
3.
A iliquidez da dívida não impede a compensação.
ARTIGO 848º
(Como se torna efectiva)
1.
A compensação torna-se efectiva mediante declaração de uma das partes à outra.
2.
A declaração é ineficaz, se for feita sob condição ou a termo.
ARTIGO 849º
(Prazo gratuito)
O
credor que concedeu gratuitamente um prazo ao devedor está impedido de
compensar a sua dívida antes do vencimento do prazo.
ARTIGO 850º
(Créditos prescritos)
O
crédito prescrito não impede a compensação, se a prescrição não podia ser
invocada na data em que os dois créditos se tornaram compensáveis.
ARTIGO 851º
(Reciprocidade dos créditos)
1.
A compensação apenas pode abranger a dívida do declarante, e não a de terceiro,
ainda que aquele possa efectuar a prestação deste, salvo se o declarante
estiver em risco de perder o que é seu em consequência de execução por dívida
de terceiro.
2.
O declarante só pode utilizar para a compensação créditos que sejam seus, e não
créditos alheios, ainda que o titular respectivo dê o seu consentimento; e só
procedem para o efeito créditos seus contra o seu credor.
ARTIGO 852º
(Diversidade de lugares do cumprimento)
1.
Pelo simples facto de deverem ser cumpridas em lugares diferentes, as duas
obrigações não deixam de ser compensáveis, salvo estipulação em contrário.
2.
O declarante é, todavia, obrigado a reparar os danos sofridos pela outra parte,
em consequência de esta não receber o seu crédito ou não cumprir a sua
obrigação no lugar determinado.
ARTIGO 853º
(Exclusão da compensação)
1.
Não podem extinguir-se por compensação:
a)
Os créditos provenientes de factos ilícitos dolosos;
b)
Os créditos impenhoráveis, excepto se ambos forem da mesma natureza;
c)
Os créditos do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, excepto quando
a lei o autorize.
2.
Também não é admitida a compensação, se houver prejuízo de direitos de
terceiro, constituídos antes de os créditos se tornarem compensáveis, ou se o
devedor a ela tiver renunciado.
ARTIGO 854º
(Retroactividade)
Feita
a declaração de compensação, os créditos consideram-se extintos desde o momento
em que se tornaram compensáveis.
ARTIGO 855º
(Pluralidade de créditos)
1.
Se existirem, de uma ou outra parte, vários créditos compensáveis, a escolha
dos que ficam extintos pertence ao declarante.
2.
Na falta de escolha, é aplicável o disposto nos artigos 784º e 785º.
ARTIGO 856º
(Nulidade ou anulabilidade da compensação)
Declarada
nula ou anulada a compensação, subsistem as obrigações respectivas; mas, sendo
a nulidade ou anulação imputável a alguma das partes, não renascem as garantias
que em seu benefício foram prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o
vício quando foi feita a declaração de compensação.
SECÇÃO IV
Novação
ARTIGO 857º
(Novação objectiva)
Dá-se
a novação objectiva quando o devedor contrai perante o credor uma nova
obrigação em substituição da antiga.
ARTIGO 858º
(Novação subjectiva)
A
novação por substituição do credor dá-se quando um novo credor é substituído ao
antigo, vinculando-se o devedor para com ele por uma nova obrigação; e a
novação por substituição do devedor, quando um novo devedor, contraindo nova
obrigação, é substituído ao antigo, que é exonerado pelo credor.
ARTIGO 859º
(Declaração negocial)
A
vontade de contrair a nova obrigação em substituição da antiga deve ser
expressamente manifestada.
ARTIGO 860º
(Ineficácia da novação)
1.
Se a primeira obrigação estava extinta ao tempo em que a segunda foi contraída,
ou vier a ser declarada nula ou anulada, fica a novação sem efeito.
2.
Se for declarada nula ou anulada a nova obrigação, subsiste a obrigação
primitiva; mas, sendo a nulidade ou anulação imputável ao credor, não renascem
as garantias prestadas por terceiro, salvo se este, na data em que teve notícia
da novação, conhecia o vício da nova obrigação.
ARTIGO
861º
(Garantias)
1.
Extinta a obrigação antiga pela novação, ficam igualmente extintas, na falta de
reserva expressa, as garantias que asseguravam o seu cumprimento, mesmo quando
resultantes da lei.
2.
Dizendo a garantia respeito a terceiro, é necessária também a reserva expressa
deste.
ARTIGO 862º
(Meios de defesa)
O
novo crédito não está sujeito aos meios de defesa oponíveis à obrigação antiga,
salvo estipulação em contrário.
SECÇÃO V
Remissão
ARTIGO 863º
(Natureza contratual da remissão)
1.
O credor pode remitir a dívida por contrato com o devedor.
2.
Quando tiver o carácter de liberalidade, a remissão por negócio entre vivos é
havida como doação, na conformidade dos artigos 940º e seguintes.
ARTIGO 864º
(Obrigações solidárias)
1.
A remissão concedida a um devedor solidário libera os outros somente na parte
do devedor exonerado.
2.
Se o credor, neste caso, reservar o seu direito, por inteiro, contra os outros
devedores, conservam estes, por inteiro também, o direito de regresso contra o
devedor exonerado.
3.
A remissão concedida por um dos credores solidários exonera o devedor para com
os restantes credores, mas somente na parte que respeita ao credor remitente.
ARTIGO 865º
(Obrigações indivisíveis)
1.
À remissão concedida pelo credor de obrigação indivisível a um dos devedores é
aplicável o disposto no artigo 536º.
2.
Sendo a remissão concedida por um dos credores ao devedor, este não fica
exonerado para com os outros credores; mas estes não podem exigir do devedor a
prestação senão entregando-lhe o valor da parte daquele concredor.
ARTIGO 866º
(Eficácia em relação a terceiros)
1.
A remissão concedida ao devedor aproveita a terceiros.
2.
A remissão concedida a um dos fiadores aproveita aos outros na parte do fiador
exonerado; mas, se os outros consentirem na remissão, respondem pela totalidade
da dívida, salvo declaração em contrário.
3.
Se for declarada nula ou anulada a remissão por facto imputável ao credor, não
renascem as garantias prestadas por terceiro, excepto se este conhecia o vício
na data em que teve notícia da remissão.
ARTIGO 867º
(Renúncia às garantias)
A
renúncia às garantias da obrigação não faz presumir a remissão da dívida.
SECÇÃO VI
Confusão
ARTIGO 868º
(Noção)
Quando
na mesma pessoa se reúnam as qualidades de credor e devedor da mesma obrigação,
extinguem-se o crédito e a dívida.
ARTIGO 869º
(Obrigações solidárias)
1.
A reunião na mesma pessoa das qualidades de devedor solidário e credor exonera
os demais obrigados, mas só na parte da dívida relativa a esse devedor.
2.
A reunião na mesma pessoa das qualidades de credor solidário e devedor exonera
este na parte daquele.
ARTIGO 870º
(Obrigações indivisíveis)
1.
Se na obrigação indivisível em que há vários devedores se reunirem as
qualidades de credor e devedor, é aplicável o disposto no artigo 536º.
2.
Sendo vários os credores e verificando-se a confusão entre um deles e o
devedor, é aplicável o disposto no nº 2 do artigo 865º.
ARTIGO 871º
(Eficácia em relação a terceiros)
1.
A confusão não prejudica os direitos de terceiro.
2.
Se houver, a favor de terceiro, direitos de usufruto ou de penhor sobre o
crédito, este subsiste, não obstante a confusão, na medida em que o exija o
interesse do usufrutuário ou do credor pignoratício.
3.
Se na mesma pessoa se reunirem as qualidades de devedor e fiador, fica extinta
a fiança, excepto se o credor tiver legítimo interesse na subsistência da
garantia.
4.
A reunião na mesma pessoa das qualidades de credor e de proprietário da coisa
hipotecada ou empenhada não impede que a hipoteca ou o penhor se mantenha, se o
credor nisso tiver interesse e na medida em que esse interesse se justifique.
ARTIGO 872º
(Patrimónios separados)
Não
há confusão, se o crédito e a dívida pertencem a patrimónios separados.
ARTIGO 873º
(Cessação da confusão)
1.
Se a confusão se desfizer, renasce a obrigação com os seus acessórios, mesmo em
relação a terceiro, quando o facto que a destrói seja anterior à própria
confusão.
2.
Quando a cessação da confusão for imputável ao credor, não renascem as
garantias prestadas por terceiro, salvo se este conhecia o vício na data em que
teve notícia da confusão.
TÍTULO II
DOS CONTRATOS EM ESPECIAL
CAPÍTULO I
Compra e venda
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 874º
(Noção)
Compra
e venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou
outro direito, mediante um preço.
ARTIGO 875º
(Forma)
O
contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado por
escritura pública.
ARTIGO 876º
(Venda de coisa ou direito litigioso)
1.
Não podem ser compradores de coisa ou direito litigioso, quer directamente,
quer por interposta pessoa, aqueles a quem a lei não permite que seja feita a
cessão de créditos ou direitos litigiosos, conforme se dispõe no capítulo
respectivo.
2.
A venda feita com quebra do disposto no número anterior, além de nula, sujeita
o comprador, nos termos gerais, à obrigação de reparar os danos causados.
3.
A nulidade não pode ser invocada pelo comprador.
ARTIGO 877º
(Venda a filhos ou netos)
1.
Os pais e avós não podem vender a filhos ou netos, se os outros filhos ou netos
não consentirem na venda; o consentimento dos descendentes, quando não possa
ser prestado ou seja recusado, é susceptível de suprimento judicial.
2.
A venda feita com quebra do que preceitua o número anterior é anulável; a
anulação pode ser pedida pelos filhos ou netos que não deram o seu
consentimento, dentro do prazo de um ano a contar do conhecimento da celebração
do contrato, ou do termo da incapacidade, se forem incapazes.
3.
A proibição não abrange a dação em cumprimento feita pelo ascendente.
ARTIGO 878º
(Despesas do contrato)
Na
falta de convenção em contrário, as despesas do contrato e outras acessórias
ficam a cargo do comprador.
SECÇÃO II
Efeitos da compra e venda
ARTIGO 879º
(Efeitos essenciais)
A
compra e venda tem como efeitos essenciais:
a)
A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito;
b)
A obrigação de entregar a coisa;
c)
A obrigação de pagar o preço.
ARTIGO 880º
(Bens futuros, frutos pendentes e
partes componentes ou integrantes)
1.
Na venda de bens futuros, de frutos pendentes ou de partes componentes ou
integrantes de uma coisa, o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias
para que o comprador adquira os bens vendidos, segundo o que for estipulado ou
resultar das circunstâncias do contrato.
2.
Se as partes atribuírem ao contrato carácter aleatório, é devido o preço, ainda
que a transmissão dos bens não chegue a verificar-se.
ARTIGO 881º
(Bens de existência ou titularidade incerta)
Quando
se vendam bens de existência ou titularidade incerta e no contrato se faça
menção dessa incerteza, é devido o preço, ainda que os bens não existam ou não
pertençam ao vendedor, excepto se as partes recusarem ao contrato natureza
aleatória.
ARTIGO 882º
(Entrega da coisa)
1.
A coisa deve ser entregue no estado em que se encontrava ao tempo da venda.
2.
A obrigação de entrega abrange, salvo estipulação em contrário, as partes
integrantes, os frutos pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
3.
Se os documentos contiverem outras matérias de interesse do vendedor, é este
obrigado a entregar pública-forma da parte respeitante à coisa ou direito que
foi objecto da venda, ou fotocópia de igual valor.
ARTIGO 883º
(Determinação do preço)
1.
Se o preço não estiver fixado por entidade pública, e as partes o não
determinarem nem convencionarem o modo de ele ser determinado, vale como preço
contratual o que o vendedor normalmente praticar à data da conclusão do
contrato ou, na falta dele, o do mercado ou bolsa no momento do contrato e no
lugar em que o comprador deva cumprir; na insuficiência destas regras, o preço
é determinado pelo tribunal, segundo juízos de equidade.
2.
Quando as partes se tenham reportado ao justo preço, é aplicável o disposto no
número anterior.
ARTIGO 884º
(Redução do preço)
1.
Se a venda ficar limitada a parte do seu objecto, nos termos do artigo 292º ou
por força de outros preceitos legais, o preço respeitante à parte válida do
contrato é o que neste figurar, se houver sido discriminado como parcela do
preço global.
2.
Na falta de discriminação, a redução é feita por meio de avaliação.
ARTIGO 885º
(Tempo e lugar do pagamento do preço)
1.
O preço deve ser pago no momento e no lugar da entrega da coisa vendida.
2.
Mas, se por estipulação das partes ou por força dos usos o preço não tiver de
ser pago no momento da entrega, o pagamento será efectuado no lugar do
domicílio que o credor tiver ao tempo do cumprimento.
ARTIGO 886º
(Falta de pagamento do preço)
Transmitida
a propriedade da coisa, ou o direito sobre ela, e feita a sua entrega, o
vendedor não pode, salvo convenção em contrário, resolver o contrato por falta
de pagamento do preço.
SECÇÃO III
Venda de coisas sujeitas a contagem,
pesagem ou medição
ARTIGO 887º
(Coisas determinadas. Preço fixado por unidade)
Na
venda de coisas determinadas, com preço fixado à razão de tanto por unidade, é
devido o preço proporcional ao número, peso ou medida real das coisas vendidas,
sem embargo de no contrato se declarar quantidade diferente.
ARTIGO 888º
(Coisas determinadas. Preço não fixado por unidade)
1.
Se na venda de coisas determinadas o preço não for estabelecido à razão de
tanto por unidade, o comprador deve o preço declarado, mesmo que no contrato se
indique o número, peso ou medida das coisas vendidas e a indicação não
corresponda à realidade.
2.
Se, porém, a quantidade efectiva diferir da declarada em mais de um vigésimo
desta, o preço sofrerá redução ou aumento proporcional.
ARTIGO 889º
(Compensação entre faltas e excessos)
Quando
se venda por um só preço uma pluralidade de coisas determinadas e homogéneas,
com indicação do peso ou medida de cada uma delas, e se declare quantidade
inferior à real quanto a alguma ou algumas e superior quanto a outra ou outras,
far-se-á compensação entre as faltas e os excessos até ao limite da sua
concorrência.
ARTIGO 890º
(Caducidade do direito à diferença de preço)
1.
O direito ao recebimento da diferença de preço caduca dentro de seis meses ou
um ano após a entrega da coisa, consoante esta for móvel ou imóvel; mas, se a
diferença só se tornar exigível em momento posterior à entrega, o prazo
contar-se-á a partir desse momento.
2.
Na venda de coisas que hajam de ser transportadas de um lugar para outro, o
prazo reportado à data da entrega só começa a correr no dia em que o comprador
as receber.
ARTIGO 891º
(Resolução do contrato)
1.
Se o preço devido por aplicação do artigo 887º ou do nº 2 do artigo 888º
exceder o proporcional à quantidade declarada em mais de um vigésimo deste, e o
vendedor exigir esse excesso, o comprador tem o direito de resolver o contrato,
salvo se houver procedido com dolo.
2.
O direito à resolução caduca no prazo de três meses, a contar da data em que o
vendedor fizer por escrito a exigência do excesso.
SECÇÃO IV
Venda de bens alheios
ARTIGO 892º
(Nulidade da venda)
É
nula a venda de bens alheios sempre que o vendedor careça de legitimidade para
a realizar; mas o vendedor não pode opor a nulidade ao comprador de boa fé,
como não pode opô-la ao vendedor de boa fé o comprador doloso.
ARTIGO 893º
(Bens alheios como bens futuros)
A
venda de bens alheios fica, porém, sujeita ao regime da venda de bens futuros,
se as partes os considerarem nesta qualidade.
ARTIGO 894º
(Restituição do preço)
1.
Sendo nula a venda de bens alheios, o comprador que tiver procedido de boa fé
tem o direito de exigir a restituição integral do preço, ainda que os bens se
hajam perdido, estejam deteriorados ou tenham diminuído de valor por qualquer
outra causa.
2.
Mas, se o comprador houver tirado proveito da perda ou diminuição de valor dos
bens, será o proveito abatido no montante do preço e da indemnização que o
vendedor tenha de pagar-lhe.
ARTIGO 895º
(Convalidação do contrato)
Logo
que o vendedor adquira por algum modo a propriedade da coisa ou o direito
vendido, o contrato torna-se válido e a dita propriedade ou direito
transfere-se para o comprador.
ARTIGO 896º
(Casos em que o contrato se não convalida)
1.
O contrato não adquire, porém, validade, se entretanto ocorrer algum dos
seguintes factos:
a)
Pedido judicial de declaração de nulidade do contrato, formulado por um dos
contraentes contra o outro;
b)
Restituição do preço ou pagamento da indemnização, no todo ou em parte, com
aceitação do credor;
c)
Transacção entre os contraentes, na qual se reconheça a nulidade do contrato;
d)
Declaração escrita, feita por um dos estipulantes ao outro, de que não quer que
o contrato deixe de ser declarado nulo.
2.
As disposições das alíneas a) e d) do número precedente não prejudicam o
disposto na segunda parte do artigo 892º.
ARTIGO 897º
(Obrigação de convalidação)
1.
Em caso de boa fé do comprador, o vendedor é obrigado a sanar a nulidade da
venda, adquirindo a propriedade da coisa ou o direito vendido.
2.
Quando exista uma tal obrigação, o comprador pode subordinar ao não cumprimento
dela, dentro do prazo que o tribunal fixar, o efeito previsto na alínea a) do
nº 1 do artigo anterior.
ARTIGO 898º
(Indemnização em caso de dolo)
Se
um dos contraentes houver procedido de boa fé e o outro dolosamente, o primeiro
tem direito a ser indemnizado, nos termos gerais, de todos os prejuízos que não
teria sofrido se o contrato fosse válido desde o começo, ou não houvesse sido
celebrado, conforme venha ou não a ser sanada a nulidade.
ARTIGO 899º
(Indemnização, não havendo dolo nem culpa)
O
vendedor é obrigado a indemnizar o comprador de boa fé, ainda que tenha agido
sem dolo nem culpa; mas, neste caso, a indemnização compreende apenas os danos
emergentes que não resultem de despesas voluptuárias.
ARTIGO 900º
(Indemnização pela não convalidação da venda)
1.
Se o vendedor for responsável pelo não cumprimento da obrigação de sanar a
nulidade da venda ou pela mora no seu cumprimento, a respectiva indemnização
acresce à regulada nos artigos anteriores, excepto na parte em que o prejuízo
seja comum.
2.
Mas, no caso previsto no artigo 898º, o comprador escolherá entre a
indemnização dos lucros cessantes pela celebração do contrato nulo e a dos
lucros cessantes pela falta ou retardamento da convalidação.
ARTIGO 901º
(Garantia do pagamento de benfeitorias)
O
vendedor é garante solidário do pagamento das benfeitorias que devam ser reembolsadas
pelo dono da coisa ao comprador de boa fé.
ARTIGO 902º
(Nulidade parcial do contrato)
Se
os bens só parcialmente forem alheios e o contrato valer na parte restante por
aplicação do artigo 292º, observar-se-ão as disposições antecedentes quanto à
parte nula e reduzir-se-á proporcionalmente o preço estipulado.
ARTIGO 903º
(Disposições supletivas)
1.
O disposto no artigo 894º, no nº 1 do artigo 897º, no artigo 899º, no nº 1 do
artigo 900º e no artigo 901º cede perante convenção em contrário, excepto se o
contraente a quem a convenção aproveitaria houver agido com dolo, e de boa fé o
outro estipulante.
2.
A declaração contratual de que o vendedor não garante a sua legitimidade ou não
responde pela evicção envolve derrogação de todas as disposições legais a que o
número anterior se refere, com excepção do preceituado no artigo 894º.
3.
As cláusulas derrogadoras das disposições supletivas a que se refere o nº 1 são
válidas, sem embargo da nulidade do contrato de compra e venda onde se
encontram insertas, desde que a nulidade proceda da ilegitimidade do vendedor,
nos termos desta secção.
ARTIGO 904º
(Âmbito desta secção)
As
normas da presente secção apenas se aplicam à venda de coisa alheia como
própria.
SECÇÃO V
Venda de bens onerados
ARTIGO 905º
(Anulabilidade por erro ou dolo)
Se
o direito transmitido estiver sujeito a alguns ónus ou limitações que excedam
os limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria, o contrato é
anulável por erro ou dolo, desde que no caso se verifiquem os requisitos legais
da anulabilidade.
ARTIGO 906º
(Convalescença do contrato)
1.
Desaparecidos por qualquer modo os ónus ou limitações a que o direito estava
sujeito, fica sanada a anulabilidade do contrato.
2.
A anulabilidade persiste, porém, se a existência dos ónus ou limitações já
houver causado prejuízo ao comprador, ou se este já tiver pedido em juízo a
anulação da compra e venda.
ARTIGO 907º
(Obrigação de fazer convalescer o contrato.
Cancelamento dos registos)
1.
O vendedor é obrigado a sanar a anulabilidade do contrato, mediante a
expurgação dos ónus ou limitações existentes.
2.
O prazo para a expurgação será fixado pelo tribunal, a requerimento do
comprador.
3.
O vendedor deve ainda promover, à sua custa, o cancelamento de qualquer ónus ou
limitação que conste do registo, mas na realidade não exista.
ARTIGO 908º
(Indemnização em caso de dolo)
Em
caso de dolo, o vendedor, anulado o contrato, deve indemnizar o comprador do
prejuízo que este não sofreria se a compra e venda não tivesse sido celebrada.
ARTIGO 909º
(Indemnização em caso de simples erro)
Nos
casos de anulação fundada em simples erro, o vendedor também é obrigado a
indemnizar o comprador, ainda que não tenha havido culpa da sua parte, mas a
indemnização abrange apenas os danos emergentes do contrato.
ARTIGO 910º
(Não cumprimento da obrigação de fazer convalescer o
contrato)
1.
Se o vendedor se constituir em responsabilidade por não sanar a anulabilidade
do contrato, a correspondente indemnização acresce à que o comprador tenha
direito a receber na conformidade dos artigos precedentes, salvo na parte em
que o prejuízo foi comum.
2.
Mas, no caso previsto no artigo 908º, o comprador escolherá entre a
indemnização dos lucros cessantes pela celebração do contrato que veio a ser
anulado e a dos lucros cessantes pelo facto de não ser sanada a anulabilidade.
ARTIGO 911º
(Redução do preço)
1.
Se as circunstâncias mostrarem que, sem erro ou dolo, o comprador teria
igualmente adquirido os bens, mas por preço inferior, apenas lhe caberá o
direito à redução do preço, em harmonia com a desvalorização resultante dos
ónus ou limitações, além da indemnização que no caso competir.
2.
São aplicáveis à redução do preço os preceitos anteriores, com as necessárias
adaptações.
ARTIGO 912º
(Disposições supletivas)
1.
O disposto nos nºs 1 e 3 do artigo 907º, no artigo 909º e no nº 1 do artigo
910º cede perante estipulação das partes em contrário, a não ser que o vendedor
tenha procedido com dolo e as cláusulas contrárias àquelas normas visem a
beneficiá-lo.
2.
Não obsta à validade das cláusulas derrogadoras destas disposições supletivas a
anulação do contrato de compra e venda por erro ou dolo, segundo as prescrições
desta secção.
SECÇÃO VI
Venda de coisas defeituosas
ARTIGO 913º
(Remissão)
1.
Se a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do
fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou
necessárias para a realização daquele fim, observar-se-á, com as devidas
adaptações, o prescrito na secção precendente, em tudo quanto não seja
modificado pelas disposições dos artigos seguintes.
2.
Quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina,
atender-se-á à função normal das coisas da mesma categoria.
ARTIGO 914º
(Reparação ou substituição da coisa)
O
comprador tem o direito de exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for
necessário e esta tiver natureza fungível, a substituição dela; mas esta
obrigação não existe, se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de
qualidade de que a coisa padece.
ARTIGO 915º
(Indemnização em caso de simples erro)
A
indemnização prevista no artigo 909º também não é devida, se o vendedor se
encontrava nas condições a que se refere a parte final do artigo anterior.
ARTIGO 916º
(Denúncia do defeito)
1.
O comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da
coisa, excepto se este houver usado de dolo.
2.
A denúncia será feita até trinta dias depois de conhecido o defeito e dentro de
seis meses após a entrega da coisa.
3.
Os prazos referidos no número anterior são, respectivamente, de um e de cinco
anos, caso a coisa vendida seja um imóvel.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 917º
(Caducidade da acção)
A
acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no
artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta
seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no nº 2 do artigo
287º.
ARTIGO 918º
(Defeito superveniente)
Se
a coisa, depois de vendida e antes de entregue, se deteriorar, adquirindo
vícios ou perdendo qualidades, ou a venda respeitar a coisa futura ou a coisa
indeterminada de certo género, são aplicáveis as regras relativas ao não
cumprimento das obrigações.
ARTIGO 919º
(Venda sobre amostra)
Sendo
a venda feita sobre amostra, entende-se que o vendedor assegura a existência,
na coisa vendida, de qualidades iguais às da amostra, salvo se da convenção ou
dos usos resultar que esta serve somente para indicar de modo aproximado as
qualidades do objecto.
ARTIGO 920º
(Venda de animais defeituosos)
Ficam
ressalvadas as leis especiais ou, na falta destas, os usos sobre a venda de
animais defeituosos
ARTIGO 921º
(Garantia de bom funcionamento)
1.
Se o vendedor estiver obrigado, por convenção das partes ou por força dos usos,
a garantir o bom funcionamento da coisa vendida, cabe-lhe repará-la, ou
substituí-la quando a substituição for necessária e a coisa tiver natureza
fungível, independentemente de culpa sua ou de erro do comprador.
2.
No silêncio do contrato, o prazo da garantia expira seis meses após a entrega
da coisa, se os usos não estabelecerem prazo maior.
3.
O defeito de funcionamento deve ser denunciado ao vendedor dentro do prazo da
garantia e, salvo estipulação em contrário, até trinta dias depois de
conhecido.
4.
A acção caduca logo que finde o tempo para a denúncia sem o comprador a ter
feito, ou passados seis meses sobre a data em que a denúncia foi efectuada.
ARTIGO 922º
(Coisas que devem ser transportadas)
Na
venda de coisas que devam ser transportadas de um lugar para outro, os prazos
que os artigos 916º e 921º mandam contar a partir da entrega só começam a
correr no dia em que o credor as receber.
SECÇÃO VII
Venda a contento e venda sujeita a
prova
ARTIGO 923º
(Primeira modalidade de venda a contento)
1.
A compra e venda feita sob reserva de a coisa agradar ao comprador vale como
proposta de venda.
2.
A proposta considera-se aceita se, entregue a coisa ao comprador, este não se
pronunciar dentro do prazo da aceitação, nos termos do nº 1 do artigo 228º.
3.
A coisa deve ser facultada ao comprador para exame.
ARTIGO 924º
(Segunda modalidade de venda a contento)
1.
Se as partes estiverem de acordo sobre a resolução da compra e venda no caso de
a coisa não agradar ao comprador, é aplicável ao contrato o disposto nos
artigos 432º e seguintes.
2.
A entrega da coisa não impede a resolução do contrato.
3.
O vendedor pode fixar um prazo razoável para a resolução, se nenhum for estabelecido
pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
ARTIGO 925º
(Venda sujeita a prova)
1.
A venda sujeita a prova considera-se feita sob a condição suspensiva de a coisa
ser idónea para o fim a que é destinada e ter as qualidades asseguradas pelo
vendedor, excepto se as partes a subordinarem a condição resolutiva.
2.
A prova deve ser feita dentro do prazo e segundo a modalidade estabelecida pelo
contrato ou pelos usos; se tanto o contrato como os usos forem omissos,
observar-se-ão o prazo fixado pelo vendedor e a modalidade escolhida pelo
comprador, desde que sejam razoáveis.
3.
Não sendo o resultado da prova comunicado ao vendedor antes de expirar o prazo
a que se refere o número antecedente, a condição tem-se por verificada quando
suspensiva, e por não verificada quando resolutiva.
4.
A coisa deve ser facultada ao comprador para prova.
ARTIGO 926º
(Dúvidas sobre a modalidade da venda)
Em
caso de dúvida sobre a modalidade de venda que as partes escolheram, de entre
as previstas nesta secção, presume-se terem adoptado a primeira.
SECÇÃO VIII
Venda a retro
ARTIGO 927º
(Noção)
Diz-se
a retro a venda em que se reconhece ao vendedor a faculdade de resolver o
contrato.
ARTIGO 928º
(Cláusulas nulas)
1.
É nula, sem prejuízo da validade das outras cláusulas, a estipulação de
pagamento de dinheiro ao comprador ou de qualquer outra vantagem para este,
como contrapartida da resolução.
2.
É igualmente nula, quanto ao excesso, a cláusula que declare o vendedor
obrigado a restituir, em caso de resolução, preço superior ao fixado para a
venda.
ARTIGO 929º
(Prazo para a resolução)
1.
A resolução pode ser exercida dentro de dois ou cinco anos a contar da venda,
conforme esta for de bens móveis ou imóveis, salvo estipulação de prazo mais
curto.
2.
Se as partes convencionarem prazo ou prorrogação de prazo que exceda o limite
de dois ou cinco anos a partir da venda, a convenção considera-se reduzida a
esse preciso limite.
ARTIGO 930º
(Forma da resolução)
A
resolução é feita por meio de notificação judicial ao comprador dentro dos
prazos fixados no artigo antecedente; se respeitar a coisas imóveis, a
resolução será reduzida a escritura pública nos quinze dias imediatos, com ou
sem a intervenção do comprador, sob pena de caducidade do direito.
ARTIGO 931º
(Reembolso do preço e de despesas)
No
silêncio do contrato, a resolução fica igualmente sem efeito se, dentro do
mesmo prazo de quinze dias, o vendedor não fizer ao comprador oferta real das
importâncias líquidas que haja de pagar-lhe a título de reembolso do preço e
das despesas com o contrato e outras acessórias.
ARTIGO 932º
(Efeitos em relação a terceiros)
A
cláusula a retro é oponível a terceiros, desde que a venda tenha por objecto
coisas imóveis, ou coisas móveis sujeitas a registo, e tenha sido registada.
ARTIGO 933º
(Venda de coisa ou direito comum)
Se
for vendida coisa ou direito comum com a cláusula a retro, só em conjunto os
vendedores podem exercer o direito de resolução.
SECÇÃO IX
Venda a prestações
ARTIGO 934º
(Falta de pagamento de uma prestação)
Vendida
a coisa a prestações, com reserva de propriedade, e feita a sua entrega ao
comprador, a falta de pagamento de uma só prestação que não exceda a oitava
parte do preço não dá lugar à resolução do contrato, nem sequer, haja ou não
reserva de propriedade, importa a perda do benefício do prazo relativamente às
prestações seguintes, sem embargo de convenção em contrário.
ARTIGO 935º
(Cláusula penal no caso de o comprador não cumprir)
1.
A indemnização estabelecida em cláusula penal, por o comprador não cumprir, não
pode ultrapassar metade do preço, salva a faculdade de as partes estipularem,
nos termos gerais, a ressarcibilidade de todo o prejuízo sofrido.
2.
A indemnização fixada pelas partes será reduzida a metade do preço, quando
tenha sido estipulada em montante superior, ou quando as prestações pagas
superem este valor e se tenha convencionado a não restituição delas; havendo,
porém, prejuízo excedente e não se tendo estipulado a sua ressarcibilidade,
será ressarcido até ao limite da indemnização convencionada pelas partes .
ARTIGO 936º
(Outros contratos com finalidade equivalente)
1.
O disposto nos dois artigos anteriores é extensivo a todos os contratos pelos
quais se pretenda obter resultado equivalente ao da venda a prestações.
2.
Quando se locar uma coisa, com a cláusula de que se tornará propriedade do
locatário depois de satisfeitas todas as rendas ou alugueres pactuados, a
resolução do contrato por o locatário o não cumprir tem efeito retroactivo,
devendo o locador restituir as importâncias recebidas, sem possibilidade de
convenção em contrário, mas também sem prejuízo do seu direito a indemnização
nos termos gerais e nos do artigo anterior.
SECÇÃO X
Venda sobre documentos
ARTIGO 937º
(Entrega dos documentos)
Na
venda sobre documentos, a entrega da coisa é substituída pela entrega do seu
título representativo e dos outros documentos exigidos pelo contrato ou, no
silêncio deste, pelos usos.
ARTIGO 938º
(Venda de coisa em viagem)
1.
Se o contrato tiver por objecto coisa em viagem e, mencionada esta
circunstância, figurar entre os documentos entregues a apólice de seguro contra
os riscos do transporte, observar-se-ão as regras seguintes, na falta de
estipulação em contrário:
a)
O preço deve ser pago, ainda que a coisa já não existisse quando o contrato foi
celebrado, por se haver perdido casualmente depois de ter sido entregue ao
transportador;
b)
O contrato não é anulável com fundamento em defeitos da coisa, produzidos
casualmente após o momento da entrega;
c)
O risco fica a cargo do comprador desde a data da compra.
2.
As duas primeiras regras do número anterior não têm aplicação se, ao tempo do
contrato, o vendedor já sabia que a coisa estava perdida ou deteriorada e
dolosamente o não revelou ao comprador de boa fé.
3.
Quando o seguro apenas cobrir parte dos riscos, o disposto neste artigo vale
exclusivamente em relação à parte segurada.
SECÇÃO XI
Outros contratos onerosos
ARTIGO 939º
(Aplicabilidade das normas relativas à compra e
venda)
As
normas da compra e venda são aplicáveis aos outros contratos onerosos pelos
quais se alienam bens ou se estabeleçam encargos sobre eles, na medida em que
sejam conformes com a sua natureza e não estejam em contradição com as
disposições legais respectivas.
CAPÍTULO II
Doação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 940º
(Noção)
1.
Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à
custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou
assume uma obrigação, em benefício do outro contraente.
2.
Não há doação na renúncia a direitos e no repúdio de herança ou legado, nem
tão-pouco nos donativos conformes aos usos sociais.
ARTIGO 941º
(Doação remuneratória)
É
considerada doação a liberalidade remuneratória de serviços recebidos pelo
doador, que não tenham a natureza de dívida exigível.
ARTIGO 942º
(Objecto da doação)
1.
A doação não pode abranger bens futuros.
2.
Incidindo, porém, a doação sobre uma universalidade de facto que continue no
uso e fruição do doador, consideram-se doadas, salvo declaração em contrário,
as coisas singulares que venham de futuro a integrar a universalidade.
ARTIGO 943º
(Prestações periódicas)
A
doação que tiver por objecto prestações periódicas extingue-se por morte do
doador.
ARTIGO 944º
(Doação conjunta)
1.
A doação feita a várias pessoas conjuntamente considera-se feita por partes
iguais, sem que haja direito de acrescer entre os donatários, salvo se o doador
houver declarado o contrário.
2.
O disposto no número anterior não prejudica o direito de acrescer entre
usufrutuários, quando o usufruto tenha sido constituído por doação.
ARTIGO 945º
(Aceitação da doação)
1.
A proposta de doação caduca, se não for aceita em vida do doador.
2.
A tradição para o donatário, em qualquer momento, da coisa móvel doada, ou do
seu título representativo, é havida como aceitação.
3.
Se a proposta não for aceita no próprio acto ou não se verificar a tradição nos
termos do número anterior, a aceitação deve obedecer à forma prescrita no
artigo 947º e ser declarada ao doador, sob pena de não produzir os seus
efeitos.
ARTIGO 946º
(Doação por morte)
1.
É proibida a doação por morte, salvo nos casos especialmente previstos na lei.
2.
Será, porém, havida como disposição testamentária a doação que houver de
produzir os seus efeitos por morte do doador, se tiverem sido observadas as
formalidades dos testamentos.
ARTIGO 947º
(Forma da doação)
1.
A doação de coisas imóveis só é válida se for celebrada por escritura pública.
2.
A doação de coisas móveis não depende de formalidade alguma externa, quando
acompanhada de tradição da coisa doada; não sendo acompanhada de tradição da
coisa, só pode ser feita por escrito.
SECÇÃO II
Capacidade para fazer ou receber
doações
ARTIGO 948º
(Capacidade activa)
1.
Têm capacidade para fazer doações todos os que podem contratar e dispor dos
seus bens.
2.
A capacidade é regulada pelo estado em que o doador se encontrar ao tempo da
declaração negocial.
ARTIGO 949º
(Carácter pessoal da doação)
1.
Não é permitido atribuir a outrem, por mandato, a faculdade de designar a
pessoa do donatário ou determinar o objecto da doação, salvo nos casos
previstos no nº 2 do artigo 2182º.
2.
Os representantes legais dos incapazes não podem fazer doações em nome destes.
ARTIGO 950º
(Capacidade passiva)
1.
Podem receber doações todos os que não estão especialmente inibidos de as
aceitar por disposição da lei.
2.
A capacidade do donatário é fixada no momento da aceitação.
ARTIGO 951º
(Aceitação por parte de incapazes)
1.
As pessoas que não têm capacidade para contratar não podem aceitar doações com
encargos senão por intermédio dos seus representantes legais.
2.
Porém, as doações puras feitas a tais pessoas produzem efeitos
independentemente de aceitação em tudo o que aproveite aos donatários.
ARTIGO 952º
(Doações a nascituros)
1.
Os nascituros concebidos ou não concebidos podem adquirir por doação, sendo
filhos de pessoa determinada, viva ao tempo da declaração de vontade do doador.
2.
Na doação feita a nascituro presume-se que o doador reserva para si o usufruto
dos bens doados até ao nascimento do donatário.
ARTIGO 953º
(Casos de indisponibilidade relativa)
É
aplicável às doações, devidamente adaptado, o disposto nos artigos 2192º a
2198º.
SECÇÃO III
Efeitos das doações
ARTIGO 954º
(Efeitos essenciais)
A
doação tem como efeitos essenciais:
a)
A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito;
b)
A obrigação de entregar a coisa;
c)
A assunção da obrigação, quando for esse o objecto do contrato.
ARTIGO 955º
(Entrega da coisa)
1.
A coisa deve ser entregue no estado em que se encontrava ao tempo da aceitação.
2.
A obrigação de entrega abrange, na falta de estipulação em contrário, as partes
integrantes, os frutos pendentes e os documentos relativos à coisa ou direito.
ARTIGO 956º
(Doação de bens alheios)
1.
É nula a doação de bens alheios; mas o doador não pode opor a nulidade ao
donatário de boa fé.
2.
O doador só responde pelo prejuízo causado ao donatário quando este esteja de
boa fé e se verifique algum dos seguintes factos:
a)
Ter o doador assumido expressamente a obrigação de indemnizar o prejuízo;
b)
Ter o doador agido com dolo;
c)
Ter a doação carácter remuneratório;
d)
Ser a doação onerosa ou modal, ficando a responsabilidade do doador limitada,
neste caso, ao valor dos encargos.
3.
É imputável no prejuízo do donatário o valor da coisa ou do direito doado, mas
não os benefícios que ele deixou de obter em consequência da nulidade.
4.
Não havendo lugar a indemnização, o donatário fica sub-rogado nos direitos que
possam competir ao doador relativamente à coisa ou direito doado.
ARTIGO 957º
(Ónus ou vícios do direito ou da coisa doada)
1.
O doador não responde pelos ónus ou limitações do direito transmitido, nem
pelos vícios da coisa, excepto quando se tiver expressamente responsabilizado
ou tiver procedido com dolo.
2.
A doação é, porém, anulável em qualquer caso, a requerimento do donatário de
boa fé.
ARTIGO 958º
(Reserva de usufruto)
1.
O doador tem a faculdade de reservar para si, ou para terceiro, o usufruto dos
bens doados.
2.
Havendo reserva de usufruto em favor de várias pessoas, simultânea ou
sucessivamente, são aplicáveis as disposições dos artigos 1441º e 1442º.
ARTIGO 959º
(Reserva do direito de dispor de coisa determinada)
1.
O doador pode reservar para si o direito de dispor, por morte ou por acto entre
vivos, de alguma ou algumas das coisas compreendidas na doação, ou o direito a
certa quantia sobre os bens doados.
2.
O direito reservado não se transmite aos herdeiros do doador, e, quando
respeite a imóveis, ou móveis sujeitos a registo, carece de ser registado.
ARTIGO 960º
(Cláusula de reversão)
1.
O doador pode estipular a reversão da coisa doada.
2.
A reversão dá-se no caso de o doador sobreviver ao donatário, ou a este e a
todos os seus descendentes; não havendo estipulação em contrário, entende-se
que a reversão só se verifica neste último caso.
3.
A cláusula de reversão que respeite a coisas imóveis, ou a coisas móveis sujeitas
a registo, carece de ser registada.
ARTIGO 961º
(Efeitos da reversão)
Os
bens doados que pela cláusula de reversão regressem ao património do doador
passam livres dos encargos que lhes tenham sido impostos enquanto estiverem em
poder do donatário ou de terceiros a quem tenham sido transmitidos.
ARTIGO 962º
(Substituições fideicomissárias)
1.
São admitidas substituições fideicomissárias nas doações.
2.
A estas substituições são aplicáveis, com as necessárias correcções, os artigos
2286º e seguintes.
ARTIGO 963º
(Cláusulas modais)
1.
As doações podem ser oneradas com encargos.
2.
O donatário não é obrigado a cumprir os encargos senão dentro dos limites do
valor da coisa ou do direito doado.
ARTIGO 964º
(Pagamento de dívidas)
1.
Se a doação for feita com o encargo de pagamento das dívidas do doador,
entender-se-á a cláusula, na falta de outra declaração, como obrigando ao
pagamento das que existirem ao tempo da doação.
2.
Só é legal o encargo do pagamento de dívidas futuras do doador desde que se
determine o seu montante no acto da doação.
ARTIGO 965º
(Cumprimento dos encargos)
Na
doação modal, tanto o doador, ou os seus herdeiros, como quaisquer interessados
têm legitimidade para exigir do donatário, ou dos seus herdeiros, o cumprimento
dos encargos.
ARTIGO 966º
(Resolução da doação)
O
doador, ou os seus herdeiros, também podem pedir a resolução da doação, fundada
no não cumprimento dos encargos, quando esse direito lhes seja conferido pelo
contrato.
ARTIGO 967º
(Condições ou encargos impossíveis ou ilícitos)
As
condições ou encargos física ou legalmente impossíveis, contrários à lei ou à
ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes ficam sujeitos às regras
estabelecidas em matéria testamentária.
ARTIGO 968º
(Confirmação das doações nulas)
Não
pode prevalecer-se da nulidade da doação o herdeiro do doador que a confirme
depois da morte deste ou lhe dê voluntária execução, conhecendo o vício e o
direito à declaração de nulidade.
SECÇÃO IV
Revogação das doações
ARTIGO 969º
(Revogação da proposta de doação)
1.
Enquanto não for aceita a doação, o doador pode livremente revogar a sua
declaração negocial, desde que observe as formalidades desta.
2.
A proposta de doação não caduca pelo decurso dos prazos fixados no nº 1 do
artigo 228º.
ARTIGO 970º
(Revogação da doação)
As
doações são revogáveis por ingratidão do donatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 971º A 973º
(Revogados pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 974º
(Casos de ingratidão)
A
doação pode ser revogada por ingratidão, quando o donatário se torne incapaz,
por indignidade, de suceder ao doador, ou quando se verifique alguma das
ocorrências que justificam a deserdação.
ARTIGO 975º
(Exclusão da revogação)
A
doação não é revogável por ingratidão do donatário:
a)
Sendo feita para casamento;
b)
Sendo remuneratória;
c)
Se o doador houver perdoado ao donatário.
ARTIGO 976º
(Prazo e legitimidade para a acção)
1.
A acção de revogação por ingratidão não pode ser proposta, nem depois da morte
do donatário, nem pelos herdeiros do doador, salvo o caso previsto no nº 3 e
caduca ao cabo de um ano, contado desde o facto que lhe deu causa ou desde que
o doador teve conhecimento desse facto.
2.
Falecido o doador ou o donatário, a acção, quando pendente, é transmissível aos
herdeiros de um ou de outro.
3.
Se o donatário tiver cometido contra o doador o crime de homicídio, ou por
qualquer causa o tiver impedido de revogar a doação, a acção pode ser proposta
pelos herdeiros do doador dentro de um ano a contar da morte deste.
ARTIGO 977º
(Inadmissibilidade de renúncia antecipada)
O
doador não pode antecipadamente renunciar ao direito de revogar a doação por
ingratidão do donatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 978º
(Efeitos da revogação)
1.
Os efeitos da revogação da doação
retrotraem-se à data da proposição da
acção.
2.
Revogada a liberalidade, são os bens doados restituídos ao doador, ou aos seus
herdeiros, no estado em que se encontrarem.
3.
Se os bens tiverem sido alienados ou não puderem ser restituídos em espécie por
outra causa imputável ao donatário, entregará este, ou entregarão os seus
herdeiros, o valor que eles tinham ao tempo em que foram alienados ou se
verificou a impossibilidade de restituição, acrescido dos juros legais a contar
da proposição da acção.
ARTIGO 979º
(Efeitos em relação a terceiros)
A
revogação da doação não afecta terceiros que hajam adquirido, anteriormente à
demanda, direitos reais sobre os bens doados, sem prejuízo das regras relativas
ao registo; neste caso, porém, o donatário indemnizará o doador.
CAPÍTULO III
Sociedade
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 980º
(Noção)
Contrato
de sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com
bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que
não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa
actividade.
ARTIGO 981º
(Forma)
1.
O contrato de sociedade não está sujeito a forma especial, à excepção da que
for exigida pela natureza dos bens com que os sócios entram para a sociedade.
2.
A inobservância da forma, quando esta for exigida, só anula todo o negócio se
este não puder converter-se segundo o disposto no artigo 293º, de modo que à
sociedade fique o simples uso e fruição dos bens cuja transferência determina a
forma especial, ou se o negócio não puder reduzir-se, nos termos do artigo
292º, às demais participações.
ARTIGO 982º
(Alterações do contrato)
1.
As alterações do contrato requerem o acordo de todos os sócios, excepto se o
próprio contrato o dispensar.
2.
Se o contrato conceder direitos especiais a algum dos sócios, não podem os
direitos concedidos ser suprimidos ou coarctados sem o assentimento do
respectivo titular, salvo estipulação expressa em contrário.
SECÇÃO II
Relações entre os sócios
ARTIGO 983º
(Entradas)
1.
Os sócios estão somente obrigados às entradas estabelecidas no contrato.
2.
As entradas dos sócios presumem-se iguais em valor, se este não for determinado
no contrato.
ARTIGO 984º
(Execução da prestação, garantia e risco da coisa)
A
execução da prestação, a garantia e o risco da coisa são regulados nos termos
seguintes:
a)
Se a entrada consistir na transferência ou constituição de um direito real,
pelas normas do contrato de compra e venda;
b)
Se o sócio apenas se obrigar a facultar à sociedade o uso e fruição de uma
coisa, pelas normas do contrato de locação;
c)
Se a entrada consistir na transferência de um crédito ou de uma posição
contratual, pelas normas, respectivamente, da cessão de créditos ou da cessão
da posição contratual, presumindo-se, todavia, que o sócio garante a solvência
do devedor.
ARTIGO 985º
(Administração)
1.
Na falta de convenção em contrário, todos os sócios têm igual poder para
administrar.
2.
Pertencendo a administração a todos os sócios ou apenas a alguns deles,
qualquer dos administradores tem o direito de se opor ao acto que outro
pretenda realizar, cabendo à maioria decidir sobre o mérito da oposição.
3.
Se o contrato confiar a administração a todos ou a vários sócios em conjunto,
entende-se, em caso de dúvida, que as deliberações podem ser tomadas por
maioria.
4.
Salvo estipulação noutro sentido, considera-se tomada por maioria a deliberação
que reúna os sufrágios de mais de metade dos administradores.
5.
Ainda que para a administração em geral, ou para determinada categoria de
actos, seja exigido o assentimento de todos os administradores, ou da maioria
deles, a qualquer dos administradores é lícito praticar os actos urgentes da
administração destinados a evitar à sociedade um dano iminente.
ARTIGO 986º
(Alteração da administração)
1.
A cláusula do contrato que atribuir a administração ao sócio pode ser
judicialmente revogada, a requerimento de qualquer outro, ocorrendo justa
causa.
2.
É permitido incluir no contrato casos especiais de revogação, mas não é lícito
aos interessados afastar a regra do número anterior.
3.
A designação de administradores feita em acto posterior pode ser revogada por
deliberação da maioria dos sócios, sendo em tudo o mais aplicáveis à revogação
as regras do mandato.
ARTIGO 987º
(Direitos e obrigações dos administradores)
1.
Aos direitos e obrigações dos administradores são aplicáveis as normas do
mandato.
2.
Qualquer sócio pode tornar efectiva a responsabilidade a que está sujeito o
administrador.
ARTIGO 988º
(Fiscalização dos sócios)
1.
Nenhum sócio pode ser privado, nem sequer por cláusula do contrato, do direito
de obter dos administradores as informações de que necessite sobre os negócios
da sociedade, de consultar os documentos a eles pertinentes e de exigir a
prestação de contas.
2.
As contas são prestadas no fim de cada ano civil, salvo se outra coisa for
estipulada no contrato, ou se for inferior a um ano a duração prevista para a
sociedade.
ARTIGO 989º
(Uso das coisas sociais)
O
sócio não pode, sem consentimento unânime dos consócios, servir-se das coisas
sociais para fins estranhos à sociedade.
ARTIGO 990º
(Proibição de concorrência)
O
sócio que, sem expressa autorização de todos os outros, exercer, por conta
própria ou alheia, actividade igual à da sociedade fica responsável pelos danos
que lhe causar, podendo ainda ser excluído, nos termos da alínea a) do artigo
1003º.
ARTIGO 991º
(Distribuição periódica dos lucros)
Se
os contraentes nada tiverem declarado sobre o destino dos lucros de cada
exercício, os sócios têm direito a que estes lhes sejam atribuídos nos termos
fixados no artigo imediato, depois de deduzidas as quantias afectadas, por
deliberação da maioria, à prossecução dos fins sociais.
ARTIGO 992º
(Distribuição dos lucros e das perdas)
1.
Na falta de convenção em contrário, os sócios participam nos lucros e perdas da
sociedade segundo a proporção das respectivas entradas.
2.
No silêncio do contrato, os sócios de indústria não respondem, nas relações
internas, pelas perdas sociais.
3.
Se o contrato não fixar o quinhão do sócio de indústria nos lucros nem o valor
da sua contribuição, será o quinhão deste estimado pelo tribunal segundo juízos
de equidade; do mesmo modo se avaliará a parte nos lucros e perdas do sócio que
apenas se obrigou a facultar à sociedade o uso e fruição de uma coisa.
4.
Se o contrato determinar somente a parte de cada sócio nos lucros,
presumir-se-á ser a mesma a sua parte nas perdas.
ARTIGO 993º
(Divisão deferida a terceiro)
1.
Convencionando-se que a divisão dos ganhos e perdas seja feita por terceiro,
deve este fazê-la segundo juízos de equidade, sempre que não haja estipulação
em contrário; se a divisão não puder ser feita ou não tiver sido feita no tempo
devido, sê-lo-á pelo tribunal, segundo os mesmos juízos.
2.
Qualquer sócio tem o direito de impugnar a divisão feita por terceiro, no prazo
de seis meses a contar do dia em que ela chegou ao seu conhecimento.
3.
Porém, a recepção dos respectivos lucros extingue o direito à impugnação, salvo
se anteriormente se protestou contra a divisão, ou se, ao tempo do recebimento,
eram desconhecidas as causas da impugnabilidade.
ARTIGO 994º
(Pacto leonino)
É
nula a cláusula que exclui um sócio da comunhão nos lucros ou que o isenta de
participar nas perdas da sociedade, salvo o disposto no nº 2 do artigo 992º.
ARTIGO 995º
(Cessão de quotas)
1.
Nenhum sócio pode ceder a terceiro a sua quota sem consentimento de todos os
outros.
2.
A cessão de quotas está sujeita à forma exigida para a transmissão dos bens da
sociedade.
SECÇÃO III
Relações com terceiros
ARTIGO 996º
(Representação da sociedade)
1.
A sociedade é representada em juízo e fora dele pelos seus administradores, nos
termos do contrato ou de harmonia com as regras fixadas no artigo 985º.
2.
Quando não estiverem sujeitas a registo, as deliberações sobre a extinção ou
modificação dos poderes dos administradores não são oponíveis a terceiros que,
sem culpa, as ignoravam ao tempo em que contrataram com a sociedade;
considera-se sempre culposa a ignorância, se à deliberação foi dada a
publicidade conveniente.
ARTIGO 997º
(Responsabilidade pelas obrigações sociais)
1.
Pelas dívidas sociais respondem a sociedade e, pessoal e solidariamente, os
sócios.
2.
Porém, o sócio demandado para pagamento dos débitos da sociedade pode exigir a
prévia excussão do património social.
3.
A responsabilidade dos sócios que não sejam administradores pode ser
modificada, limitada ou excluída por cláusula expressa do contrato, excepto no
caso de a administração competir unicamente a terceiras pessoas; se a cláusula
não estiver sujeita a registo, é aplicável, quanto à sua oponibilidade a
terceiros, o disposto no nº 2 do artigo anterior.
4.
O sócio não pode eximir-se à responsabilidade por determinada dívida a pretexto
de esta ser anterior à sua entrada para a sociedade.
ARTIGO 998º
(Resposabilidade por factos ilícitos)
1.
A sociedade responde civilmente pelos actos ou omissões dos seus
representantes, agentes ou mandatários, nos mesmos termos em que os comitentes
respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários.
2.
Não podendo o lesado ressarcir-se completamente, nem pelos bens da sociedade,
nem pelo património do representante, agente ou mandatário, ser-lhe-á lícito
exigir dos sócios o que faltar, nos mesmos termos em que o poderia fazer
qualquer credor social.
ARTIGO 999º
(Credor particular do sócio)
1.
Enquanto se não dissolver a sociedade, e sendo suficientes outros bens do
devedor, o credor particular do sócio apenas pode executar o direito deste aos
lucros e à quota de liquidação.
2.
Se os outros bens do devedor forem insuficientes, o credor pode exigir a
liquidação da quota do devedor nos termos do artigo 1021º.
ARTIGO 1000º
(Compensação)
Não
é admitida compensação entre aquilo que um terceiro deve à sociedade e o
crédito dele sobre algum dos sócios, nem entre o que a sociedade deve a
terceiro e o crédito que sobre este tenha algum dos sócios.
SECÇÃO IV
Morte, exoneração ou exclusão de sócios
ARTIGO 1001º
(Morte de um sócio)
1.
Falecendo um sócio, se o contrato nada estipular em contrário, deve a sociedade
liquidar a sua quota em benefício dos herdeiros; mas os sócios supérstites têm
a faculdade de optar pela dissolução da sociedade, ou pela sua continuação com
os herdeiros se vierem a acordo com eles.
2.
A opção pela dissolução da sociedade
só é oponível aos herdeiros do sócio
falecido se lhes for comunicada dentro de sessenta dias, a contar do
conhecimento da morte pelos sócios supérstites.
3.
Sendo dissolvida a sociedade, os herdeiros assumem todos os direitos inerentes,
na sociedade em liquidação, à quota do sócio falecido.
4.
Sendo os herdeiros chamados à sociedade, podem livremente dividir entre si o
quinhão do seu antecessor ou encabeçá-lo em algum ou alguns deles.
ARTIGO 1002º
(Exoneração)
1.
Todo o sócio tem o direito de se exonerar da sociedade, se a duração desta não
tiver sido fixada no contrato; não se considera, para este efeito, fixada no
contrato a duração da sociedade, se esta tiver sido constituída por toda a vida
de um sócio ou por período superior a trinta anos.
2.
Havendo fixação de prazo, o direito de exoneração só pode ser exercido nas
condições previstas no contrato ou quando ocorra justa causa.
3.
A exoneração só se torna efectiva no fim do ano social em que é feita a
comunicação respectiva, mas nunca antes de decorridos três meses sobre esta
comunicação.
4.
As causas legais de exoneração não podem ser suprimidas ou modificadas; a
supressão ou modificação das causas contratuais depende do acordo de todos os
sócios.
ARTIGO 1003º
(Exclusão)
A
exclusão de um sócio pode dar-se nos casos previstos no contrato, e ainda nos
seguintes:
a)
Quando lhe seja imputável violação grave das obrigações para com a sociedade;
b)
Em caso de interdição ou inabilitação;
c)
Quando, sendo sócio de indústria, se impossibilite de prestar à sociedade os
serviços a que ficou obrigado;
d)
Quando, por causa não imputável aos administradores, se verifique o perecimento
da coisa ou direito que constituía a entrada do sócio, nos termos do artigo
seguinte.
ARTIGO 1004º
(Perecimento superveniente da coisa)
O
perecimento superveniente da coisa é fundamento de exclusão do sócio:
a)
Se a entrada consistir na transferência ou constituição de um direito real
sobre a coisa e esta perecer antes da entrega;
b)
Se o sócio entrou para a sociedade apenas com o uso e fruição da coisa perdida.
ARTIGO 1005º
(Deliberação sobre a exclusão)
1.
A exclusão depende do voto da maioria dos sócios, não incluindo no número
destes o sócio em causa, e produz efeitos decorridos trinta dias sobre a data
da respectiva comunicação ao excluído.
2.
O direito de oposição do sócio excluído caduca decorrido o prazo referido no
número anterior.
3.
Se a sociedade tiver apenas dois sócios, a exclusão de qualquer deles só pode
ser pronunciada pelo tribunal.
ARTIGO 1006º
(Eficácia da exoneração ou exclusão)
1.
A exoneração ou exclusão não isenta o sócio da responsabilidade em face de
terceiros pelas obrigações sociais contraídas até ao momento em que a
exoneração ou exclusão produzir os seus efeitos.
2.
A exoneração e a exclusão que não estejam sujeitas a registo não são oponíveis
a terceiros que, sem culpa, as ignoravam ao tempo em que contrataram com a
sociedade; considera-se sempre culposa a ignorância, se ao acto foi dada a
publicidade conveniente.
SECÇÃO V
Dissolução da sociedade
ARTIGO 1007º
(Causas de dissolução)
A
sociedade dissolve-se:
a)
Por acordo dos sócios;
b)
Pelo decurso do prazo fixado no contrato, não havendo porrogação;
c)
Pela realização do objecto social, ou por este se tornar impossível;
d)
Por se extinguir a pluralidade dos sócios, se no prazo de seis meses não for
reconstituída;
e)
Por decisão judicial que declare a sua insolvência;
f)
Por qualquer outra causa prevista no contrato.
ARTIGO 1008º
(Dissolução por acordo. Prorrogação do prazo)
1.
A dissolução por acordo depende do voto unânime dos sócios, a não ser que o
contrato permita a modificação das suas cláusulas ou a dissolução da sociedade
por simples voto maioritário.
2.
A prorrogação do prazo fixado no contrato pode ser validamente convencionada
até à partilha; considera-se tacitamente prorrogada a sociedade, por tempo
indeterminado, se os sócios continuaram a exercer a actividade social, salvo se
das circunstâncias resultar que não houve essa intenção.
ARTIGO 1009º
(Poderes dos administradores depois da dissolução)
1.
Dissolvida a sociedade, os poderes dos administradores ficam limitados à
prática dos actos meramente conservatórios e, no caso de não terem sido
nomeados liquidatários, dos actos necessários à liquidação do património
social.
2.
Pelas obrigações que os administradores assumam contra o disposto no número
anterior, a sociedade e os outros sócios só respondem perante terceiros se
estes estavam de boa fé ou, no caso de ser obrigatório o registo da dissolução,
se este não tiver sido efectuado; nos restantes casos, respondem solidariamente
os administradores que tenham assumido aquelas obrigações.
SECÇÃO VI
Liquidação da sociedade e de quotas
ARTIGO 1010º
(Liquidação da sociedade)
Dissolvida
a sociedade, procede-se à liquidação do seu património.
ARTIGO 1011º
(Forma da liquidação)
1.
Se não estiver fixada no contrato, a forma da liquidação é regulada pelos
sócios; na falta de acordo de todos, observar-se-ão as disposições dos artigos
subsequentes e as das leis de processo.
2.
Se o prazo para a liquidação não estiver determinado, qualquer sócio ou credor
pode requerer a sua determinação pelo tribunal.
ARTIGO 1012º
(Liquidatários)
1.
A liquidação compete aos administradores.
2.
Se o contrato confiar aos sócios a nomeação dos liquidatários e o acordo se
revelar impossível, será a falta deste suprida pelo tribunal, por iniciativa de
qualquer sócio ou credor.
ARTIGO 1013º
(Posição dos liquidatários)
1.
A posição dos liquidatários é idêntica à dos administradores, com as
modificações constantes dos artigos seguintes.
2.
Salvo acordo dos sócios em contrário, as decisões dos liquidatários são tomadas
por maioria.
ARTIGO 1014º
(Termos iniciais da liquidação)
1.
Se os liquidatários não forem os administradores, devem exigir destes a entrega
dos bens e dos livros e documentos da sociedade, bem como as contas relativas
ao último período de gestão; na falta de entrega, esta deve ser requerida ao
tribunal.
2.
É obrigatória a organização de um
inventário que dê a conhecer a situação do
património social; o inventário é elaborado
conjuntamente por administradores e
liquidatários.
ARTIGO 1015º
(Poderes dos liquidatários)
Cabe
aos liquidatários praticar todos os actos necessários à liquidação do
património social, ultimando os negócios pendentes, cobrando os créditos,
alienando os bens e pagando aos credores.
ARTIGO 1016º
(Pagamento do passivo)
1.
É defeso aos liquidatários proceder à partilha dos bens sociais enquanto não
tiverem sido pagos os credores da sociedade ou consignadas as quantias
necessárias.
2.
Quando os bens da sociedade não forem suficientes para liquidação do passivo,
os liquidatários podem exigir dos sócios, além das entradas em dívida, as
quantias necessárias, em proporção da parte de cada um nas perdas e dentro dos
limites da respectiva responsabilidade; se, porém, algum sócio se encontrar
insolvente, será a sua parte dividida pelos demais, nos termos referidos.
ARTIGO 1017º
(Restituição dos bens atribuídos em uso e fruição)
1.
O sócio que tiver entrado para a sociedade com o uso e fruição de certos bens
tem o direito de os levantar no estado em que se encontrarem.
2.
Se os bens se houverem perdido ou deteriorado por causa imputável aos
administradores, são estes e a sociedade solidariamente responsáveis pelos
danos.
ARTIGO 1018º
(Partilha)
1.
Extintas as dívidas sociais, o activo restante é destinado em primeiro lugar ao
reembolso das entradas efectivamente realizadas, exceptuadas as contribuições
de serviços e as de uso e fruição de certos bens.
2.
Se não puder ser feito o reembolso integral, o activo existente é distribuído
pelos sócios, por forma que a diferença para menos recaia em cada um deles na
proporção da parte que lhe competir nas perdas da sociedade; se houver saldo
depois de feito o reembolso, será repartido por eles na proporção da parte que
lhes caiba nos lucros.
3.
As entradas que não sejam de dinheiro são estimadas no valor que tinham à data
da constituição da sociedade, se não lhes tiver sido atribuído outro no
contrato.
4.
Ainda que o contrato o não preveja, podem os sócios acordar em que a partilha
dos bens se faça em espécie.
ARTIGO 1019º
(Regresso à actividade social)
1.
Enquanto não se ultimarem as partilhas, podem os sócios retomar o exercício da
actividade social, desde que o resolvam por unanimidade.
2.
Se, porém, a dissolução tiver resultado de causa imperativa, é necessário que
tenham cessado as circunstâncias que a determinaram.
ARTIGO 1020º
(Responsabilidade dos sócios após a liquidação)
Encerrada
a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios continuam responsáveis
perante terceiros pelo pagamento dos débitos que não tenham sido saldados, como
se não tivesse havido liquidação.
ARTIGO 1021º
(Liquidação de quotas)
1.
Nos casos de morte, exoneração ou exclusão de um sócio, o valor da sua quota é
fixado com base no estado da sociedade à data em que ocorreu ou produziu
efeitos o facto determinante da liquidação; se houver negócios em curso, o
sócio ou os herdeiros participarão nos lucros e perdas deles resultantes.
2.
Na avaliação da quota observar-se-ão, com as adaptações necessárias, as regras
dos nºs 1 a 3 do artigo 1018º, na parte em que forem aplicáveis.
3.
O pagamento do valor da liquidação deve ser feito, salvo acordo em contrário,
dentro do prazo de seis meses, a contar do dia em que tiver ocorrido ou
produzido efeitos o facto determinante da liquidação.
CAPÍTULO IV
Locação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1022º
(Noção)
Locação
é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo
temporário de uma coisa, mediante retribuição.
ARTIGO 1023º
(Arrendamento e aluguer)
A
locação diz-se arrendamento quando versa sobre coisa imóvel, aluguer quando
incide sobre coisa móvel.
ARTIGO 1024º
(A locação como acto de administração)
1.
A locação constitui, para o locador, um acto de administração ordinária,
excepto quando for celebrada por prazo superior a seis anos.
2
- O arrendamento de prédio indiviso feito pelo consorte ou consortes
administradores
só
é válido quando os restantes comproprietários manifestem, por escrito e antes
ou
ARTIGO 1025º
(Duração máxima)
A
locação não pode celebrar-se por mais de trinta anos; quando estipulada por
tempo superior, ou como contrato perpétuo, considera-se reduzida àquele limite.
ARTIGO 1026º
(Prazo supletivo)
Na
falta de estipulação, entende-se que o prazo de duração do contrato é igual à
unidade de tempo a que corresponde a retribuição fixada, salvas as disposições
especiais deste código.
ARTIGO 1027º
(Fim do contrato)
Se
do contrato e respectivas circunstâncias não resultar o fim a que a coisa
locada se destina, é permitido ao locatário aplicá-la a quaisquer fins lícitos,
dentro da função normal das coisas de igual natureza.
ARTIGO 1028º
(Pluralidade de fins)
1.
Se uma ou mais coisas forem locadas para fins diferentes, sem subordinação de
uns a outros, observar-se-á, relativamente a cada um deles, o regime
respectivo.
2.
As causas de nulidade, anulabilidade ou resolução que respeitem a um dos fins
não afectam a parte restante da locação, excepto se do contrato ou das
circunstâncias que o acompanham não resultar a discriminação das coisas ou
partes da coisa correspondentes às várias finalidades, ou estas forem
solidárias entre si.
3.
Se, porém, um dos fins for principal e os outros subordinados, prevalecerá o
regime correspondente ao fim principal; os outros regimes só são aplicáveis na
medida em que não contrariem o primeiro e a aplicação deles se não mostre
incompatível com o fim principal.
ARTIGO 1029º
Revogado pelo NRAU (Lei 6/2006, de 27/02)
(Exigência de escritura pública)
1.
Devem ser reduzidos a escritura pública:
a)
Os arrendamentos sujeitos a registo;
b)
Os arrendamentos para o comércio, indústria ou exercício de profissão liberal.
2.
No caso da alínea a) do número anterior, a falta de escritura pública ou do
registo não impede que o contrato se considere validamente celebrado e
plenamente eficaz pelo prazo máximo por que o poderia ser sem a exigência de
escritura e de registo.
(Redacção do Dec.-Lei 321-B/90, de 15-10)
ARTIGO 1030º
(Encargos da coisa locada)
Os
encargos da coisa locada, sem embargo de estipulação em contrário, recaem sobre
o locador, a não ser que a lei os imponha ao locatário.
SECÇÃO II
Obrigações do locador
ARTIGO 1031º
(Enumeração)
São
obrigações do locador:
a)
Entregar ao locatário a coisa locada;
b)
Assegurar-lhe o gozo desta para os fins a que a coisa se destina.
ARTIGO 1032º
(Vício da coisa locada)
Quando
a coisa locada apresentar vício que lhe não permita realizar cabalmente o fim a
que é destinada, ou carecer de qualidades necessárias a esse fim ou asseguradas
pelo locador, considera-se o contrato não cumprido:
a)
Se o defeito datar, pelo menos, do momento da entrega e o locador não provar
que o desconhecia sem culpa;
b)
Se o defeito surgir posteriormente à entrega, por culpa do locador.
ARTIGO 1033º
(Casos de irresponsabilidade do locador)
O
disposto no artigo anterior não é aplicável:
a)
Se o locatário conhecia o defeito quando celebrou o contrato ou recebeu a
coisa;
b)
Se o defeito já existia ao tempo da celebração do contrato e era facilmente
reconhecível, a não ser que o locador tenha assegurado a sua inexistência ou
usado de dolo para o ocultar;
c)
Se o defeito for da responsabilidade do locatário;
d)
Se este não avisou do defeito o locador, como lhe cumpria.
ARTIGO 1034º
(Ilegitimidade do locador ou deficiência do seu
direito)
1.
São aplicáveis as disposições dos dois artigos anteriores:
a)
Se o locador não tiver a faculdade de proporcionar a outrem o gozo da coisa
locada;
b)
Se o seu direito não for de propriedade ou estiver sujeito a algum ónus ou
limitação que exceda os limites normais inerentes a este direito;
c)
Se o direito do locador não possuir os atributos que ele assegurou ou estes
atributos cessarem posteriormente por culpa dele.
2.
As circunstâncias descritas no número antecedente só importam a falta de
cumprimento do contrato quando determinarem a privação, definitiva ou
temporária, do gozo da coisa ou a diminuição dele por parte do locatário.
ARTIGO 1035º
(Anulabilidade por erro ou dolo)
O
disposto nos artigos 1032º e 1034º não obsta à anulação do contrato por erro ou
por dolo, nos termos gerais.
ARTIGO 1036º
(Reparações ou outras despesas urgentes)
1.
Se o locador estiver em mora quanto à obrigação de fazer reparações ou outras
despesas, e umas ou outras, pela sua urgência, se não compadecerem com as
delongas do procedimento judicial, tem o locatário a possibilidade de fazê-las
extrajudicialmente, com direito ao seu reembolso.
2.
Quando a urgência não consinta qualquer dilação, o locatário pode fazer as
reparações ou despesas, também com direito a reembolso, independentemente de
mora do locador, contanto que o avise ao mesmo tempo.
ARTIGO 1037º
(Actos que impedem ou diminuem o gozo da coisa)
1.
Não obstante convenção em contrário, o locador não pode praticar actos que
impeçam ou diminuam o gozo da coisa pelo locatário, com excepção dos que a lei
ou os usos facultem ou o próprio locatário consinta em cada caso, mas não tem
obrigação de assegurar esse gozo contra actos de terceiro.
2.
O locatário que for privado da coisa ou perturbado no exercício dos seus
direitos pode usar, mesmo contra o locador, dos meios facultados ao possuidor
nos artigos 1276º e seguintes.
SECÇÃO III
Obrigações do locatário
SUBSECÇÃO I
Disposição geral
ARTIGO 1038º
(Enumeração)
São
obrigações do locatário:
a)
Pagar a renda ou aluguer;
b)
Facultar ao locador o exame da coisa locada;
c)
Não aplicar a coisa a fim diverso daqueles a que ela se destina;
d)
Não fazer dela uma utilização imprudente;
e)
Tolerar as reparações urgentes, bem como quaisquer obras ordenadas pela
autoridade pública;
f)
Não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cessão
onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, excepto se
a lei o permitir ou o locador o autorizar;
g)
Comunicar ao locador, dentro de quinze dias, a cedência do gozo da coisa por
algum dos referidos títulos, quando permitida ou autorizada;
h)
Avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vícios na
coisa, ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos
em relação a ela, desde que o facto seja ignorado pelo locador;
i)
Restituir a coisa locada findo o contrato.
SUBSECÇÃO II
Pagamento da renda ou aluguer
ARTIGO 1039º
(Tempo e lugar do pagamento)
1.
O pagamento da renda ou aluguer deve ser efectuado no último dia de vigência do
contrato ou do período a que respeita, e no domicílio do locatário à data do
vencimento, se as partes ou os usos não fixarem outro regime.
2.
Se a renda ou aluguer houver de ser pago no domicílio, geral ou particular, do
locatário ou de procurador seu, e o pagamento não tiver sido efectuado,
presume-se que o locador não veio nem mandou receber a prestação no dia do
vencimento.
ARTIGO 1040º
(Redução da renda ou aluguer)
1.
Se, por motivo não atinente à sua pessoa ou à dos seus familiares, o locatário
sofrer privação ou diminuição do gozo da coisa locada, haverá lugar a uma
redução da renda ou aluguer proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à
extensão desta, sem prejuízo do disposto na secção anterior.
2.
Mas, se a privação ou diminuição não for imputável ao locador nem aos seus
familiares, a redução só terá lugar no caso de uma ou outra exceder um sexto da
duração do contrato.
3.
Consideram-se familiares os parentes, afins ou serviçais que vivam
habitualmente em comunhão de mesa e habitação com o locatário ou o locador.
ARTIGO 1041º
(Mora do locatário)
1.
Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além
das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for
devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento.
2.
Cessa o direito à indemnização ou à resolução do contrato, se o locatário fizer
cessar a mora no prazo de oito dias a contar do seu começo.
3.
Enquanto não forem cumpridas as obrigações a que o nº 1 se refere, o locador
tem o direito de recusar o recebimento das rendas ou alugueres seguintes, os
quais são considerados em dívida para todos os efeitos.
4.
A recepção de novas rendas ou alugueres não priva o locador do direito à
resolução do contrato ou à indemnização referida, com base nas prestações em
mora.
(Redacção do Dec.-Lei 293/77, de 20-7)
Artigo
1042.º *
Cessação
da mora
1
- O locatário pode pôr fim à mora oferecendo ao locador o pagamento das rendas
ou
alugueres
em atraso, bem como a indemnização fixada no n.º 1 do artigo anterior.
2
- Perante a recusa do locador em receber as correspondentes importâncias, pode
o
(Redacção Anterior: ARTIGO 1042º
(Depósito das rendas ou alugueres em atraso)
2.
O depósito, quando abranja a indemnização, envolve da parte do locatário o
reconhecimento de que caíra em mora, salvo se for feito condicionalmente; mas
este preceito não se aplica à oferta do pagamento.)
SUBSECÇÃO III
Restituição da coisa locada
ARTIGO 1043º
(Dever de manutenção e restituição da coisa)
1.
Na falta de convenção, o locatário é obrigado a manter e restituir a coisa no
estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente
utilização, em conformidade com os fins do contrato.
2.
Presume-se que a coisa foi entregue ao locatário em bom estado de manutenção,
quando não exista documento onde as partes tenham descrito o estado dela ao
tempo da entrega.
ARTIGO 1044º
(Perda ou deterioração da coisa)
O
locatário responde pela perda ou deteriorações da coisa, não exceptuadas no
artigo anterior, salvo se resultarem de causa que lhe não seja imputável nem a
terceiro a quem tenha permitido a utilização dela.
ARTIGO 1045º
(Indemnização pelo atraso na restituição da coisa)
1.
Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o
contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao
momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado,
excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.
2.
Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao
dobro.
ARTIGO 1046º
(Indemnização de despesas e levantamento de
benfeitorias)
1.
Fora dos casos previstos no artigo 1036º, e salvo estipulação em contrário, o
locatário é equiparado ao possuidor de má fé quanto a benfeitorias que haja
feito na coisa locada.
2.
Tratando-se de aluguer de animais, as despesas de alimentação destes correm
sempre, na falta de estipulação em contrário, por conta do locatário.
SECÇÃO IV
Resolução e caducidade do contrato
SUBSECÇÃO I
Resolução
Artigo
1047.º *
Resolução
Redacção Anterior: ARTIGO 1047º
(Falta de cumprimento por parte do locatário)
ARTIGO 1048º *
(Falta de pagamento da renda ou aluguer)
1
- O direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer
caduca
2
- Em fase judicial, o locatário só pode fazer uso da faculdade referida no
número
Redacção anterior do parágrafo único do artigo 1048º: O
direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer
caduca logo que o locatário, até à contestação da acção destinada a fazer valer
esse direito, pague ou deposite as somas devidas e a indemnização referida no
nº 1 do artigo 1041º.
ARTIGO 1049º
(Cedência do gozo da coisa)
O
locador não tem direito à resolução do contrato com fundamento na violação do
disposto nas alíneas f) e g) do artigo 1038º, se tiver reconhecido o
beneficiário da cedência como tal, ou ainda, no caso da alínea g), se a
comunicação lhe tiver sido feita por este.
(Resolução do contrato pelo locatário)
O
locatário pode resolver o contrato, independentemente de responsabilidade do
locador:
a)
Se, por motivo estranho à sua própria pessoa ou à dos seus familiares, for
privado do gozo da coisa, ainda que só temporariamente;
b)
Se na coisa locada existir ou sobrevier defeito que ponha em perigo a vida ou a
saúde do locatário ou dos seus familiares.
Caducidade
ARTIGO 1051º
(Casos de caducidade)
1.
O contrato de locação caduca:
a)
Findo o prazo estipulado ou estabelecido por lei;
b)
Verificando-se a condição a que as partes o subordinaram, ou tornando-se certo
que não pode verificar-se, conforme a condição seja resolutiva ou suspensiva;
c)
Quando cesse o direito ou findem os poderes legais de administração com base
nos quais o contrato foi celebrado;
d)
Por morte do locatário ou, tratando-se de pessoa colectiva, pela extinção
desta, salvo convenção escrita em contrário;
e)
Pela perda da coisa locada;
com
a subsistência do contrato; *
(Redacção do Dec.-Lei 321-B/90, de 15-10)
*alíneas f e g com Redacção do NRAU (Lei 6/2006, de 27/02)
ARTIGO 1052º
(Excepções)
O
contrato de locação não caduca:
a)
Se for celebrado pelo usufrutuário e a propriedade se consolidar na sua mão;
b)
Se o usufrutuário alienar o seu direito ou renunciar a ele, pois nestes casos o
contrato só caduca pelo termo normal do usfruto;
c)
Se for celebrado pelo cônjuge administrador.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1053º *
(Despejo do prédio)
Em
qualquer dos casos de caducidade previstos nas alíneas b) e seguintes do artigo
* Redacção do NRAU (Lei 6/2006, de 27/02)
Redacção anterior do artigo 1053º: Em
qualquer dos casos de caducidade previstos nas alíneas b) e seguintes do artigo
1051º, a restituição do prédio, tratando-se de arrendamento, só pode ser
exigida passados três meses sobre a verificação do facto que determina a
caducidade ou, sendo o arrendamento rural, no fim do ano agrícola em curso no
termo do referido prazo.
ARTIGO 1054º
(Renovação do contrato)
1
- Findo o prazo do arrendamento, o contrato renova-se por períodos sucessivos
se
nenhuma
das partes se tiver oposto à renovação no tempo e pela forma convencionados
2.
O prazo da renovação é igual ao do contrato; mas é apenas de um ano, se o prazo
do contrato for mais longo.
ARTIGO 1055º
(Denúncia)
1
- A oposição à renovação tem de ser comunicada ao outro contraente com a
a)
Seis meses, se o prazo for igual ou superior a seis anos;
ARTIGO 1056º
(Outra causa de renovação)
Se,
não obstante a caducidade do arrendamento, o locatário se mantiver no gozo da
coisa pelo lapso de um ano, sem oposição do locador, o contrato considera-se
igualmente renovado nas condições do artigo 1054º.
SECÇÃO V
Transmissão da posição contratual
ARTIGO 1057º
(Transmissão da posição do locador)
O
adquirente do direito com base no qual foi celebrado o contrato sucede nos
direitos e obrigações do locador, sem prejuízo das regras do registo.
ARTIGO 1058º
(Liberação ou cessão de rendas ou alugueres)
A
liberação ou cessão de rendas ou alugueres não vencidos é inoponível ao
sucessor entre vivos do locador, na medida em que tais rendas ou alugueres
respeitem a períodos de tempo não decorridos à data da sucessão.
ARTIGO 1059º
(Transmissão da posição do locatário)
1.
A posição contratual do locatário é transmissível por morte dele ou, tratando-se
de pessoa colectiva, pela extinção desta, se assim tiver sido convencionado por
escrito.
2.
A cessão da posição do locatário está sujeita ao regime geral dos artigos 424º
e seguintes, sem prejuízo das disposições especiais deste capítulo.
SECÇÃO VI
Sublocação
ARTIGO 1060º
(Noção)
A
locação diz-se sublocação, quando o locador a celebra com base no direito de
locatário que lhe advém de um precedente contrato locativo.
ARTIGO 1061º
(Efeitos)
A
sublocação só produz efeitos em relação ao locador ou a terceiros a partir do
seu reconhecimento pelo locador ou da comunicação a que se refere a alínea g)
do artigo 1038º.
ARTIGO 1062º
(Limite da renda ou aluguer)
O
locatário não pode cobrar do sublocatário renda ou aluguer superior ou
proporcionalmente superior ao que é devido pelo contrato de locação, aumentado
de vinte por cento, salvo se outra coisa tiver sido convencionada com o
locador.
ARTIGO 1063º
(Direitos do locador em relação ao sublocatário)
Se
tanto o locatário como o sublocatário estiverem em mora quanto às respectivas
dívidas de renda ou aluguer, é lícito ao locador exigir do sublocatário o que
este dever, até ao montante do seu próprio crédito.
SECÇÃO
VII
Arrendamento
de prédios urbanos
SUBSECÇÃO
I
Disposições
gerais
Artigo
1064.º
Âmbito
A
presente secção aplica-se ao arrendamento, total ou parcial, de prédios urbanos
e,
ainda,
a outras situações nela previstas.
Artigo
1065.º
Imóveis
mobilados e acessórios
A
locação de imóveis mobilados e seus acessórios presume-se unitária, originando
uma
única
renda e submetendo-se à presente secção.
Artigo
1066.º
Arrendamentos
mistos
1
- O arrendamento conjunto de uma parte urbana e de uma parte rústica é havido
por
urbano
quando essa seja a vontade dos contratantes.
2
- Na dúvida, atende-se, sucessivamente, ao fim principal do contrato e à renda
que os
contratantes
tenham atribuído a cada uma delas.
3
- Na falta ou insuficiência de qualquer dos critérios referidos no número
anterior, o
arrendamento
tem-se por urbano.
Artigo
1067.º
Fim
do contrato
1
- O arrendamento urbano pode ter fim habitacional ou não habitacional.
2
- Quando nada se estipule, o local arrendado pode ser gozado no âmbito das suas
aptidões,
tal como resultem da licença de utilização.
3
- Na falta de licença de utilização, o arrendamento vale como habitacional se o
local
for
habitável ou como não habitacional se o não for, salvo se outro destino lhe
tiver
vindo
a ser dado.
Artigo
1068.º
Comunicabilidade
O
direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de
acordo
com
o regime de bens vigente.
SUBSECÇÃO
II
Celebração
Artigo
1069.º
Forma
O
contrato de arrendamento urbano deve ser celebrado por escrito desde que tenha
duração
superior a seis meses.
Artigo
1070.º
Requisitos
de celebração
1
- O arrendamento urbano só pode recair sobre locais cuja aptidão para o fim do
contrato
seja atestada pelas entidades competentes, designadamente através de licença
de
utilização, quando exigível.
2
- Diploma próprio regula o requisito previsto no número anterior e define os
elementos
que o contrato de arrendamento urbano deve conter.
SUBSECÇÃO
III
Direitos
e obrigações das partes
DIVISÃO
I
Obrigações
não pecuniárias
Artigo
1071.º
Limitações
ao exercício do direito
Os
arrendatários estão sujeitos às limitações impostas aos proprietários de coisas
imóveis,
tanto nas relações de vizinhança como nas relações entre arrendatários de
partes
de uma mesma coisa.
Artigo
1072.º
Uso
efectivo do locado
1
- O arrendatário deve usar efectivamente a coisa para o fim contratado, não
deixando
de
a utilizar por mais de um ano.
2
- O não uso pelo arrendatário é lícito:
a)
Em caso de força maior ou de doença;
b)
Se a ausência, não perdurando há mais de dois anos, for devida ao cumprimento
de
deveres
militares ou profissionais do próprio, do cônjuge ou de quem viva com o
arrendatário
em união de facto;
c)
Se a utilização for mantida por quem, tendo direito a usar o locado, o fizesse
há mais
de
um ano.
Artigo
1073.º
Deteriorações
lícitas
1
- É lícito ao arrendatário realizar pequenas deteriorações no prédio arrendado
quando
elas
se tornem necessárias para assegurar o seu conforto ou comodidade.
2
- As deteriorações referidas no número anterior devem, no entanto, ser
reparadas pelo
arrendatário
antes da restituição do prédio, salvo estipulação em contrário.
Artigo
1074.º
Obras
1
- Cabe ao senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou
extraordinárias,
requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, salvo estipulação
em
contrário.
2
- O arrendatário apenas pode executar quaisquer obras quando o contrato o
faculte ou
quando
seja autorizado, por escrito, pelo senhorio.
3
- Exceptuam-se do disposto no número anterior as situações previstas no artigo
1036.º,
caso em que o arrendatário pode efectuar a compensação do crédito pelas
despesas
com a realização da obra com a obrigação de pagamento da renda.
4
- O arrendatário que pretenda exercer o direito à compensação previsto no
número
anterior
comunica essa intenção aquando do aviso da execução da obra e junta os
comprovativos
das despesas até à data do vencimento da renda seguinte.
5
- Salvo estipulação em contrário, o arrendatário tem direito, no final do
contrato, a
compensação
pelas obras licitamente feitas, nos termos aplicáveis às benfeitorias
realizadas
por possuidor de boa fé.
DIVISÃO
II
Renda
e encargos
Artigo
1075.º
Disposições
gerais
1
- A renda corresponde a uma prestação pecuniária periódica.
2
- Na falta de convenção em contrário, se as rendas estiverem em correspondência
com
os
meses do calendário gregoriano, a primeira vencer-se-á no momento da celebração
do
contrato e cada uma das restantes no 1.º dia útil do mês imediatamente anterior
àquele
a que diga respeito.
Artigo
1076.º
Antecipação
de rendas
1
- O pagamento da renda pode ser antecipado, havendo acordo escrito, por período
não
superior
a três meses.
2
- As partes podem caucionar, por qualquer das formas legalmente previstas, o
cumprimento
das obrigações respectivas.
Artigo
1077.º
Actualização
de rendas
1
- As partes estipulam, por escrito, a possibilidade de actualização da renda e
o
respectivo
regime.
2
- Na falta de estipulação, aplica-se o seguinte regime:
a)
A renda pode ser actualizada anualmente, de acordo com os coeficientes de
actualização
vigentes;
b)
A primeira actualização pode ser exigida um ano após o início da vigência do
contrato
e as seguintes, sucessivamente, um ano após a actualização anterior;
c)
O senhorio comunica, por escrito e com a antecedência mínima de 30 dias, o
coeficiente
de actualização e a nova renda dele resultante;
d)
A não actualização prejudica a recuperação dos aumentos não feitos, podendo,
todavia,
os coeficientes ser aplicados em anos posteriores, desde que não tenham
passado
mais de três anos sobre a data em que teria sido inicialmente possível a sua
aplicação.
Artigo
1078.º
Encargos
e despesas
1
- As partes estipulam, por escrito, o regime dos encargos e despesas,
aplicando-se, na
falta
de estipulação em contrário, o disposto nos números seguintes.
2
- Os encargos e despesas correntes respeitantes ao fornecimento de bens ou
serviços
relativos
ao local arrendado correm por conta do arrendatário.
3
- No arrendamento de fracção autónoma, os encargos e despesas referentes à
administração,
conservação e fruição de partes comuns do edifício, bem como o
pagamento
de serviços de interesse comum, correm por conta do senhorio.
4
- Os encargos e despesas devem ser contratados em nome de quem for responsável
pelo
seu pagamento.
5
- Sendo o arrendatário responsável por um encargo ou despesa contratado em nome
do
senhorio,
este apresenta, no prazo de um mês, o comprovativo do pagamento feito.
6
- No caso previsto no número anterior, a obrigação do arrendatário vence-se no
final
do
mês seguinte ao da comunicação pelo senhorio, devendo ser cumprida
simultaneamente
com a renda subsequente.
7
- Se as partes acordarem uma quantia fixa mensal a pagar por conta dos encargos
e
despesas,
os acertos são feitos semestralmente.
SUBSECÇÃO
IV
Cessação
DIVISÃO
I
Disposições
comuns
Artigo
1079.º
Formas
de cessação
O
arrendamento urbano cessa por acordo das partes, resolução, caducidade,
denúncia ou
outras
causas previstas na lei.
Artigo
1080.º
Imperatividade
O
disposto nesta subsecção tem natureza imperativa, salvo disposição legal em
contrário.
Artigo
1081.º
Efeitos
da cessação
1
- A cessação do contrato torna imediatamente exigível, salvo se outro for o
momento
legalmente
fixado ou acordado pelas partes, a desocupação do local e a sua entrega, com
as
reparações que incumbam ao arrendatário.
2
- Com antecedência não superior a três meses sobre a obrigação de desocupação
do
local,
o senhorio pode exigir ao arrendatário a colocação de escritos, quando
correspondam
aos usos da terra.
3
- O arrendatário deve, em qualquer caso, mostrar o local a quem o pretender
tomar de
arrendamento
durante os três meses anteriores à desocupação, em horário acordado com
o
senhorio.
4
- Na falta de acordo, o horário é, nos dias úteis, das 17 horas e 30 minutos às
19 horas
e
30 minutos e, aos sábados e domingos, das 15 às 19 horas.
DIVISÃO
II
Cessação
por acordo entre as partes
Artigo
1082.º
Revogação
1
- As partes podem, a todo o tempo, revogar o contrato, mediante acordo a tanto
dirigido.
2
- O acordo referido no número anterior é celebrado por escrito, quando não seja
imediatamente
executado ou quando contenha cláusulas compensatórias ou outras
cláusulas
acessórias.
DIVISÃO
III
Resolução
Artigo
1083.º
Fundamento
da resolução
1
- Qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito,
com base
em
incumprimento pela outra parte.
2
- É fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou
consequências,
torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento,
designadamente,
quanto à resolução pelo senhorio:
a)
A violação reiterada e grave de regras de higiene, de sossego, de boa
vizinhança ou
de
normas constantes do regulamento do condomínio;
b)
A utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública;
c)
O uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina;
d)
O não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do
artigo
1072.º;
e)
A cessão, total ou parcial, temporária ou permanente e onerosa ou gratuita,
quando
ilícita,
inválida ou ineficaz perante o senhorio.
3
- É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora
superior a
três
meses no pagamento da renda, encargos ou despesas, ou de oposição pelo
arrendatário
à realização de obra ordenada por autoridade pública, sem prejuízo do
disposto
nos n.os 3 e 4 do artigo seguinte.
4
- É fundamento de resolução pelo arrendatário, designadamente, a não realização
pelo
senhorio
de obras que a este caibam, quando tal omissão comprometa a habitabilidade
do
locado.
Artigo
1084.º
Modo
de operar
1
- A resolução pelo senhorio quando fundada em causa prevista no n.º 3 do artigo
anterior
bem como a resolução pelo arrendatário operam por comunicação à contraparte
onde
fundamentadamente se invoque a obrigação incumprida.
2
- A resolução pelo senhorio com fundamento numa das causas previstas no n.º 2
do
artigo
anterior é decretada nos termos da lei de processo.
3
- A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se
funde
na
falta de pagamento da renda, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora
no
prazo
de três meses.
4
- Fica igualmente sem efeito a resolução fundada na oposição pelo arrendatário
à
realização
de obra ordenada por autoridade pública se no prazo de três meses cessar essa
oposição.
Artigo
1085.º
Caducidade
do direito de resolução
1
- A resolução deve ser efectivada dentro do prazo de um ano a contar do
conhecimento
do facto que lhe serve de fundamento, sob pena de caducidade.
2
- Quando se trate de facto continuado ou duradouro, o prazo não se completa
antes de
decorrido
um ano da sua cessação.
Artigo
1086.º
Cumulações
1
- A resolução é cumulável com a
denúncia ou com a oposição à
renovação, podendo
prosseguir
a discussão a ela atinente mesmo depois da cessação do contrato, com a
finalidade
de apurar as consequências que ao caso caibam.
2
- A resolução é igualmente cumulável com a responsabilidade civil.
Artigo
1087.º
Desocupação
A
desocupação do locado, nos termos do artigo 1081.º, é exigível no final do 3.º
mês
seguinte
à resolução, se outro prazo não for judicialmente fixado ou acordado pelas
partes.
SUBSECÇÃO
V
Subarrendamento
Artigo
1088.º
Autorização
do senhorio
1
- A autorização para subarrendar o prédio deve ser dada por escrito.
2
- O subarrendamento não autorizado considera-se, todavia, ratificado pelo
senhorio se
ele
reconhecer o subarrendatário como tal.
Artigo
1089.º
Caducidade
O
subarrendamento caduca com a extinção, por qualquer causa, do contrato de
arrendamento,
sem prejuízo da responsabilidade do sublocador para com o sublocatário,
quando
o motivo da extinção lhe seja imputável.
Artigo
1090.º
Direitos
do senhorio em relação ao subarrendatário
1
- Sendo total o subarrendamento, o senhorio pode substituir-se ao arrendatário,
mediante
notificação judicial, considerando-se resolvido o primitivo arrendamento e
passando
o subarrendatário a arrendatário directo.
2
- Se o senhorio receber alguma renda do subarrendatário e lhe passar recibo
depois da
extinção
do arrendamento, é o subarrendatário havido como arrendatário directo.
SUBSECÇÃO
VI
Direito
de preferência
Artigo
1091.º
Regra
geral
1
- O arrendatário tem direito de preferência:
a)
Na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três
anos;
b)
Na celebração de novo contrato de arrendamento, em caso de caducidade do seu
contrato
por ter cessado o direito ou terem findado os poderes legais de administração
com
base nos quais o contrato fora celebrado.
2
- O direito previsto na alínea b) existe enquanto não for exigível a
restituição do
prédio,
nos termos do artigo 1053.º
3
- O direito de preferência do arrendatário é graduado imediatamente acima do
direito
de
preferência conferido ao proprietário do solo pelo artigo 1535.º
4
- É aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 416.º a
418.º e
1410.º
SUBSECÇÃO
VII
Disposições
especiais do arrendamento para habitação
DIVISÃO
I
Âmbito
do contrato
Artigo
1092.º
Indústrias
domésticas
1
- No uso residencial do prédio arrendado inclui-se, salvo cláusula em
contrário, o
exercício
de qualquer indústria doméstica, ainda que tributada.
2
- É havida como doméstica a indústria explorada na residência do arrendatário
que
não
ocupe mais de três auxiliares assalariados.
Artigo
1093.º
Pessoas
que podem residir no local arrendado
1
- Nos arrendamentos para habitação podem residir no prédio, além do
arrendatário:
a)
Todos os que vivam com ele em economia comum;
b)
Um máximo de três hóspedes, salvo cláusula em contrário.
2
- Consideram-se sempre como vivendo com o arrendatário em economia comum a
pessoa
que com ele viva em união de facto, os seus parentes ou afins na linha recta ou
até
ao 3.º grau da linha colateral, ainda que paguem alguma retribuição, e bem
assim as
pessoas
relativamente às quais, por força da lei ou de negócio jurídico que não
respeite
directamente
à habitação, haja obrigação de convivência ou de alimentos.
3
- Consideram-se hóspedes as pessoas a quem o arrendatário proporcione habitação
e
preste
habitualmente serviços relacionados com esta, ou forneça alimentos, mediante
retribuição.
DIVISÃO
II
Duração
Artigo
1094.º
Tipos
de contratos
1
- O contrato de arrendamento urbano para habitação pode celebrar-se com prazo
certo
ou
por duração indeterminada.
2
- No contrato com prazo certo pode convencionar-se que, após a primeira
renovação,
o
arrendamento tenha duração indeterminada.
3
- No silêncio das partes, o contrato tem-se como celebrado por duração
indeterminada.
SUBDIVISÃO
I
Contrato
com prazo certo
Artigo
1095.º
Estipulação
de prazo certo
1
- O prazo deve constar de cláusula inserida no contrato.
2
- O prazo referido no número anterior não pode, contudo, ser inferior a 5 nem
superior
a
30 anos, considerando-se automaticamente ampliado ou reduzido aos referidos
limites
mínimo
e máximo quando, respectivamente, fique aquém do primeiro ou ultrapasse o
segundo.
3
- O limite mínimo previsto no número anterior não se aplica aos contratos para
habitação
não permanente ou para fins especiais transitórios, designadamente por
motivos
profissionais, de educação e formação ou turísticos, neles exarados.
Artigo
1096.º
Renovação
automática
1
- Excepto se celebrado para habitação não permanente ou para fim especial
transitório,
o
contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por
períodos
mínimos sucessivos de três anos, se outros não estiverem contratualmente
previstos.
2
- Qualquer das partes se pode opor à renovação, nos termos dos artigos
seguintes.
Artigo
1097.º
Oposição
à renovação deduzida pelo senhorio
O
senhorio pode impedir a renovação automática mediante comunicação ao
arrendatário
com
uma antecedência não inferior a um ano do termo do contrato.
Artigo
1098.º
Oposição
à renovação ou denúncia pelo arrendatário
1
- O arrendatário pode impedir a renovação automática mediante comunicação ao
senhorio
com uma antecedência não inferior a 120 dias do termo do contrato.
2
- Após seis meses de duração efectiva do contrato, o arrendatário pode
denunciá-lo a
todo
o tempo, mediante comunicação ao senhorio com uma antecedência não inferior a
120
dias do termo pretendido do contrato, produzindo essa denúncia efeitos no final
de
um
mês do calendário gregoriano.
3
- A inobservância da antecedência prevista nos números anteriores não obsta à
cessação
do contrato, mas obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período
de
pré-aviso em falta.
SUBDIVISÃO
II
Contrato
de duração indeterminada
Artigo
1099.º
Princípio
geral
O
contrato de duração indeterminada cessa por denúncia de uma das partes, nos
termos
dos
artigos seguintes.
Artigo
1100.º
Denúncia
pelo arrendatário
1
- O arrendatário pode denunciar o contrato, independentemente de qualquer
justificação,
mediante comunicação ao senhorio com antecedência não inferior a 120
dias
sobre a data em que pretenda a cessação, produzindo essa denúncia efeitos no
final
de
um mês do calendário gregoriano.
2
- À denúncia pelo arrendatário é
aplicável, com as necessárias adaptações, o
disposto
no
n.º 3 do artigo 1098.º
Artigo
1101.º
Denúncia
pelo senhorio
O
senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada nos casos
seguintes:
a)
Necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau;
b)
Para demolição ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos;
c)
Mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a cinco anos
sobre
a data em que pretenda a cessação.
Artigo
1102.º
Denúncia
para habitação
1
- O direito de denúncia para habitação do senhorio depende do pagamento do
montante
equivalente a um ano de renda e da verificação dos seguintes requisitos:
a)
Ser o senhorio proprietário, comproprietário ou usufrutuário do prédio há mais de cinco anos
ou,
independentemente
deste prazo, se o tiver adquirido por sucessão;
b)
Não ter o senhorio, há mais de um ano, na área dos concelhos de Lisboa ou do
Porto
e
seus limítrofes, ou no respectivo concelho quanto ao resto do País, casa
própria ou
arrendada
que satisfaça as necessidades de habitação própria ou dos seus descendentes
em
1.º grau.
2
- O senhorio que tiver diversos prédios arrendados só pode denunciar o contrato
relativamente
àquele que, satisfazendo as necessidades de habitação própria e da
família,
esteja arrendado há menos tempo.
3
- O direito de denúncia para habitação do descendente está sujeito à
verificação do
requisito
previsto na alínea a) do n.º 1 relativamente ao senhorio e do da alínea b) do
mesmo
número para o descendente.
Artigo
1103.º
Denúncia
justificada
1
- A denúncia pelo senhorio com qualquer dos fundamentos previstos nas alíneas
a) e
b)
do artigo 1101.º é feita nos termos da lei de processo, com antecedência não
inferior
a
seis meses sobre a data pretendida para a desocupação.
2
- O senhorio que haja invocado o fundamento referido na alínea a) do artigo
1101.º
deve
dar ao local a utilização invocada no prazo de seis meses e por um período
mínimo
de
três anos.
3
- A invocação do disposto na alínea b) do artigo 1101.º obriga o senhorio,
mediante
acordo
e em alternativa:
a)
Ao pagamento de todas as despesas e danos, patrimoniais e não patrimoniais,
suportados
pelo arrendatário, não podendo o valor da indemnização ser inferior ao de
dois
anos de renda;
b)
A garantir o realojamento do arrendatário no mesmo concelho, em condições
análogas
às que este já detinha;
c)
A assegurar o realojamento temporário do arrendatário no mesmo concelho com
vista
a
permitir a reocupação do prédio, em
condições análogas às que este já
detinha.
4
- No caso do número anterior, na falta de acordo entre as partes aplica-se o
disposto na
alínea
a).
5
- A indemnização devida pela denúncia deve ser paga no mês seguinte ao trânsito
em
julgado
da decisão que a determine.
6
- Salvo caso de força maior, o não cumprimento do disposto no n.º 2, bem como o
não
início
da obra no prazo de seis meses, torna o senhorio responsável por todas as
despesas
e demais danos, patrimoniais e não patrimoniais, ocasionados ao arrendatário,
não
podendo o valor da indemnização ser inferior ao de dois anos de renda, e
confere ao
arrendatário
o direito à reocupação do locado.
7
- Da denúncia não pode resultar uma duração total do contrato inferior a cinco
anos.
8
- A denúncia do contrato para demolição ou realização de obra de remodelação ou
restauro
profundos é objecto de legislação especial.
Artigo
1104.º
Confirmação
da denúncia
No
caso previsto na alínea c) do artigo 1101.º, a denúncia deve ser confirmada,
sob pena
de
ineficácia, por comunicação com a antecedência máxima de 15 meses e mínima de
um
ano relativamente à data da sua efectivação.
DIVISÃO
III
Transmissão
Artigo
1105.º
Comunicabilidade
e transmissão em vida para o cônjuge
1
- Incidindo o arrendamento sobre casa de morada de família, o seu destino é, em
caso
de
divórcio ou de separação judicial de pessoas e bens, decidido por acordo dos
cônjuges,
podendo estes optar pela transmissão ou pela concentração a favor de um
deles.
2
- Na falta de acordo, cabe ao tribunal decidir, tendo em conta a necessidade de
cada
um,
os interesses dos filhos e outros factores relevantes.
3
- A transferência ou a concentração acordadas e homologadas pelo juiz ou pelo
conservador
do registo civil ou a decisão judicial a elas relativa são notificadas
oficiosamente
ao senhorio.
Artigo
1106.º
Transmissão
por morte
1
- O arrendamento para habitação não caduca por morte do arrendatário quando lhe
sobreviva:
a)
Cônjuge com residência no locado ou pessoa que com o arrendatário vivesse no
locado
em união de facto e há mais de um ano;
b)
Pessoa que com ele residisse em economia comum e há mais de um ano.
2
- No caso referido no número anterior, a posição do arrendatário transmite-se,
em
igualdade
de circunstâncias, sucessivamente para o cônjuge sobrevivo ou pessoa que,
com
o falecido, vivesse em união de facto, para o parente ou afim mais próximo ou
de
entre
estes para o mais velho ou para o mais velho de entre as restantes pessoas que
com
ele
residissem em economia comum há mais de um ano.
3
- A morte do arrendatário nos seis meses anteriores à data da cessação do
contrato dá
ao
transmissário o direito de permanecer no local por período não inferior a seis
meses a
contar
do decesso.
Artigo
1107.º
Comunicação
1
- Por morte do arrendatário, a transmissão do arrendamento, ou a sua
concentração no
cônjuge
sobrevivo, deve ser comunicada ao senhorio, com cópia dos documentos
comprovativos
e no prazo de três meses a contar da ocorrência.
2
- A inobservância do disposto no número anterior obriga o transmissário faltoso
a
indemnizar
por todos os danos derivados da omissão.
SUBSECÇÃO
VIII
Disposições
especiais do arrendamento para fins não habitacionais
Artigo
1108.º
Âmbito
As
regras da presente subsecção aplicam-se aos arrendamentos urbanos para fins não
habitacionais,
bem como, com as necessárias adaptações e em conjunto com o regime
geral
da locação civil, aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais.
Artigo
1109.º
Locação
de estabelecimento
1
- A transferência temporária e onerosa do gozo de um prédio ou de parte dele,
em
conjunto
com a exploração de um estabelecimento comercial ou industrial nele
instalado,
rege-se pelas regras da presente subsecção, com as necessárias adaptações.
2
- A transferência temporária e onerosa de estabelecimento instalado em local
arrendado
não carece de autorização do senhorio, mas deve ser-lhe comunicada no
prazo
de um mês.
Artigo
1110.º
Duração,
denúncia ou oposição à renovação
1
- As regras relativas à duração, denúncia e
oposição à renovação dos contratos
de
arrendamento
para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes,
aplicando-se,
na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação.
2
- Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo,
pelo
período
de 10 anos, não podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a
um
ano.
Artigo
1111.º
Obras
1
- As regras relativas à responsabilidade pela realização das obras de
conservação
ordinária
ou extraordinária, requeridas por lei ou pelo fim do contrato, são livremente
estabelecidas
pelas partes.
2
- Se as partes nada convencionarem, cabe ao senhorio executar as obras de
conservação,
considerando-se o arrendatário autorizado a realizar as obras exigidas por
lei
ou requeridas pelo fim do contrato.
Artigo
1112.º
Transmissão
da posição do arrendatário
1
- É permitida a transmissão por acto entre vivos da posição do arrendatário,
sem
dependência
da autorização do senhorio:
a)
No caso de trespasse de estabelecimento comercial ou industrial;
b)
A pessoa que no prédio arrendado continue a exercer a mesma profissão liberal,
ou a
sociedade
profissional de objecto equivalente.
2
- Não há trespasse:
a)
Quando a transmissão não seja acompanhada de transferência, em conjunto, das
instalações,
utensílios, mercadorias ou outros elementos que integram o
estabelecimento;
b)
Quando a transmissão vise o exercício, no prédio, de outro ramo de comércio ou
indústria
ou, de um modo geral, a sua afectação a outro destino.
3
- A transmissão deve ser celebrada por escrito e comunicada ao senhorio.
4
- O senhorio tem direito de preferência no trespasse por venda ou dação em
cumprimento,
salvo convenção em contrário.
5
- Quando, após a transmissão, seja dado outro destino ao prédio, ou o
transmissário
não
continue o exercício da mesma profissão liberal, o senhorio pode resolver o
contrato.
Artigo
1113.º
Morte
do arrendatário
1
- O arrendamento não caduca por morte do arrendatário, mas os sucessores podem
renunciar
à transmissão, comunicando a renúncia ao senhorio no prazo de três meses,
com
cópia dos documentos comprovativos da ocorrência.
ARTIGOS 1114º A 1120º
(Revogados pelo Dec.-Lei 321-B/90, de 15-10)
CAPÍTULO V
Parceria pecuária
ARTIGO 1121º
(Noção)
Parceria
pecuária é o contrato pelo qual uma ou mais pessoas entregam a outra ou outras
um animal ou certo número deles, para estas os criarem, pensarem e vigiarem,
com o ajuste de repartirem entre si os lucros futuros em certa proporção.
ARTIGO 1122º
(Prazo)
1.
Na falta de convenção quanto a prazo, atender-se-á aos usos da terra; na falta
de usos, qualquer dos contraentes pode, a todo o tempo, fazer caducar a
parceria.
2.
A existência de prazo não impede que o contraente resolva o contrato, se a
outra parte não cumprir as suas obrigações.
ARTIGO 1123º
(Caducidade)
A
parceria caduca pela morte do parceiro pensador ou pela perda dos animais, e
também quando cesse o direito ou findem os poderes legais de administração com
base nos quais o contrato foi celebrado, ou quando se verifique a condição
resolutiva a que as partes o subordinaram.
ARTIGO 1124º
(Obrigações do parceiro pensador)
O
parceiro pensador é obrigado a empregar na guarda e tratamento dos animais o
cuidado de um pensador diligente.
ARTIGO 1125º
(Utilização dos animais)
1.
O parceiro proprietário é obrigado a assegurar a utilização dos animais ao
parceiro pensador.
2.
O parceiro pensador que for privado dos seus direitos ou perturbado no
exercício deles pode usar, mesmo contra o parceiro proprietário, dos meios
facultados ao possuidor nos artigos 1276º e seguintes.
ARTIGO 1126º
(Risco)
1.
Se os animais perecerem, se inutilizarem ou diminuírem de valor, por facto não
imputável ao parceiro pensador, o risco corre por conta do proprietário.
2.
Se, porém, algum proveito se puder tirar dos animais que pereceram ou se
inutilizaram, pertence o benefício ao proprietário até ao valor deles no
momento da entrega.
3.
As regras dos números anteriores são imperativas.
ARTIGO 1127º
(Tosquia de gado lanígero)
O
parceiro pensador de gado lanígero não pode fazer a tosquia sem que previna o
parceiro proprietário; se o não prevenir, pagará em dobro o valor da parte que
deveria pertencer ao proprietário.
ARTIGO 1128º
(Regime subsidiário)
Em
tudo o que não estiver estabelecido nos artigos precedentes devem ser
observados, na falta de convenção, os usos da terra.
CAPÍTULO VI
Comodato
ARTIGO 1129º
(Noção)
Comodato
é o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa, móvel
ou imóvel, para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir.
ARTIGO 1130º
(Comodato fundado num direito temporário)
1.
Se o comodante emprestar a coisa com base num direito de duração limitada, não
pode o contrato ser celebrado por tempo superior; e, quando o seja,
reduzir-se-á ao limite de duração desse direito.
2.
É aplicável ao comodato constituído pelo usufrutuário o disposto nas alíneas a)
e b) do artigo 1052º.
ARTIGO 1131º
(Fim do contrato)
Se
do contrato e respectivas circunstâncias não resultar o fim a que a coisa
emprestada se destina, é permitido ao comodatário aplicá-la a quaisquer fins
lícitos, dentro da função normal das coisas de igual natureza.
ARTIGO 1132º
(Frutos da coisa)
Só
por força de convenção expressa o comodatário pode fazer seus os frutos
colhidos.
ARTIGO 1133º
(Actos que impedem ou diminuem o uso da coisa)
1.
O comodante deve abster-se de actos que impeçam ou restrinjam o uso da coisa
pelo comodatário, mas não é obrigado a assegurar-lhe esse uso.
2.
Se este for privado dos seus direitos ou perturbado no exercício deles, pode
usar, mesmo contra o comodante, dos meios facultados ao possuidor nos artigos
1276º e seguintes.
ARTIGO 1134º
(Responsabilidade do comodante)
O
comodante não responde pelos vícios ou limitações do direito nem pelos vícios
da coisa, excepto quando se tiver expressamente responsabilizado ou tiver
procedido com dolo.
ARTIGO 1135º
(Obrigações do comodatário)
São
obrigações do comodatário:
a)
Guardar e conservar a coisa emprestada;
b)
Facultar ao comodante o exame dela;
c)
Não a aplicar a fim diverso daquele a que a coisa se destina;
d)
Não fazer dela uma utilização imprudente;
e)
Tolerar quaisquer benfeitorias que o comodante queira realizar na coisa;
f)
Não proporcionar a terceiro o uso da coisa, excepto se o comodante o autorizar;
g)
Avisar imediantamente o comodante, sempre que tenha conhecimento de vícios na
coisa ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiro se arroga direitos em
relação a ela, desde que o facto seja ignorado do comodante;
h)
Restituir a coisa findo o contrato.
ARTIGO 1136º
(Perda ou deterioração da coisa)
1.
Quando a coisa emprestada perecer ou se deteriorar casualmente, o comodatário é
responsável, se estava no seu poder tê-lo evitado, ainda que mediante o
sacrifício de coisa própria de valor não superior.
2.
Quando, porém, o comodatário a tiver aplicado a fim diverso daquele a que a
coisa se destina, ou tiver consentido que terceiro a use sem para isso estar
autorizado, será responsável pela perda ou deterioração, salvo provando que ela
teria igualmente ocorrido sem a sua conduta ilegal.
3.
Sendo avaliada a coisa ao tempo do contrato, presume-se que a responsabilidade
ficou a cargo do comodatário, embora este não pudesse evitar o prejuízo pelo sacrifício
de coisa própria.
ARTIGO 1137º
(Restituição)
1.
Se os contraentes não convencionaram prazo certo para a restituição da coisa,
mas esta foi emprestada para uso determinado, o comodatário deve restituí-la ao
comodante logo que o uso finde, independentemente de interpelação.
2.
Se não foi convencionado prazo para a restituição nem determinado o uso da
coisa, o comodatário é obrigado a restituí-la logo que lhe seja exigida.
3.
É aplicável à manutenção e restituição da coisa emprestada o disposto no artigo
1043º.
ARTIGO 1138º
(Benfeitorias)
1.
O comodatário é equiparado, quanto a benfeitorias, ao possuidor de má fé.
2.
Tratando-se de empréstimo de animais, as despesas de alimentação destes correm,
salvo estipulação em contrário, por conta do comodatário.
ARTIGO 1139º
(Solidariedade dos comodatários)
Sendo
dois ou mais os comodatários, são solidárias as suas obrigações.
ARTIGO 1140º
(Resolução)
Não
obstante a existência de prazo, o comodante pode resolver o contrato, se para
isso tiver justa causa.
ARTIGO 1141º
(Caducidade)
O
contrato caduca pela morte do comodatário.
CAPÍTULO VII
Mútuo
ARTIGO 1142º
(Noção)
Mútuo
é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa
fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e
qualidade.
ARTIGO 1143º
(Forma)
O contrato de mútuo de valor superior a
20 000 euros só é válido se for celebrado por escritura pública e o de valor
superior a 2000 euros se o for por documento assinado pelo mutuário.
(Decreto-Lei n.º 343/98,
de 6 de Novembro)
ARTIGO 1144º
(Propriedade das coisas mutuadas)
As
coisas mutuadas tornam-se propriedade do mutuário pelo facto da entrega.
ARTIGO 1145º
(Gratuidade ou onerosidade do mútuo)
1.
As partes podem convencionar o pagamento de juros como retribuição do mútuo;
este presume-se oneroso em caso de dúvida.
2.
Ainda que o mútuo não verse sobre dinheiro, observar-se-á, relativamente a
juros, o disposto no artigo 559º e, havendo mora do mutuário, o disposto no
artigo 806º.
ARTIGO 1146º
(Usura)
1.
É havido como usurário o contrato de mútuo em que sejam estipulados juros
anuais que excedam os juros legais, acrescidos de 3% ou 5%, conforme exista ou
não garantia real.
2.
É havida também como usurária a cláusula penal que fixar como indemnização
devida pela falta de restituição de empréstimo, relativamente ao tempo de mora,
mais do que o correspondente a 7% ou a 9% acima dos juros legais, conforme
exista ou não garantia real.
3.
Se a taxa de juros estipulada ou o montante da indemnização exceder o máximo
fixado nos números precedentes, considera-se reduzido a esses máximos, ainda
que seja outra a vontade dos contraentes.
4.
O respeito dos limites máximos referidos neste artigo não obsta à
aplicabilidade dos artigos 282º a 284º.
(Redacção do Dec.-Lei 262/83, de 16-6)
ARTIGO 1147º
(Prazo no mútuo oneroso)
No
mútuo oneroso o prazo presume-se estipulado a favor de ambas as partes, mas o
mutuário pode antecipar o pagamento, desde que satisfaça os juros por inteiro.
ARTIGO 1148º
(Falta de fixação de prazo)
1.
Na falta de estipulação de prazo, a obrigação do mutuário, tratando-se de mútuo
gratuito, só se vence trinta dias após a exigência do seu cumprimento.
2.
Se o mútuo for oneroso e não se tiver fixado prazo, qualquer das partes pode
pôr termo ao contrato, desde que o denuncie com uma antecipação mínima de
trinta dias.
3.
Tratando-se, porém, de empréstimo, gratuito ou oneroso, de cereais ou outros
produtos rurais a favor de lavrador, presume-se feito até à colheita seguinte
dos produtos semelhantes.
4.
A doutrina do número anterior é aplicável aos mutuários que, não sendo
lavradores, recolhem pelo arrendamento de terras próprias frutos semelhantes
aos que receberam de empréstimo.
ARTIGO 1149º
(Impossibilidade de restituição)
Se
o mútuo recair em coisa que não seja dinheiro e a restituição se tornar
impossível ou extremamente difícil por causa não imputável ao mutuário, pagará
este o valor que a coisa tiver no momento e lugar do vencimento da obrigação.
ARTIGO 1150º
(Resolução do contrato)
O
mutuante pode resolver o contrato, se o mutuário não pagar os juros no seu
vencimento.
ARTIGO 1151º
(Responsabilidade do mutuante)
É
aplicável à responsabilidade do mutuante, no mútuo gratuito, o disposto no artigo
1134º.
CAPÍTULO VIII
Contrato de trabalho
ARTIGO 1152º
(Noção)
Contrato
de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a
prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade
e direcção desta.
ARTIGO 1153º
(Regime)
O
contrato de trabalho está sujeito a legislação especial.
CAPÍTULO IX
Prestação de serviço
ARTIGO 1154º
(Noção)
Contrato
de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar
à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem
retribuição.
ARTIGO 1155º
(Modalidades do contrato)
O
mandato, o depósito e a empreitada, regulados nos capítulos subsequentes, são
modalidades do contrato de prestação de serviço.
ARTIGO 1156º
(Regime)
As
disposições sobre o mandato são extensivas, com as necessárias adaptações, às
modalidades do contrato de prestação de serviço que a lei não regule
especialmente.
CAPÍTULO X
Mandato
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1157º
(Noção)
Mandato
é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos
jurídicos por conta da outra.
ARTIGO 1158º
(Gratuidade ou onerosidade do mandato)
1.
O mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o
mandatário pratique por profissão; neste caso, presume-se oneroso.
2.
Se o mandato for oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as
partes, é determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos;
e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade.
ARTIGO 1159º
(Extensão do mandato)
1.
O mandato geral só compreende os actos de administração ordinária.
2.
O mandato especial abrange, além dos actos nele referidos, todos os demais
necessários à sua execução.
ARTIGO 1160º
(Pluralidade de mandatos)
Se
alguém incumbir duas ou mais pessoas da prática dos mesmos actos jurídicos,
haverá tantos mandatos quantas as pessoas designadas, salvo se o mandante
declarar que devem agir conjuntamente.
SECÇÃO II
Direitos e obrigações do mandatário
ARTIGO 1161º
(Obrigações do mandatário)
O
mandatário é obrigado:
a)
A praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do
mandante;
b)
A prestar as informações que este lhe peça, relativas ao estado da gestão;
c)
A comunicar ao mandante, com prontidão, a execução do mandato ou, se o não
tiver executado, a razão por que assim procedeu;
d)
A prestar contas, findo o mandato ou quando o mandante as exigir;
e)
A entregar ao mandante o que recebeu em execução do mandato ou no exercício deste,
se o não despendeu normalmente no cumprimento do contrato.
ARTIGO 1162º
(Inexecução do mandato ou a inobservância das
instruções)
O
mandatário pode deixar de executar o mandato ou afastar-se das instruções
recebidas, quando seja razoável supor que o mandante aprovaria a sua conduta,
se conhecesse certas circunstâncias que não foi possível comunicar-lhe em tempo
útil.
ARTIGO 1163º
(Aprovação tácita da execução ou inexecução do
mandato)
Comunicada
a execução ou inexecução do mandato, o silêncio do mandante por tempo superior
àquele em que teria de pronunciar-se, segundo os usos ou, na falta destes, de
acordo com a natureza do assunto, vale como aprovação da conduta do mandatário,
ainda que este haja excedido os limites do mandato ou desrespeitado as
instruções do mandante, salvo acordo em contrário.
ARTIGO 1164º
(Juros devidos pelo mandatário)
O
mandatário deve pagar ao mandante os juros legais correspondentes às quantias
que recebeu dele ou por conta dele, a partir do momento em que devia entregar-lhas,
ou remeter-lhas, ou aplicá-las segundo as suas instruções.
ARTIGO 1165º
(Substituto e auxiliares do mandatário)
O
mandatário pode, na execução do mandato, fazer-se substituir por outrem ou
servir-se de auxiliares, nos mesmos termos em que o procurador o pode fazer.
ARTIGO 1166º
(Pluralidade de mandatários)
Havendo
dois ou mais mandatários com o dever de agirem conjuntamente, responderá cada
um deles pelos seus actos, se outro regime não tiver sido convencionado.
SECÇÃO III
Obrigações do mandante
ARTIGO 1167º
(Enumeração)
O
mandante é obrigado:
a)
A fornecer ao mandatário os meios necessários à execução do mandato, se outra
coisa não foi convencionada;
b)
A pagar-lhe a retribuição que ao caso competir, e fazer-lhe provisão por conta
dela segundo os usos;
c)
A reembolsar o mandatário das despesas feitas que este fundadamente tenha
considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efectuadas;
d)
A indemnizá-lo do prejuízo sofrido em consequência do mandato, ainda que o mandante
tenha procedido sem culpa.
ARTIGO 1168º
(Suspensão da execução do mandato)
O
mandatário pode abster-se da execução do mandato enquanto o mandante estiver em
mora quanto à obrigação expressa na alínea a) do artigo anterior.
ARTIGO 1169º
(Pluralidade de mandantes)
Sendo
dois ou mais os mandantes, as suas obrigações para com o madatário são
solidárias, se o mandato tiver sido conferido para assunto de interesse comum.
SECÇÃO IV
Revogação e caducidade do mandato
SUBSECÇÃO I
Revogação
ARTIGO 1170º
(Revogabilidade do mandato)
1.
O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante
convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
2.
Se, porém, o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandatário ou
de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado,
salvo ocorrendo justa causa.
ARTIGO 1171º
(Revogação tácita)
A
designação de outra pessoa, por parte do mandante, para a prática dos mesmos
actos implica revogação do mandato, mas só produz este efeito depois de ser
conhecida pelo mandatário.
ARTIGO 1172º
(Obrigação de indemnização)
A
parte que revogar o contrato deve indemnizar a outra do prejuízo que esta
sofrer:
a)
Se assim tiver sido convencionado;
b)
Se tiver sido estipulada a irrevogabilidade ou tiver havido renúncia ao direito
de revogação;
c)
Se a revogação proceder do mandante e versar sobre mandato oneroso, sempre que
o mandato tenha sido conferido por certo tempo ou para determinado assunto, ou
que o mandante o revogue sem a antecedência conveniente;
d)
Se a revogação proceder do mandatário e não tiver sido realizada com a
antecedência conveniente.
ARTIGO 1173º
(Mandato colectivo)
Sendo
o mandato conferido por várias pessoas e para assunto de interesse comum, a
revogação só produz efeito se for realizada por todos os mandantes.
SUBSECÇÃO II
Caducidade
ARTIGO 1174º
(Casos de caducidade)
O
mandato caduca:
a)
Por morte ou interdição do mandante ou do mandatário;
b)
Por inabilitação do mandante, se o mandato tiver por objecto actos que não
possam ser praticados sem intervenção do curador.
ARTIGO 1175º
(Morte, interdição ou inabilitação do mandante)
A
morte, interdição ou inabilitação do mandante não faz caducar o mandato, quando
este tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro; nos
outros casos, só o faz caducar a partir do momento em que seja conhecida do
mandatário, ou quando da caducidade não possam resultar prejuízos para o
mandante ou seus herdeiros.
ARTIGO 1176º
(Morte, interdição ou incapacidade natural do
mandatário)
1.
Caducando o mandato por morte ou interdição do mandatário, os seus herdeiros
devem prevenir o mandante e tomar as providências adequadas, até que ele
próprio esteja em condições de providenciar.
2.
Idêntica obrigação recai sobre as pessoas que convivam com o mandatário, no
caso de incapacidade natural deste.
ARTIGO 1177º
(Pluralidade de mandatários)
Se
houver vários mandatários com obrigação de agir conjuntamente, o mandato caduca
em relação a todos, embora a causa de caducidade respeite apenas a um deles,
salvo convenção em contrário.
SECÇÃO V
Mandato com representação
ARTIGO 1178º
(Mandatário com poderes de representação)
1.
Se o mandatário for representante, por ter recebido poderes para agir em nome
do mandante, é também aplicável ao mandato o disposto nos artigos 258º e
seguintes.
2.
O mandatário a quem hajam sido conferidos poderes de representação tem o dever
de agir não só por conta, mas em nome do mandante, a não ser que outra coisa
tenha sido estipulada.
ARTIGO 1179º
(Revogação ou renúncia da procuração)
A
revogação e a renúncia da procuração implicam revogação do mandato.
SECÇÃO VI
Mandato sem representação
ARTIGO 1180º
(Mandatário que age em nome próprio)
O
mandatário, se agir em nome próprio, adquire os direitos e assume as obrigações
decorrentes dos actos que celebra, embora o mandato seja conhecido dos
terceiros que participem nos actos ou sejam destinatários destes.
ARTIGO 1181º
(Direitos adquiridos em execução do mandato)
1.
O mandatário é obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos em
execução do mandato.
2.
Relativamente aos créditos, o mandante pode substituir-se ao mandatário no
exercício dos respectivos direitos.
ARTIGO 1182º
(Obrigações contraídas em execução do mandato)
O
mandante deve assumir, por qualquer das formas indicadas no nº 1
do artigo
595º, as obrigações contraídas pelo
mandatário em execução do mandato; se não
puder fazê-lo, deve entregar ao mandatário os meios
necessários para as cumprir
ou reembolsá-lo do que este houver despendido nesse cumprimento.
ARTIGO 1183º
(Responsabilidade do mandatário)
Salvo
estipulação em contrário, o mandatário não é responsável pela falta de
cumprimento das obrigações assumidas pelas pessoas com quem haja contratado, a
não ser que no momento da celebração do contrato conhecesse ou devesse conhecer
a insolvência delas.
ARTIGO 1184º
(Responsabilidade dos bens adquiridos pelo
mandatário)
Os
bens que o mandatário haja adquirido em execução do mandato e devam ser
transferidos para o mandante nos termos do nº 1 do artigo 1181º não respondem
pelas obrigações daquele, desde que o mandato conste de documento anterior à
data da penhora desses bens e não tenha sido feito o registo da aquisição,
quando esta esteja sujeita a registo.
CAPÍTULO XI
Depósito
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1185º
(Noção)
Depósito
é o contrato pelo qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou
imóvel, para que a guarde, e a restitua quando for exigida.
ARTIGO 1186º
(Gratuidade ou onerosidade do depósito)
É
aplicável ao depósito o disposto no artigo 1158º.
SECÇÃO II
Direitos e obrigações do depositário
ARTIGO 1187º
(Obrigações de depositário)
O
depositário é obrigado:
a)
A guardar a coisa depositada;
b)
A avisar imediatamente o depositante, quando saiba que algum perigo ameaça a
coisa ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o facto
seja desconhecido do depositante;
c)
A restituir a coisa com os seus frutos.
ARTIGO 1188º
(Turbação de detenção ou esbulho da coisa)
1.
Se o depositário for privado da detenção da coisa por causa que lhe não seja
imputável, fica exonerado das obrigações de guarda e restituição, mas deve dar
conhecimento imediato da privação ao depositante.
2.
Independentemente da obrigação imposta no número anterior, o depositário que
for privado da detenção da coisa ou perturbado no exercício dos seus direitos
pode usar, mesmo contra o depositante, dos meios facultados ao possuidor nos
artigos 1276º e seguintes.
ARTIGO 1189º
(Uso da coisa e subdepósito)
O
depositário não tem o direito de usar a coisa depositada nem de a dar em
depósito a outrem, se o depositante o não tiver autorizado.
ARTIGO 1190º
(Guarda da coisa)
O
depositário pode guardar a coisa de modo diverso do convencionado, quando haja
razões para supor que o depositante aprovaria a alteração, se conhecesse as
circunstâncias que a fundamentam; mas deve participar-lhe a mudança logo que a
comunicação seja possível.
ARTIGO 1191º
(Depósito cerrado)
1.
Se o depósito recair sobre coisa encerrada nalgum invólucro ou recipiente, deve
o depositário guardá-la e restituí-la no mesmo estado, sem a devassar.
2.
No caso de o invólucro ou recipiente ser violado, presume-se que na violação
houve culpa do depositário; e, se este não ilidir a presunção, presumir-se-á
verdadeira a descrição feita pelo depositante.
ARTIGO 1192º
(Restituição da coisa)
1.
O depositário não pode recusar a restituição ao depositante com o fundamento de
que este não é proprietário da coisa nem tem sobre ela outro direito.
2.
Se, porém, for proposta por terceiro acção de reivindicação contra o
depositário, este, enquanto não for julgada definitivamente a acção, só pode
liberar-se da obrigação de restituir consignando em depósito a coisa.
3.
Se chegar ao conhecimento do depositário que a coisa provém de crime, deve
participar imediatamente o depósito à pessoa a quem foi subtraída ou, não
sabendo quem é, ao Ministério Público; e só poderá restituir a coisa ao
depositante se dentro de quinze dias, contados da participação, ela não lhe for
reclamada por quem de direito.
ARTIGO 1193º
(Terceiro interessado no depósito)
Se
a coisa foi depositada também no interesse de terceiro e este comunicou ao
depositário a sua adesão, o depositário não pode exonerar-se restituindo a
coisa ao depositante sem consentimento do terceiro.
ARTIGO 1194º
(Prazo de restituição)
O
prazo de restituição da coisa tem-se por estabelecido a favor do depositante;
mas, sendo o depósito oneroso, o depositante satisfará por inteiro a
retribuição do depositário, mesmo quando exija a restituição da coisa antes de
findar o prazo estipulado, salvo se para isso tiver justa causa.
ARTIGO 1195º
(Lugar de restituição)
No
silêncio das partes, o depositário deve restituir a coisa móvel no lugar onde,
segundo o contrato, tiver de a guardar.
ARTIGO 1196º
(Despesas da restituição)
As
despesas da restituição ficam a cargo do depositante.
ARTIGO 1197º
(Responsabilidade no caso de subdepósito)
Se
o depositário, devidamente autorizado, confiar por sua vez a coisa em depósito
a terceiro, é responsável por culpa sua na escolha dessa pessoa.
ARTIGO 1198º
(Auxiliares)
O
depositário pode socorrer-se de auxiliares no cumprimento das suas obrigações,
sempre que o contrário não resulte do conteúdo ou finalidade do depósito.
SECÇÃO III
Obrigações do depositante
ARTIGO 1199º
(Enumeração)
O
depositante é obrigado:
a)
A pagar ao depositário a retribuição devida;
b)
A reembolsá-lo das despesas que ele fundadamente tenha considerado
indispensáveis para a conservação da coisa, com juros legais desde que foram
efectuadas;
c)
A indemnizá-lo do prejuízo sofrido em consequência do depósito, salvo se o
depositante houver procedido sem culpa.
ARTIGO 1200º
(Remuneração do depositário)
1.
A remuneração do depositário, quando outra coisa se não tenha convencionado,
deve ser paga no termo do depósito; mas, se for fixada por períodos de tempo,
pagar-se-á no fim de cada um deles.
2.
Findado o depósito antes do prazo convencionado, pode o depositário exigir uma
parte proporcional ao tempo decorrido, sem prejuízo do preceituado no artigo
1194º.
ARTIGO 1201º
(Restituição da coisa)
Não
tendo sido convencionado prazo para a restituição da coisa, o depositário tem o
direito de a restituir a todo o tempo; se, porém, tiver sido convencionado
prazo, só havendo justa causa o pode fazer antes de o prazo findar.
SECÇÃO IV
Depósito de coisa controvertida
ARTIGO 1202º
(Noção)
Se
duas ou mais pessoas disputam a propriedade de uma coisa ou outro direito sobre
ela, podem por meio de depósito entregá-la a terceiro, para que este a guarde
e, resolvida a controvérsia, a restitua à pessoa a quem se apurar que pertence.
ARTIGO 1203º
(Onerosidade do depósito)
O
depósito de coisa controvertida presume-se oneroso.
ARTIGO 1204º
(Administração da coisa)
Salvo
convenção em contrário, cabe ao depositário a obrigação de administrar a coisa.
SECÇÃO V
Depósito irregular
ARTIGO 1205º
(Noção)
Diz-se
irregular o depósito que tem por objecto coisas fungíveis.
ARTIGO 1206º
(Regime)
Consideram-se
aplicáveis ao depósito irregular, na medida do possível, as normas relativas ao
contrato de mútuo.
CAPÍTULO XII
Empreitada
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1207º
(Noção)
Empreitada
é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar
certa obra, mediante um preço.
ARTIGO 1208º
(Execução da obra)
O
empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e
sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso
ordinário ou previsto no contrato.
ARTIGO 1209º
(Fiscalização)
1.
O dono da obra pode fiscalizar, à sua custa, a execução dela, desde que não
perturbe o andamento ordinário da empreitada.
2.
A fiscalização feita pelo dono da obra, ou por comissário, não impede aquele,
findo o contrato, de fazer valer os seus direitos contra o empreiteiro, embora
sejam aparentes os vícios da coisa ou notória a má execução do contrato,
excepto se tiver havido da sua parte concordância expressa com a obra
executada.
ARTIGO 1210º
(Fornecimento dos materiais e utensílios)
1.
Os materiais e utensílios necessários à execução da obra devem ser fornecidos
pelo empreiteiro, salvo convenção ou uso em contrário.
2.
No silêncio do contrato, os materiais devem corresponder às características da
obra e não podem ser de qualidade inferior à média.
ARTIGO 1211º
(Determinação e pagamento do preço)
1.
É aplicável à determinação do
preço, com as necessárias adaptações, o
disposto
no artigo 883º.
2.
O preço deve ser pago, não havendo cláusula ou uso em contrário, no acto de
aceitação da obra.
ARTIGO 1212º
(Propriedade da obra)
1.
No caso de empreitada de construção de coisa móvel com materiais fornecidos, no
todo ou na sua maior parte, pelo empreiteiro, a aceitação da coisa importa a
transferência da propriedade para o dono da obra; se os materiais foram
fornecidos por este, continuam a ser propriedade dele, assim como é propriedade
sua a coisa logo que seja concluída.
2.
No caso de empreitada de construção de imóveis, sendo o solo ou a superfície
pertença do dono da obra, a coisa é propriedade deste, ainda que seja o
empreiteiro quem fornece os materiais; estes consideram-se adquiridos pelo dono
da obra à medida que vão sendo incorporados no solo.
ARTIGO 1213º
(Subempreitada)
1.
Subempreitada é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o
empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte
dela.
2.
É aplicável à subempreitada, assim como ao concurso de auxiliares na execução
da empreitada, o disposto no artigo 264º, com as necessárias adaptações.
SECÇÃO II
Alterações e obras novas
ARTIGO 1214º
(Alterações da iniciativa do empreiteiro)
1.
O empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, fazer alterações ao
plano convencionado.
2.
A obra alterada sem autorização é havida como defeituosa; mas, se o dono quiser
aceitá-la tal como foi executada, não fica obrigado a qualquer suplemento de
preço nem a indemnização por enriquecimento sem causa.
3.
Se tiver sido fixado para a obra um preço global e a autorização não tiver sido
dada por escrito com fixação do aumento de preço, o empreiteiro só pode exigir
do dono da obra uma indemnização correspondente ao enriquecimento deste.
ARTIGO 1215º
(Alterações necessárias)
1.
Se, para execução da obra, for necessário, em consequência de direitos de
terceiro ou de regras técnicas, introduzir alterações ao plano convencionado, e
as partes não vierem a acordo, compete ao tribunal determinar essas alterações
e fixar as correspondentes modificações quanto ao preço e prazo de execução.
2.
Se, em consequência das alterações, o preço for elevado em mais de vinte por
cento, o empreiteiro pode denunciar o contrato e exigir uma indemnização
equitativa.
ARTIGO 1216º
(Alterações exigidas pelo dono da obra)
1.
O dono da obra pode exigir que sejam feitas alterações ao plano convencionado,
desde que o seu valor não exceda a quinta parte do preço estipulado e não haja
modificação da natureza da obra.
2.
O empreiteiro tem direito a um aumento do preço estipulado, correspondente ao
acréscimo de despesa e trabalho, e a um prolongamento do prazo para a execução
da obra.
3.
Se das alterações introduzidas resultar uma diminuição de custo ou de trabalho,
o empreiteiro tem direito ao preço estipulado, com dedução do que, em
consequência das alterações, poupar em despesas ou adquirir por outras
aplicações da sua actividade.
ARTIGO 1217º
(Alterações posteriores à entrega e obras novas)
1.
Não é aplicável o disposto nos artigos precedentes às alterações feitas depois
da entrega da obra, nem às obras que tenham autonomia em relação às previstas
no contrato.
2.
O dono da obra tem o direito de recusar as alterações e as obras referidas no
número anterior, se as não tiver autorizado; pode, além disso, exigir a sua
eliminação, se esta for possível, e, em qualquer caso, uma indemnização pelo
prejuízo, nos termos gerais.
SECÇÃO III
Defeitos da obra
ARTIGO 1218º
(Verificação da obra)
1.
O dono da obra deve verificar, antes de a aceitar, se ela se encontra nas
condições convencionadas e sem vícios.
2.
A verificação deve ser feita dentro do prazo usual ou , na falta de uso, dentro
do período que se julgue razoável depois de o empreiteiro colocar o dono da
obra em condições de a poder fazer.
3.
Qualquer das partes tem o direito de exigir que a verificação seja feita, à sua
custa, por peritos.
4.
Os resultados da verificação devem ser comunicados ao empreiteiro.
5.
A falta da verificação ou da comunicação importa aceitação da obra.
ARTIGO 1219º
(Casos de irresponsabilidade do empreiteiro)
1.
O empreiteiro não responde pelos defeitos da obra, se o dono a aceitou sem
reserva, com conhecimento deles.
2.
Presumem-se conhecidos os defeitos aparentes, tenha ou não havido verificação
da obra.
ARTIGO 1220º
(Denúncia dos defeitos)
1.
O dono da obra deve, sob pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos
seguintes, denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias
seguintes ao seu descobrimento.
2.
Equivale à denúncia o reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência
do defeito.
ARTIGO 1221º
(Eliminação dos defeitos)
1.
Se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir
do empreiteiro a sua eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode
exigir nova construção.
2.
Cessam os direitos conferidos no número anterior, se as despesas forem
desproporcionadas em relação ao proveito.
ARTIGO 1222º
(Redução do preço e resolução do contrato)
1.
Não sendo eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, o dono pode
exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a
obra inadequada ao fim a que se destina.
2.
A redução do preço é feita nos termos do artigo 884º.
ARTIGO 1223º
(Indemnização)
O
exercício dos direitos conferidos nos artigos antecedentes não exclui o direito
a ser indemnizado nos termos gerais.
ARTIGO 1224º
(Caducidade)
1.
Os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato
e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de um ano a contar da
recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da
caducidade prevista no artigo 1220º.
2.
Se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de
caducidade conta-se a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles
direitos podem ser exercidos depois de decorrerem dois anos sobre a entrega da
obra.
ARTIGO 1225º
(Imóveis destinados a longa duração)
1.
Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219º e seguintes, se a empreitada tiver
por objecto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros
imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos
a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra,
por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na
execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o
empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro
adquirente.
2.
A denúncia, em qualquer dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a
indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia.
3.
Os prazos previstos no número anterior são igualmente aplicáveis ao direito à
eliminação dos defeitos, previstos no artigo 1221º.
4.
O disposto nos números anteriores é aplicável ao vendedor de imóvel que o tenha
construído, modificado ou reparado.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1226º
(Responsabilidade dos subempreiteiros)
O
direito de regresso do empreiteiro contra os subempreiteiros quanto aos
direitos conferidos nos artigos anteriores caduca, se não lhes for comunicada a
denúncia dentro dos trinta dias seguintes à sua recepção.
SECÇÃO IV
Impossibilidade de cumprimento e
risco
pela perda ou deterioração da obra
ARTIGO 1227º
(Impossibilidade de execução da obra)
Se
a execução da obra se tornar impossível por causa não imputável a qualquer das
partes, é aplicável o disposto no artigo 790º; tendo, porém, havido começo de
execução, o dono da obra é obrigado a indemnizar o empreiteiro do trabalho
executado e das despesas realizadas.
ARTIGO 1228º
(Risco)
1.
Se, por causa não imputável a qualquer das partes, a coisa perecer ou se
deteriorar, o risco corre por conta do proprietário.
2.
Se, porém, o dono da obra estiver em mora quanto à verificação ou aceitação da
coisa, o risco corre por conta dele.
SECÇÃO V
Extinção do contrato
ARTIGO 1229º
(Desistência do dono da obra)
O
dono da obra pode desistir da empreitada a todo o tempo, ainda que tenha sido
iniciada a sua execução contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e
trabalho e do proveito que poderia tirar da obra.
ARTIGO 1230º
(Morte ou incapacidade das partes)
1.
O contrato de empreitada não se extingue por morte do dono da obra, nem por
morte ou incapacidade do empreiteiro, a não ser que, neste último caso, tenham
sido tomadas em conta, no acto da celebração, as qualidades pessoais deste.
2.
Extinto o contrato por morte ou incapacidade do empreiteiro, considera-se a
execução da obra como impossível por causa não imputável a qualquer das partes.
CAPÍTULO XIII
Renda perpétua
ARTIGO 1231º
(Noção)
Contrato
de renda perpétua é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa
soma de dinheiro, ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a
segunda se obriga, sem limite de tempo, a pagar, como renda, determinada
quantia em dinheiro ou outra coisa fungível.
ARTIGO 1232º
(Forma)
A
renda perpétua só é válida se for constituída por escritura pública.
ARTIGO 1233º
(Caução)
O
devedor da renda é obrigado a caucionar o cumprimento da obrigação.
ARTIGO 1234º
(Exclusão do direito de acrescer)
Não
há na renda perpétua direito de acrescer entre os beneficiários.
ARTIGO 1235º
(Resolução do contrato)
Ao
beneficiário da renda é permitido resolver o contrato, quando o devedor se
constitua em mora quanto às prestações correspondentes a dois anos, ou se
verifique algum dos casos previstos no artigo 780º.
ARTIGO 1236º
(Remição)
1.
O devedor pode a todo o tempo remir a renda, mediante o pagamento da
importância em dinheiro que represente a capitalização da mesma, à taxa legal
de juros.
2.
O direito de remição é irrenunciável, mas é lícito estipular-se que não possa
ser exercido em vida do primeiro beneficiário ou dentro de certo prazo não
superior a vinte anos.
ARTIGO 1237º
(Juros)
A
renda perpétua fica sujeita às disposições legais sobre juros, no que for
compatível com a sua natureza e com o preceituado nos artigos antecedentes.
CAPÍTULO XIV
Renda vitalícia
ARTIGO 1238º
(Noção)
Contrato
de renda vitalícia é aquele em que uma pessoa aliena em favor de outra certa
soma de dinheiro, ou qualquer outra coisa móvel ou imóvel, ou um direito, e a
segunda se obriga a pagar certa quantia em dinheiro ou outra coisa fungível
durante a vida do alienante ou de terceiro.
ARTIGO 1239º
(Forma)
Sem prejuízo da aplicação das regras
especiais de forma quanto à alienação da coisa ou do direito, a renda vitalícia
deve ser constituída por documento escrito, sendo necessária escritura pública
se a coisa ou o direito alienado for de valor igual ou superior a 20 000 euros.
(Decreto-Lei n.º 343/98,
de 6 de Novembro)
ARTIGO 1240º
(Duração da renda)
A
renda pode ser convencionada por uma ou duas vidas.
ARTIGO 1241º
(Direito de acrescer)
No
silêncio do contrato, sendo dois ou mais os beneficiários da renda, e falecendo
algum deles, a sua parte acresce à dos outros.
ARTIGO 1242º
(Resolução do contrato)
Ao
beneficiário da renda vitalícia é lícito resolver o contrato nos mesmos termos
em que é permitida a resolução da renda perpétua ao respectivo beneficiário.
ARTIGO 1243º
(Remição)
O
devedor só pode remir a renda, com reembolso do que tiver recebido e perda das
prestações já efectuadas, se assim se tiver convencionado.
ARTIGO 1244º
(Prestações antecipadas)
Se
as prestações se vencem antecipadamente, a última é devida por inteiro, ainda
que o beneficiário faleça antes de completado o período respectivo.
CAPÍTULO XV
Jogo e aposta
ARTIGO 1245º
(Nulidade do contrato)
O
jogo e a aposta não são contratos válidos nem constiuem fonte de obrigações
civis; porém, quando lícitos, são fonte de obrigações naturais, excepto se
neles concorrer qualquer outro motivo de nulidade ou anulabilidade, nos termos
gerais de direito, ou se houver fraude do credor na sua execução.
ARTIGO 1246º
(Competições desportivas)
Exceptuam-se
do disposto no artigo anterior as competições desportivas, com relação às
pessoas que nelas tomarem parte.
ARTIGO 1247º
(Legislação especial)
Fica
ressalvada a legislação especial sobre a matéria de que trata este capítulo.
CAPÍTULO XVI
Transacção
ARTIGO 1248º
(Noção)
1.
Transacção é o contrato pelo qual as partes previnem ou terminam um litígio
mediante recíprocas concessões.
2.
As concessões podem envolver a constituição, modificação ou extinção de
direitos diversos do direito controvertido.
ARTIGO 1249º
(Matérias insusceptíveis de transacção)
As
partes não podem transigir sobre direitos de que lhes não é permitido dispor,
nem sobre questões respeitantes a negócios jurídicos ilícitos.
ARTIGO 1250º
(Forma)
A
transacção preventiva ou extrajudicial constará de escritura pública quando
dela possa derivar algum efeito para o qual a escritura seja exigida, e
constará de documento escrito nos casos restantes.
LIVRO III
DIREITO DAS COISAS
TÍTULO I
DA POSSE
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1251º
(Noção)
Posse
é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao
exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.
ARTIGO 1252º
(Exercício da posse por intermediário)
1.
A posse tanto pode ser exercida pessoalmente como por intermédio de outrem.
2.
Em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto, sem
prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 1257º.
ARTIGO 1253º
(Simples detenção)
São
havidos como detentores ou possuidores precários:
a)
Os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiários do
direito;
b)
Os que simplesmente se aproveitam da tolerância do titular do direito;
c)
Os representantes ou mandatários do possuidor e, de um modo geral, todos os que
possuem em nome de outrem.
ARTIGO 1254º
(Presunções de posse)
1.
Se o possuidor actual possuiu em tempo mais remoto, presume-se que possuiu
igualmente no tempo intermédio.
2.
A posse actual não faz presumir a posse anterior, salvo quando seja titulada;
neste caso, presume-se que há posse desde a data do título.
ARTIGO 1255º
(Sucessão na posse)
Por
morte do possuidor, a posse continua nos seus sucessores desde o momento da
morte, independentemente da apreensão material da coisa.
ARTIGO 1256º
(Acessão da posse)
1.
Aquele que houver sucedido na posse de outrem por título diverso da sucessão
por morte pode juntar à sua a posse do antecessor.
2.
Se, porém, a posse do antecessor for de natureza diferente da posse do
sucessor, a acessão só se dará dentro dos limites daquela que tem menor âmbito.
ARTIGO 1257º
(Conservação da posse)
1.
A posse mantém-se enquanto durar a actuação correspondente ao exercício do
direito ou a possibilidade de a continuar.
2.
Presume-se que a posse continua em nome de quem a começou.
CAPÍTULO II
Caracteres da posse
ARTIGO 1258º
(Espécies de posse)
A
posse pode ser titulada ou não titulada, de boa ou de má fé, pacífica ou
violenta, pública ou oculta.
ARTIGO 1259º
(Posse titulada)
1.
Diz-se titulada a posse fundada em qualquer modo legítimo de adquirir,
independentemente, quer do direito do transmitente, quer da validade
substancial do negócio jurídico.
2.
O título não se presume, devendo a sua existência ser provada por aquele que o
invoca.
ARTIGO 1260º
(Posse de boa fé)
1.
A posse diz-se de boa fé, quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que
lesava o direito de outrem.
2.
A posse titulada presume-se de boa fé, e a não titulada, de má fé.
3.
A posse adquirida por violência é sempre considerada de má fé, mesmo quando
seja titulada.
ARTIGO 1261º
(Posse pacífica)
1.
Posse pacífica é a que foi adquirida sem violência.
2.
Considera-se violenta a posse quando, para obtê-la, o possuidor usou de coacção
física, ou de coacção moral nos termos do artigo 255º.
ARTIGO 1262º
(Posse pública)
Posse
pública é a que se exerce de modo a poder ser conhecida pelos interessados.
CAPÍTULO III
Aquisição e perda da posse
ARTIGO 1263º
(Aquisição da posse)
A
posse adquire-se:
a)
Pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao
exercício do direito;
b)
Pela tradição material ou simbólica da coisa, efectuada pelo anterior
possuidor;
c)
Por constituto possessório;
d)
Por inversão do título da posse.
ARTIGO 1264º
(Constituto possessório)
1.
Se o titular do direito real, que está na posse da coisa, transmitir esse
direito a outrem, não deixa de considerar-se transferida a posse para o
adquirente, ainda que, por qualquer causa, aquele continue a deter a coisa.
2.
Se o detentor da coisa, à data do negócio translativo do direito, for um
terceiro, não deixa de considerar-se igualmente transferida a posse, ainda que
essa detenção haja de continuar.
ARTIGO 1265º
(Inversão do título da posse)
A
inversão do título da posse pode dar-se por oposição do detentor do direito
contra aquele em cujo nome possuía ou por acto de terceiro capaz de transferir
a posse.
ARTIGO 1266º
(Capacidade para adquirir a posse)
Podem
adquirir posse todos os que têm uso da razão, e ainda os que o não têm,
relativamente às coisas susceptíveis de ocupação.
ARTIGO 1267º
(Perda da posse)
1.
O possuidor perde a posse:
a)
Pelo abandono;
b)
Pela perda ou destruição material da coisa ou por esta ser posta fora do
comércio;
c)
Pela cedência;
d)
Pela posse de outrem, mesmo contra a vontade do antigo possuidor, se a nova
posse houver durado por mais de um ano.
2.
A nova posse de outrem conta-se desde o seu início, se foi tomada publicamente,
ou desde que é conhecida do esbulhado, se foi tomada ocultamente; sendo
adquirida por violência, só se conta a partir da cessação desta.
CAPÍTULO IV
Efeitos da posse
ARTIGO 1268º
(Presunção da titularidade do direito)
1.
O possuidor goza da presunção da titularidade do direito excepto se existir, a
favor de outrem, presunção fundada em registo anterior ao início da posse.
2.
Havendo concorrência de presunções legais fundadas em registo, será a
prioridade entre elas fixada na legislação respectiva.
ARTIGO 1269º
(Perda ou deterioração da coisa)
O
possuidor de boa fé só responde pela perda ou deterioração da coisa se tiver
procedido com culpa.
ARTIGO 1270º
(Frutos na posse de boa fé)
1.
O possuidor de boa fé faz seus os frutos naturais percebidos até ao dia em que
souber que está a lesar com a sua posse o direito de outrem, e os frutos civis
correspondentes ao mesmo período.
2.
Se ao tempo em que cessa a boa fé estiverem pendentes frutos naturais, é o
titular obrigado a indemnizar o possuidor das despesas de cultura, sementes ou
matérias-primas e, em geral, de todas as despesas de produção, desde que não
sejam superiores ao valor dos frutos que vierem a ser colhidos.
3.
Se o possuidor tiver alienado frutos antes da colheita e antes de cessar a boa
fé, a alienação subsiste mas o produto da colheita pertence ao titular do
direito, deduzida a indemnização a que o número anterior se refere.
ARTIGO 1271º
(Frutos na posse de má fé)
O
possuidor de má fé deve restituir os frutos que a coisa produziu até ao termo
da posse e responde, além disso, pelo valor daqueles que um proprietário
diligente poderia ter obtido.
ARTIGO 1272º
(Encargos)
Os
encargos com a coisa são pagos pelo titular do direito e pelo possuidor, na
medida dos direitos de cada um deles sobre os frutos no período a que respeitam
os encargos.
ARTIGO 1273º
(Benfeitorias necessárias e úteis)
1.
Tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das
benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as
benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento
dela.
2.
Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das
benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas,
calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
ARTIGO 1274º
(Compensação de benfeitorias com deteriorações)
A
obrigação de indemnização por benfeitorias
é susceptível de compensação com a
responsabilidade do possuidor por deteriorações.
ARTIGO 1275º
(Benfeitorias voluptuárias)
1.
O possuidor de boa fé tem direito a levantar as benfeitorias voluptuárias, não
se dando detrimento da coisa; no caso contrário, não pode levantá-las nem haver
o valor delas.
2.
O possuidor de má fé perde, em qualquer caso, as benfeitorias voluptuárias que
haja feito.
CAPÍTULO V
Defesa da posse
ARTIGO 1276º
(Acção de prevenção)
Se
o possuidor tiver justo receio de ser perturbado ou esbulhado por outrem, será
o autor da ameaça, a requerimento do ameaçado, intimado para se abster de lhe
fazer agravo, sob pena de multa e responsabilidade pelo prejuízo que causar.
ARTIGO 1277º
(Acção directa e defesa judicial)
O
possuidor que for perturbado ou esbulhado pode manter-se ou restituir-se por sua
própria força e autoridade, nos termos do artigo 336º, ou recorrer ao tribunal
para que este lhe mantenha ou restitua a posse.
ARTIGO 1278º
(Manutenção e restituição da posse)
1.
No caso de recorrer ao tribunal, o possuidor perturbado ou esbulhado será
mantido ou restituído enquanto não for convencido na questão da titularidade do
direito.
2.
Se a posse não tiver mais de um ano, o possuidor só pode ser mantido ou
restituído contra quem não tiver melhor posse.
3.
É melhor posse a que for titulada; na falta de título, a mais antiga; e, se
tiverem igual antiguidade, a posse actual.
ARTIGO 1279º
(Esbulho violento)
Sem
prejuízo do disposto nos artigos anteriores, o possuidor que for esbulhado com
violência tem o direito de ser restituído provisoriamente à sua posse, sem
audiência do esbulhador.
ARTIGO 1280º
(Exclusão das servidões não aparentes)
As
acções mencionadas nos artigos anteriores não são aplicáveis à defesa das
servidões não aparentes, salvo quando a posse se funde em título provindo do proprietário
do prédio serviente ou de quem lho transmitiu.
ARTIGO 1281º
(Legitimidade)
1.
A acção de manutenção da posse pode ser intentada pelo perturbado ou pelos seus
herdeiros, mas apenas contra o perturbador, salva a acção de indemnização
contra os herdeiros deste.
2.
A acção de restituição de posse pode ser intentada pelo esbulhado ou pelos seus
herdeiros, não só contra o esbulhador ou seus herdeiros, mas ainda contra quem
esteja na posse da coisa e tenha conhecimento do esbulho.
ARTIGO 1282º
(Caducidade)
A
acção de manutenção, bem como as de restituição da posse, caducam, se não forem
intentadas dentro do ano subsequente ao facto da turbação ou do esbulho, ou ao
conhecimento dele quando tenha sido praticado a ocultas.
ARTIGO 1283º
(Efeito da manutenção ou restituição)
É
havido como nunca perturbado ou esbulhado o que foi mantido na sua posse ou a
ela foi restituído judicialmente.
ARTIGO 1284º
(Indemnização de prejuízos e encargos com a
restituição)
1.
O possuidor mantido ou restituído tem direito a ser indemnizado do prejuízo que
haja sofrido em consequência da turbação ou do esbulho.
2.
A restituição da posse é feita à custa do esbulhador e no lugar do esbulho.
ARTIGO 1285º
(Embargos de terceiro)
O
possuidor cuja posse for ofendida por penhora ou diligência ordenada
judicialmente pode defender a sua posse mediante embargos de terceiro, nos
termos definidos na lei de processo.
Redacção introduzida pelo Dec.-Lei 38/2003, de 08.03.
Redacção anterior: O possuidor cuja posse for ofendida por diligência ordenada
judicialmente pode defender a sua posse mediante embargos de terceiro, nos
termos definidos na lei de processo.
¾ Ver art.os 351.º e 393.º
do CPC
ARTIGO 1286º
(Defesa da composse)
1.
Cada um dos compossuidores, seja qual for a parte que lhe cabe, pode usar
contra terceiro dos meios facultados nos artigos precedentes, quer para defesa
da própria posse, quer para defesa da posse comum, sem que ao terceiro seja
lícito opor-lhe que ela não lhe pertence por inteiro.
2.
Nas relações entre compossuidores não é permitido o exercício da acção de
manutenção.
3.
Em tudo o mais são aplicáveis à composse as disposições do presente capítulo.
CAPÍTULO VI
Usucapião
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1287º
(Noção)
A
posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida
por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário,
a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se
chama usucapião.
ARTIGO 1288º
(Retroactividade da usucapião)
Invocada
a usucapião, os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse.
ARTIGO 1289º
(Capacidade para adquirir)
1.
A usucapião aproveita a todos os que podem adquirir.
2.
Os incapazes podem adquirir por usucapião, tanto por si como por intermédio das
pessoas que legalmente os representam.
ARTIGO 1290º
(Usucapião em caso de detenção)
Os
detentores ou possuidores precários não podem adquirir para si, por usucapião,
o direito possuído, excepto achando-se invertido o título da posse; mas, neste
caso, o tempo necessário para a usucapião só começa a correr desde a inversão
do título.
ARTIGO 1291º
(Usucapião por compossuidor)
A
usucapião por um compossuidor relativamente ao objecto da posse comum aproveita
igualmente aos demais compossuidores.
ARTIGO 1292º
(Aplicação das regras da prescrição)
São
aplicáveis à usucapião, com as necessárias
adaptações, as disposições relativas
à suspensão e interrupção da
prescrição, bem como o preceituado nos artigos
300º, 302º, 303º e 305º.
SECÇÃO II
Usucapião de imóveis
ARTIGO 1293º
(Direitos excluídos)
Não
podem adquirir-se por usucapião:
a)
As servidões prediais não aparentes;
b)
Os direitos de uso e de habitação.
ARTIGO 1294º
(Justo título e registo)
Havendo
título de aquisição e registo deste, a usucapião tem lugar:
a)
Quando a posse, sendo de boa fé, tiver durado por dez anos, contados desde a
data do registo;
b)
Quando a posse, ainda que de má fé, houver durado quinze anos, contados da
mesma data.
ARTIGO 1295º
(Registo da mera posse)
1.
Não havendo registo do título de aquisição, mas registo da mera posse, a
usucapião tem lugar:
a)
Se a posse tiver continuado por cinco anos, contados desde a data do registo, e
for de boa fé;
b)
Se a posse tiver continuado por dez anos, a contar da mesma data, ainda que não
seja de boa fé.
2.
A mera posse só será registada em vista de sentença passada em julgado, na qual
se reconheça que o possuidor tem possuído pacífica e publicamente por tempo não
inferior a cinco anos.
ARTIGO 1296º
(Falta de registo)
Não
havendo registo do título nem da mera posse, a usucapião só pode dar-se no
termo de quinze anos, se a posse for de boa fé, e de vinte anos, se for de má
fé.
ARTIGO 1297º
(Posse violenta ou oculta)
Se
a posse tiver sido constituída com violência ou tomada ocultamente, os prazos
da usucapião só começam a contar-se desde que cesse a violência ou a posse se
torne pública.
SECÇÃO III
Usucapião de móveis
ARTIGO 1298º
(Coisas sujeitas a registo)
Os
direitos reais sobre coisas móveis sujeitas a registo adquirem-se por
usucapião, nos termos seguintes:
a)
Havendo título de aquisição e registo deste, quando a posse tiver durado dois
anos, estando o possuidor de boa fé, ou quatro anos, se estiver de má fé;
b)
Não havendo registo, quando a posse tiver durado dez anos, independentemente da
boa fé do possuidor e da existência de título.
ARTIGO 1299º
(Coisas não sujeitas a registo)
A
usucapião de coisas não sujeitas a registo dá-se quando a posse, de boa fé e
fundada em justo título, tiver durado três anos, ou quando, independentemente
da boa fé e de título, tiver durado seis anos.
ARTIGO 1300º
(Posse violenta ou oculta)
1.
É aplicável à usucapião de móveis o disposto no artigo 1297º.
2.
Se, porém, a coisa possuída passar a terceiro de boa fé antes da cessação da
violência ou da publicidade da posse, pode o interessado adquirir direitos
sobre ela passados quatros anos desde a constituição da sua posse, se esta for
titulada, ou sete, na falta de título.
ARTIGO 1301º
(Coisa comprada a comerciante)
O
que exigir de terceiro coisa por este comprada, de boa fé, a comerciante que
negoceie em coisa do mesmo ou semelhante género é obrigado a restituir o preço
que o adquirente tiver dado por ela, mas goza do direito de regresso contra
aquele que culposamente deu causa ao prejuízo.
TÍTULO II
DO DIREITO DE PROPRIEDADE
CAPÍTULO I
Propriedade em geral
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1302º
(Objecto do direito de propriedade)
Só
as coisas corpóreas, móveis ou imóveis, podem ser objecto do direito de
propriedade regulado neste código.
ARTIGO 1303º
(Propriedade intelectual)
1.
Os direitos de autor e a propriedade industrial estão sujeitos a legislação
especial.
2.
São, todavia, subsidiariamente aplicáveis aos direitos de autor e à propriedade
industrial as disposições deste código, quando se harmonizem com a natureza
daqueles direitos e não contrariem o regime para eles especialmente
estabelecido.
ARTIGO 1304º
(Domínio do Estado e de outras pessoas colectivas
públicas)
O
domínio das coisas pertencentes ao Estado ou a quaisquer outras pessoas
colectivas públicas está igualmente sujeito às disposições deste código em tudo
o que não for especialmente regulado e não contrarie a natureza própria daquele
domínio.
ARTIGO 1305º
(Conteúdo do direito de propriedade)
O
proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e
disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com
observância das restrições por ela impostas.
ARTIGO 1306º
(«Numerus clausus»)
1.
Não é permitida a constituição, com
carácter real, de restrições ao direito de
propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos
casos previstos na
lei; toda a restrição resultante de negócio
jurídico, que não esteja nestas condições,
tem natureza obrigacional.
2.
O quinhão e o compáscuo constituídos até à entrada em vigor deste código ficam
sujeitos à legislação anterior.
ARTIGO 1307º
(Propriedade resolúvel e temporária)
1.
O direito de propriedade pode constituir-se sob condição.
2.
A propriedade temporária só é admitida nos casos especialmente previstos na
lei.
3.
À propriedade sob condição é aplicável o disposto nos artigos 272º a 277º.
ARTIGO 1308º
(Expropriações)
Ninguém
pode ser privado, no todo ou em parte, do seu direito de propriedade senão nos
casos fixados na lei.
ARTIGO 1309º
(Requisições)
Só
nos casos previstos na lei pode ter lugar a requisição temporária de coisas do
domínio privado.
ARTIGO 1310º
(Indemnizações)
Havendo
expropriação por utilidade pública ou particular ou requisição de bens, é
sempre devida a indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos
outros direitos reais afectados.
SECÇÃO II
Defesa da propriedade
ARTIGO 1311º
(Acção de reivindicação)
1.
O proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da
coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente
restituição do que lhe pertence.
2.
Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser
recusada nos casos previstos na lei.
ARTIGO 1312º
(Encargos com a restituição)
A
restituição da coisa é feita à custa do esbulhador, se o houver, e no lugar do
esbulho.
ARTIGO 1313º
(Imprescritibilidade da acção de reivindicação)
Sem
prejuízo dos direitos adquiridos por usucapião, a acção de reivindicação não
prescreve pelo decurso do tempo.
ARTIGO 1314º
(Acção directa)
É
admitida a defesa da propriedade por meio de acção directa, nos termos do
artigo 336º.
ARTIGO 1315º
(Defesa de outros direitos reais)
As
disposições precedentes são aplicáveis, com
as necessárias correcções, à defesa
de todo o direito real.
CAPÍTULO II
Aquisição da propriedade
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1316º
(Modos de aquisição)
O
direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião,
ocupação, acessão e demais modos previstos na lei.
ARTIGO 1317º
(Momento da aquisição)
O
momento da aquisição do direito de propriedade é:
a)
No caso de contrato, o designado nos artigos 408º e 409º;
b)
No caso de sucessão por morte, o da abertura da sucessão;
c)
No caso de usucapião, o do início da posse;
d)
Nos casos de ocupação e acessão, o da verificação dos factos respectivos.
SECÇÃO II
Ocupação
ARTIGO 1318º
(Coisas susceptíveis de ocupação)
Podem
ser adquiridos por ocupação os animais e outras coisas móveis que nunca tiveram
dono, ou foram abandonados, perdidos ou escondidos pelos seus proprietários,
salvas as restrições dos artigos seguintes.
ARTIGO 1319º
(Caça e pesca)
A
ocupação dos animais bravios que se encontram no seu estado de liberdade
natural é regulada por legislação especial.
ARTIGO 1320º
(Animais selvagens com guarida própria)
1.
Os animais bravios habituados a certa guarida, ordenada por indústria do homem,
que mudem para outra guarida de diverso dono ficam pertencendo a este, se não
puderem ser individualmente reconhecidos; no caso contrário, pode o antigo dono
recuperá-los, contanto que o faça sem prejuízo do outro.
2.
Provando-se, porém, que os animais foram atraídos por fraude ou artifício do
dono da guarida onde se hajam acolhido, é este obrigado a entregá-los ao antigo
dono, ou a pagar-lhe em triplo o valor deles, se lhe não for possível
restituí-los.
ARTIGO 1321º
(Animais ferozes fugidos)
Os
animais ferozes e maléficos que se evadirem da clausura em que o seu dono os
tiver podem ser destruídos ou ocupados livremente por qualquer pessoa que os
encontre.
ARTIGO 1322º
(Enxames de abelhas)
1.
O proprietário de enxame de abelhas tem o direito de o perseguir e capturar em
prédio alheio, mas é responsável pelos danos que causar.
2.
Se o dono da colmeia não perseguir o enxame logo que saiba terem as abelhas
enxameado, ou se decorrerem dois dias sem que o enxame tenha sido capturado,
pode ocupá-lo o proprietário do prédio onde ele se encontre, ou consentir que
outrem o ocupe.
ARTIGO 1323º
(Animais e coisas móveis perdidas)
1.
Aquele que encontrar animal ou outra coisa móvel perdida e souber a quem
pertence deve restituir o animal ou a coisa a seu dono, ou avisar este do achado;
se não souber a quem pertence, deve anunciar o achado pelo modo mais
conveniente, atendendo ao valor da coisa e às possibilidades locais, ou avisar
as autoridades, observando os usos da terra, sempre que os haja.
2.
Anunciado o achado, o achador faz sua a coisa perdida, se não for reclamada
pelo dono dentro do prazo de um ano, a contar do anúncio ou aviso.
3. Restituída a coisa, o achador tem direito à
indemnização do prejuízo havido e das despesas realizadas, bem como a um prémio
dependente do valor do achado, no momento da entrega, calculado pela forma
seguinte : até ao valor de € 4, 99, dez por cento; sobre o excedente desse
valor até € 24, 94, cinco por cento; sobre o restante, dois e meio por cento. (Redacção do Dec.-Lei n.º 323/01, de 17.12)
4.
O achador goza do direito de retenção e não responde, no caso de perda ou
deterioração da coisa, senão havendo da sua parte dolo ou culpa grave.
ARTIGO 1324º
(Tesouros)
1.
Se aquele que descobrir coisa móvel de algum valor, escondida ou enterrada, não
puder determinar quem é o dono dela, torna-se proprietário de metade do achado;
a outra metade pertence ao proprietário da coisa móvel ou imóvel onde o tesouro
estava escondido ou enterrado.
2.
O achador deve anunciar o achado nos termos do nº 1 do artigo anterior, ou
avisar as autoridades, excepto quando seja evidente que o tesouro foi escondido
ou enterrado há mais de vinte anos.
3.
Se o achador não cumprir o disposto no número anterior, ou fizer seu o achado
ou parte dele sabendo quem é o dono, ou ocultar do proprietário da coisa onde
ele se encontrava, perde em benefício do Estado os direitos conferidos no nº 1
deste artigo, sem exclusão dos que lhe possam caber como proprietário.
SECÇÃO III
Acessão
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1325º
(Noção)
Dá-se
a acessão, quando com a coisa que é propriedade de alguém se une e incorpora
outra coisa que lhe não pertencia.
ARTIGO 1326º
(Espécies)
1.
A acessão diz-se natural, quando resulta exclusivamente das forças da natureza;
dá-se a acessão industrial, quando, por facto do homem, se confundem objectos
pertencentes a diversos donos, ou quando alguém aplica o trabalho próprio a
matéria pertencente a outrem, confundindo o resultado desse trabalho com
propriedade alheia.
2.
A acessão industrial é mobiliária ou imobiliária, conforme a natureza das
coisas.
SUBSECÇÃO II
Acessão natural
ARTIGO 1327º
(Princípio geral)
Pertence
ao dono da coisa tudo o que a esta acrescer por efeito da natureza.
ARTIGO 1328º
(Aluvião)
1.
Pertence aos donos dos prédios confinantes com quaisquer correntes de água tudo
o que, por acção das águas, se lhes unir ou neles for depositado, sucessiva e
imperceptivelmente.
2.
É aplicável o disposto no número anterior ao terreno que insensivelmente se for
deslocando, por acção das águas, de uma das margens para outra, ou de um prédio
superior para outro inferior, sem que o proprietário do terreno perdido possa
invocar direitos sobre ele.
ARTIGO 1329º
(Avulsão)
1.
Se, por acção natural e violenta, a corrente arrancar quaisquer plantas ou
levar qualquer objecto ou porção conhecida de terreno, e arrojar essas coisas
sobre prédio alheio, o dono delas tem o direito de exigir que lhe sejam
entregues, contanto que o faça dentro de seis meses, se antes não foi
notificado para fazer a remoção no prazo judicialmente assinado.
2.
Não se fazendo a remoção nos prazos designados, é aplicável o disposto no
artigo anterior.
ARTIGO 1330º
(Mudança de leito)
1.
Se a corrente mudar de direcção, abandonando o leito antigo, os proprietários
deste conservam o direito que tinham sobre ele, e o dono do prédio invadido
conserva igualmente a propriedade do terreno ocupado de novo pela corrente.
2.
Se a corrente se dividir em dois ramos ou braços, sem que o leito antigo seja
abandonado, é ainda aplicável o disposto no número anterior.
ARTIGO 1331º
(Formação de ilhas e mouchões)
1.
As ilhas ou mouchões que se formem nas correntes de água pertencem ao dono da
parte do leito ocupado.
2.
Se, porém, as ilhas ou mouchões se formarem por avulsão, o proprietário do
terreno onde a diminuição haja ocorrido goza do direito de remoção nas
condições prescritas pelo artigo 1329º.
ARTIGO 1332º
(Lagos e lagoas)
As
disposições dos artigos antecedentes são aplicáveis aos lagos e lagoas, quando
aí ocorrerem factos análogos.
SUBSECÇÃO III
Acessão industrial mobiliária
ARTIGO 1333º
(União ou confusão de boa fé)
1.
Se alguém, de boa fé, unir ou confundir objecto seu com objecto alheio, de modo
que a separação deles não seja possível ou, sendo-o, dela resulte prejuízo para
alguma das partes, faz seu o objecto adjunto o dono daquele que for de maior
valor, contanto que indemnize o dono do outro ou lhe entregue coisa
equivalente.
2.
Se ambas as coisas forem de igual valor e os donos não acordarem sobre qual
haja de ficar com ela, abrir-se-á entre eles licitação, adjudicando-se o
objecto licitado àquele que maior valor oferecer por ele; verificada a soma que
no valor oferecido deve pertencer ao outro, é o adjudicatário obrigado a
pagar-lha.
3.
Se os interessados não quiserem licitar, será vendida a coisa e cada um deles
haverá no produto da venda a parte que deva tocar-lhe.
4.
Em qualquer dos casos previstos nos números anteriores, o autor da confusão é
obrigado a ficar com a coisa adjunta, ainda que seja de maior valor, se o dono
dela preferir a respectiva indemnização.
ARTIGO 1334º
(União ou confusão de má fé)
1.
Se a união ou confusão tiver sido feita de má fé e a coisa alheia puder ser
separada sem padecer detrimento, será esta restituída a seu dono, sem prejuízo
do direito que este tem de ser indemnizado do dano sofrido.
2.
Se, porém, a coisa não puder ser separada sem padecer detrimento, deve o autor
da união ou confusão restituir o valor da coisa e indemnizar o seu dono, quando
este não prefira ficar com ambas as coisas adjuntas e pagar ao autor da união
ou confusão o valor que for calculado segundo as regras do enriquecimento sem
causa.
ARTIGO 1335º
(Confusão casual)
1.
Se a adjunção ou confusão se operar casualmente e as coisas adjuntas ou
confundidas não puderem separar-se sem detrimento de alguma delas, ficam
pertencendo ao dono da mais valiosa, que pagará o justo valor da outra; se,
porém, este não quiser fazê-lo, assiste idêntico direito ao dono da menos
valiosa.
2.
Se nenhum deles quiser ficar com a coisa, será esta vendida, e cada um deles
haverá a parte do preço que lhe pertencer.
3.
Se ambas as coisas forem de igual valor, observar-se-á o disposto nos números 2
e 3 do artigo 1333º.
ARTIGO 1336º
(Especificação de boa fé)
1.
Quem de boa fé der nova forma, por seu trabalho, a coisa móvel pertencente a
outrem faz sua a coisa transformada, se ela não puder ser restituída à
primitiva forma ou não puder sê-lo sem perda do valor criado pela
especificação; neste último caso, porém, tem o dono da matéria o direito de
ficar com a coisa, se o valor da especificação não exceder o da matéria.
2.
Em ambos os casos previstos no número anterior, o que ficar com a coisa é
obrigado a indemnizar o outro do valor que lhe pertencer.
ARTIGO 1337º
(Especificação de má fé)
Se
a especificação tiver sido feita de má fé, será a coisa especificada restituída
a seu dono no estado em que se encontrar, com indemnização dos danos, sem que o
dono seja obrigado a indemnizar o especificador, se o valor da especificação
não tiver aumentado em mais de um terço o valor da coisa especificada; se o
aumento for superior, deve o dono da coisa repor o que exceder o dito terço.
ARTIGO 1338º
(Casos de especificação)
Constituem
casos de especificação a escrita, a pintura, o desenho, a fotografia, a
impressão, a gravura e outros actos semelhantes, feitos com utilização de
materiais alheios.
SUBSECÇÃO IV
Acessão industrial imobiliária
ARTIGO 1339º
(Obras, sementeiras ou plantações com materiais
alheios)
Aquele
que em terreno seu construir obra ou fizer sementeira ou plantação com materiais,
sementes ou plantas alheias adquire os materiais, sementes ou plantas que
utilizou, pagando o respectivo valor, além da indemnização a que haja lugar.
ARTIGO 1340º
(Obras, sementeiras ou plantações
feitas de boa fé em terreno alheio)
1.
Se alguém, de boa fé, construir obra em terreno alheio, ou nele fizer
sementeira ou plantação, e o valor que as obras, sementeiras ou plantações
tiverem trazido à totalidade do prédio for maior do que o valor que este tinha
antes, o autor da incorporação adquire a propriedade dele, pagando o valor que
o prédio tinha antes das obras, sementeiras ou plantações.
2.
Se o valor acrescentado for igual, haverá licitação entre o antigo dono e o
autor da incorporação, pela forma estabelecida no nº 2 do artigo 1333º.
3.
Se o valor acrescentado for menor, as obras, sementeiras ou plantações
pertencem ao dono do terreno, com obrigação de indemnizar o autor delas do
valor que tinham ao tempo da incorporação.
4.
Entende-se que houve boa fé, se o autor da obra, sementeira ou plantação
desconhecia que o terreno era alheio, ou se foi autorizada a incorporação pelo
dono do terreno.
ARTIGO 1341º
(Obras, sementeiras ou plantações
feitas de má fé em terreno alheio)
Se
a obra, sementeira ou plantação for feita de má fé, tem o dono do terreno o
direito de exigir que seja desfeita e que o terreno seja restituído ao seu
primitivo estado à custa do autor dela, ou, se o preferir, o direito de ficar
com a obra, sementeira ou plantação pelo valor que for fixado segundo as regras
do enriquecimento sem causa.
ARTIGO 1342º
(Obras, sementeiras ou plantações
feitas com materiais alheios em terreno alheio)
1.
Quando as obras, sementeiras ou plantações sejam feitas em terreno alheio com
materiais, sementes ou plantas alheias, ao dono dos materiais, sementes ou
plantas cabem os direitos conferidos no artigo 1340º ao autor da incorporação,
quer este esteja de boa, quer de má fé.
2.
Se, porém, o dono dos materiais, sementes ou plantas tiver culpa, é-lhe
aplicável o disposto no artigo antecedente em relação ao autor da incorporação;
neste caso, se o autor da incorporação estiver de má fé, é solidária a
responsabilidade de ambos, e a divisão do enriquecimento é feita em proporção
do valor dos materiais, sementes ou plantas e da mão-de-obra.
ARTIGO 1343º
(Prolongamento de edifício por terreno alheio)
1.
Quando na construção de um edifício em terreno próprio se ocupe, de boa fé, uma
parcela de terreno alheio, o construtor pode adquirir a propriedade do terreno
ocupado, se tiverem decorrido três meses a contar do início da ocupação, sem
oposição do proprietário, pagando o valor do terreno e reparando o prejuízo
causado, designadamente o resultante da depreciação eventual do terreno
restante.
2.
É aplicável o disposto no número anterior relativamente a qualquer direito real
de terceiro sobre o terreno ocupado.
CAPÍTULO III
Propriedade de imóveis
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1344º
(Limites materiais)
1.
A propriedade dos imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície,
bem como o subsolo, com tudo o que neles se contém e não esteja desintegrado do
domínio por lei ou negócio jurídico.
2.
O proprietário não pode, todavia, proibir os actos de terceiro que, pela altura
ou profundidade a que têm lugar, não haja interesse em impedir.
ARTIGO 1345º
(Coisas imóveis sem dono conhecido)
As
coisas imóveis sem dono conhecido consideram-se do património do Estado.
ARTIGO 1346º
(Emissão de fumo, produção de ruídos e factos
semelhantes)
O
proprietário de um imóvel pode opor-se à emissão de fumo, fuligem, vapores,
cheiros, calor ou ruídos, bem como à produção de trepidações e a outros
quaisquer factos semelhantes, provenientes de prédio vizinho, sempre que tais
factos importem um prejuízo substancial para o uso do imóvel ou não resultem da
utilização normal do prédio de que emanam.
ARTIGO 1347º
(Instalações prejudiciais)
1.
O proprietário não pode construir nem manter no seu prédio quaisquer obras,
instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas, se for de
recear que possam ter sobre o prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por
lei.
2.
Se as obras, instalações ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade
pública competente, ou tiverem sido observadas as condições especiais
prescritas na lei para a construção ou manutenção deles, a sua inutilização só
é admitida a partir do momemto em que o prejuízo se torne efectivo.
3.
É devida, em qualquer dos casos, indemnização pelo prejuízo sofrido.
ARTIGO 1348º
(Escavações)
1.
O proprietário tem a faculdade de abrir no seu prédio minas ou poços e fazer
escavações, desde que não prive os prédios vizinhos do apoio necssário para
evitar desmoronamentos ou deslocações de terra.
2.
Logo que venham a padecer danos com as obras feitas, os proprietários vizinhos
serão indemnizados pelo autor delas, mesmo que tenham sido tomadas as
precauções julgadas necessárias.
ARTIGO 1349º
(Passagem forçada momentânea)
1.
Se, para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar
andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os
materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio
obrigado a consentir nesses actos.
2.
É igualmente permitido o acesso a prédio alheio a quem pretenda apoderar-se de
coisas suas que acidentalmente nele se encontrem; o proprietário pode impedir o
acesso, entregando a coisa ao seu dono.
3.
Em qualquer dos casos previstos neste artigo, o proprietário tem direito a ser
indemnizado do prejuízo sofrido.
ARTIGO 1350º
(Ruína de construção)
Se
qualquer edifício ou outra obra oferecer perigo de ruir, no todo ou em parte, e
do desmoronamento puderem resultar danos para o prédio vizinho, é lícito ao
dono deste exigir da pessoa responsável pelos danos, nos termos do artigo 492º,
as providências necessárias para eliminar o perigo.
ARTIGO 1351º
(Escoamento natural das águas)
1.
Os prédios inferiores estão sujeitos a receber as águas que, naturalmente e sem
obra do homem, decorrem dos prédios superiores, assim como a terra e entulhos
que elas arrastam na sua corrente.
2.
Nem o dono do prédio inferior pode fazer obras que estorvem o escoamento, nem o
dono do prédio superior obras capazes de o agravar, sem prejuízo da
possibilidade de constituição da servidão legal de escoamento, nos casos em que
é admitida.
ARTIGO 1352º
(Obras defensivas das águas)
1.
O dono do prédio onde existam obras defensivas para conter as águas, ou onde,
pela variação do curso das águas, seja necessário construir novas obras, é
obrigado a fazer reparos precisos, ou a tolerar que os façam, sem prejuízo
dele, os donos dos prédios que padeçam danos ou estejam exposto a danos
iminentes.
2.
O disposto no número anterior é aplicável, sempre que seja necessário despojar
algum prédio de materiais cuja acumulação ou queda estorve o curso das águas
com prejuízo ou risco de terceiro.
3.
Todos os proprietários que participam do benefício das obras são obrigados a
contribuir para as despesas delas, em proporção do seu interesse, sem prejuízo
da responsabilidade que recaia sobre o autor dos danos.
SECÇÃO II
Direito de demarcação
ARTIGO 1353º
(Conteúdo)
O
proprietário pode obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a
demarcação das estremas entre o seu prédio e os deles.
ARTIGO 1354º
(Modo de proceder à demarcação)
1.
A demarcação é feita de conformidade com os títulos de cada um e, na falta de
títulos suficientes, de harmonia com a posse em que estejam os confinantes ou
segundo o que resultar de outros meios de prova.
2.
Se os títulos não determinarem os limites dos prédios ou a área pertencente a
cada proprietário, e a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro
meio de prova, a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes
iguais.
3.
Se os títulos indicarem um espaço maior ou menor do que o abrangido pela
totalidade do terreno, atribuir-se-á a falta ou o acréscimo proporcionalmente à
parte de cada um.
ARTIGO 1355º
(Imprescritibilidade)
O
direito de demarcação é imprescritível, sem prejuízo dos direitos adquiridos
por usucapião.
SECÇÃO III
Direito da tapagem
ARTIGO 1356º
(Conteúdo)
A
todo o tempo o proprietário pode murar, valar, rodear de sebes o seu prédio, ou
tapá-lo de qualquer modo.
ARTIGO 1357º
(Valas, regueiras e valados)
O
proprietário que pretenda abrir vala ou regueira ao redor do prédio é obrigado
a deixar mota externa de largura igual à profundidade da vala e a conformar-se
com o disposto no artigo 1348º; se fizer valado, deve deixar externamente
regueira ou alcorca, salvo havendo, em qualquer dos casos, uso da terra em
contrário.
ARTIGO 1358º
(Presunção de comunhão)
1.
As valas, regueiras e valados, entre prédios de diversos donos, a que faltem as
condições impostas no artigo antecedente, presumem-se comuns, não havendo sinal
em contrário.
2.
É sinal de que a vala ou regueira sem mota externa não é comum o achar-se a
terra da escavação ou limpeza lançada só de um lado durante mais de um ano;
neste caso, presume-se que a vala é do proprietário de cujo lado a terra
estiver.
ARTIGO 1359º
(Sebes vivas)
1.
Não podem ser plantadas sebes vivas nas estremas dos prédios sem previamente se
colocarem marcos divisórios.
2.
As sebes vivas consideram-se, em caso de dúvida, pertencentes ao proprietário
que mais precisa delas; se ambos estiverem no mesmo caso, presumem-se comuns,
salvo se existir uso da terra pelo qual se determine de outro modo a sua
propriedade.
SECÇÃO IV
Construções e edificações
ARTIGO 1360º
(Abertura de janelas, portas, varandas e obras
semelhantes)
1.
O proprietário que no seu prédio levantar edifício ou outra construção não pode
abrir nela janelas ou portas que deitem directamente sobre o prédio vizinho sem
deixar entre este e cada uma das obras o intervalo de metro e meio.
2.
Igual restrição é aplicável às varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes,
quando sejam servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a
sua extensão ou parte dela.
3.
Se os dois prédios forem oblíquos entre si, a distância de metro e meio
conta-se perpendicularmente do prédio para onde deitam as vistas até à
construção ou edifício novamente levantado; mas, se a obliquidade for além de
quarenta e cinco graus, não tem aplicação a restrição imposta ao proprietário.
ARTIGO 1361º
(Prédios isentos da restrição)
As
restrições do artigo precedente não são aplicáveis a prédios separados entre si
por estrada, caminho, rua, travessa ou outra passagem por terreno do domínio
público.
ARTIGO 1362º
(Servidão de vistas)
1.
A existência de janelas, portas, varandas, terraços, eirados ou obras
semelhantes, em contravenção do disposto na lei, pode importar, nos termos
gerais, a constituição da servidão de vistas por usucapião.
2.
Constituída a servidão de vistas, por usucapião ou outro título, ao
proprietário vizinho só é permitido levantar edifício ou outra construção no
seu prédio desde que deixe entre o novo edifício ou construção e as obras
mencionadas no nº 1 o espaço mínimo de metro e meio, correspondente à extensão
destas obras.
ARTIGO 1363º
(Frestas, seteiras ou óculos para luz e ar)
1.
Não se consideram abrangidos pelas restrições da lei as frestas, seteiras ou
óculos para luz e ar, podendo o vizinho levantar a todo o tempo a sua casa ou
contramuro, ainda que vede tais aberturas.
2.
As frestas, seteiras ou óculos para luz e ar devem, todavia, situar-se pelo
menos a um metro e oitenta centímetros de altura, a contar do solo ou do
sobrado, e não devem ter, numa das suas dimensões, mais de quinze centímetros;
a altura de um metro e oitenta centímetros respeita a ambos os lados da parede
ou muro onde essas aberturas se encontram.
ARTIGO 1364º
(Janelas gradadas)
É
aplicável o disposto no nº 1 do artigo antecedente às aberturas, quaisquer que
sejam as suas dimensões, igualmente situadas a mais de um metro e oitenta
centímetros do solo ou do sobrado, com grades fixas de ferro ou outro metal, de
secção não inferior a um centímetro quadrado e cuja malha não seja superior a
cinco centímetros.
ARTIGO 1365º
(Estilicídio)
1.
O proprietário deve edificar de modo que a beira do telhado ou outra cobertura
não goteje sobre o prédio vizinho, deixando um intervalo mínimo de cinco
decímetros entre o prédio e a beira, se de outro modo não puder evitá-lo.
2.
Constituída por qualquer título a servidão de estilicídio, o proprietário do
prédio serviente não pode levantar edifício ou construção que impeça o
escoamento das águas, devendo realizar as obras necessárias para que o
escoamento se faça sobre o seu prédio, sem prejuízo para o prédio dominante.
SECÇÃO V
Plantação de árvores e arbustos
ARTIGO 1366º
(Termos em que pode ser feita)
1.
É lícita a plantação de árvores e
arbustos até à linha divisória dos prédios;
mas ao dono do prédio vizinho é permitido arrancar e
cortar as raízes que se
introduzirem no seu terreno e o tronco ou ramos que sobre ele
propenderem, se o
dono da árvore, sendo rogado judicialmente ou
extrajudicialmente, o não fizer
dentro de três dias.
2.
O disposto no número antecedente não prejudica as restrições constantes de leis
especiais relativas à plantação ou sementeira de eucaliptos, acácias ou outras
árvores igualmente nocivas nas proximidades de terrenos cultivados, terras de
regadio, nascentes de água ou prédios urbanos, nem quaisquer outras restrições
impostas por motivos de interesse público.
ARTIGO 1367º
(Apanha de frutos)
O
proprietário de árvore ou arbusto contíguo a prédio de outrem ou com ele
confinante pode exigir que o dono do prédio lhe permita fazer a apanha dos
frutos, que não seja possível fazer do seu lado; mas é responsável pelo
prejuízo que com a apanha vier a causar.
ARTIGO 1368º
(Árvores ou arbustos situados na linha divisória)
As
árvores ou arbustos nascidos na linha divisória de prédios pertencentes a donos
diferentes presumem-se comuns; qualquer dos consortes tem a faculdade de os
arrancar, mas o outro tem direito a haver metade do valor das árvores ou
arbustos, ou metade da lenha ou madeira que produzirem, como mais lhe convier.
ARTIGO 1369º
(Árvores ou arbustos que sirvam de marco divisório)
Servindo
a árvore ou o arbusto de marco divisório, não pode ser cortado ou arrancado
senão de comum acordo.
SECÇÃO VI
Paredes e muros de meação
ARTIGO 1370º
(Comunhão forçada)
1.
O proprietário de prédio confinante com parede ou muro alheio pode adquirir
nele comunhão, no todo ou em parte, quer quanto à sua extensão, quer quanto à
sua altura, pagando metade do seu valor e metade do valor do solo sobre que
estiver construído.
2.
De igual faculdade gozam o superficiário e o enfiteuta.
ARTIGO 1371º
(Presunção de compropriedade)
1.
A parede ou muro divisório entre dois edifícios presume-se comum em toda a sua
altura, sendo os edifícios iguais, e até à altura do inferior, se o não forem.
2.
Os muros entre prédios rústicos, ou entre pátios e quintais de prédios urbanos,
presumem-se igualmente comuns, não havendo sinal em contrário.
3.
São sinais que excluem a presunção de comunhão:
a)
A existência de espigão em ladeira só para um lado;
b)
Haver no muro, só de um lado, cachorros de pedra salientes encravados em toda a
largura dele;
c)
Não estar o prédio contíguo igualmente murado pelos outros lados.
4.
No caso da alínea a) do número anterior, presume-se que o muro pertence ao
prédio para cujo lado se inclina a ladeira; nos outros casos, àquele de cujo
lado se encontrem as construções ou sinais mencionados.
5.
Se o muro sustentar em toda a sua largura qualquer construção que esteja só de
um dos lados, presume-se do mesmo modo que ele pertence exclusivamente ao dono
da construção.
ARTIGO 1372º
(Abertura de janelas ou frestas)
O
proprietário a quem pertença em comum alguma parede ou muro não pode abrir nele
janelas ou frestas, nem fazer outra alteração, sem consentimento do seu
consorte.
ARTIGO 1373º
(Construção sobre o muro comum)
1.
Qualquer dos consortes tem, no entanto, a faculdade de edificar sobre a parede ou
muro comum e de introduzir nele traves ou barrotes, contanto que não ultrapasse
o meio da parede ou do muro.
2.
Tendo a parede ou muro espessura inferior a cinco decímetros, não tem lugar a
restrição do número anterior.
ARTIGO 1374º
(Alçamento do muro comum)
1.
A qualquer dos consortes é permitido alterar a parede ou muro comum, contanto
que o faça à sua custa, ficando a seu cargo todas as despesas de conservação da
parte alterada.
2.
Se a parede ou muro não estiver em estado de aguentar o alçamento, o consorte
que pretender levantá-lo tem de reconstruí-lo por inteiro à sua custa e, se
quiser aumentar-lhe a espessura, é o espaço para isso necessário tomado do seu
lado.
3.
O consorte que não tiver contribuído para o alçamento pode adquirir comunhão na
parte aumentada, pagando metade do valor dessa parte e, no caso de aumento de
espessura, também metade do valor do solo correspondente a esse aumento.
ARTIGO 1375º
(Reparação e reconstrução do muro)
1.
A reparação ou reconstrução da parede ou muro comum é feita por conta dos
consortes, em proporção das suas partes.
2.
Se o muro for simplesmente de vedação, a despesa é dividida pelos consortes em
partes iguais.
3.
Se, além da vedação, um dos consortes tirar do muro proveito que não seja comum
ao outro, a despesa é rateada entre eles em proporção do proveito que cada um
tirar.
4.
Se a ruína do muro provier de facto do qual só um dos consortes tire proveito,
só o beneficiário é obrigado a reconstruí-lo ou repará-lo.
5.
É sempre facultado ao consorte eximir-se dos encargos de reparação ou
reconstrução da parede ou muro, renunciando ao seu direito nos termos dos nºs 1
e 2 do artigo 1411º.
SECÇÃO VII
Fraccionamento e emparcelamento de
prédios rústicos
ARTIGO 1376º
(Fraccionamento)
1.
Os terrenos aptos para cultura não podem fraccionar-se em parcelas de área
inferior a determinada superfície mínima, correspondente à unidade de cultura
fixada para cada zona do País; importa fraccionamento, para este efeito, a
constituição de usufruto sobre uma parcela do terreno.
2.
Também não é admitido o fraccionamento, quando dele possa resultar o encrave de
qualquer das parcelas, ainda que seja respeitada a área fixada para a unidade
de cultura.
3.
O preceituado neste artigo abrange todo o terreno contíguo pertencente ao mesmo
proprietário, embora seja composto por prédios distintos.
ARTIGO 1377º
(Possibilidade do fraccionamento)
A
proibição do fraccionamento não é aplicável:
a)
A terrenos que constituam partes componentes de prédios urbanos ou se destinem
a algum fim que não seja a cultura;
b)
Se o adquirente da parcela resultante do fraccionamento for proprietário de
terreno contíguo ao adquirido, desde que a área da parte restante do terreno
fraccionado corresponda, pelo menos, a uma unidade de cultura;
c)
Se o fraccionamento tiver por fim a desintegração de terrenos para construção
ou rectificação de estremas.
ARTIGO 1378º
(Troca de terrenos)
A
troca de terrenos aptos para cultura só é admissível:
a)
Quando ambos os terrenos tenham área igual ou superior à unidade de cultura
fixada para a respectiva zona;
b)
Quando, tendo qualquer dos terrenos àrea inferior à unidade de cultura, da
permuta resulte adquirir um dos proprietários terreno contíguo a outro que lhe
pertença, em termos que lhe permitam constituir um novo prédio com área igual
ou superior àquela unidade;
c)
Quando, independentemente da área dos terrenos, ambos os permutantes adquiram
terreno confinante com prédio seu.
ARTIGO 1379º
(Sanções)
1.
São anuláveis os actos de fraccionamento ou troca contrários ao disposto nos
artigos 1376º e 1378º, bem como o fraccionamento efectuado ao abrigo da alínea
c) do artigo 1377º, se a construção não for iniciada dentro do prazo de três
anos.
2.
Têm legitimidade para a acção de anulação o Ministério Público ou qualquer
proprietário que goze do direito de preferência nos termos do artigo seguinte.
3.
A acção de anulação caduca no fim de três anos, a contar da celebração do acto
ou do termo do prazo referido no nº 1.
ARTIGO 1380º
(Direito de preferência)
1.
Os proprietários de terrenos confinantes, de área inferior à unidade de
cultura, gozam reciprocamente do direito de preferência nos casos de venda,
dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja
proprietário confinante.
2.
Sendo vários os proprietários com direito de preferência, cabe este direito:
a)
No caso de alienação de prédio encravado, ao proprietário que estiver onerado
com a servidão de passagem;
b)
Nos outros casos, ao proprietário que, pela preferência, obtenha a área que
mais se aproxime da unidade de cultura fixada para a respectiva zona.
3.
Estando os preferentes em igualdade de circunstâncias, abrir-se-á licitação
entre eles, revertendo o excesso para o alienante.
4.
É aplicável ao direito de preferência conferido neste artigo o disposto nos
artigos 416º a 418º e 1410º, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 1381º
(Casos em que não existe o direito de preferência)
Não
gozam do direito de preferência os proprietários de terrenos confinantes:
a)
Quando algum dos terrenos constitua parte componente de um prédio urbano ou se
destine a algum fim que não seja a cultura;
b)
Quando a alienação abranja um conjunto de prédios que, embora dispersos, formem
uma exploração agrícola de tipo familiar.
ARTIGO 1382º
(Emparcelamento)
1.
Chama-se emparcelamento o conjunto de operações de remodelação predial
destinadas a pôr termo à fragmentação e dispersão dos prédios rústicos
pertencentes ao mesmo titular, com o fim de melhorar as condições técnicas e
económicas da exploração agrícola.
2.
Os termos em que devem ser realizadas as operações de emparcelamento são
fixados em legislação especial.
SECÇÃO VIII
Atravessadouros
ARTIGO 1383º
(Abolição dos atravessadouros)
Consideram-se
abolidos os atravessadouros, por mais antigos que sejam, desde que não se
mostrem estabelecidos em proveito de prédios determinados, constituindo
servidões.
ARTIGO 1384º
(Atravessadouros reconhecidos)
São,
porém, reconhecidos os atravessadouros com posse imemorial, que se dirijam a ponte
ou fonte de manifesta utilidade, enquanto não existirem vias públicas
destinadas à utilização ou aproveitamento de uma ou outra, bem como os
admitidos em legislação especial.
CAPÍTULO IV
Propriedade das águas
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1385º
(Classificação das águas)
As
águas são públicas ou particulares; as primeiras estão sujeitas ao regime
estabelecido em leis especiais e as segundas às disposições dos artigos
seguintes.
ARTIGO 1386º
(Águas particulares)
1.
São particulares:
a)
As águas que nascerem em prédio particular e as pluviais que nele caírem,
enquanto não transpuserem, abandonadas, os limites do mesmo prédio ou daquele
para onde o dono dele as tiver conduzido, e ainda as que, ultrapassando esses
limites e correndo por prédios particulares, forem consumidas antes de se
lançarem no mar ou em outra água pública;
b)
As águas subterrâneas existentes em prédios particulares;
c)
Os lagos e lagoas existentes dentro de um prédio particular, quando não sejam
alimentados por corrente pública;
d)
As águas originariamente públicas que tenham entrado no domínio privado até 21
de Março de 1868, por preocupação, doação régia ou concessão;
e)
As águas públicas concedidas perpetuamente para regas ou melhoramentos
agrícolas;
f)
As águas subterrâneas existentes em terrenos públicos, municipais ou de
freguesia, exploradas mediante licença e destinadas a regas ou melhoramentos
agrícolas.
2.
Não estando fixado o volume das águas referidas nas alíneas d), e) e f), do
número anterior, entender-se-á que há direito apenas ao caudal necessário para
o fim a que as mesmas se destinam.
ARTIGO 1387º
(Obras para armanezamento ou derivação de águas;
leito das correntes não navegáveis nem flutuáveis)
1.
São ainda particulares:
a)
Os poços, galerias, canais, levadas, aquedutos, reservatórios, albufeiras e
demais obras destinadas à captação, derivação ou armazenamento de águas
públicas ou particulares;
b)
O leito ou álveo das correntes não navegáveis nem flutuáveis que atravessam
terrenos particulares.
2.
Entende-se por leito ou álveo a porção do terreno que a água cobre sem
transbordar para o solo natural, habitualmente enxuto.
3.
Quando a corrente passa entre dois prédios, pertence a cada proprietário o
tracto compreendido entre a linha marginal e a linha média do leito ou álveo,
sem prejuízo do disposto nos artigos 1328º e seguintes.
4.
As faces ou rampas e os capelos dos cômoros, valados, tapadas, muros de terra,
alvenaria ou enrocamentos erguidos sobre a superfície natural do solo marginal
não pertencem ao leito ou álveo da corrente, mas fazem parte da margem.
ARTIGO 1388º
(Requisição de águas)
1.
Em casos urgentes de incêndio ou calamidade pública, as autoridades
administrativas podem, sem forma de processo nem indemnização prévia, ordenar a
utilização imediata de quaisquer águas particulares necessárias para conter ou
evitar os danos.
2.
Se da utilização da água resultarem danos apreciáveis, têm os lesados direito a
indemnização, paga por aqueles em benefício de quem a água foi utilizada.
SECÇÃO II
Aproveitamento das águas
ARTIGO 1389º
(Fontes e nascentes)
O
dono do prédio onde haja alguma fonte ou nascente de água pode servir-se dela e
dispor do seu uso livremente, salvas as restrições previstas na lei e os
direitos que terceiro haja adquirido ao uso da água por título justo.
ARTIGO 1390º
(Títulos de aquisição)
1.
Considera-se título justo de aquisição da água das fontes e nascentes, conforme
os casos, qualquer meio legítimo de adquirir a propriedade de coisas imóveis ou
de constituir servidões.
2.
A usucapião, porém, só é atendida quando for acompanhada da construção de
obras, visíveis e permanentes, no prédio onde exista a fonte ou nascente, que
revelem a captação e a posse da água nesse prédio; sobre o significado das
obras é admitida qualquer espécie de prova.
3.
Em caso de divisão ou partilha de prédios sem intervenção de terceiro, a
aquisição do direito de servidão nos termos do artigo 1549º não depende da
existência de sinais reveladores da destinação do antigo proprietário.
ARTIGO 1391º
(Direitos dos prédios inferiores)
Os
donos dos prédios para onde se derivam as águas vertentes de qualquer fonte ou
nascente podem eventualmente aproveitá-las nesses prédios; mas a privação desse
uso por efeito de novo aproveitamento que faça o proprietário da fonte ou
nascente não constitui violação de direito.
ARTIGO 1392º
(Restrições ao uso das águas)
1.
Ao proprietário da fonte ou nascente não é lícito mudar o seu curso costumado,
se os habitantes de uma povoação ou casal há mais de cinco anos se abastecerem
dela ou das suas águas vertentes para gastos domésticos.
2.
Se os habitantes da povoação ou casal não houverem adquirido por título justo o
uso das águas, o proprietário tem direito a indemnização, que será paga,
conforme os casos, pela respectiva junta de freguesia ou pelo dono do casal.
ARTIGO 1393º
(Águas pluviais e de lagos e lagoas)
O
disposto nos artigos antecedentes é aplicável, com as necessárias adaptações,
às águas pluviais referidas na alínea a) do nº 1 do artigo 1386º e às águas dos
lagos e lagoas compreendidas na alínea c) do mesmo número.
ARTIGO 1394º
(Águas subterrâneas)
1.
É lícito ao proprietário procurar águas subterrâneas no seu prédio, por meio de
poços ordinários ou artesianos, minas ou quaisquer escavações, contanto que não
prejudique direitos que terceiro haja adquirido por título justo.
2.
Sem prejuízo do disposto no artigo 1396º, a diminuição do caudal de qualquer
água pública ou particular, em consequência da exploração de água subterrânea,
não constitui violação de direitos de terceiro, excepto se a captação se fizer
por meio de infiltrações provocadas e não naturais.
ARTIGO 1395º
(Títulos de aquisição)
1.
Consideram-se títulos justos de aquisição das águas subterrâneas os referidos
nos nº 1 e 2 do artigo 1390º.
2.
A simples atribuição a terceiro do direito de explorar águas subterrâneas não
importa, para o proprietário, privação do mesmo direito, se tal abdicação não
resultar claramente do título.
ARTIGO 1396º
(Restrições ao aproveitamento das águas)
O
proprietário que, ao explorar águas subterrâneas, altere ou faça diminuir as
águas de fonte ou reservatório destinado a uso público é obrigado a repor as
coisas no estado anterior; não sendo isso possível, deve fornecer, para o mesmo
uso, em local apropriado, água equivalente àquela de que o público ficou
privado.
ARTIGO 1397º
(Águas originariamente públicas)
As
águas referidas nas alíneas d), e) e f) do nº 1 do artigo 1386º são
inseparáveis dos prédios a que se destinam, e o direito sobre elas caduca,
revertendo as águas ao domínio público, se forem abandonadas, ou não se fizer
delas um uso proveitoso correpondente ao fim a que eram destinadas ou para que
foram concedidas.
SECÇÃO III
Condomínio das águas
ARTIGO 1398º
(Despesas de conservação)
1.
Pertencendo a água a dois ou mais co-utentes, todos devem contribuir para as
despesas necessárias ao conveniente aproveitamento dela, na proporção do seu
uso, podendo para esse fim executar-se as obras necessárias e fazer-se os
trabalhos de pesquisa indispensáveis, quando se reconheça haver perda ou
diminuição de volume ou caudal.
2.
O co-utente não pode eximir-se do encargo, renunciando ao seu direito em
benefício dos outros co-utentes, contra a vontade destes.
ARTIGO 1399º
(Divisão de águas)
A
divisão das águas comuns, quando deva realizar-se, é feita, no silêncio do
título, em proporção da superfície, necessidades e natureza da cultura dos
terrenos a regar, podendo repartir-se o caudal ou o tempo da sua utilização,
como mais convier ao seu bom aproveitamento.
ARTIGO 1400º
(Costumes na divisão de águas)
1.
As águas fruídas em comum que, por costume seguido há mais de vinte anos,
estiveram divididas ou subordinadas a um regime estável e normal de
distribuição continuam a ser aproveitadas por essa forma, sem nova divisão.
2.
A obrigatoriedade do costume impõe-se também aos co-utentes que não sejam donos
da água, sem prejuízo dos direitos do proprietário, que pode a todo tempo
desviá-la ou reivindicá-la, se estiver a ser aproveitada por quem não tem nem
adquiriu direito a ela.
ARTIGO 1401º
(Costumes abolidos)
1.
Consideram-se abolidos no aproveitamento das águas o costume de as utilizar
pelo sistema de torna-torna ou outros semelhantes, mediante os quais a água
pertença ao primeiro ocupante, sem outra norma de distribuição que não seja o
arbítrio; as águas que assim tenham sido utilizadas consideram-se indivisas
para todos os efeitos.
2.
Consideram-se igualmente abolidos os costumes de romper ou esvaziar os açudes e
diques construídos superiormente, distraindo deles água para ser utilizada em
prédios ou engenhos inferiormente situados que não têm direito ao
aproveitamento; se existir direito ao aproveitamento, consideram-se as águas
indivisas.
ARTIGO 1402º
(Interpretação dos títulos)
Sempre
que dos títulos não resulte outro sentido, entende-se por uso contínuo o de
todos os instantes; por uso diário, o de vinte e quatro horas a contar da meia
noite; por uso diurno ou nocturno, o que medeia entre o nascer e o pôr do Sol
ou vice-versa, por uso semanal, o que principia ao meio-dia de domingo e
termina à mesma hora em igual dia da semana seguinte; por uso estival, o que
começa em 1 de Abril e termina em 1 de Outubro seguinte; por uso hibernal, o
que corresponde aos outros meses do ano.
CAPÍTULO V
Compropriedade
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1403º
(Noção)
1.
Existe propriedade em comum, ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são
simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa.
2.
Os direitos dos consortes ou comproprietários sobre a coisa comum são
qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes; as
quotas presume-se, todavia, quantitativamente iguais na falta de indicação em
contrário do título constitutivo.
ARTIGO 1404º
(Aplicação das regras da compropriedade
a outras formas de comunhão)
As
regras da compropriedade são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à
comunhão de quaisquer outros direitos, sem prejuízo do disposto especialmente
para cada um deles.
ARTIGO 1405º
(Posição dos comproprietários)
1.
Os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao
proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da
coisa, em proporção da suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.
2.
Cada consorte pode reivindicar de terceiro a coisa comum, sem que a este seja
lícito opor-lhe que ela lhe não pertence por inteiro.
SECÇÃO II
Direitos e encargos do
comproprietário
ARTIGO 1406º
(Uso da coisa comum)
1.
Na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários
é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele
a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que
igualmente têm direito.
2.
O uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva
ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título.
ARTIGO 1407º
(Administração da coisa)
1.
É aplicável aos comproprietários, com as necessárias adaptações, o disposto no
artigo 985º; para que haja, porém, a maioria dos consortes exigida por lei, é
necessário que eles representem, pelo menos, metade do valor total das quotas.
2.
Quando não seja possível formar a maioria legal, a qualquer dos consortes é
lícito recorrer ao tribunal, que decidirá segundo juízos de equidade.
3.
Os actos realizados pelo comproprietário contra a oposição da maioria legal dos
consortes são anuláveis e tornam o autor responsável pelo prejuízo a que der
causa.
ARTIGO 1408º
(Disposição e oneração da quota)
1.
O comproprietário pode dispor de toda a sua quota na comunhão ou de parte dela,
mas não pode, sem consentimento dos restantes consortes, alienar nem onerar
parte especificada da coisa comum.
2.
A disposição ou oneração de parte especificada sem o consentimento dos
consortes é havida como disposição ou oneração de coisa alheia.
3.
A disposição da quota está sujeita à forma exigida para a disposição da coisa.
ARTIGO 1409º
(Direito de preferência)
1.
O comproprietário goza do direito de preferência e tem o primeiro lugar entre
os preferentes legais no caso de venda, ou dação em cumprimento, a estranhos da
quota de qualquer dos seus consortes.
2.
É aplicável à preferência do comproprietário, com as adaptações convenientes, o
disposto nos artigos 416º a 418º.
3.
Sendo dois ou mais os preferentes, a quota alienada é adjudicada a todos, na
proporção das suas quotas.
ARTIGO 1410º
(Acção de preferência)
1.
O comproprietário a quem se não dê conhecimento da venda ou da dação em cumprimento
tem o direito de haver para si a quota alienada, contanto que o requeira dentro
do prazo de seis meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos
essenciais da alienação, e deposite o preço devido nos 15 dias seguintes à
propositura da acção.
2.
O direito de preferência e a respectiva acção não são prejudicados pela
modificação ou distrate da alienação, ainda que estes efeitos resultem de
confissão ou transacção judicial.
(Redacção do Dec.-Lei 68/96, de 31-5)
ARTIGO 1411º
(Benfeitorias necessárias)
1.
Os comproprietários devem contribuir, em proporção das respectivas quotas, para
as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum, sem prejuízo
da faculdade de se eximirem do encargo renunciando ao seu direito.
2.
A renúncia, porém, não é válida sem o consentimento dos restantes consortes,
quando a despesa tenha sido anteriormente aprovada pelo interessado, e é
revogável sempre que as despesas previstas não venham a reslizar-se.
3.
A renúncia do comproprietário está sujeita à forma prescrita para a doação e
aproveita a todos os consortes, na proporção das respectivas quotas.
ARTIGO 1412º
(Direito de exigir a divisão)
1.
Nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo quando
se houver convencionado que a coisa se conserve indivisa.
2.
O prazo fixado para a indivisão da coisa não excederá cinco anos; mas é lícito
renovar este prazo, uma ou mais vezes, por nova convenção.
3.
A cláusula de indivisão vale em relação a terceiros, mas deve ser registada
para tal efeito, se a compropriedade respeitar a coisas imóveis ou a coisas
móveis sujeitas a registo.
ARTIGO 1413º
(Processo da divisão)
1.
A divisão é feita amigavelmente ou nos termos da lei do processo.
2.
A divisão amigável está sujeita à forma exigida para a alienação onerosa da
coisa.
CAPÍTULO VI
Propriedade horizontal
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1414º
(Princípio geral)
As
fracções de que um edifício se compõe, em condições de constituírem unidades
independentes, podem pertencer a proprietários diversos em regime de
propriedade horizontal.
ARTIGO 1415º
(Objecto)
Só
podem ser objecto de propriedade horizontal as fracções autónomas que, além de
constituírem unidades independentes, sejam distintas e isoladas entre si, com saída
própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública.
ARTIGO 1416º
(Falta de requisitos legais)
1.
A falta de requisitos legalmente exigidos importa a nulidade do título
constitutivo da propriedade horizontal e a sujeição do prédio ao regime da
compropriedade, pela atribuição a cada consorte da quota que lhe tiver sido
fixada nos termos do artigo 1418º ou, na falta de fixação, da quota
correspondente ao valor relativo da sua fracção.
2.
Têm legitimidade para arguir a nulidade do título os condóminos, e também o
Ministério Público sobre participação da entidade pública a quem caiba a
aprovação ou fiscalização das construções.
SECÇÃO II
Constituição
ARTIGO 1417º
(Princípio geral)
1
- A propriedade horizontal pode ser constituída por negócio jurídico,
usucapião,
2.
A constituição da propriedade horizontal por decisão judicial pode ter lugar a
requerimento de qualquer consorte, desde que no caso se verifiquem os
requisitos exigidos pelo artigo 1415º.
ARTIGO 1418º
(Conteúdo do título constitutivo)
1.
No título constitutivo serão especificadas as partes do edifício
correspondentes às várias fracções, por forma que estas fiquem devidamente
individualizadas, e será fixado o valor relativo de cada fracção, expresso em
percentagem ou permilagem, do valor total do prédio.
2.
Além das especificações constantes do número anterior, o título constitutivo
pode ainda conter, designadamente:
a)
Menção do fim a que se destina cada fracção ou parte comum;
b)
Regulamento do condomínio, disciplinando o uso, fruição e conservação, quer das
partes comuns, quer das fracções autónomas;
c)
Previsão do compromisso arbitral para a resolução dos litígios emergentes da
relação de condomínio.
3.
A falta da especificação exigida pelo nº 1 e a não coincidência entre o fim
referido na alínea a) do nº 2 e o que foi fixado no projecto aprovado pela
entidade pública competente determinam a nulidade do título constitutivo.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1419º
(Modificação do título)
1.
Sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 1422º-A, o título constitutivo da
propriedade horizontal pode ser modificado por escritura pública, havendo
acordo de todos os condóminos.
2.
O administrador, em representação do condomínio, pode outorgar a escritura
pública a que se refere o número anterior, desde que o acordo conste de acta
assinada por todos os condóminos.
3.
A inobservância do disposto no artigo 1415º importa a nulidade do acordo; esta
nulidade pode ser declarada a requerimento das pessoas e entidades designadas
no nº 2 do artigo 1416º.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
SECÇÃO III
Direitos e encargos dos condóminos
ARTIGO 1420º
(Direitos dos condóminos)
1.
Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e
comproprietário das partes comuns do edifício.
2.
O conjunto dos dois direitos é incindível; nenhum deles pode ser alienado
separadamente, nem é lícito renunciar à parte comum como meio de o condómino se
desonerar das despesas necessárias à sua conservação ou fruição.
ARTIGO 1421º
(Partes comuns do prédio)
1.
São comuns as seguintes partes do edifício:
a)
O solo, bem como os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as
partes restantes que constituem a estrutura do prédio;
b)
O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer
fracção;
c)
As entradas, vestílbulos, escadas e corredores de uso ou passagem comum a dois
ou mais condóminos;
d)
As instalações gerais de água, electricidade, aquecimento, ar condicionado,
gás, comunicações e semelhantes.
2.
Presumem-se ainda comuns:
a)
Os pátios e jardins anexos ao edifício;
b)
Os ascensores;
c)
As dependências destinadas ao uso e habitação do porteiro;
d)
As garagens e outros lugares de estacionamento;
e)
Em geral, as coisas que não sejam afectadas ao uso exclusivo de um dos
condóminos.
3.
O título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas
zonas das partes comuns.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1422º
(Limitações ao exercício dos direitos)
1.
Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto
às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às
limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.
2.
É especialmente vedado aos condóminos:
a)
Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a
linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
b)
Destinar a sua fracção a usos ofensivos dos bons costumes;
c)
Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada;
d)
Praticar quaisquer actos ou actividades que tenham sido proibidos no título
constitutivo ou, posteriormente, por deliberação da assembleia de condóminos
aprovada sem oposição.
3.
As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do
edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da
assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do
valor total do prédio.
4.
Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção
autónoma, a alteração ao seu uso carece da autorização da assembleia de
condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total
do prédio.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1422º-A
(Junção e divisão de fracções autónomas)
1.
Não carece de autorização dos restantes condóminos a junção, numa só, de duas
ou mais fracções do mesmo edifício, desde que estas sejam contíguas.
2.
Para efeitos do disposto no número anterior, a contiguidade das fracções é
dispensada quando se trate de fracções correspondentes a arrecadações e
garagens.
3.
Não é permitida a divisão de fracções em novas fracções autónomas, salvo
autorização do título constitutivo ou da assembleia de condóminos, aprovada sem
qualquer oposição.
4.
Nos casos previstos nos números anteriores, cabe aos condóminos que juntaram ou
cindiram as fracções o poder de, por acto unilateral constante de escritura
pública, introduzir a correspondente alteração no título constitutivo.
5.
A escritura pública a que se refere o número anterior deve ser comunicada ao
administrador no prazo de 30 dias.
(Aditado pelo Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1423º
(Direitos de preferência e de divisão)
Os
condóminos não gozam do direito de preferência na alienação de fracções nem do
direito de pedir a divisão das partes comuns.
ARTIGO 1424º
(Encargos de conservação e fruição)
1.
Salvo disposição em contrário, as despesas
necessárias à conservação e
fruição
das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços
de interesse comum são
pagas pelos condóminos em proporção do valor das
suas fracções.
2.
Porém, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem,
mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por
maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ficar a cargo
dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, desde que
devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua
imputação.
3.
As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do
prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que
dela se servem.
4.
Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles
possam ser servidas.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1425º
(Inovações)
1.
As obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos
condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do
prédio.
2.
Nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de
prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas
próprias como das comuns.
ARTIGO 1426º
(Encargos com as inovações)
1.
As despesas com as inovações ficam a cargo dos condóminos nos termos fixados
pelo artigo 1424º.
2.
Os condóminos que não tenham aprovado a inovação são obrigados a concorrer para
as respectivas despesas, salvo se a recusa for judicialmente havida como
fundada.
3.
Considera-se sempre fundada a recusa, quando as obras tenham natureza
voluptuária ou não sejam proporcionadas à importância do edifício.
4.
O condómino cuja recusa seja havida como fundada pode a todo o tempo participar
nas vantagens da inovação, mediante o pagamento da quota correspondente às
despesas de execução e manutenção da obra.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1427º
(Reparações indispensáveis e urgentes)
As
reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser
levadas a efeito, na falta ou impedimento do administrador, por iniciativa de
qualquer condómino.
ARTIGO 1428º
(Destruição do edifício)
1.
No caso de destruição do edifício ou de uma parte que represente, pelo menos,
três quartos do seu valor, qualquer dos condóminos tem o direito de exigir a
venda do terreno e dos materiais, pela forma que a assembleia vier a designar.
2.
Se a destruição atingir uma parte menor, pode a assembleia deliberar, pela maioria
do número dos condóminos e do capital investido no edifício, a reconstrução
deste.
3.
Os condóminos que não queiram participar nas despesas da reconstrução podem ser
obrigados a alienar os seus direitos a outros condóminos, segundo o valor entre
eles acordado ou fixado judicialmente.
4.
É permitido ao alienante escolher o condómino ou condóminos a quem a
transmissão deve ser feita.
ARTIGO 1429º
(Seguro obrigatório)
1.
É obrigatório o seguro contra o risco de incêndio
do edifício, quer quanto às fracções
autónomas, quer relativamente às partes comuns.
2.
O seguro deve ser celebrado pelos condóminos; o administrador deve, no entanto,
efectuá-lo quando os condóminos o não hajam feito dentro do prazo e pelo valor
que, para o efeito, tenha sido fixado em assembleia; nesse caso, ficará com o
direito de reaver deles o respectivo prémio.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1429º-A
(Regulamento do condomínio)
1
- Havendo mais de quatro condóminos e caso não faça parte do título constitutivo,
deve ser elaborado um regulamento do condomínio disciplinando o uso, a fruição
e a conservação das partes comuns.
2
- Sem prejuízo do disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 1418º, a feitura do
regulamento compete à assembleia de condóminos ou ao administrador, se aquela o
não houver elaborado.
(Aditado pelo Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
SECÇÃO IV
Administração das partes comuns do
edifício
ARTIGO 1430º
(Órgãos administrativos)
1.
A administração das partes comuns do edifício compete à assembleia dos
condóminos e a um administrador.
2.
Cada condómino tem na assembleia tantos votos quantas as unidades inteiras que
couberem na percentagem ou permilagem a que o artigo 1418º se refere.
ARTIGO 1431º
(Assembleia dos condóminos)
1.
A assembleia reúne-se na primeira quinzena de Janeiro, mediante convocação do
administrador, para discussão e aprovação das contas respeitantes ao último ano
e aprovação do orçamento das despesas a efectuar durante o ano.
2.
A assembleia também reunirá quando for convocada pelo administrador, ou por
condóminos que representem, pelo menos, vinte e cinco por cento do capital
investido.
3.
Os condóminos podem fazer-se representar por procurador.
ARTIGO 1432º
(Convocação e funcionamento da assembleia)
1.
A assembleia é convocada por meio de carta registada, enviada com 10 dias de
antecedência, ou mediante aviso convocatório feito com a mesma antecedência,
desde que haja recibo de recepção assinado pelos condóminos.
2.
A convocatória deve indicar o dia, hora, local e ordem de trabalhos da reunião
e informar sobre os assuntos cujas deliberações só podem ser aprovadas por
unanimidade dos votos.
3.
As deliberações são tomadas, salvo disposição especial, por maioria dos votos
representativos do capital investido.
4.
Se não comparecer o número de condóminos suficiente para se obter
vencimento
e na convocatória não tiver sido desde logo fixada outra data, considera-se
convocada nova reunião para uma semana depois, na mesma hora e local, podendo
neste caso a assembleia deliberar por maioria de votos dos condóminos
presentes, desde que estes representem, pelo menos, um quarto do valor total do
prédio.
5.
As deliberações que careçam de ser aprovadas por unanimidade dos votos podem
ser aprovadas por unanimidade dos condóminos presentes desde que estes
representem, pelo menos, dois terços do capital investido, sob condição de
aprovação da deliberação pelos condóminos ausentes, nos termos dos números
seguintes.
6.
As deliberações têm de ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, por
carta registada com aviso de recepção, no prazo de 30 dias.
7.
Os condóminos têm 90 dias após a recepção da carta referida no número anterior
para comunicar, por escrito, à assembleia de condóminos o seu assentimento ou a
sua discordância.
8.
O silêncio dos condóminos deve ser considerado como aprovação da deliberação
comunicada nos termos do nº 6.
9.
Os condóminos não residentes devem comunicar, por escrito, ao administrador o
seu domicílio ou o do seu representante.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1433º
(Impugnação das deliberações)
1.
As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente
aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha
aprovado.
2.
No prazo de 10 dias contado da deliberação, para os condóminos presentes, ou
contado da sua comunicação, para os condóminos ausentes, pode ser exigida ao
administrador a convocação de uma assembleia extraordinária, a ter lugar no
prazo de 20 dias, para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes.
3.
No prazo de 30 dias contado nos termos do número anterior, pode qualquer
condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem.
4.
O direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 20 dias contados
sobre a deliberação da assembleia extraordinária ou, caso esta não tenha sido
solicitada, no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação.
5.
Pode também ser requerida a suspensão das deliberações nos termos da lei de
processo.
6.
A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções
compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse
efeito.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1434º
(Compromisso arbitral)
1.
A assembleia pode estabelecer a obrigatoriedade da celebração de compromissos
arbitrais para a resolução de litígios entre condóminos, ou entre condóminos e
o administrador, e fixar penas pecuniárias para a inobservância das disposições
deste código, das deliberações da assembleia ou das decisões do administrador.
2.
O montante das penas aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do
rendimento colectável anual da fracção do infractor.
ARTIGO 1435º
(Administrador)
1.
O administrador é eleito e exonerado pela assembleia.
2.
Se a assembleia não eleger administrador, será este nomeado pelo tribunal a
requerimento de qualquer dos condóminos.
3.
O administrador pode ser exonerado pelo tribunal, a requerimento de qualquer
condómino, quando se mostre que praticou irregularidades ou agiu com
negligência no exercício das suas funções.
4.
O cargo de administrador é remunerável e tanto pode ser desempenhado por um dos
condóminos como por terceiro; o período de funções é, salvo disposição em
contrário, de um ano, renovável.
5.
O administrador mantém-se em funções até que seja eleito ou nomeado o seu
sucessor.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1435º-A
(Administrador provisório)
1.
Se a assembleia de condóminos não eleger administrador e este não houver sido
nomeado judicialmente, as correspondentes funções são obrigatoriamente
desempenhadas, a título provisório, pelo condómino cuja fracção ou fracções
representem a maior percentagem do capital investido, salvo se outro condómino
houver manifestado vontade de exercer o cargo e houver comunicado tal propósito
aos demais condóminos.
2.
Quando, nos termos do número anterior, houver mais de um condómino em igualdade
de circunstâncias, as funções recaem sobre aquele a que corresponda a primeira
letra na ordem alfabética utilizada na descrição das fracções constante do
registo predial.
3.
Logo que seja eleito ou judicialmente nomeado um administrador, o condómino que
nos termos do presente artigo se encontre provido na administração cessa
funções, devendo entregar àquele todos os documentos respeitantes ao condomínio
que estejam confiados à sua guarda.
(Aditado pelo Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1436º
(Funções do administrador)
São
funções do administrador, além de outras que lhe sejam atribuídas pela
assembleia:
a)
Convocar a assembleia dos condóminos;
b)
Elaborar o orçamento das receitas e despesas relativas a cada ano;
c)
Verificar a existência do seguro contra o risco de incêndio, propondo à
assembleia o montante do capital seguro;
d)
Cobrar as receitas e efectuar as despesas comuns;
e)
Exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas;
f)
Realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns;
g)
Regular o uso das coisas comuns e a prestação dos serviços de interesse comum;
h)
Executar as deliberações da assembleia;
i)
Representar o conjunto dos condóminos perante as autoridades administrativas;
j)
Prestar contas à assembleia;
l)
Assegurar a execução do regulamento e das disposições legais e administrativas
relativas ao condomínio;
m)
Guardar e manter todos os documentos que digam respeito ao condomínio.
(Redacção do Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
ARTIGO 1437º
(Legitimidade do administrador)
1.
O administrador tem legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos
condóminos, quer contra terceiro, na execução das funções que lhe pertencem ou
quando autorizado pela assembleia.
2.
O administrador pode também ser demandado nas acções respeitantes às partes
comuns do edifício.
3.
Exceptuam-se as acções relativas a questões de propriedade ou posse dos bens
comuns, salvo se a assembleia atribuir para o efeito poderes especiais ao
administrador.
ARTIGO 1438º
(Recurso dos actos do administrador)
Dos
actos do administrador cabe recurso para a assembleia, a qual pode neste caso
ser convocada pelo condómino recorrente.
ARTIGO 1438º-A
(Propriedade horizontal de conjuntos de edifícios)
O
regime previsto neste capítulo pode ser aplicado, com as necessárias
adaptações, a conjuntos de edifícios contíguos funcionalmente ligados entre si
pela existência de partes comuns afectadas ao uso de todas ou algumas unidades
ou fracções que os compõem.
(Aditado pelo Dec.-Lei 267/94, de 25-10)
TÍTULO III
DO USUFRUTO, USO E HABITAÇÃO
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1439º
(Noção)
Usufruto
é o direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem
alterar a sua forma ou substância.
ARTIGO 1440º
(Constituição)
O
usufruto pode ser constituído por contrato, testamento, usucapião ou disposição
da lei.
ARTIGO 1441º
(Usufruto simultâneo e sucessivo)
O
usufruto pode ser constituído em favor de uma ou mais pessoas, simultânea ou
sucessivamente, contanto que existam ao tempo em que o direito do primeiro
usufrutuário se torne efectivo.
ARTIGO 1442º
(Direito de acrescer)
Salvo
estipulação em contrário, o usufruto constituído por contrato ou testamento em
favor de várias pessoas conjuntamente só se consolida com a propriedade por
morte da última que sobreviver.
ARTIGO 1443º
(Duração)
Sem
prejuízo do disposto nos artigos anteriores, o usufruto não pode exceder a vida
do usufrutuário; sendo constituído a favor de uma pessoa colectiva, de direito
público ou privado, a sua duração máxima é de trinta anos.
ARTIGO 1444º
(Trespasse a terceiro)
1.
O usufrutuário pode trespassar a outrem o seu direito, definitiva ou
temporáriamente, bem como onerá-lo, salvas as restrições impostas pelo título
constitutivo ou pela lei.
2.
O usufrutuário responde pelos danos que as coisas padecerem por culpa da pessoa
que o substituir.
ARTIGO 1445º
(Direitos e obrigações do usufrutuário)
Os
direitos e obrigações do usufrutuário são regulados pelo título constitutivo do
usufruto; na falta ou insuficiência deste, observar-se-ão as disposições
seguintes.
CAPÍTULO II
Direitos do usufrutuário
ARTIGO 1446º
(Uso, fruição e administração da coisa ou do direito)
O
usufrutuário pode usar, fruir e administrar a coisa ou o direito como faria um
bom pai de família, respeitando o seu destino económico.
ARTIGO 1447º
(Indemnização do usufrutuário)
O
usufrutuário, ao começar o usufruto, não é obrigado a abonar ao proprietário
despesa alguma feita; mas, findo o usufruto, o proprietário é obrigado a
indemnizar aquele das despesas de cultura, sementes ou matérias-primas e, de um
modo geral, de todas as despesas de produção feitas pelo usufrutuário, até ao
valor dos frutos que vierem a ser colhidos.
ARTIGO 1448º
(Alienação dos frutos antes da colheita)
Se
o usufrutuário tiver alienado frutos antes da colheita e o usufruto se
extinguir antes que sejam colhidos, a alienação subsiste, mas o produto dela
pertence ao proprietário, deduzida a indemnização a que o artigo anterior se
refere.
ARTIGO 1449º
(Âmbito do usufruto)
O
usufruto abrange as coisas acrescidas e todos os direitos inerentes à coisa
usufruída.
ARTIGO 1450º
(Benfeitorias úteis e voluptuárias)
1.
O usufrutuário tem a faculdade de fazer na coisa usufruída as benfeitorias
úteis e voluptuárias que bem lhe parecer, contanto que não altere a sua forma
ou substância, nem o seu destino económico.
2.
É aplicável ao usufrutuário, quanto a benfeitorias úteis e voluptuárias, o que
neste código se prescreve relativamente ao possuidor de boa fé.
ARTIGO 1451º
(Usufruto de coisas consumíveis)
1.
Quando o usufruto tiver por objecto coisas consumíveis, pode o usufrutuário
servir-se delas ou aliená-las, mas é obrigado a restituir o seu valor, findo o
usufruto, no caso de as coisas terem sido estimadas; se o não foram, a
restituição será feita pela entrega de outras do mesmo género, qualidade ou
quantidade, ou do valor destas na conjuntura em que findar o usufruto.
2.
O usufruto de coisas consumíveis não importa transferência da propriedade para
o usufrutuário.
ARTIGO 1452º
(Usufruto de coisas deterioráveis)
1.
Se o usufruto abranger coisas que, não sendo consumíveis, são, todavia,
susceptíveis de se deteriorarem pelo uso, não é o usufrutuário obrigado a mais
do que restituí-las no fim do usufruto como se encontrarem, a não ser que
tenham sido deterioradas por uso diverso daquele que lhes era próprio ou por culpa
do usufrutuário.
2.
Se as não apresentar, o usufrutuário responde pelo valor que as coisas tinham
na conjuntura em que começou o usufruto, salvo se provar que perderam todo o
seu valor em uso legítimo.
ARTIGO 1453º
(Perecimento natural de árvores e arbustos)
1.
Ao usufrutuário de árvores ou arbustos é lícito aproveitar-se das que forem
perecendo naturalmente.
2.
Tratando-se, porém, de árvores ou arbustos frutíferos, o usufrutuário é
obrigado a plantar tantos pés quantos os que perecerem naturalmente, ou a
substituir esta cultura por outra igualmente útil para o proprietário, se for
impossível ou prejudicial a renovação de plantas do mesmo género.
ARTIGO 1454º
(Perecimento acidental de árvores e arbustos)
1.
As árvores ou arbustos que caiam ou sejam arrancados ou quebrados por acidente
pertencem ao proprietário, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo seguinte
quando se trate de matas ou árvores de corte.
2.
O usufrutuário pode, todavia, aplicar essas árvores e arbustos às reparações
que seja obrigado a fazer, ou exigir que o proprietário as retire, desocupando
o terreno.
ARTIGO 1455º
(Usufruto de matas e árvores de corte)
1.
O usufrutuário de matas ou quaisquer árvores isoladas que se destinem à
produção de madeira ou lenha deve observar, nos cortes, a ordem e as praxes
usadas pelo proprietário ou, na sua falta, o uso da terra.
2.
Se, em consequência de ciclone, incêndio, requisição do Estado ou outras causas
análogas vier a ser prejudicada consideravelmente a fruição normal do
usufrutuário, deve o proprietário compensá-lo até ao limite dos juros da
quantia correspondente ao valor das árvores mortas, ou até ao limite dos juros
da importância recebida.
ARTIGO 1456º
(Usufruto de plantas de viveiro)
O
usufrutuário de plantas de viveiro é obrigado a conformar-se, no arranque das
plantas, com a ordem e praxes do proprietário ou, na sua falta, com o uso da
terra, tanto pelo que toca ao tempo e modo do arranque como pelo que respeita
ao tempo e modo de retanchar o viveiro.
ARTIGO 1457º
(Exploração de minas)
1.
O usufrutuário de concessão mineira deve conformar-se, na exploração das minas,
com as praxes seguidas pelo respectivo titular.
2.
O usufrutuário de terrenos onde existam explorações mineiras tem direito às
quantias devidas ao proprietário do solo, quer a título de renda, quer por
qualquer outro título, em proporção do tempo que durar o usufruto.
ARTIGO 1458º
(Exploração de pedreiras)
1.
O usufrutuário não pode abrir de novo pedreiras sem consentimento do
proprietário; mas, se elas já estiverem em exploração ao começar o usufruto,tem
o usufrutuário a faculdade de explorá-las, conformando-se com as praxes
observadas pelo proprietário.
2.
A proibição não inibe o usufrutuário de extrair pedra do solo para reparações
ou obras a que seja obrigado.
ARTIGO 1459º
(Exploração de águas)
1.
O usufrutuário pode, em benefício do prédio usufruído, procurar águas
subterrâneas por meio de poços, minas ou outras escavações.
2.
As benfeitorias a que o número anterior se refere ficam sujeitas ao que neste
código se dispõe quanto ao possuidor de boa fé.
ARTIGO 1460º
(Constituição de servidões)
1.
Relativamente à constituição de servidões activas, o usufrutuário goza dos
mesmos direitos do proprietário, mas não lhe é lícito constituir encargos que
ultrapassem a duração do usufruto.
2.
O proprietário não pode constituir servidões sem consentimento do usufrutuário,
desde que delas resulte diminuição do valor do usufruto.
ARTIGO 1461º
(Tesouros)
Se
o usufrutuário descobrir na coisa usufruída algum tesouro, observar-se-ão as
disposições deste código acerca dos que acham tesouros em propriedade alheia.
ARTIGO 1462º
(Usufruto sobre universalidades de animais)
1.
Se o usufruto for constituído numa universalidade de animais, é o usufrutuário
obrigado a substituir com as crias novas as cabeças que, por qualquer motivo,
vierem a faltar.
2.
Se os animais se perderem, na totalidade ou em parte, por caso fortuito, sem
produzirem outros que os substituam, o usufrutuário é tão somente obrigado a
entregar as cabeças restantes.
3.
Neste caso, porém, o usufrutuário é responsável pelos despojos dos animais,
quando de tais despojos se tenha aproveitado.
ARTIGO 1463º
(Usufruto de rendas vitalícias)
O
usufrutuário de rendas vitalícias tem direito a perceber as prestações
correspondentes à duração do usufruto, sem ser obrigado a qualquer restituição.
ARTIGO 1464º
(Usufruto de capitais postos a juro)
1.
O usufrutuário de capitais postos a juro ou a qualquer outro interesse, ou
investidos em títulos de crédito, tem o direito de perceber os frutos
correspondentes à duração do usufruto.
2.
Não é lícito levantar ou investir capitais sem o acordo dos dois titulares; no
caso de divergência, pode ser judicialmente suprido o consentimento, quer do
proprietário, quer do usufrutuário.
ARTIGO 1465º
(Usufruto constituído sobre dinheiro
e usufruto de capitais levantados)
1.
Se o usufruto tiver por objecto certa quantia, e bem assim quando no decurso do
usufruto sejam levantados capitais nos termos do artigo anterior, tem o
usufrutuário a faculdade de administrar esses valores como bem lhe parecer,
desde que preste a devida caução; neste caso, corre por sua conta o risco da
perda da soma usufruída.
2.
Se o usufrutuário não quiser usar desta faculdade, é aplicável o disposto no nº
2 do artigo anterior.
ARTIGO 1466º
(Prémios e outras utilidades aleatórias)
O
usufrutuário de títulos de crédito tem direito à fruição dos prémios ou outras
utilidades aleatórias produzidas pelo título.
ARTIGO 1467º
(Usufruto de títulos de participação)
1.
O usufrutuário de acções ou de partes sociais tem direito:
a)
Aos lucros distribuídos correspondentes ao tempo de duração do usufruto;
b)
A votar nas assembleias gerais, salvo quando se trate de deliberações que
importem alteração dos estatutos ou dissolução da sociedade;
c)
A usufruir os valores que, no acto de liquidação da sociedade ou da quota,
caibam à parte social sobre que incide o usufruto.
2.
Nas deliberações que importem alteração dos estatutos ou dissolução da
sociedade, o voto pertence conjuntamente ao usufrutuário e ao titular da raiz.
CAPÍTULO III
Obrigações do usufrutário
ARTIGO 1468º
(Relação de bens e caução)
Antes
de tomar conta dos bens, o usufrutuário deve:
a)
Relacioná-los, com citação ou assistência do proprietário, declarando o estado
deles, bem como o valor dos móveis, se os houver;
b)
Prestar caução, se esta lhe for exigida, tanto para a restituição dos bens ou
do respectivo valor, sendo bens consumíveis, como para a reparação das
deteriorações que venham a padecer por sua culpa, ou para o pagamento de
qualquer outra indemnização que seja devida.
ARTIGO 1469º
(Dispensa de caução)
A
caução não é exigível do alienante com reserva de usufruto e pode ser
dispensada no título constitutivo do usufruto.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1470º
(Falta de caução)
1.
Se o usufrutuário não prestar a caução devida, tem o proprietário a faculdade
de exigir que os imóveis se arrendem ou ponham em administração, que os móveis
se vendam ou lhe sejam entregues, que os capitais, bem como a importância dos
preços das vendas, se dêem a juros ou se empreguem em títulos de crédito
nominativos, que os títulos ao portador se convertam em nominativos ou se
depositem nas mãos de terceiro, ou que se adoptem outras medidas adequadas.
2.
Não havendo acordo do usufrutuário quanto ao destino dos bens, decidirá o
tribunal.
ARTIGO 1471º
(Obras e melhoramentos)
1.
O usufrutuário é obrigado a consentir ao proprietário quaisquer obras ou
melhoramentos de que seja susceptível a coisa usufruída, e também quaisquer
novas plantações, se o usufruto recair em prédios rústicos, contanto que dos
actos do proprietário não resulte diminuição do valor do usufruto.
2.
Das obras ou melhoramentos realizados tem o usufrutuário direito ao usufruto,
sem ser obrigado a pagar juros das somas desembolsadas pelo proprietário ou
qualquer outra indemnização; no caso, porém, de as obras ou melhoramentos
aumentarem o rendimento líquido da coisa usufruída, o aumento pertence ao
proprietário.
ARTIGO 1472º
(Reparações ordinárias)
1.
Estão a cargo do usufrutuário tanto as reparações ordinárias indispensáveis
para a conservação da coisa como as despesas de administração.
2.
Não se consideram ordinárias as reparações que, no ano em que forem
necessárias, excedam dois terços do rendimento líquido desse ano.
3.
O usufrutuário pode eximir-se das reparações ou despesas a que é obrigado,
renunciando ao usufruto.
ARTIGO 1473º
(Reparações extraordinárias)
1.
Quanto às reparações extraordinárias, só incumbe ao usufrutuário avisar em
tempo o proprietário, para que este querendo, as mande fazer; se, porém, elas
se tiverem tornado necessárias por má administração do usufrutuário, é
aplicável o disposto no artigo anterior.
2.
Se o proprietário, depois de avisado, não fizer as reparações extraordinárias,
e estas forem de utilidade real, pode o usufrutuário fazê-las a expensas suas e
exigir a importância despendida, ou o pagamento do valor que tiverem no fim do
usufruto, se este valor for inferior ao custo.
3.
Se o proprietário fizer as reparações, observar-se-á o disposto no nº 2 do
artigo 1471º.
ARTIGO 1474º
(Impostos e outros encargos anuais)
O
pagamento dos impostos e quaisquer outros encargos anuais que incidam sobre o
rendimento dos bens usufruídos incumbe a quem for titular do usufruto no
momento do vencimento.
ARTIGO 1475º
(Actos lesivos da parte de terceiros)
O
usufrutuário é obrigado a avisar o proprietário de qualquer facto de terceiro,
de que tenha notícia, sempre que ele possa lesar os direitos do proprietário;
se o não fizer, responde pelos danos que este venha a sofrer.
CAPÍTULO IV
Extinção do usufruto
ARTIGO 1476º
(Causas de extinção)
1.
O usufruto extingue-se:
a)
Por morte do usufrutuário, ou chegado o termo do prazo por que o direito foi
conferido, quando não seja vitalício;
b)
Pela reunião do usufruto e da propriedade na mesma pessoa;
c)
Pelo seu não exercício durante vinte anos, qualquer que seja o motivo;
d)
Pela perda total da coisa usufruída;
e)
Pela renúncia.
2.
A renúncia não requer aceitação do proprietário.
ARTIGO 1477º
(Usufruto até certa idade de terceira pessoa)
O
usufruto concedido a alguém até certa idade de terceira pessoa durará pelos
anos prefixos, ainda que o terceiro faleça antes da idade referida, excepto se
o usufruto tiver sido concedido só em atenção à existência de tal pessoa.
ARTIGO 1478º
(Perda parcial e «rei mutatio»)
1.
Se a coisa ou direito usufruído se perder só em parte, continua o usufruto na
parte restante.
2.
O disposto no número anterior é aplicável no caso de a coisa se transformar
noutra que ainda tenha valor, embora com finalidade económica distinta.
ARTIGO 1479º
(Destruição de edifícios)
1.
Se o usufruto for constituído em algum prédio urbano e este for destruído por
qualquer causa, tem o usufrutuário direito a desfrutar o solo e os materiais
restantes.
2.
O proprietário da raiz pode, porém, reconstruir o prédio, ocupando o solo e os
materiais, desde que pague ao usufrutuário, durante o usufruto, os juros
correspondentes ao valor do mesmo solo e dos materiais.
3.
As disposições dos números anteriores são igualmente aplicáveis, se o usufruto
for constituído em algum prédio rústico de que faça parte o edifício destruído.
ARTIGO 1480º
(Indemnizações)
1.
Se a coisa ou direito usufruído se perder, deteriorar ou diminuir de valor, e o
proprietário tiver direito a ser indemnizado, o usufruto passa a incidir sobre
a indemnização.
2.
O disposto no número antecedente é aplicável à indemnização resultante de
expropriação ou requisição da coisa ou direito, à indemnização devida por
extinção do direito de superfície, ao preço da remição do foro e a outros casos
análogos.
ARTIGO 1481º
(Seguro de coisa destruída)
1.
Se o usufrutuário tiver feito o seguro da coisa ou pago os prémios pelo seguro
já feito, o usufruto transfere-se para a indemnização devida pelo segurador.
2.
Tratando-se de um edifício, o proprietário pode reconstruí-lo, transferindo-se,
neste caso, o usufruto para o novo edifício; se, porém, a soma despendida na reconstrução
for superior à indemnização recebida, o direito do usufrutuário será
proporcional à indemnização.
3.
Sendo os prémios pagos pelo proprietário, a este pertence por inteiro a
indemnização que for devida.
ARTIGO 1482º
(Mau uso por parte do usufrutuário)
O
usufruto não se extingue, ainda que o usufrutuário faça mau uso da coisa
usufruída; mas, se o abuso se tornar consideravelmente prejudicial ao
proprietário, pode este exigir que a coisa lhe seja entregue, ou que se tomem
as providências previstas no artigo 1470º, obrigando-se, no primeiro caso, a
pagar anualmente ao usufrutuário o produto líquido dela, depois de deduzidas as
despesas e o prémio que pela sua administração lhe for arbitrado.
ARTIGO 1483º
(Restituição da coisa)
Findo
o usufruto, deve o usufrutuário restituir a coisa ao proprietário, sem prejuízo
do disposto para as coisas consumíveis e salvo o direito de retenção nos casos
em que possa ser invocado.
CAPÍTULO V
Uso e habitação
ARTIGO 1484º
(Noção)
1.
O direito de uso consiste na faculdade de se servir de certa coisa alheia e
haver os respectivos frutos, na medida das necessidades, quer do titular, quer
da sua família.
2.
Quando este direito se refere a casa de morada, chama-se direito de habitação.
ARTIGO 1485º
(Constituição, extinção e regime)
Os
direitos de uso e de habitação constituem-se e extinguem-se pelos mesmos modos
que o usufruto, sem prejuízo do disposto na alínea b) do artigo 1293º, e são
igualmente regulados pelo seu título constitutivo; na falta ou insuficiência
deste, observar-se-ão as disposições seguintes.
ARTIGO 1486º
(Fixação das necessidades pessoais)
As
necessidades pessoais do usuário ou do morador usuário são fixadas segundo a
sua condição social.
ARTIGO 1487º
(Âmbito da família)
Na
família do usuário ou do morador usuário compreendem-se apenas o cônjuge, não
separado judicialmente de pessoas e bens, os filhos solteiros, outros parentes
a quem sejam devidos alimentos e as pessoas que, convivendo com o respectivo
titular, se encontrem ao seu serviço ou ao serviço das pessoas designadas.
ARTIGO 1488º
(Intransmissibilidade do direito)
O
usuário e o morador usuário não podem trespassar ou locar o seu direito, nem
onerá-lo por qualquer modo.
ARTIGO 1489º
(Obrigações inerentes ao uso e à habitação)
1.
Se o usuário consumir todos os frutos do prédio ou ocupar todo o edifício,
ficam a seu cargo as reparações ordinárias, as despesas de administração e os
impostos e encargos anuais, como se fosse usufrutuário.
2.
Se o usuário perceber só parte dos frutos ou ocupar só parte do edifício,
contribuirá para as despesas mencionadas no número precedente em proporção da
sua fruição.
ARTIGO 1490º
(Aplicação das normas do usufruto)
São
aplicadas aos direitos de uso e de habitação as disposições que regulam o
usufruto, quando conformes à natureza daqueles direitos
TÍTULO
IV
DA
ENFITEUSE
ARTIGOS
1491º A 1523º
(Revogados
pelos Decs.-Lei 195-A/76, de 16-3, e 233/76, de 2-4)
TÍTULO V
DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1524º
(Noção)
O
direito de superfície consiste na faculdade de construir ou manter, perpétua ou
temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter
plantações.
ARTIGO 1525º
(Objecto)
1.
Tendo por objecto a construção de uma obra, o direito de superfície pode
abranger uma parte do solo não necessária à sua implantação, desde que ela
tenha utilidade para o uso da obra.
2.
O direito de superfície pode ter por objecto a construção ou a manutenção de
obra sob solo alheio.
(Redacção do Dec.-Lei 257/91, de 18-7)
ARTIGO 1526º
(Direito de construir sobre edifício alheio)
O
direito de construir sobre edifício alheio está sujeito às disposições deste
título e às limitações impostas à constituição da propriedade horizontal;
levantado o edifício, são aplicáveis as regras da propriedade horizontal,
passando o construtor a ser condómino das partes referidas no artigo 1421º.
ARTIGO 1527º
(Direito de superfície constituído pelo Estado
ou por pessoas colectivas públicas)
O
direito de superfície constituído pelo Estado ou por pessoas colectivas
públicas em terrenos do seu domínio privado fica sujeito a legislação especial
e, subsidiariamente, às disposições deste código.
CAPÍTULO II
Constituição do direito de
superfície
ARTIGO 1528º
(Princípio geral)
O
direito de superfície pode ser constituído por contrato, testamento ou
usucapião, e pode resultar da alienação de obra ou árvores já existentes,
separadamente da propriedade do solo.
ARTIGO 1529º
(Servidões)
1.
A constituição do direito de superfície importa a constituição das servidões
necessárias ao uso e fruição da obra ou das árvores; se no título não forem
designados o local e as demais condições de exercício das servidões, serão
fixados, na falta de acordo, pelo tribunal.
2.
A constituição coerciva da servidão de passagem sobre prédio de terceiro só é
possível se, à data da constituição do direito de superfície, já era encravado
o prédio sobre que este direito recaía.
CAPÍTULO III
Direitos e encargos do superficiário
e do proprietário
ARTIGO 1530º
(Preço)
1.
No acto de constituição do direito de superfície, pode convencionar-se, a
título de preço, que o superficiário pague uma única prestação ou pague certa
prestação anual, perpétua ou temporária.
2.
O pagamento temporário de uma prestação anual é compatível com a constituição
perpétua do direito de superfície.
3.
As prestações são sempre em dinheiro.
ARTIGO 1531º
(Pagamento das prestações anuais)
1.
Ao pagamento das prestações anuais é aplicável o disposto nos artigos 1505º e
1506º, com as necessárias adaptações.
2.
Havendo mora no cumprimento, o proprietário do solo tem o direito de exigir o
triplo das prestações em dívida.
ARTIGO 1532º
(Fruição do solo antes do início da obra)
Enquanto
não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, o
uso e a fruição da superfície pertencem ao proprietário do solo, o qual,
todavia, não pode impedir nem tornar mais onerosa a construção ou a plantação.
ARTIGO 1533º
(Fruição do subsolo)
O
uso e a fruição do subsolo pertencem ao proprietário; este é, porém,
responsável pelos prejuízos causados ao superficiário em consequência da
exploração que dele fizer.
ARTIGO 1534º
(Transmissibilidade dos direitos)
O
direito de superfície e o direito de propriedade do solo são transmissíveis por
acto entre vivos ou por morte.
ARTIGO 1535º
(Direito de preferência)
1.
O proprietário do solo goza do direito de preferência, em último lugar, na
venda ou dação em cumprimento do direito de superfície; sendo, porém, enfitêutico
o prédio incorporado no solo, prevalece o direito de preferência do
proprietário.
2.
É aplicável ao direito de preferência o disposto nos artigos 416º a 418º e
1410º.
CAPÍTULO IV
Extinção do direito de superfície
ARTIGO 1536º
(Casos de extinção)
1.
O direito de superfície extingue-se:
a)
Se o superficiário não concluir a obra ou não fizer a plantação dentro do prazo
fixado ou, na falta de fixação, dentro do prazo de dez anos;
b)
Se, destruída a obra ou as árvores, o superficiário não reconstruir a obra ou
não renovar a plantação, dentro dos mesmos prazos a contar da destruição;
c)
Pelo decurso do prazo, sendo constituído por certo tempo;
d)
Pela reunião na mesma pessoa do direito de superfície e do direito de
propriedade;
e)
Pelo desaparecimento ou inutilização do solo;
f)
Pela expropriação por utilidade pública.
2.
No título constitutivo pode também estipular-se a extinção do direito de
superfície em consequência da destruição da obra ou das árvores, ou da
verificação de qualquer condição resolutiva.
3.
À extinção do direito de superfície, nos casos previstos nas alíneas a) e b) do
nº 1, são aplicáveis as regras da prescrição.
ARTIGO 1537º
(Falta de pagamento das prestações anuais)
1.
A falta de pagamento das prestações anuais durante vinte anos extingue a
obrigação de as pagar, mas o superficiário não adquire a propriedade do solo,
salvo se houver usucapião em seu benefício.
2.
À extinção da obrigação de pagamento
das prestações são aplicáveis as regras da
prescrição.
ARTIGO 1538º
(Extinção pelo decurso do prazo)
1.
Sendo o direito de superfície constituído por certo tempo, o proprietário do
solo, logo que expire o prazo, adquire a propriedade da obra ou das árvores.
2.
Salvo estipulação em contrário, o superficiário tem, nesse caso, direito a uma
indemnização, calculada segundo as regras do enriquecimento sem causa.
3.
Não havendo lugar à indemnização, o superficiário responde pelas deteriorações
da obra ou das plantações, quando haja culpa da sua parte.
ARTIGO 1539º
(Extinção de direitos reais constituídos
sobre o direito de superfície)
1.
A extinção do direito de superfície pelo decurso do prazo fixado importa a
extinção dos direitos reais de gozo ou de garantia constituídos pelo
superficiário em benefício de terceiro.
2.
Se, porém, o superficiário tiver a receber alguma indemnização nos termos do
artigo anterior, aqueles direitos transferem-se para a indemnização, conforme o
disposto nos lugares respectivos.
ARTIGO 1540º
(Direitos reais constituídos pelo proprietário)
Os
direitos reais constituídos pelo proprietário sobre o solo estendem-se à obra e
às árvores adquiridas nos termos do artigo 1538º.
ARTIGO 1541º
(Permanência dos direitos reais)
Extinguindo-se
o direito de superfície perpétuo, ou o temporário antes do decurso do prazo, os
direitos reais constituídos sobre a superfície ou sobre o solo continuam a
onerar separadamente as duas parcelas, como se não tivesse havido extinção, sem
prejuízo da aplicação das disposições dos artigos anteriores logo que o prazo
decorra.
ARTIGO 1542º
(Extinção por expropriação)
Extinguindo-se
o direito de superfície em consequência da expropriação por utilidade pública,
cabe a cada um dos titulares a parte da indemnização que corresponder ao valor
do respectivo direito.
TÍTULO VI
DAS SERVIDÕES PREDIAIS
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1543º
(Noção)
Servidão
predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio
pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e
dominante o que dela beneficia.
ARTIGO 1544º
(Conteúdo)
Podem
ser objecto da servidão quaisquer utilidades, ainda que futuras ou eventuais,
susceptíveis de ser gozadas por intermédio do prédio dominante, mesmo que não
aumentem o seu valor.
ARTIGO 1545º
(Inseparabilidade das servidões)
1.
Salvas as excepções previstas na lei, as servidões não podem ser separadas dos
prédios a que pertencem, activa ou passivamente.
2.
A afectação das utilidades próprias da servidão a outros prédios importa sempre
a constituição de uma servidão nova e a extinção da antiga.
ARTIGO 1546º
(Indivisibilidade das servidões)
As
servidões são indivisíveis: se o prédio serviente for dividido entre vários
donos, cada porção fica sujeita à parte da servidão que lhe cabia; se for dividido
o prédio dominante, tem cada consorte o direito de usar da servidão sem
alteração nem mudança.
CAPÍTULO II
Constituição das servidões
ARTIGO 1547º
(Princípios gerais)
1.
As servidões prediais podem ser constituídas por contrato, testamento, usucapião
ou destinação do pai de família.
2.
As servidões legais, na falta de constituição voluntária, podem ser
constituídas por sentença judicial ou por decisão administrativa, conforme os
casos.
ARTIGO 1548º
(Constituição por usucapião)
1.
As servidões não aparentes não podem ser constituídas por usucapião.
2.
Consideram-se não aparentes as servidões que não se revelam por sinais visíveis
e permanentes.
ARTIGO 1549º
(Constituição por destinação do pai de família)
Se
em dois prédios do mesmo dono, ou em duas fracções de um só prédio, houver
sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem
serventia de um para com outro, serão esses sinais havidos como prova da
servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios, ou as duas fracções do
mesmo prédio, vierem a separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa
se houver declarado no respectivo documento.
CAPÍTULO III
Servidões legais
SECÇÃO I
Servidões legais de passagem
ARTIGO 1550º
(Servidão em benefício de prédio encravado)
1.
Os proprietários de prédios que não tenham comunicação com a via pública, nem
condições que permitam estabelecê-la sem excessivo incómodo ou dispêndio, têm a
faculdade de exigir a constituição de servidões de passagem sobre os prédios
rústicos vizinhos.
2.
De igual faculdade goza o proprietário que tenha comunicação insuficiente com a
via pública, por terreno seu ou alheio.
ARTIGO 1551º
(Possibilidade de afastamento da servidão)
1.
Os proprietários de quintas muradas, quintais, jardins ou terreiros adjacentes
a prédios urbanos podem subtrair-se ao encargo de ceder passagem, adquirindo o
prédio encravado pelo seu justo valor.
2.
Na falta de acordo, o preço é fixado judicialmente; sendo dois ou mais os
proprietários interessados, abrir-se-á licitação entre eles, revertendo o
excesso para o alienante.
ARTIGO 1552º
(Encrave voluntário)
1.
O proprietário que, sem justo motivo, provocar o encrave absoluto ou relativo
do prédio só pode constituir a servidão mediante o pagamento de indemnização
agravada.
2.
A indemnização agravada é fixada, de harmonia com a culpa do proprietário, até
ao dobro da que normalmente seria devida.
ARTIGO 1553º
(Lugar da constituição da servidão)
A
passagem deve ser concedida através do prédio ou prédios que sofram menor
prejuízo, e pelo modo e lugar menos inconvenientes para os prédios onerados.
ARTIGO 1554º
(Indemnização)
Pela
constituição da servidão de passagem é devida a indemnização correspondente ao
prejuízo sofrido.
ARTIGO 1555º
(Direito de preferência na alienação do prédio
encravado)
1.
O proprietário de prédio onerado com a servidão legal de passagem, qualquer que
tenha sido o título constitutivo, tem direito de preferência, no caso de venda,
dação em cumprimento ou aforamento do prédio dominante.
2.
É aplicável a este caso o disposto nos artigos 416º a 418º e 1410º.
3.
Sendo dois ou mais os preferentes, abrir-se-á entre eles licitação, revertendo
o excesso para o alienante.
ARTIGO 1556º
(Servidões de passagem para o aproveitamento de
águas)
1.
Quando para seus gastos domésticos os proprietários não tenham acesso às
fontes, poços e reservatórios públicos destinados a esse uso, bem como às
correntes de domínio público, podem ser constituídas servidões de passagem nos
termos aplicáveis dos artigos anteriores.
2.
Estas servidões só serão constituídas depois de se verificar que os
proprietários que as reclamam não podem haver água suficiente de outra
proveniência, sem excessivo incómodo ou dispêndio.
SECÇÃO II
Servidões legais de águas
ARTIGO 1557º
(Aproveitamento de águas para gastos domésticos)
1.
Quando não seja possível ao proprietário, sem excessivo incómodo ou dispêndio,
obter água para seus gastos domésticos pela forma indicada no artigo anterior,
os proprietários vizinhos podem ser compelidos a permitir, mediante
indemnização, o aproveitamento das águas sobrantes das suas nascentes ou
reservatórios, na medida do indispensável para aqueles gastos.
2.
Estão isentos da servidão os prédios urbanos e os referidos no nº 1 do artigo
1551º.
ARTIGO 1558º
(Aproveitamento de águas para fins agrícolas)
1.
O proprietário que não tiver nem puder obter, sem excessivo incómodo ou
dispêndio, água suficiente para a irrigação do seu prédio, tem a faculdade de
aproveitar as águas dos prédios vizinhos, que estejam sem utilização, pagando o
seu justo valor.
2.
O disposto no número anterior não é aplicável às águas provenientes de
concessão nem faculta a exploração de águas subterrâneas em prédio alheio.
ARTIGO 1559º
(Servidão legal de presa)
Os
proprietários e os donos de estabelecimentos industriais, que tenham direito ao
uso de águas particulares existentes em prédio alheio, podem fazer neste prédio
as obras necessárias ao represamento e derivação da respectiva água, mediante o
pagamento da indemnização correspondente ao prejuízo que causarem.
ARTIGO 1560º
(Servidão legal de presa para o
aproveitamento de águas públicas)
1.
A servidão de presa para o aproveitamento de águas públicas só pode ser imposta
coercivamente nos casos seguintes:
a)
Quando os proprietários, ou os donos de estabelecimentos industriais, sitos na
margem de uma corrente não navegável nem flutuável, só possam aproveitar a água
a que tenham direito fazendo presa, açude ou obra semelhante que vá travar no
prédio fronteiro;
b)
Quando a água tenha sido objecto de concessão.
2.
No caso da alínea a) do número anterior e no de concessão de interesse privado,
não estão sujeitas à servidão as casas de habitação, nem os quintais, jardins
ou terreiros que lhes sejam contíguos; no caso de concessão de utilidade
pública, estes prédios só estão sujeitos ao encargo se no respectivo processo
administrativo se tiver provado a impossibilidade material ou económica de
executar as obras sem a sua utilização.
3.
No caso da alínea b) do nº 1, a servidão considera-se constituída em
consequência da concessão, mas a indemnização, na falta de acordo, é fixada
pelo tribunal.
4.
Se o proprietário do prédio fronteiro sujeito à servidão de travamento quiser
utilizar a obra realizada, pode torná-la comum, provando que tem direito a
aproveitar-se da água e pagando uma parte da despesa proporcional ao benefício
que receber.
ARTIGO 1561º
(Servidão legal de aqueduto)
1.
Em proveito da agricultura ou da indústria, ou para gastos domésticos, a todos
é permitido encanar, subterraneamente ou a descoberto, as águas particulares a
que tenham direito, através de prédios rústicos alheios, não sendo quintais,
jardins ou terreiros contíguos a casas de habitação, mediante indemnização do
prejuízo que da obra resulte para os ditos prédios; as quintas muradas só estão
sujeitas ao encargo quando o aqueduto seja construído subterraneamente.
2.
O proprietário do prédio serviente tem, a todo o tempo, o direito de ser também
indemnizado do prejuízo que venha a resultar da infiltração ou erupção das
águas ou da deterioração das obras feitas para a sua condução.
3.
A natureza, direcção e forma do aqueduto serão as mais convenientes para o
prédio dominante e as menos onerosas para o prédio serviente.
4.
Se a água do aqueduto não for toda necessária ao seu proprietário, e o
proprietário do prédio serviente quiser ter parte no excedente, ser-lhe-á
concedida essa parte a todo o tempo, mediante prévia indemnização, e pagando
ele, além disso, a quota proporcional à despesa feita com a sua condução até ao
ponto donde pretende derivá-la.
ARTIGO 1562º
(Servidão legal de aqueduto para o
aproveitamento de águas públicas)
1.
Para o aproveitamento de águas públicas, a constituição forçada de servidão de
aqueduto só é admitida no caso de haver concessão da água.
2.
É aplicável a esta servidão o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 1560º.
ARTIGO 1563º
(Servidão legal de escoamento)
1.
A constituição forçada da servidão de escoamento é permitida, precedendo
indemnização do prejuízo:
a)
Quando, por obra do homem, e para fins agrícolas ou industriais, nasçam águas
em algum prédio ou para ele sejam conduzidas de outro prédio;
b)
Quando se pretenda dar direcção definida a águas que seguiam o seu curso
natural;
c)
Em relação às águas provenientes de gaivagem, canos falsos, valas,
guarda-matos, alcorcas ou qualquer outro modo de enxugo de prédios;
d)
Quando haja concessão de águas públicas, relativamente às sobejas.
2.
Aos proprietários onerados com a servidão de escoamento é aplicável o disposto
no artigo 1391º.
3.
Na liquidação da indemnização será levado em conta o valor dos benefícios que
para o prédio serviente advenham do uso da água, nos termos do número anterior;
e, no caso da alínea b) do nº 1, será atendido o prejuízo que já resultava do
decurso natural das águas.
4.
Só estão sujeitos à servidão de escoamento os prédios que podem ser onerados
com a servidão legal de aqueduto.
CAPÍTULO IV
Exercício das servidões
ARTIGO 1564º
(Modo de exercício)
As
servidões são reguladas, no que respeita à sua extensão e exercício, pelo
respectivo título; na insuficiência do título, observar-se-á o disposto nos
artigos seguintes.
ARTIGO 1565º
(Extensão da servidão)
1.
O direito de servidão compreende tudo o que é necessário para o seu uso e
conservação.
2.
Em caso de dúvida quanto à extensão ou modo de exercício, entender-se-á
constituída a servidão por forma a satisfazer as necessidades normais e
previsíveis do prédio dominante com o menor prejuízo para o prédio serviente.
ARTIGO 1566º
(Obras no prédio serviente)
1.
É lícito ao proprietário do prédio dominante fazer obras no prédio serviente,
dentro dos poderes que lhe são conferidos no artigo anterior, desde que não
torne mais onerosa a servidão.
2.
As obras devem ser feitas no tempo e pela forma que sejam mais convenientes
para o proprietário do prédio serviente.
ARTIGO 1567º
(Encargos das obras)
1.
As obras são feitas à custa do proprietário do prédio dominante, salvo se outro
regime tiver sido convencionado.
2.
Sendo diversos os prédios dominantes, todos os proprietários são obrigados a
contribuir na proporção da parte que tiverem nas vantagens da servidão, para as
despesas das obras; e só poderão eximir-se do encargo renunciando à servidão em
proveito dos outros.
3.
Se o proprietário do prédio serviente também auferir utilidades da servidão, é
obrigado a contribuir pela forma estabelecida no número anterior.
4.
Se o proprietário do prédio serviente se houver obrigado a custear as obras, só
lhe será possível eximir-se desse encargo pela renúncia ao seu direito de
propriedade em benefício do proprietário do prédio dominante, podendo a
renúncia, no caso de a servidão onerar apenas uma parte do prédio, limitar-se a
essa parte; recusando-se o proprietário do prédio dominante a aceitar a
renúncia, não fica, por isso, dispensado de custear as obras.
ARTIGO 1568º
(Mudança de servidão)
1.
O proprietário do prédio serviente não pode estorvar o uso da servidão, mas
pode, a todo o tempo, exigir a mudança dela para sítio diferente do
primitivamente assinado, ou para outro prédio, se a mudança lhe for conveniente
e não prejudicar os interesses do proprietário do prédio dominante, contanto
que a faça à sua custa; com o consentimento de terceiro pode a servidão ser
mudada para o prédio deste.
2.
A mudança também pode dar-se a requerimento e à custa do proprietário do prédio
dominante, se dela lhe advierem vantagens e com ela não for prejudicado o
proprietário do prédio serviente.
3.
O modo e o tempo de exercício da servidão serão igualmente alterados, a pedido
de qualquer dos proprietários, desde que se verifiquem os requisitos referidos
nos números anteriores.
4.
As faculdades conferidas neste artigo não são renunciáveis nem podem ser
limitadas por negócio jurídico.
CAPÍTULO V
Extinção das servidões
ARTIGO 1569º
(Casos de extinção)
1.
As servidões extinguem-se:
a)
Pela reunião dos dois prédios, dominante e serviente, no domínio da mesma
pessoa;
b)
Pelo não uso durante vinte anos, qualquer que seja o motivo;
c)
Pela aquisição, por usucapião, da liberdade do prédio;
d)
Pela renúncia;
e)
Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente.
2.
As servidões constituídas por usucapião serão judicialmente declaradas
extintas, a requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se
mostrem desnecessárias ao prédio dominante.
3.
O disposto no número anterior é aplicável às servidões legais, qualquer que
tenha sido o título da sua constituição: tendo havido indemnização, será esta
restituída, no todo ou em parte, conforme as circunstâncias.
4.
As servidões referidas nos artigos 1557º e 1558º também podem ser remidas
judicialmente, mostrando o proprietário do prédio serviente que pretende fazer
da água um aproveitamento justificado; no que respeita à restituição da
indemnização, é aplicável o disposto anteriormente, não podendo, todavia, a
remição ser exigida antes de decorridos dez anos sobre a constituição da
servidão.
5.
A renúncia a que se refere a alínea d) do nº 1 não requer aceitação do
proprietário do prédio serviente.
ARTIGO 1570º
(Começo do prazo para a extinção pelo não uso)
1.
O prazo para a extinção das servidões pelo não uso conta-se a partir do momento
em que deixaram de ser usadas; tratando-se de servidões para cujo exercício não
é necessário o facto do homem, o prazo corre desde a verificação de algum facto
que impeça o seu exercício.
2.
Nas servidões exercidas com intervalos de tempo, o prazo corre desde o dia em
que poderiam exercer-se e não foi retomado o seu exercício.
3.
Se o prédio dominante pertencer a vários proprietários, o uso que um deles
fizer da servidão impede a extinção relativamente aos demais.
ARTIGO 1571º
(Impossibilidade de exercício)
A
impossibilidade de exercer a servidão não importa a sua extinção, enquanto não
decorrer o prazo da alínea b) do nº 1 do artigo 1569º.
ARTIGO 1572º
(Exercício parcial)
A
servidão não deixa de considerar-se exercida por inteiro, quando o proprietário
do prédio dominante aproveita apenas uma parte das utilidades que lhe são inerentes.
ARTIGO 1573º
(Exercício em época diversa)
O
exercício da servidão em época diferente da fixada no título não impede a sua
extinção pelo não uso, sem prejuízo da possibilidade de aquisição de uma nova
servidão por usucapião.
ARTIGO 1574º
(«Usucapio libertatis»)
1.
A aquisição, por usucapião, da liberdade do prédio só pode dar-se quando haja,
por parte do proprietário do prédio serviente, oposição ao exercício da
servidão.
2.
O prazo para a usucapião só começa a contar-se desde a oposição.
ARTIGO 1575º
(Servidões constituídas pelo usufrutuário ou
enfiteuta)
As
servidões activas adquiridas pelo usufrutuário não se extinguem pela cessação
do usufruto, como também se não extinguem pela devolução do prazo ao senhorio
as servidões, activas ou passivas, constituídas pelo enfiteuta.
LIVRO IV
DIREITO DA FAMÍLIA
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
ARTIGO 1576º
(Fontes das relações jurídicas familiares)
São
fontes das relações jurídicas familiares o casamento, o parentesco, a afinidade
e a adopção.
ARTIGO 1577º
(Noção de casamento)
Casamento
é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem
constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das
disposições deste Código.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1578º
(Noção de parentesco)
Parentesco
é o vínculo que une duas pessoas, em consequência de uma delas descender da
outra ou de ambas procederem de um progenitor comum.
ARTIGO 1579º
(Elementos do parentesco)
O
parentesco determina-se pelas gerações que vinculam os parentes um ao outro:
cada geração forma um grau, e a série dos graus constitui a linha de
parentesco.
ARTIGO 1580º
(Linhas de parentesco)
1.
A linha diz-se recta, quando um dos parentes descende do outro; diz-se
colateral, quando nenhum dos parentes descende do outro, mas ambos procedem de
um progenitor comum.
2.
A linha recta é descendente ou ascendente: descendente, quando se considera
como partindo do ascendente para o que dele procede; ascendente, quando se
considera como partindo deste para o progenitor.
ARTIGO 1581º
(Cômputo dos graus)
1.
Na linha recta há tantos graus quantas as pessoas que formam a linha de
parentesco, excluindo o progenitor.
2.
Na linha colateral os graus contam-se pela mesma forma, subindo por um dos
ramos e descendo pelo outro, mas sem contar o progenitor comum.
ARTIGO 1582º
(Limites do parentesco)
Salvo
disposição da lei em contrário, os efeitos do parentesco produzem-se em
qualquer grau da linha recta e até ao sexto grau na colateral.
ARTIGO 1583º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1584º
(Noção de afinidade)
Afinidade
é o vínculo que liga cada um dos cônjuges aos parentes do outro.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1585º
(Elementos e cessação da afinidade)
A
afinidade determina-se pelos mesmos graus e linhas que definem o parentesco e
não cessa pela dissolução do casamento.
ARTIGO 1586º
(Noção de adopção)
Adopção
é o vínculo que, à semelhança da filiação natural, mas independentemente dos
laços do sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas nos termos dos
artigos 1973º e seguintes.
TÍTULO II
DO CASAMENTO
CAPÍTULO I
Modalidades do casamento
ARTIGO 1587º
(Casamento católico e civil)
1.
O casamento é católico ou civil.
2.
A lei civil reconhece valor e eficácia de casamento ao matrimónio católico nos
termos das disposições seguintes.
ARTIGO 1588º
(Efeitos do casamento católico)
O
casamento católico rege-se, quantos aos efeitos civis, pelas normas comuns
deste código, salvo disposição em contrário.
ARTIGO 1589º
(Dualidade de casamentos)
1.
O casamento católico contraído por pessoas já ligadas entre si por casamento
civil não dissolvido é averbado ao assento, independentemente do processo
preliminar de publicações.
2.
Não é permitido o casamento civil de duas pessoas unidas por matrimónio
católico anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 35/97, de 31-1)
ARTIGO 1590º
(Casamentos urgentes)
O
casamento urgente que for celebrado sem a presença de ministro da Igreja
Católica ou funcionário do registo civil é havido por católico ou civil segundo
a intenção das partes, manifestada expressamente ou deduzida das formalidades
adoptadas, das crenças dos nubentes ou de quaisquer outros elementos.
CAPÍTULO II
Promessa de casamento
ARTIGO 1591º
(Ineficácia da promessa)
O
contrato pelo qual, a título de esponsais, desposórios ou qualquer outro, duas
pessoas de sexo diferente se comprometem a contrair matrimónio não dá direito a
exigir a celebração do casamento, nem a reclamar, na falta de cumprimento,
outras indemnizações que não sejam as previstas no artigo 1594º, mesmo quando
resultantes de cláusula penal.
ARTIGO 1592º
(Restituições, nos casos de incapacidade e de
retractação)
1.
No caso de o casamento deixar de celebrar-se por incapacidade ou retractação de
algum dos promitentes, cada um deles é obrigado a restituir os donativos que o
outro ou terceiro lhe tenha feito em virtude da promessa e na expectativa do
casamento, segundo os termos prescritos para a nulidade ou anulabilidade do
negócio jurídico.
2.
A obrigação de restituir abrange as cartas e retratos pessoais do outro
contraente, mas não as coisas que hajam sido consumidas antes da retractação ou
da verificação da incapacidade.
ARTIGO 1593º
(Restituições no caso de morte)
1.
Se o casamento não se efectuar em razão da morte de algum dos promitentes, o
promitente sobrevivo pode conservar os donativos do falecido, mas, nesse caso,
perderá o direito de exigir os que, por sua parte, lhe tenha feito.
2.
O mesmo promitente pode reter a correspondência e os retratos pessoais do
falecido e exigir a restituição dos que este haja recebido da sua parte.
ARTIGO 1594º
(Indemnizações)
1.
Se algum dos contraentes romper a promessa sem justo motivo ou, por culpa sua,
der lugar a que outro se retracte, deve indemnizar o esposado inocente, bem
como os pais deste ou terceiros que tenham agido em nome dos pais, quer das
despesas feitas, quer das obrigações contraída na previsão do casamento.
2.
Igual indemnização é devida, quando o casamento não se realize por motivo de
incapacidade de algum dos contraentes, se ele ou os seus representantes
houverem procedido com dolo.
3.
A indemnização é fixada segundo o prudente arbítrio do tribunal, devendo
atender-se, no seu cálculo, não só à medida em que as despesas e obrigações se
mostre razoáveis, perante as circunstâncias do caso e a condição dos
contraentes, mas também às vantagens que, independentemente do casamento, umas
e outras possam ainda proporcionar.
ARTIGO 1595º
(Caducidade das acções)
O
direito de exigir a restituição dos donativos ou a indemnização caduca no prazo
de um ano, contado da data do rompimento da promessa ou da morte do promitente.
CAPÍTULO III
Pressuposto da celebração do
casamento
SECÇÃO I
Casamento católico
ARTIGO 1596º
(Capacidade civil)
O
casamento católico só pode ser celebrado por quem tiver a capacidade
matrimonial exigida na lei civil.
ARTIGO 1597º
(Processo preliminar)
1.
A capacidade matrimonial dos nubentes é comprovada por meio do processo
preliminar de publicações, organizado nas repartições do registo civil a
requerimento dos nubentes ou do pároco respectivo.
2.
O consentimento dos pais ou tutor, relativo ao nubente menor, pode ser prestado
na presença de duas testemunhas perante o pároco, o qual levantará auto de
ocorrência, assinando-o com todos os intervenientes.
ARTIGO 1598º
(Certificado da capacidade matrimonial)
1.
Verificada no despacho final do processo preliminar a inexistência de
impedimento à realização do casamento, o funcionário do registo civil extrairá
dele o certificado da capacidade matrimonial, que é remetido ao pároco e sem o
qual o casamento não pode ser celebrado.
2.
Se, depois de expedido o certificado, o funcionário tiver conhecimento de algum
impedimento, comunicá-lo-á imediatamente ao pároco, a fim de se sobrestar na
celebração até ao julgamento respectivo.
ARTIGO 1599º
(Dispensa do processo preliminar)
1.
O casamento in articulo mortis, na iminência de parto ou cuja celebração
imediata seja expressamente autorizada pelo ordinário próprio por grave motivo
de ordem moral pode celebrar-se independentemente do processo preliminar de
publicações de passagem do certificado da capacidade matrimonial dos nubentes.
2.
A dispensa de processo preliminar não altera as exigências da lei civil quanto
à capacidade matrimonial dos nubentes, continuando estes sujeitos às sanções
estabelecidas na mesma lei.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Casamento Civil
SUBSECÇÃO I
Impedimentos matrimoniais
ARTIGO 1600º
(Regra geral)
Têm
capacidade para contrair casamento todos aqueles em quem se não verifique algum
dos impedimentos matrimoniais previstos na lei.
ARTIGO 1601º
(Impedimentos dirimentes absolutos)
São
impedimentos dirimentes, obstando ao casamento da pessoa a quem respeitam com
qualquer outra:
a)
A idade inferior a dezasseis anos;
b)
A demência notória, mesmo durante os intervalos lúcidos, e a interdição ou
inabilitação por anomalia psíquica;
c)
O casamento anterior não dissolvido, católico ou civil, ainda que o respectivo
assento não tenha sido lavrado no registo do estado civil.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1602º
(Impedimentos dirimentes relativos)
São
também dirimentes, obstando ao casamento entre si das pessoas a quem respeitam,
os impedimentos seguintes:
a)
O parentesco na linha recta;
b)
O parentesco no segundo grau da linha colateral;
c)
A afinidade na linha recta;
d)
A condenação anterior de um dos nubentes, como autor ou cúmplice, por homicídio
doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1603º
(Prova da maternidade ou paternidade)
1.
A prova da maternidade ou paternidade para efeitos do disposto nas alíneas a),
b) e c) do artigo precedente é sempre admitida no processo preliminar de
publicações, mas o reconhecimento do parentesco, quer neste processo, quer na
acção de declaração de nulidade ou anulação do casamento, não produz qualquer
outro efeito, e não vale sequer como começo de prova em acção de investigação de
maternidade ou paternidade.
2.
Fica salvo o recurso aos meios ordinários para o efeito de se fazer declarar a
inexistência do impedimento em acção proposta contra as pessoas que teriam
legitimidade para requerer a declaração de nulidade ou anulação do casamento,
com base no impedimento reconhecido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1604º
(Impedimentos impedientes)
São
impedimentos impedientes, além de outros designados em leis especiais:
a)
A falta de autorização dos pais ou do tutor para o casamento do nubente menor,
quando não suprida pelo conservador do registo civil;
b)
O prazo internupcial;
c)
O parentesco no terceiro grau da linha colateral;
d)
O vínculo de tutela, curatela ou administração legal de bens;
e)
O vínculo de adopção restrita;
f)
A pronúncia do nubente pelo crime de homicídio doloso, ainda que não consumado,
contra o cônjuge do outro, enquanto não houver despronúncia ou absolvição por
decisão passada em julgado.
(Redacção do Dec.-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1605º
(Prazo internupcial)
1.
O impedimento do prazo internupcial obsta ao casamento daquele cujo matrimónio
anterior foi dissolvido, declarado nulo ou anulado, enquanto não decorrerem
sobre a dissolução, declaração de nulidade ou anulação, cento e oitenta ou
trezentos dias, conforme se trate de homem ou mulher.
2.
É, porém, lícito à mulher contrair novas núpcias passados cento e oitenta dias
se obtiver declaração judicial de que não está grávida ou tiver tido algum
filho depois da dissolução, declaração de nulidade ou anulação do casamento
anterior; se os cônjuges estavam separados judicialmente de pessoas e bens e o
casamento se dissolver por morte do marido, pode ainda a mulher celebrar
segundo casamento decorridos cento e oitenta dias sobre a data em que transitou
em julgado a sentença de separação, se obtiver declaração judicial de que não
está grávida ou tiver tido algum filho depois daquela data.
3.
Sendo o casamento católico declarado nulo ou dissolvido por dispensa, o prazo
conta-se a partir do registo da decisão proferida pelas autoridades
eclesiásticas; no caso de divórcio ou anulação do casamento civil, o prazo
conta-se a partir do trânsito em julgado da respectiva sentença.
4.
Cessa o impedimento do prazo internupcial se os prazos referidos nos números
anteriores já tiverem decorrido desde a data, fixada na sentença de divórcio,
em que findou a coabitação dos cônjuges ou, no caso de conversão da separação
judicial de pessoas e bens em divórcio, desde a data em que transitou em
julgado a sentença que decretou a separação.
5.
O impedimento cessa ainda se o casamento se dissolver por morte de um dos
cônjuges, estando estes separados judicialmente de pessoas e bens, quando já
tenham decorrido, desde a data do trânsito em julgado da sentença, os prazos fixados
nos números anteriores.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1606º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1607º
(Vínculo de adopção)
O
impedimento do vínculo de adopção restrita obsta ao casamento:
a)
Do adoptante, ou seus parentes na linha recta, com o adoptado ou seus
descendentes;
b)
Do adoptado com o que foi cônjuge do adoptante;
c)
Do adoptante com o que foi cônjuge do adoptado;
d)
Dos filhos adoptivos da mesma pessoa, entre si.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1608º
(Vínculo de tutela, curatela ou administração legal
de bens)
O
vínculo de tutela, curatela ou administração legal de bens impede o casamento
do incapaz com o tutor, curador ou administrador, ou seus parentes ou afins na
linha recta, irmãos, cunhados ou sobrinhos, enquanto não tiver decorrido um ano
sobre o termo da incapacidade e não estiverem aprovadas as respectivas contas,
se houver lugar a elas.
ARTIGO 1609º
(Dispensa)
1.
São susceptíveis de dispensa os impedimentos seguintes:
a)
O parentesco no terceiro grau da linha colateral;
b)
O vínculo de tutela, curatela ou administração legal de bens, se as respectivas
contas estiverem já aprovadas;
c)
O vínculo de adopção restrita.
2.
A dispensa compete ao conservador do registo civil, que a concederá quando haja
motivos sérios que justifiquem a celebração do casamento.
3.
Se algum dos nubentes for menor, o conservador ouvirá, sempre que possível, os
pais ou o tutor.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
SUBSECÇÃO II
Processo preliminar de publicações
ARTIGO 1610º
(Necessidade e fim do processo de publicações)
A
celebração do casamento é precedida de um processo de publicações, regulado nas
leis do registo civil e destinado à verificação da inexistência de
impedimentos.
ARTIGO 1611º
(Declaração de impedimentos)
1.
Até ao momento da celebração do casamento, qualquer pessoa pode declarar os
impedimentos de que tenha conhecimento.
2.
A declaração é obrigatória para o Ministério Público e para os funcionários do
registo civil logo que tenham conhecimento do impedimento.
3.
Feita a declaração, o casamento só será celebrado se o impedimento cessar, for
dispensado nos termos do artigo 1609º ou for julgado improcedente por decisão
judicial com trânsito em julgado.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1612º
(Autorização dos pais ou do tutor)
1.
A autorização para o casamento de menor de dozoito anos e maior de dezasseis
deve ser concedida pelos progenitores que exerçam o poder paternal, ou pelo
tutor.
2.
Pode o conservador do registo civil suprir a autorização a que se refere o
número anterior se razões ponderosas justificarem a celebração do casamento e o
menor tiver suficiente maturidade física e psíquica.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1613º
(Despacho final)
Findo
o processo preliminar e os processos judiciais a que este der causa, cabe ao
funcionário do registo civil proferir despacho final, no qual autorizará os
nubentes a celebrar o casamento ou mandará arquivar o processo.
ARTIGO 1614º
(Prazo para a celebração do casamento)
Autorizada
a realização do casamento, este deve celebrar-se dentro dos noventa dias
seguintes.
CAPÍTULO IV
Celebração do casamento civil
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1615º
(Publicidade e solenidade)
A
celebração do casamento é pública e está sujeita às solenidades fixadas nas
leis do registo civil.
ARTIGO 1616º
(Pessoas que devem intervir)
É
indispensável para a celebração do casamento a presença:
a)
Dos contraentes, ou de um deles e do procurador do outro;
b)
Do funcionário do registo civil;
c)
De duas testemunhas, sempre que exigida na lei do registo civil.
(Redacção do Dec.-Lei 35/97, de 31-1)
ARTIGO 1617º
(Actualidade do mútuo consenso)
A
vontade dos nubentes só é relevante quando manifestada no próprio acto da
celebração do casamento.
ARTIGO 1618º
(Aceitação dos efeitos do casamento)
1.
A vontade de contrair casamento importa aceitação de todos os efeitos legais do
matrimónio, sem prejuízo das legítimas estipulações dos esposos em convenção
antenupcial.
2.
Consideram-se não escritas as cláusulas pelas quais os nubentes, em convenção
antenupcial, no momento da celebração do casamento ou em outro acto, pretendam
modificar os efeitos do casamento, ou submetê-lo a condição, a termo ou à
preexistência de algum facto.
ARTIGO 1619º
(Carácter pessoal do mútuo consenso)
A
vontade de contrair casamento é estritamente pessoal em relação a cada um dos
nubentes.
ARTIGO 1620º
(Casamento por procuração)
1.
É lícito a um dos nubentes fazer-se representar por procurador na celebração do
casamento.
2.
A procuração deve conter poderes especiais para o acto, a designação expressa
do outro nubente e a indicação da modalidade do casamento.
ARTIGO 1621º
(Revogação e caducidade da procuração)
1.
Cessam todos os efeitos da procuração pela revogação dela, pela morte do
constituinte ou do procurador, ou pela interdição ou inabilitação de qualquer
deles em consequência de anomalia psíquica.
2.
O constituinte pode revogar a todo o tempo a procuração, mas é responsável pelo
prejuízo que causar se, por culpa sua, o não fizer a tempo de evitar a
celebração do casamento.
SECÇÃO II
Casamentos urgentes
ARTIGO 1622º
(Celebração)
1.
Quando haja fundado receio de morte próxima de algum dos nubentes, ou iminência
de parto, é permitida a celebração do casamento independentemente do processo
preliminar de publicações e sem a intervenção do funcionário do registo civil.
2.
Do casamento urgente é lavrado, oficiosamente, um assento provisório.
3.
O funcionário do registo civil é obrigado a lavrar o assento provisório, desde
que lhe seja apresentada, para esse fim, a acta do casamento urgente, nas
condições prescritas nas leis do registo civil.
ARTIGO 1623º
(Homologação do casamento)
1.
Lavrado o assento provisório, o funcionário decidirá se o casamento deve ser
homologado.
2.
Se não tiver já corrido,o processo de publicações é organizado oficiosamente e
a decisão sobre a homologação será proferida no despacho final deste processo.
ARTIGO 1624º
(Causas justificativas da não homologação)
1.
O casamento não pode ser homologado:
a)
Se não se verificarem os requisitos exigidos por lei, ou não tiverem sido
observadas as formalidades prescritas para a celebração do casamento urgente e
para a realização do respectivo registo provisório;
b)
Se houver indícios sérios de serem supostos ou falsos esses requisitos ou
formalidades;
c)
Se existir algum impedimento dirimente;
d)
Se o casamento tiver sido considerado como católico pelas autoridades
eclesiásticas e, como tal, se encontrar transcrito.
2.
Se o casamento não for homologado, o assento provisório será cancelado.
3.
Do despacho que recusar a homologação podem os cônjuges ou seus herdeiros, bem
como o Ministério Público, recorrer para o tribunal, a fim de ser declarada a
validade do casamento.
CAPÍTULO V
Invalidade do casamento
SECÇÃO I
Casamento católico
ARTIGO 1625º
(Competência dos tribunais eclesiásticos)
O
conhecimento das causas respeitantes à nulidade do casamento católico e à
dispensa do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e às
repartições eclesiásticas competentes.
ARTIGO 1626º
(Processo)
1.
As decisões dos tribunais e repartições eclesiásticas, quando definitivas,
sobem ao Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica para verificação, e são
depois, com os decretos desse Tribunal, transmitidas por via diplomática ao
tribunal da Relação territorialmente competente, que as tornará executórias,
independentemente de revisão e confirmação, e mandará que sejam averbadas no
registo civil.
2.
O tribunal eclesiástico pode requisitar aos tribunais judiciais a citação ou
notificação das partes, peritos ou testemunhas, bem como diligências de
carácter probatório ou de outra natureza.
SECÇÃO II
Casamento Civil
SUBSECÇÃO I
Disposição geral
ARTIGO 1627º
(Regra de validade)
É
válido o casamento civil relativamente ao qual não se verifique alguma das
causas de inexistência jurídica, ou de anulabilidade, especificadas na lei.
SUBSECÇÃO II
Inexistência do casamento
ARTIGO 1628º
(Casamentos inexistentes)
É
juridicamente inexistente:
a)
O casamento celebrado perante quem não tinha competência funcional para o acto,
salvo tratando-se de casamento urgente;
b)
O casamento urgente que não tenha sido homologado;
c)
O casamento em cuja celebração tenha faltado a declaração da vontade de um ou
ambos os nubentes, ou do procurador de um deles;
d)
O casamento contraído por intermédio de procurador, quando celebrado depois de
terem cessado os efeitos da procuração, ou quando esta não tenha sido outorgada
por quem nela figura como constituinte, ou quando seja nula por falta de
concessão de poderes especiais para o acto ou de designação expressa do outro
contraente;
e)
O casamento contraído por duas pessoas do mesmo sexo.
ARTIGO 1629º
(Funcionários de facto)
Não
se considera, porém, jurídicamente inexistente o casamento celebrado perante
quem, sem ter competência funcional para o acto, exercia publicamente as
correspondentes funções, salvo se ambos os nubentes, no momento da celebração,
conheciam a falta daquela competência.
ARTIGO 1630º
(Regime da inexistência)
1.
O casamento juridicamente inexistente não produz qualquer efeito jurídico e nem
sequer é havido como putativo.
2.
A inexistência pode ser invocada por qualquer pessoa, a todo o tempo,
independentemente de declaração judicial.
SUBSECÇÃO III
Anulabilidade do casamento
Divisão I
Disposições gerais
ARTIGO 1631º
(Causas de anulabilidade)
É
anulável o casamento:
a)
Contraído com algum impedimento dirimente;
b)
Celebrado, por parte de um ou de ambos os nubentes, com falta de vontade ou com
a vontade viciada por erro ou coacção;
c)
Celebrado sem a presença das testemunhas quando exigida por lei.
(Redacção do Dec.-Lei 35/97, de 31-1)
ARTIGO 1632º
(Necessidade da acção de anulação)
A
anulabilidade do casamento não é invocável para nenhum efeito, judicial
ou.extrajudicial, enquanto não for reconhecida por sentença em acção
especialmente intentada para esse fim.
ARTIGO 1633º
(Validação do casamento)
1.
Considera-se sanada a anulabilidade, e válido o casamento desde o momento da
celebração, se antes de transitar em julgado a sentença de anulação ocorrer
algum dos seguintes factos:
a)
Ser o casamento de menor não núbil confirmado por este, perante o funcionário
do registo civil e de duas testemunhas, depois de atingir a maioridade;
b)
Ser o casamento do interdito ou inabilitado por anomalia psíquica confirmado
por ele, nos termos da alínea precedente, depois de lhe ser levantada a
interdição ou inabilitação ou, tratando-se de demência notória, depois de o
demente fazer verificar judicialmente o seu estado de sanidade mental;
c)
Ser declarado nulo ou anulado o primeiro casamento do bígamo;
d)
Ser a falta de testemunhas devida a circunstâncias atendíveis, como tais
reconhecidas pelo Ministro da Justiça, desde que não haja dúvidas sobre a
celebração do acto.
2.
Não é aplicável ao casamento o disposto no nº 2 do artigo 287º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
DIVISÃO II
Falta ou vícios da vontade
ARTIGO 1634º
(Presunção da vontade)
A
declaração da vontade, no acto da
celebração, constitui presunção não
só de que
os nubentes quiseram contrair o matrimónio, mas de que a sua
vontade não está
viciada por erro ou coacção.
ARTIGO 1635º
(Anulabilidade por falta de vontade)
O
casamento é anulável por falta de vontade:
a)
Quando o nubente, no momento da celebração, não tinha a consciência do acto que
praticava, por incapacidade acidental ou outra causa;
b)
Quando o nubente estava em erro acerca da identidade física do outro contraente;
c)
Quando a declaração da vontade tenha sido extorquida por coacção física;
d)
Quando tenha sido simulado.
ARTIGO 1636º
(Erro que vicia a vontade)
O
erro que vicia a vontade só é relevante para efeitos de anulação quando recaia
sobre qualidades essenciais da pessoa do outro cônjuge, seja desculpável e se
mostre que sem ele, razoavelmente, o casamento não teria sido celebrado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1637º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1638º
(Coacção moral)
1.
É anulável o casamento celebrado sob coacção moral, contanto que seja grave o
mal com que o nubente é ilicitamente ameaçado, e justificado o receio da sua
consumação.
2.
É equiparada à ameaça ilícita o facto de alguém, consciente e ilicitamente,
extorquir ao nubente a declaração da vontade mediante a promessa de o libertar
de um mal fortuito ou causado por outrem.
DIVISÃO III
Legitimidade
ARTIGO 1639º
(Anulação fundada em impedimento dirimente)
1.
Têm legitimidade para intentar a acção de anulação fundada em impedimento
dirimente, ou para prosseguir nela, os cônjuges, ou qualquer parente deles na
linha recta ou até ao quarto grau da linha colateral, bem como os herdeiros e
adoptantes dos cônjuges, e o Ministério Público.
2.
Além das pessoas mencionadas no número precedente, podem ainda intentar a
acção, ou prosseguir nela, o tutor ou curador, no caso de menoridade,
interdição ou inabilitação por anomalia psíquica, e o primeiro cônjuge do
infractor, no caso de bigamia.
ARTIGO 1640º
(Anulação fundada na falta de vontade)
1.
A anulação por simulação pode ser requerida pelos próprios cônjuges ou por
quaisquer pessoas prejudicadas com o casamento.
2.
Nos restantes casos de falta de vontade, a acção de anulação só pode ser
proposta pelo cônjuge cuja vontade faltou; mas podem prosseguir nela os seus
parentes, afins na linha recta, herdeiros ou adoptantes, se o autor falecer na
pendência da causa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1641º
(Anulação fundada em vícios da vontade)
A
acção de anulação fundada em vícios da vontade só pode ser intentada pelo
cônjuge que foi vítima do erro ou da coacção; mas podem prosseguir na acção
osseus parentes, afins na linha recta, herdeiros ou adoptantes, se o autor
falecer na pendência da causa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1642º
(Anulação fundada na falta de testemunhas)
A
acção de anulação por falta de testemunhas só pode ser proposta pelo Ministério
Público.
DIVISÃO IV
Prazos
ARTIGO 1643º
(Anulação fundada em impedimento dirimente)
1.
A acção de anulação fundada em impedimento dirimente deve ser instaurada:
a)
Nos casos de menoridade, interdição ou inabilitação por anomalia psíquica ou
demência notória, quando proposta pelo próprio incapaz, até seis meses depois
de ter atingido a maioridade, de lhe ter sido levantada a interdição ou
inabilitação ou de a demência ter cessado; quando proposta por outra pessoa,
dentro dos três anos seguintes à celebração do casamento, mas nunca depois da
maioridade, do levantamento da incapacidade ou da cessação da demência;
b)
No caso de condenação por homicídio contra o cônjuge de um dos nubentes, no
prazo de três anos a contar da celebração do casamento;
c)
Nos outros casos, até seis meses depois da dissolução do casamento.
2.
O Ministério Público só pode propor a
acção até à dissolução do
casamento.
3.
Sem prejuízo do prazo fixado na alínea c) do nº 1, a acção de anulação fundada
na existência de casamento anterior não dissolvido não pode ser instaurada, nem
prosseguir, enquanto estiver pendente acção de declaração de nulidade ou
anulação do primeiro casamento do bígamo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1644º
(Anulação fundada na falta de vontade)
A
acção de anulação por falta de vontade de um ou ambos os nubentes só pode ser
instaurada dentro dos três anos subsequentes à celebração do casamento ou, se
este era ignorado do requerente, nos seis meses seguintes ao momento em que
dele teve conhecimento.
ARTIGO 1645º
(Anulação fundada em vícios da vontade)
A
acção de anulação fundada em vícios da vontade caduca, se não for instaurada
dentro dos seis meses subsequentes à cessação do vício.
ARTIGO 1646º
(Anulação fundada na falta de testemunhas)
A
acção de anulação por falta de testemunhas só pode ser intentada dentro do ano
posterior à celebração do casamento.
CAPÍTULO VI
Casamento putativo
ARTIGO 1647º
(Efeitos do casamento declarado nulo ou anulado)
1.
O casamento civil anulado, quando contraído de boa fé por ambos os cônjuges,
produz os seus efeitos em relação a estes e a terceiros até ao trânsito em
julgado da respectiva sentença.
2.
Se apenas um dos cônjuges o tiver contraído de boa fé, só esse cônjuge pode
arrogar-se os benefícios do estado matrimonial e opô-los a terceiros, desde
que, relativamente a estes, se trate de mero reflexo das relações havidas entre
os cônjuges.
3.
O casamento católico declarado nulo pelos tribunais e repartições eclesiásticas
produz os seus efeitos, nos termos dos números anteriores, até ao averbamento
da decisão, desde que esteja transcrito no registo civil.
ARTIGO 1648º
(Boa fé)
1.
Considera-se de boa fé o cônjuge que tiver contraído o casamento na ignorância
desculpável do vício causador da nulidade ou anulabilidade, ou cuja declaração
de vontade tenha sido extorquida por coacção física ou moral.
2.
É da exclusiva competência dos tribunais do Estado o conhecimento judicial da
boa fé.
3.
A boa fé dos cônjuges presume-se.
CAPÍTULO VII
Sanções especiais
ARTIGO 1649º
(Casamento de menores)
1.
O menor que casar sem ter obtido a autorização dos pais ou do tutor, ou o
respectivo suprimento judicial, continua a ser considerado menor quanto à
administração de bens que leve para o casal ou que posteriormente lhe advenham
por título gratuito até à maioridade, mas dos rendimentos desses bens
ser-lhe-ão arbitrados os alimentos necessários ao seu estado.
2.
Os bens subtraídos à administração do menor são administrados pelos pais, tutor
ou administrador legal, não podendo em caso algum ser entregues à administração
do outro cônjuge durante a menoridade do seu consorte; além disso, não
respondem, nem antes nem depois da dissolução do casamento, por dívidas
contraídas por um ou ambos os cônjuges no mesmo período.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1650º
(Casamento com impedimento impediente)
1.
Aquele que contrair novo casamento sem respeitar o prazo internupcial perde
todos os bens que tenha recebido por doação ou testamento do seu primeiro
cônjuge.
2.
A infracção do disposto nas alíneas c), d) e e) do artigo 1604º importa,
respectivamente, para o tio ou tia, para o tutor, curador ou administrador ou
seus parentes ou afins na linha recta, irmãos, cunhados ou sobrinhos, e para o
adoptante, seu cônjuge ou parentes na linha recta, a incapacidade para receberem
do seu consorte qualquer benefício por doação ou testamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO VIII
Registo do casamento
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1651º
(Casamentos sujeitos a registo)
1.
É obrigatório o registo:
a)
Dos casamentos celebrados em Portugal por qualquer das formas previstas na lei
portuguesa;
b)
Dos casamentos de português ou portugueses celebrados no estrangeiro;
c)
Dos casamentos dos estrangeiros que, depois de o celebrarem, adquiram a
nacionalidade portuguesa.
2.
São admitidos a registo, a requerimento de quem mostre legítimo interesse no
assento, quaisquer outros casamentos que não contrariem os princípios
fundamentais da ordem pública internacional do Estado português.
ARTIGO 1652º
(Forma do registo)
O
registo do casamento consiste no assento, que é lavrado por inscrição ou
transcrição, na conformidade das leis do registo.
ARTIGO 1653º
(Prova do casamento para efeitos do registo)
1.
Na acção judicial proposta para suprir a omissão ou perda do registo do
casamento presume-se a existência deste, sempre que as pessoas vivam ou tenham
vivido na posse do estado de casado.
2.
Existe posse de estado quando se verifiquem, cumulativamente, as seguintes
condições:
a)
Viverem as pessoas como casadas;
b)
Serem reputadas como tais nas relações sociais, especialmente nas respectivas
famílias.
SECÇÃO II
Registo por transcrição
SUBSECÇÃO I
Disposição geral
ARTIGO 1654º
(Casos de transcrição)
São
lavrados por transcrição:
a)
Os assentos dos casamentos católicos celebrados em Portugal;
b)
Os assentos dos casamentos civis urgentes celebrados em Portugal;
c)
Os assentos dos casamento católicos ou civis celebrados no estrangeiro por
portugueses, ou por estrangeiros que adquiram a nacionalidade portuguesa;
d)
Os assentos mandados lavrar por decisão judicial;
e)
Os assentos dos casamentos admitidos a registo, a requerimento dos
interessados, nos termos do nº 2 do artigo 1651º;
f)
Os assentos dos casamentos que devam passar a constar dos livros de repartição
diversa daquela onde originariamente foram registados.
SUBSECÇÃO II
Transcrição dos casamentos católicos
celebrados em Portugal
ARTIGO 1655º
(Remessa do duplicado ou certidão do assento)
1.
No caso de o casamento católico ser celebrado em Portugal, o pároco é obrigado
a enviar aos serviços do registo civil o duplicado do assento paroquial, a fim
de ser transcrito no livro de casamentos.
2.
Nos casamentos cuja celebração imediata haja sido autorizada pelo ordinário, é
remetida com o duplicado uma cópia da autorização autenticada com a assinatura
do pároco.
ARTIGO 1656º
(Dispensa da remessa de duplicado)
A
obrigação da remessa de duplicado não é aplicável:
a)
Ao casamento de consciência, cujo assento só é transcrito perante certidão de
teor e mediante denúncia feita pelo ordinário, bem como aos casamentos
celebrados nos termos do artigo 1599º deste Código e que não possam ser
transcritos;
b)
Ao casamento em que, logo após a celebração, se verifique a necessidade de
convalidar o acto, mediante a renovação da manifestação de vontade dos cônjuges
na forma canónica, bastando remeter à repartição do registo civil, quando assim
seja, o duplicado do assento paroquial da nova celebração.
(Redacção do Dec.-Lei 261/75, de 27-5)
ARTIGO 1657º
(Recusa da transcrição)
1.
A transcrição do casamento católico deve ser recusada:
a)
Se o funcionário a quem o duplicado é enviado for incompetente;
b)
Se o duplicado ou certidão do assento paroquial não contiver as indicações
exigidas na lei ou as assinaturas devidas;
c)
Se o funcionário tiver fundadas dúvidas acerca da identidade dos contraentes;
d)
Se no momento da celebração for oponível ao casamento algum impedimento
dirimente;
e)
Se, tratando-se de casamento que possa legalmente ser celebrado sem precedência
do processo de publicações, existir no momento da celebração o impedimento de
falta de idade nupcial, o impedimento de interdição ou inabilitação por
anomalia psíquica reconhecida por sentença com trânsito em julgado ou o de
casamento civil anterior não dissolvido, desde que, em qualquer dos casos, o
impedimento ainda subsista.
2.
A morte de um ou ambos os cônjuges não obsta, em caso algum, à transcrição.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1658º
(Transcrição na falta de processo preliminar)
Se
o casamento católico não houver sido precedido do processo de publicações, a
transcrição só se efectua depois de organizado esse processo.
ARTIGO 1659º
(Realização da transcrição)
1.
A transcrição do duplicado ou da certidão do assento é comunicada ao pároco.
2.
Na falta de remessa do duplicado ou da certidão do assento pelo pároco, a
transcrição pode ser feita a todo o tempo, em face do documento necessário, a
requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público.
3.
A falta do assento paroquial é suprível mediante acção judicial.
ARTIGO 1660º
(Efectivação da transcrição, depois de recusada)
A
transcrição recusada com base nos impedimentos dirimentes que a ela podem
obstar deve ser efectuada oficiosamente, ou por iniciativa do Ministério
Público ou de qualquer interessado, logo que cessar o impedimento que deu causa
à recusa.
ARTIGO 1661º
(Sanação e convalidação do casamento)
1.
A sanação in radice do casamento católico nulo, mas transcrito, é averbada à
margem do assento respectivo, mediante comunicação do pároco, feita no
interesse dos cônjuges e com o consentimento do ordinário do lugar da
celebração.
2.
No caso de convalidação simples do casamento nulo, mas transcrito, operada pela
renovação da manifestação de vontade de ambos os cônjuges na forma canónica, o
pároco lavrará novo assento e dele enviará duplicado aos serviços do registo
civil no prazo de cinco dias, a fim de aí ser transcrito nos termos gerais.
3.
Feita a transcrição, é cancelado o primeiro assento do casamento convalidado,
sem prejuízo dos direitos de terceiro.
SUBSECÇÃO III
Transcrição dos casamentos civis
urgentes
ARTIGO 1662º
(Conteúdo do assento)
O
despacho que homologar o casamento civil urgente fixará o conteúdo do assento,
de acordo com o registo provisório, documentos juntos e diligências efectuadas.
ARTIGO 1663º
(Transcrição)
1.
A transcrição é feita com base no despacho de homologação, trasladando-se para
o assento apenas os elementos normais do registo, acrescidos da referência à
natureza especial do casamento transcrito.
2.
A transcrição será cancelada, se o casamento for havido como católico pelas
autoridades eclesiásticas e, como tal, se encontrar transcrito, sem prejuízo
dos direitos de terceiro.
SUBSECÇÃO IV
Transcrição dos casamentos de
portugueses no estrangeiro
ARTIGO 1664º
(Registo consular)
O
casamento entre portugueses, ou entre português e estrangeiro, celebrado fora
do País, é registado no consulado competente, ainda que do facto do casamento
advenha para a nubente portuguesa a perda desta nacionalidade.
ARTIGO 1665º
(Forma do registo)
1.
O registo é lavrado por inscrição, se o casamento for celebrado perante o
agente diplomático ou consular português, e, nos outros casos, por transcrição
do documento comprovativo do casamento, passado de harmonia com a lei do lugar
da celebração e devidamente legalizado.
2.
A transcrição pode ser requerida a todo o tempo por qualquer interessado, e
deve ser promovida pelo agente diplomático ou consular competente logo que
tenha conhecimento da celebração do casamento.
ARTIGO 1666º
(Processo preliminar)
1.
Se o casamento não tiver sido precedido das publicações exigidas na lei, o
cônsul organizará o respectivo processo.
2.
No despacho final, o cônsul relatará as diligências feitas e as informações
recebidas da repartição competente, e decidirá se o casamento pode ou não ser
transcrito.
ARTIGO 1667º
(Recusa da transcrição)
A
transcrição será recusada se, pelo processo de publicações ou por outro modo, o
cônsul verificar que o casamento foi celebrado com algum impedimento que o
torne anulável; sendo o casamento católico, a transcrição só será recusada nos
mesmos termos em que o pode ser a transcrição dos casamentos católicos
celebrados em Portugal.
SUBSECÇÃO V
Transcrição dos casamentos admitidos
a registo
ARTIGO 1668º
(Processo de transcrição)
1.
O registo dos casamentos a que se refere o nº 2 do artigo 1651º é efectuado por
transcrição, com base nos documentos que os comprovem, lavrados de acordo com a
lei do lugar da celebração.
2.
O registo, porém, só pode realizar-se mediante prova de que não há ofensa dos
princípios fundamentais da ordem pública internacional do Estado Português.
SECÇÃO III
Efeitos do registo
ARTIGO 1669º
(Atendibilidade do casamento)
O
casamento cujo registo é obrigatório não pode ser invocado, seja pelos cônjuges
ou seus herdeiros, seja por terceiro, enquanto não for lavrado o respectivo
assento, sem prejuízo das excepções previstas neste código.
ARTIGO 1670º
(Efeito retroactivo do registo)
1.
Efectuado o registo, e ainda que venha a perder-se, os efeitos civis do
casamento retrotraem-se à data da sua celebração.
2.
Ficam, porém, ressalvados os direitos de terceiro que sejam compatíveis com os
direitos e deveres de natureza pessoal dos cônjuges e dos filhos, a não ser
que, tratando-se de casamento católico celebrado em Portugal, a sua transcrição
tenha sido feita dentro dos sete dias subsequentes à celebração.
CAPÍTULO IX
Efeitos do casamento quanto às
pessoas
e aos bens dos cônjuges
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1671º
(Igualdade dos cônjuges)
1.
O casamento baseia-se na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.
2.
A direcção da família pertence a ambos os cônjuges, que devem acordar sobre, a
orientação da vida em comum tendo em conta o bem da família e os interesses de
um e outro.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1672º
(Deveres dos cônjuges)
Os
cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade,
coabitação, cooperação e assistência.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1673º
(Residência da família)
1.
Os cônjuges devem escolher de comum acordo a residência da família, atendendo,
nomeadamente, às exigências da sua vida profissional e aos interesses dos
filhos e procurando salvaguardar a unidade da vida familiar.
2.
Salvo motivos ponderosos em contrário, os cônjuges devem adoptar a residência
da família.
3.
Na falta de acordo sobre a fixação ou alteração da residência da família,
decidirá o tribunal a requerimento de qualquer dos cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1674º
(Dever de cooperação)
O
dever de cooperação importa para os cônjuges a obrigação de socorro e auxílio
mútuos e a de assumirem em conjunto as responsabilidades inerentes à vida da
família que fundaram.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1675º
(Dever de assistência)
1.
O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de
contribuir para os encargos da vida familiar.
2.
O dever de assistência mantém-se durante a separação de facto se esta não for
imputável a qualquer dos cônjuges.
3.
Se a separação de facto for imputável a um dos cônjuges, ou a ambos, o dever de
assistência só incumbe, em princípio, ao único ou principal culpado; o tribunal
pode, todavia, exepcionalmente e por motivos de equidade, impor esse dever ao
cônjuge inocente ou menos culpado, considerando, em particular, a duração do
casamento e a colaboração que o outro cônjuge tenha prestado à economia do
casal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1676º
(Dever de contribuir para os encargos da vida
familiar)
1.
O dever de contribuir para os encargos da vida familiar incumbe a ambos os
cônjuges, de harmonia com as possibilidades de cada um, e pode ser cumprido,
por qualquer deles, pela afectação dos seus recursos àqueles encargos e pelo
trabalho despendido no lar ou na manutenção e educação dos filhos.
2.
Se a contribuição de um dos cônjuges para os encargos da vida familiar exceder
a parte que lhe pertencia nos termos do número anterior, presume-se a renúncia
ao direito de exigir do outro a correspondente compensação.
3.
Não sendo prestada a contribuição devida, qualquer dos cônjuges pode exigir que
lhe seja directamente entregue a parte dos rendimentos ou proventos do outro
que o tribunal fixar.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º
(Direito ao nome)
1.
Cada um dos cônjuges conserva os seus próprios apelidos, mas pode
acrescentar-lhes apelidos do outro até ao máximo de dois.
2.
A faculdade conferida na segunda parte do número anterior não pode ser exercida
por aquele que conserve apelidos do cônjuge de anterior casamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-A
(Viuvez e segundas núpcias)
O
cônjuge que tenha acrescentado ao seu nome apelidos do outro conserva-os em
caso de viuvez e, se o declarar até à celebração do novo casamento, mesmo
depois das segundas núpcias.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-B
(Divórcio e separação judicial de pessoas e bens)
1.
Decretada a separação judicial de pessoas e bens, cada um dos cônjuges conserva
os apelidos do outro que tenha adoptado; no caso de divórcio, pode conservá-los
se o ex-cônjuge der o seu consentimento ou o tribunal o autorizar, tendo em
atenção os motivos invocados.
2.
O consentimento do ex-cônjuge pode ser prestado por documento autêntico ou
autenticado, termo lavrado em juízo ou declaração perante o funcionário do
registo civil.
3.
O pedido de autorização judicial do uso dos apelidos do ex-cônjuge pode ser
deduzido no processo de divórcio ou em processo próprio, mesmo depois de o
divórcio ter sido decretado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-C
(Privação judicial do uso do nome)
1.
Falecido um dos cônjuges ou decretada a separação judicial de pessoas e bens ou
o divórcio, o cônjuge que conserve apelidos do outro pode ser privado pelo
tribunal do direito de os usar quando esse uso lese gravemente os interesses
morais do outro cônjuge ou da sua família.
2.
Têm legitimidade para o pedido de privação do uso do nome, no caso de separação
judicial de pessoas e bens ou divórcio, o outro cônjuge ou ex-cônjuge, e, no
caso de viuvez, os descendentes, ascendentes e irmãos do cônjuge falecido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1677º-D
(Exercício de profissão ou outra actividade)
Cada
um dos cônjuges pode exercer qualquer profissão ou actividade sem o
consentimento do outro.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1678º
(Administração dos bens do casal)
1.
Cada um dos cônjuges tem a administração dos seus bens próprios.
2.
Cada um dos cônjuges tem ainda a administração:
a)
Dos proventos que receba pelo seu trabalho;
b)
Dos seus direitos de autor;
c)
Dos bens comuns por ele levados para o casamento ou adquiridos a título
gratuito depois do casamento, bem como dos sub-rogados em lugar deles;
d)
Dos bens que tenham sido doados ou deixados a ambos os cônjuges com exclusão da
administração do outro cônjuge, salvo se se tratar de bens doados ou deixados
por conta da legítima desse outro cônjuge;
e)
Dos bens móveis, próprios do outro cônjuge ou comuns, por ele exclusivamente
utilizados como instrumento de trabalho;
f)
Dos bens próprios do outro cônjuge, se este se encontrar impossibilitado de
exercer a administração por se achar em lugar remoto ou não sabido ou por
qualquer outro motivo, e desde que não tenha sido conferida procuração bastante
para administração desses bens;
g)
Dos bens próprios do outro cônjuge se este lhe conferir por mandato esse poder.
3.
Fora dos casos previstos no número anterior, cada um dos cônjuges tem
legitimidade para a prática de actos de administração ordinária relativamente
aos bens comuns do casal; os restantes actos de administração só podem ser
praticados com o consentimento de ambos os cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1679º
(Providências administrativas)
O
cônjuge que não tem a administração dos bens não está inibido de tomar
providências a ela respeitantes, se o outro se encontrar, por qualquer causa,
impossibilitado de o fazer, e do retardamento das providências puderem resultar
prejuízos.
ARTIGO 1680º
(Depósitos bancários)
Qualquer
que seja o regime de bens, pode cada um dos cônjuges fazer depósitos bancários
em seu nome exclusivo e movimentá-los livremente.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1681º
(Exercício da administração)
1.
O cônjuge que administrar bens comuns ou próprios do outro cônjuge, ao abrigo
do disposto nas alíneas a) a f) do nº2 do artigo 1678º, não é obrigado a prestar
contas da sua administração, mas responde pelos actos intencionalmente
praticados em prejuízo do casal ou do outro cônjuge.
2.
Quando a administração, por um dos cônjuges, dos bens comuns ou próprios do
outro se fundar em mandato, são aplicáveis as regras deste contrato, mas, salvo
se outra coisa tiver sido estipulada, o cônjuge administrador só tem de prestar
contas e entregar o respectivo saldo, se o houver, relativamente a actos
praticados durante os últimos cinco anos.
3.
Se um dos cônjuges entrar na administração dos bens próprios do outro ou de
bens comuns cuja administração lhe não caiba, sem mandato escrito mas com
conhecimento e sem oposição expressa do outro cônjuge, é aplicável o disposto
no número anterior; havendo oposição, o cônjuge administrador responde como
possuidor de má fé.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1682º
(Alienação ou oneração de móveis)
1.
A alienação ou oneração de móveis comuns cuja administração caiba aos dois
cônjuges carece do consentimento de ambos, salvo se se tratar de acto de
administração ordinária.
2.
Cada um dos cônjuges tem legitimidade para alienar ou onerar, por acto entre
vivos, os móveis próprios ou comuns de que tenha a administração, nos termos do
nº 1 do artigo 1678º e das alíneas a) a f) do nº 2 do mesmo artigo, ressalvado
o disposto nos números seguintes.
3.
Carece do consentimento de ambos os cônjuges a alienação ou oneração:
a)
De móveis utilizados conjuntamente por ambos os cônjuges na vida do lar ou como
instrumento comum de trabalho;
b)
De móveis pertencentes exclusivamente ao cônjuge que os não administra, salvo
tratando-se de acto de administração ordinária.
4.
Quando um dos cônjuges, sem consentimento do outro, alienar ou onerar, por
negócio gratuito, móveis comuns de que tem a administração, será o valor dos
bens alheados ou a diminuição de valor dos onerados levado em conta na sua
meação, salvo tratando-se de doação remuneratória ou de donativo conforme aos
usos sociais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1682º-A
(Alienação ou oneração de imóveis
e de estabelecimento comercial)
1.
Carece do consentimento de ambos os cônjuges, salvo se entre eles vigorar o
regime de separação de bens:
a)
A alienação, oneração, arrendamento ou constituição de outros direitos pessoais
de gozo sobre imóveis próprios ou comuns;
b)
A alienação, oneração ou locação de estabelecimento comercial, próprio ou
comum.
2.
A alienação, oneração, arrendamento ou constituição de outros direitos pessoais
de gozo sobre a casa de morada da família carece sempre do consentimento de
ambos os cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1682º-B
(Disposição do direito ao arrendamento)
Relativamente
à casa de morada de família, carecem do consentimento de ambos os
cônjuges:
a)
A resolução, a oposição à
renovação ou a denúncia do contrato de
arrendamento
pelo
b)
A revogação do arrendamento por mútuo consentimento;
c)
A cessão da posição de arrendatário;
d)
O subarrendamento ou o empréstimo, total ou parcial.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1683º
(Aceitação de doações e sucessões.
Repúdio da herança ou do legado)
1.
Os cônjuges não necessitam do consentimento um do outro para aceitar doações,
heranças ou legados.
2.
O repúdio da herança ou legado só pode ser feito com o consentimento de ambos
os cônjuges, a menos que vigore o regime da separação de bens.
ARTIGO 1684º
(Forma do consentimento conjugal e seu suprimento)
1.
O consentimento conjugal, nos casos em que é legalmente exigido, deve ser
especial para cada um dos actos.
2.
A forma do consentimento é a exigida para a procuração.
3.
O consentimento pode ser judicialmente suprido, havendo injusta recusa, ou
impossibilidade, por qualquer causa, de o prestar.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1685º
(Disposições para depois da morte)
1.
Cada um dos cônjuges tem a faculdade de dispor, para depois da morte, dos bens
próprios e da sua meação nos bens comuns, sem prejuízo das restrições impostas
por lei em favor dos herdeiros legitimários.
2.
A disposição que tenha por objecto coisa certa e determinada do património
comum apenas dá ao contemplado o direito de exigir o respectivo valor em
dinheiro.
3.
Pode, porém, ser exigida a coisa em espécie:
a)
Se esta, por qualquer título, se tiver tornado propriedade exclusiva do
disponente à data da sua morte;
b)
Se a disposição tiver sido previamente autorizada pelo outro cônjuge por forma
autêntica ou no próprio testamento;
c)
Se a disposição tiver sido feita por um dos cônjuges em benefício do outro.
ARTIGO 1686º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1687º
(Sanções)
1.
Os actos praticados contra o disposto nos nº 1 e 3 do artigo 1682º, nos artigos
1682º-A e 1682º-B e no nº 2 do artigo 1683º são anuláveis a requerimento do
cônjuge que não deu o consentimento ou dos seus herdeiros, ressalvado o
disposto nos nºs 3 e 4 deste artigo.
2.
O direito de anulação pode ser exercido nos seis meses subsequentes à data em
que o requerente teve conhecimento do acto, mas nunca depois de decorridos três
anos sobre a sua celebração.
3.
Em caso de alienação ou oneração de móvel não sujeito a registo feita apenas
por um dos cônjuges, quando é exigido o consentimento de ambos, a anulabilidade
não poderá ser oposta ao adquirente de boa fé.
4.
À alienação ou oneração de bens próprios do outro cônjuge, feita sem
legitimidade, são aplicáveis as regras relativas à alienação de coisa alheia.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1688º
(Cessação de relações pessoais e patrimoniais entre
os cônjuges)
As
relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges cessam pela dissolução,
declaração de nulidade ou anulação do casamento, sem prejuízo das disposições
deste Código relativas a alimentos; havendo separação judicial de pessoas e
bens, é aplicável o disposto no artigo 1795º-A.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1689º
(Partilha do casal. Pagamento de dívidas)
1.
Cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, estes ou os seus herdeiros
recebem os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conferindo
cada um deles o que dever a este património.
2.
Havendo passivo a liquidar, são pagas em primeiro lugar as dívidas comunicáveis
até ao valor do património comum, e só depois as restantes.
3.
Os créditos de cada um dos cônjuges sobre o outro são pagos pela meação do
cônjuge devedor no património comum; mas, não existindo bens comuns, ou sendo
estes insuficientes, respondem os bens próprios do cônjuge devedor.
SECÇÃO II
Dívidas dos cônjuges
ARTIGO 1690º
(Legitimidade para contrair dívidas)
1.
Tanto o marido como a mulher têm legitimidade para contraír dívidas sem o
consentimento do outro cônjuge.
2.
Para a determinação da responsabilidade dos cônjuges, as dívidas por eles
contraídas têm a data do facto que lhes deu origem.
ARTIGO 1691º
(Dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges)
1.
São da responsabilidade de ambos os cônjuges:
a)
As dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do casamento, pelos dois
cônjuges, ou por um deles com o consentimento do outro;
b)
As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges, antes ou depois da celebração
do casamento, para ocorrer aos encargos normais da vida familiar;
c)
As dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador,
em proveito comum do casal e nos limites dos seus poderes de administração;
d)
As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo
se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal, ou se vigorar
entre os cônjuges o regime de separação de bens;
e)
As dívidas consideradas comunicáveis nos termos do nº 2 do artigo 1693º;
2.
No regime da comunhão geral de bens, são ainda comunicáveis as dívidas
contraídas antes do casamento por qualquer dos cônjuges, em proveito comum do
casal.
3.
O proveito comum do casal não se presume, excepto nos casos em que a lei o
declarar.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1692º
(Dívidas da responsabilidade de um dos cônjuges)
São
de exclusiva responsabilidade do cônjuge a que respeitam:
a)
As dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do casamento, por cada um
dos cônjuges sem o consentimento do outro, fora dos casos indicados nas alíneas
b) e c) do nº 1 do artigo anterior;
b)
As dívidas provenientes de crimes e as indemnizações, restituições, custas judiciais
ou multas devidas por factos imputáveis a cada um dos cônjuges, salvo se esses
factos, implicando responsabilidade meramente civil, estiverem abrangidos pelo
disposto nos nº 1 ou 2 do artigo anterior:
c)
As dívidas cuja incomunicabilidade resulta do disposto no nº 2 do artigo 1694º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1693º
(Dívidas que oneram doações, heranças ou legados)
1.
As dívidas que onerem doações, heranças ou legados são da exclusiva
responsabilidade do cônjuge aceitante, ainda que a aceitação tenha sido
efectuada com o consentimento do outro.
2.
Porém, se por força do regime de bens adoptado, os bens doados, herdados ou
legados ingressarem no património comum, a responsabilidade pelas dívidas é
comum, sem prejuízo do direito que tem o cônjuge do aceitante de impugnar o seu
cumprimento com o fundamento de que o valor dos bens não é suficiente para a
satisfação dos encargos.
ARTIGO 1694º
(Dívidas que oneram bens certos e determinados)
1.
As dívidas que onerem bens comuns são sempre da responsabilidade comum dos
cônjuges, quer se tenham vencido antes, quer depois da comunicação dos bens.
2.
As dívidas que onerem bens próprios de um dos cônjuges são da sua exclusiva
responsabilidade, salvo se tiverem como causa a percepção dos respectivos
rendimentos e estes, por força do regime aplicável, forem considerados comuns.
ARTIGO 1695º
(Bens que respondem pelas dívidas
da responsabilidade de ambos os cônjuges)
1.
Pelas dívidas que são da responsabilidade de ambos os cônjuges respondem os
bens comuns do casal, e, na falta ou insuficiência deles, solidariamente, os
bens próprios de qualquer dos cônjuges.
2.
No regime da separação de bens, a responsabilidade dos cônjuges não é
solidária.
ARTIGO 1696º
(Bens que respondem pelas dívidas
da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges)
1.
Pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os
bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens
comuns.
2.
Respondem, todavia, ao mesmo tempo que os bens próprios do cônjuge devedor:
a)
Os bens por ele levados para o casal ou posteriormente adquiridos a título
gratuito, bem como os respectivos rendimentos;
b)
O produto do trabalho e os direitos de autor do cônjuge devedor;
c)
Os bens sub-rogados no lugar dos referidos na alínea a).
3.
Não há lugar à moratória estabelecida no nº 1, se a incomunicabilidade da
dívida cujo cumprimento se pretende exigir resulta do disposto na alínea b) do
artigo 1692º.
(Redacção do Dec.-Lei 329-A/95, de 12-12)
ARTIGO 1697º
(Compensações devidas pelo pagamento de dívidas do
casal)
1.
Quando por dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges tenham respondido
bens de um só deles, este torna-se credor do outro pelo que haja satisfeito
além do que lhe competia satisfazer; mas este crédito só é exigível no momento
da partilha dos bens do casal, a não ser que vigore o regime da separação.
2.
Sempre que por dívidas da exclusiva responsabilidade de um só dos cônjuges
tenham respondido bens comuns, é a respectiva importância levada a crédito do
património comum no momento da partilha.
SECÇÃO III
Convenções antenupciais
ARTIGO 1698º
(Liberdade de convenção)
Os
esposos podem fixar livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do
casamento, quer escolhendo um dos regimes previstos neste código, quer
estipulando o que a esse respeito lhes aprouver, dentro dos limites da lei.
ARTIGO 1699º
(Restrições ao princípio da liberdade)
1.
Não podem ser objecto de convenção antenupcial:
a)
A regulamentação da sucessão hereditária dos cônjuges ou de terceiro, salvo o
disposto nos artigos seguintes;
b)
A alteração dos direitos ou deveres, quer paternais, quer conjugais;
c)
A alteração das regras sobre administração dos bens do casal;
d)
A estipulação da comunicabilidade dos bens enumerados no artigo 1733º.
2.
Se o casamento for celebrado por quem tenha filhos, ainda que maiores ou
emancipados, não poderá ser convencionado o regime da comunhão geral nem
estipulada a comunicabilidade dos bens referidos no nº 1 do artigo 1722º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1700º
(Disposições por morte consideradas lícitas)
1.
A convenção antenupcial pode conter:
a)
A instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário em favor de qualquer dos
esposados, feita pelo outro esposado ou por terceiro nos termos prescritos nos
lugares respectivos;
b)
A instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário em favor de terceiro,
feita por qualquer dos esposados.
2.
São também admitidas na convenção antenupcial cláusulas de reversão ou
fideicomissárias relativas às liberalidades aí efectuadas, sem prejuízo das
limitações a que genericamente estão sujeitas essas cláusulas.
ARTIGO 1701º
(Irrevogabilidade dos pactos sucessórios)
1.
A instituição contratual de herdeiro e a nomeação de legatário, feitas na
convenção antenupcial em favor de qualquer dos esposados, quer pelo outro
esposado, quer por terceiro, não podem ser unilateralmente revogadas depois da
aceitação, nem é lícito ao doador prejudicar o donatário por actos gratuitos de
disposição; mas podem essas liberalidades, quando feitas por terceiro, ser
revogadas a todo o tempo por mútuo acordo dos contraentes.
2.
Precedendo, em qualquer dos casos, autorização do donatário, prestada por
escrito, ou o respectivo suprimento judicial, pode o doador alienar os bens
doados com fundamento em grave necessidade, própria ou dos membros da família a
seu cargo.
3.
Sempre que a doação seja afectada nos termos do número anterior, o donatário
concorrerá à sucessão do doador como legatário do valor que os bens doados
teriam ao tempo da morte deste, devendo ser pago com preferência a todos os
demais legatários do doador.
ARTIGO 1702º
(Regime da instituição contratual)
1.
Quando a instituição contratual em favor de qualquer dos esposados tiver por
objecto uma quota de herança, o cálculo dessa quota será feito conferindo-se os
bens de que o doador haja disposto gratuitamente depois da doação.
2.
Se a instituição tiver por objecto a totalidade da herança, pode o doador
dispor gratuitamente, em vida ou por morte, de uma terça parte dela, calculada
nos termos do número anterior.
3.
É lícito ao doador, no acto da doação, renunciar no todo ou em parte ao direito
de dispor da terça parte da herança.
ARTIGO 1703º
(Caducidade dos pactos sucessórios)
1.
A instituição e o legado contratuais em favor de qualquer dos esposados caducam
não só nos casos previstos no artigo 1760º, mas ainda no caso de o donatário
falecer antes do doador.
2.
Se, porém, a doação por morte for feita por terceiro, não caduca pelo
predecesso do donatário, quando ao doador sobrevivam descendentes legítimos
daquele, nascidos do casamento, os quais serão chamados a suceder nos bens
doados, em lugar do donatário.
ARTIGO 1704º
(Disposições de esposados a favor de terceiros,
com carácter testamentário)
A
instituição de herdeiro e a nomeação de legatário feitas por algum dos
esposados na convenção antenupcial em favor de pessoas indeterminadas, ou em
favor de pessoa certa e determinada que não intervenha no acto como aceitante,
têm valor meramente testamentário, e não produzem qualquer efeito se a
convenção caducar.
ARTIGO 1705º
(Disposições por morte a favor de terceiro,
com carácter contratual)
1.
À instituição de herdeiro e à nomeação de legatário feitas por qualquer dos
esposados em favor de pessoa certa e determinada que intervenha como aceitante
na convenção antenupcial é aplicável o disposto nos artigos 1701º e 1702º, sem
prejuízo da sua ineficácia se a convenção caducar.
2.
Pode, todavia, a instituição ou nomeação ser livremente revogada, se o
disponente a tiver feito com reserva dessa faculdade.
3.
A irrevogabilidade da disposição não a isenta do regime geral de revogação das
doações por ingratidão do donatário nem da redução por inoficiosidade.
4.
As liberalidades a que este artigo se refere caducam, se o donatário falecer
antes do doador.
ARTIGO 1706º
(Correspectividade das disposições
por morte a favor de terceiros)
1.
Se ambos os esposados instituírem terceiros seus herdeiros, ou fizerem legados
em seu benefício, e ficar consignado na convenção antenupcial o carácter
correspectivo das duas disposições, a invalidade ou revogação de uma das
disposições produz a ineficácia da outra.
2.
Desde que uma das disposições comece a produzir os seus efeitos, a outra já não
pode ser revogada ou alterada, excepto se o beneficiário da primeira renúnciar
a ela, restituindo quanto por força dela haja recebido.
ARTIGO 1707º
(Revogabilidade das cláusulas de reversão ou
fideicomissárias)
As
cláusulas de reversão ou fideicomissárias previstas no nº 2 do artigo 1700º são
revogáveis livremente e a todo tempo pelo autor da liberalidade.
ARTIGO 1708º
(Capacidade para celebrar convenções antenupciais)
1.
Têm capacidade para celebrar convenções antenupciais aqueles que têm capacidade
para contrair casamento.
2.
Aos menores, bem como aos interditos ou inabilitados, só é permitido celebrar
convenções antenupciais com autorização dos respectivos representantes legais.
ARTIGO 1709º
(Anulabilidade por falta de autorização)
A
anulabilidade da convenção antenupcial por falta de autorização só pode ser
invocada pelo incapaz, pelos seus herdeiros, ou por aqueles a quem competir
concedê-la, dentro do prazo de um ano a contar da celebração do casamento,
considerando-se a anulabilidade sanada se o casamento vier a ser celebrado
depois de findar a incapacidade.
ARTIGO 1710º
(Forma das convenções antenupciais)
As
convenções antenupciais só são válidas se forem celebradas por escritura
pública ou por auto lavrado perante o conservador do registo civil.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1711º
(Publicidade das convenções antenupciais)
1.
As convenções antenupciais só produzem efeitos em relação a terceiros depois de
registadas.
2.
Os herdeiros dos cônjuges e dos demais outorgantes da escritura não são
considerados terceiros.
3.
O registo da convenção não dispensa o registo predial relativo aos factos a ele
sujeitos.
ARTIGO 1712º
(Revogação ou modificação da convenção antenupcial
antes da celebração do casamento)
1.
A convenção antenupcial é livremente
revogável ou modificável até à
celebração
do casamento, desde que na revogação ou
modificação consintam todas as pessoas
que nela outorgaram ou os respectivos herdeiros.
2.
O novo acordo está sujeito aos requisitos de forma e publicidade estabelecidos
nos artigos antecedentes.
3.
A falta de intervenção de alguma das pessoas que outorgaram na primeira
convenção, ou dos respectivos herdeiros, apenas tem como efeito facultar
àquelas ou a estes o direito de resolver as cláusulas que lhes digam respeito.
ARTIGO 1713º
(Convenções sob condição ou a termo)
1.
É válida a convenção sob condição ou a termo.
2.
Em relação a terceiros, o preenchimento da condição não tem efeito retroactivo.
ARTIGO 1714º
(Imutabilidade das convenções antenupciais
e do regime de bens resultantes da lei)
1.
Fora dos casos previstos na lei, não é permitido alterar, depois da celebração
do casamento, nem as convenções antenupciais nem os regimes de bens legalmente
fixados.
2.
Consideram-se abrangidos pelas proibições do número anterior os contratos de
compra e venda e sociedade entre os cônjuges, excepto quando estes se encontrem
separados judicialmente de pessoas e bens.
3.
É lícita, contudo, a participação dos dois cônjuges na mesma sociedade de
capitais, bem como a dação em cumprimento feita pelo cônjuge devedor ao seu
consorte.
ARTIGO 1715º
(Excepções ao princípio da imutabilidade)
1.
São admitidas alterações ao regime de bens:
a)
Pela revogação das disposições mencionadas no artigo 1700º, nos casos e sob a
forma em que é permitida pelos artigos 1701º a 1707º;
b)
Pela simples separação judicial de bens;
c)
Pela separação judicial de pessoas e bens;
d)
Em todos os demais casos, previstos na lei, de separação de bens na vigência da
sociedade conjugal.
2.
Às alterações da convenção antenupcial ou do regime legal de bens previstas no
número anterior é aplicável o disposto no artigo 1711º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1716º
(Caducidade das convenções antenupciais)
A
convenção caduca, se o casamento não for celebrado dentro de um ano, ou se,
tendo-o sido, vier a ser declarado nulo ou anulado, salvo o disposto em matéria
de casamento putativo.
SECÇÃO IV
Regimes de bens
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1717º
(Regime de bens supletivo)
Na
falta de convenção antenupcial, ou no caso de caducidade, invalidade ou
ineficácia da convenção, o casamento considera-se celebrado sob o regime da
comunhão de adquiridos.
ARTIGO 1718º
(Remissão genérica para uma lei estrangeira
ou revogada, ou para usos e costumes locais)
O
regime de bens do casamento não pode ser fixado, no todo ou em parte, por
simples remissão genérica para uma lei estrangeira, para um preceito revogado,
ou para usos e costumes locais.
ARTIGO 1719º
(Partilha segundo regimes não convencionados)
1.
É permitido aos esposados convencionar, para o caso de dissolução do casamento
por morte de um dos cônjuges, quando haja descendentes comuns, que a partilha
dos bens se faça segundo o regime da comunhão geral, seja qual for o regime
adoptado.
2.
O disposto no número anterior não prejudica os direitos de terceiro na
liquidação do passivo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1720º
(Regime imperativo da separação de bens)
1.
Consideram-se sempre contraídos sob o regime da separação de bens:
a)
O casamento celebrado sem precedência do processo de publicações;
b)
O casamento celebrado por quem tenha completado sessenta anos de idade.
2.
O disposto no número anterior não obsta a que os nubentes façam entre si
doações.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Regime da comunhão de adquiridos
ARTIGO 1721º
(Normas aplicáveis)
Se
o regime de bens adoptado pelos esposados, ou aplicado supletivamente, for o da
comunhão de adquiridos, observar-se-á o disposto nos artigos seguintes.
ARTIGO 1722º
(Bens próprios)
1.
São considerados próprios dos cônjuges:
a)
Os bens que cada um deles tiver ao tempo da celebração do casamento;
b)
Os bens que lhes advierem depois do casamento por sucessão ou doação;
c)
Os bens adquiridos na constância do matrimónio por virtude de direito próprio
anterior.
2.
Consideram-se, entre outros, adquiridos por virtude de direito próprio
anterior, sem prejuízo da compensação eventualmente devida ao património comum:
a)
Os bens adquiridos em consequência de direitos anteriores ao casamento sobre
patrimónios ilíquidos partilhados depois dele;
b)
Os bens adquiridos por usucapião fundada em posse que tenha o seu início antes
do casamento;
c)
Os bens comprados antes do casamento com reserva de propriedade;
d)
Os bens adquiridos no exercício de direito de preferência fundado em situação
já existente à data do casamento.
ARTIGO 1723º
(Bens sub-rogados no lugar de bens próprios)
Conservam
a qualidade de bens próprios:
a)
Os bens sub-rogados no lugar de bens próprios de um dos cônjuges, por meio de
troca directa;
b)
O preço dos bens próprios alienados;
c)
Os bens adquiridos ou as benfeitorias feitas com dinheiro ou valores próprios
de um dos cônjuges, desde que a proveniência do dinheiro ou valores seja
devidamente mencionada no documento de aquisição, ou em documento equivalente,
com intervenção de ambos os cônjuges.
ARTIGO 1724º
(Bens integrados na comunhão)
Fazem
parte da comunhão:
a)
O produto do trabalho dos cônjuges;
b)
Os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam
exceptuados por lei.
ARTIGO 1725º
(Presunção de comunicabilidade)
Quando
haja dúvidas sobre a comunicabilidade dos bens móveis, estes consideram-se comuns.
ARTIGO 1726º
(Bens adquiridos em parte com dinheiro
ou bens próprios e noutra parte com dinheiro ou bens
comuns)
1.
Os bens adquiridos em parte com dinheiro ou bens próprios de um dos cônjuges e
noutra parte com dinheiro ou bens comuns revestem a natureza da mais valiosa
das duas prestações.
2.
Fica, porém, sempre salva a compensação devida pelo património comum aos
patrimónios próprios dos cônjuges, ou por estes àquele, no momento da
dissolução e partilha da comunhão.
ARTIGO 1727º
(Aquisição de bens indivisos já pertencentes
em parte a um dos cônjuges)
A
parte adquirida em bens indivisos pelo cônjuge que deles for comproprietário
fora da comunhão reverte igualmente para o seu património próprio, sem prejuízo
da compensação devida ao património comum pelas somas prestadas para a
respectiva aquisição.
ARTIGO 1728º
(Bens adquiridos por virtude da titularidade de bens
próprios)
1.
Consideram-se próprios os bens adquiridos por virtude da titularidade de bens
próprios, que não possam considerar-se como frutos destes, sem prejuízo da
compensação eventualmente devida ao património comum.
2.
São designadamente considerados bens próprios, por força do disposto no número
antecedente:
a)
As acessões;
b)
Os materiais resultantes da demolição ou destruição de bens;
c)
A parte do tesouro adquirida pelo cônjuge na qualidade de proprietário;
d)
Os prémios de amortização de títulos de crédito ou de outros valores
mobiliários próprios de um dos cônjuges, bem como os títulos ou valores
adquiridos por virtude de um direito de subscrição àqueles inerente.
ARTIGO 1729º
(Bens doados ou deixados em favor da comunhão)
1.
Os bens havidos por um dos cônjuges por meio de doação ou deixa testamentária
de terceiro entram na comunhão, se o doador ou testador assim o tiver
determinado; entende-se que essa é a vontade do doador ou testador, quando a
liberalidade for feita em favor dos dois cônjuges conjuntamente.
2.
O disposto no número anterior não abrange as doações e deixas testamentárias
que integrem a legítima do donatário.
ARTIGO 1730º
(Participação dos cônjuges no património comum)
1.
Os cônjuges participam por metade no activo e no passivo da comunhão, sendo
nula qualquer estipulação em sentido diverso.
2.
A regra da metade não impede que cada um dos cônjuges faça em favor de terceiro
doações ou deixas por conta da sua meação nos bens comuns, nos termos
permitidos por lei.
ARTIGO 1731º
(Instrumentos de trabalho)
Se
os instrumentos de trabalho de cada um dos cônjuges tiverem entrado no
património comum por força do regime de bens, o cônjuge que deles necessite
para o exercício da sua profissão tem direito a ser neles encabeçado no momento
da partilha.
SUBSECÇÃO III
Regime da comunhão geral
ARTIGO 1732º
(Estipulação do regime)
Se
o regime de bens adoptado pelos cônjuges for o da comunhão geral, o património
comum é constituido por todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, que não
sejam exceptuados por lei.
ARTIGO 1733º
(Bens incomunicáveis)
1.
São exceptuados da comunhão:
a)
Os bens doados ou deixados, ainda que por conta da legítima, com a cláusula de
incomunicabilidade;
b)
Os bens doados ou deixados com a cláusula de reversão ou fideicomissária, a não
ser que a cláusula tenha caducado;
c)
o usufruto, o uso ou habitação, e demais direitos estritamente pessoais;
d)
As indemnizações devidas por factos verificados contra a pessoa de cada um dos
cônjuges ou contra os seus bens próprios;
e)
Os seguros vencidos em favor da pessoa de cada um dos cônjuges ou para
cobertura de riscos sofridos por bens próprios;
f)
Os vestidos, roupas e outros objectos de uso pessoal e exclusivo de cada um dos
cônjuges, bem como os seus diplomas e a sua correspondência;
g)
As recordações de família de diminuto valor económico.
2.
A incomunicabilidade dos bens não abrange os respectivos frutos nem o valor das
benfeitorias úteis.
ARTIGO 1734º
(Disposições aplicáveis)
São
aplicáveis à comunhão geral de bens, com as necessárias adaptações, as
disposições relativas à comunhão de adquiridos.
SUBSECÇÃO IV
Regime da separação
ARTIGO 1735º
(Domínio da separação)
Se
o regime de bens imposto por lei ou adoptado pelos esposados for o da
separação, cada um deles conserva o domínio e fruição de todos os seus bens
presentes e futuros, podendo dispor deles livremente.
ARTIGO 1736º
(Prova da propriedade dos bens)
1.
É lícito aos esposados estipular, na convenção antenupcial, cláusulas de
presunção sobre a propriedade dos móveis, com eficácia extensiva a terceiros,
mas sem prejuízo de prova em contrário.
2.
Quando haja dúvidas sobre a propriedade exclusiva de um dos cônjuges, os bens
móveis ter-se-ão como pertencentes em compropriedade a ambos os cônjuges.
ARTIGO
1737º
(Revogado
pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO V
Regime dotal
ARTIGOS 1738º A 1752º
(Revogados pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO X
Doações para casamento e entre
casados
SECÇÃO I
Doações para casamento
ARTIGO 1753º
(Noção e normas aplicáveis)
1.
Doação para casamento é a doação feita a um dos esposados, ou a ambos, em vista
do seu casamento.
2.
Às doações para casamento são
aplicáveis as disposições da presente
secção e,
subsidiariamente, as dos artigos 940º a 979º.
ARTIGO 1754º
(Espécies)
As
doações para casamento podem ser feitas por um dos esposados ao outro, pelos
dois reciprocamente, ou por terceiro a um ou a ambos os esposados.
ARTIGO 1755º
(Regime)
1.
As doações entre vivos produzem os seus efeitos a partir da celebração do
casamento, salvo estipulação em contrário.
2.
As doações que hajam de produzir os seus efeitos por morte do doador são
havidas como pactos sucessórios e, como tais, estão sujeitas ao disposto nos
artigos 1701º a 1703º, sem prejuízo do preceituado nos artigos seguintes.
ARTIGO 1756º
(Forma)
1.
As doações para casamento só podem ser feitas na convenção antenupcial.
2.
A inobservância do disposto no número anterior importa, quanto às doações por
morte, a sua nulidade, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 946º, e,
quanto às doações em vida, a inaplicabilidade do regime especial desta secção.
ARTIGO 1757º
(Incomunicabilidade dos bens doados pelos esposados)
Salvo
estipulação em contrário, os bens doados por um esposado ao outro consideram-se
próprios do donatário, seja qual for o regime matrimonial.
ARTIGO 1758º
(Revogação)
As
doações entre esposados não são revogáveis por mútuo consentimento dos
contraentes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1759º
(Redução por inoficiosidade)
As
doações para casamento estão sujeitas a redução por inoficiosidade, nos termos
gerais.
ARTIGO 1760º
(Caducidade)
1.
As doações para casamento caducam:
a)
Se o casamento não for celebrado dentro de um ano, ou se, tendo-o sido, vier a
ser declarado nulo ou anulado, salvo o disposto em matéria de casamento
putativo;
b)
Se ocorrer divórcio ou separação judicial de pessoas e bens por culpa do
donatário, se este for considerado único ou principal culpado.
2.
Se a doação tiver sido feita por terceiro a ambos os esposados ou os bens
doados tiverem entrado na comunhão, e um dos cônjuges for declarado único ou
principal culpado no divórcio ou separação, a caducidade atinge apenas a parte
dele.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Doações entre casados
ARTIGO 1761º
(Disposições aplicáveis)
As
doações entre casados regem-se pelas disposições desta secção e,
subsidiariamente, pelas regras dos artigos 940º a 979º.
ARTIGO 1762º
(Regime imperativo da separação de bens)
É
nula a doação entre casados, se vigorar imperativamente entre os cônjuges o
regime da separação de bens.
ARTIGO 1763º
(Forma)
1.
A doação de coisas móveis, ainda que acompanhada da tradição da coisa, deve
constar de documento escrito.
2.
Os cônjuges não podem fazer doações recíprocas no mesmo acto.
3.
O disposto no número anterior não é aplicável às reservas de usufruto nem às
rendas vitalícias a favor do sobrevivente, estipuladas, umas e outras, em
doação dos cônjuges a terceiro.
ARTIGO 1764º
(Objecto e incomunicabilidade dos bens doados)
1.
Só podem ser doados bens próprios do doador.
2.
Os bens doados não se comunicam, seja qual for o regime matrimonial.
ARTIGO 1765º
(Livre revogabilidade)
1.
As doações entre casados podem a todo o tempo ser revogadas pelo doador, sem
que lhe seja lícito renunciar a este direito.
2.
A faculdade de revogação não se transmite aos herdeiros do doador.
ARTIGO 1766º
(Caducidade)
1.
A doação entre casados caduca:
a)
Falecendo o donatário antes do doador, salvo se este confirmar a doação nos
três meses subsequentes à morte daquele;
b)
Se o casamento vier a ser declarado nulo ou anulado, sem prejuízo do disposto
em matéria de casamento putativo;
c)
Ocorrendo divórcio ou separação judicial de pessoas e bens por culpa do
donatário, se este for considerado único ou principal culpado.
2.
A confirmação a que se refere a alínea a) do número anterior deve revestir a
forma exigida para a doação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO XI
Simples separação judicial de bens
ARTIGO 1767º
(Fundamento da separação)
Qualquer
dos cônjuges pode requerer a simples separação judicial de bens quando estiver
em perigo de perder o que é seu pela má administração do outro cônjuge.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1768º
(Carácter litigioso da separação)
A
separação só pode ser decretada em acção intentada por um dos cônjuges contra o
outro.
(Redacção do Dec-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1769º
(Legitimidade)
1.
Só tem legitimidade para a acção de separação o cônjuge lesado ou, estando ele
interdito, o seu representante legal, ouvido o conselho de família.
2.
Se o representante legal do cônjuge lesado for o outro cônjuge, a acção só pode
ser intentada, em nome daquele, por algum parente na linha recta ou até ao
terceiro grau da linha colateral.
3.
Se o cônjuge lesado estiver inabilitado, a acção pode ser intentada por ele, ou
pelo curador com autorização judicial.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1770º
(Efeitos)
Após
o trânsito em julgado da sentença que decretar a separação judicial de bens, o
regime matrimonial, sem prejuízo do disposto em matéria de registo, passa a ser
o da separação, procedendo-se à partilha do património comum como se o
casamento tivesse sido dissolvido; a partilha pode fazer-se extrajudicialmente
ou por inventário judicial.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1771º
(Irrevogabilidade)
A
simples separação judicial de bens é irrevogável.
ARTIGO 1772º
(Separação de bens com outros fundamentos)
O
disposto nos dois artigos anteriores é aplicável a todos os casos, previstos na
lei, de separação de bens na vigência da sociedade conjugal.
CAPÍTULO XII
Divórcio e separação judicial de
pessoas e bens
SECÇÃO I
Divórcio
SUBSECÇÃO I
Diposições gerais
ARTIGO 1773º
(Modalidades)
1.
O divórcio pode ser por mútuo consentimento ou litigioso.
2.
O divórcio por mútuo consentimento pode ser requerido por ambos os cônjuges, de
comum acordo, no tribunal ou na conservatória do registo civil se, neste caso,
o casal não tiver filhos menores ou, havendo-os, o exercício do respectivo
poder paternal se mostrar já judicialmente regulado.
3.
O divórcio litigioso é requerido no tribunal por um dos cônjuges contra o
outro, com algum dos fundamentos previstos nos artigos 1779º e 1781º.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1774º
(Tentativa de conciliação; conversão do divórcio
litigioso
em divórcio por mútuo consentimento)
1.
No processo de divórcio haverá sempre uma tentativa de conciliação dos
cônjuges.
2.
Se, no processo de divórcio litigioso, a tentativa de conciliação não resultar,
o juiz procurará obter o acordo dos cônjuges para o divórcio por mútuo
consentimento; obtido o acordo ou tendo os cônjuges, em qualquer altura do
processo, optado por essa modalidade do divórcio, seguir-se-ão os termos do
processo de divórcio por mútuo consentimento, com as necessárias adaptações.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11
SUBSECÇÃO II
Divórcio por mútuo consentimento
ARTIGO 1775º
(Requisitos)
1 - O divórcio por mútuo consentimento
pode ser requerido pelos cônjuges a todo o tempo. *
2.
Os cônjuges não têm de revelar a causa do divórcio, mas devem acordar sobre a
prestação de alimentos ao cônjuge que deles careça, o exercício do poder
paternal relativamente aos filhos menores e o destino da casa de morada da
família.
3.
Os cônjuges devem acordar ainda sobre o regime que vigorará, no período da
pendência do processo, quanto à prestação de alimentos, ao exercício do poder
paternal e à utilização da casa de morada de família.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
* (Lei n.º 47/98, de 10
de Agosto)
ARTIGO 1776º
(Primeira conferência)
1.
Recebido o requerimento, o juíz convocará os
cônjuges para uma conferência em
que tentará conciliá-los; se a conciliação
não for possível, adverti-los-á de que
deverão renovar o pedido de divórcio após um
período de reflexão de três meses,
a contar da data da conferência, e dentro do ano subsequente
à mesma data, sob
pena de o pedido ficar sem efeito.
2.
O juiz deve apreciar na conferência os acordos a que se refere o nº 2 do artigo
anterior, convidando os cônjuges a alterá-los se esses acordos não acautelarem
suficientemente os interesses de algum deles ou dos filhos; deve ainda
homologar os acordos provisórios previstos no nº 3 do mesmo artigo, podendo alterá-los,
ouvidos os cônjuges, quando o interesse dos filhos o exigir.
3.
Se os cônjuges persistirem no seu propósito, o dever de coabitação fica
suspenso a partir da conferência e qualquer deles pode requerer arrolamento dos
seus bens próprios e dos bens comuns.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1777º
(Segunda conferência)
Anterior redacção: Se os cônjuges renovarem o pedido de
divórcio nos termos do nº 1 do artigo anterior, o juíz covocá-los-á para uma
segunda conferência, em que tentará conciliá-los; pode ainda o juíz marcar
prazo aos cônjuges para alterarem os acordos previstos no nº 2 do artigo 1775º,
sob pena de o pedido ficar sem efeito. (Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1778º
(Sentença)
A
sentença que decrete o divórcio por mútuo consentimento homologará os acordos
referidos no nº 2 do artigo 1775º; se, porém, esses acordos não acautelarem
suficientemente os interesses de um dos cônjuges ou dos filhos, a homologação
deve ser recusada e o pedido de divórcio indeferido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1778º-A
(Divórcio decretado pelo conservador)
1.
É aplicável ao divórcio por mútuo consentimento decretado pelo conservador do
registo civil, com as necessárias adaptações, o disposto na presente subsecção.
2.
As decisões proferidas nestes termos produzem os mesmos efeitos das sentenças
judiciais sobre idêntica matéria.
(Aditado pelo Dec.-Lei 163/95, de 13-7)
SUBSECÇÃO III
Divórcio litigioso
ARTIGO 1779º
(Violação culposa dos deveres conjugais)
1.
Qualquer dos cônjuges pode requerer o divórcio se o outro violar culposamente
os deveres conjugais, quando a violação, pela sua gravidade ou reiteração,
comprometa a possibilidade da vida em comum.
2.
Na apreciação da gravidade dos factos invocados, deve o tribunal tomar em
conta, nomeadamente, a culpa que possa ser imputada ao requerente e o grau de
educação e sensibilidade moral dos cônjuges.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1780º
(Exclusão do direito de requerer o divórcio)
O
cônjuge não pode obter o divórcio, nos termos do artigo anterior:
a)
Se tiver instigado o outro a praticar o facto invocado como fundamento do
pedido ou tiver intencionalmente criado condições propícias à sua verificação;
b)
Se houver revelado pelo seu comportamento posterior, designadamente por perdão,
expresso ou tácito, não considerar o acto praticado como impeditivo da vida em
comum.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1781º
(Ruptura da vida em comum)
São ainda fundamento do divórcio
litigioso:
a) A separação de facto por três anos consecutivos;
b) A separação de facto por um ano se o divórcio for requerido por um dos
cônjuges sem oposição do outro;
c) A alteração das faculdades mentais do
outro cônjuge, quando dure há mais de três anos e, pela sua gravidade,
comprometa a possibilidade de vida em comum;
d) A ausência, sem que do ausente haja
notícias, por tempo não inferior a dois anos.
(Lei n.º 47/98, de 10 de
Agosto)
ARTIGO 1782º
(Separação de facto)
1.
Entende-se que há separação de facto, para os efeitos da alínea a) do artigo
anterior, quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de
ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer.
2.
Na acção de divórcio com fundamento em separação de facto, o juíz deve declarar
a culpa dos cônjuges, quando a haja, nos termos do artigo 1787º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1783º
(Ausência)
É
aplicável ao divórcio decretado com fundamento em ausência o disposto no nº 2
do artigo anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1784º
(eliminado pela Lei n.º 47/98, de 10 de Agosto)
ARTIGO 1785º
(Legitimidade)
1.
Só tem legitimidade para intentar acção de divórcio, nos termos do artigo 1779º,
o cônjuge ofendido ou, estando este interdito, o seu representante legal, com
autorização do conselho de família; quando o representante legal seja o outro
cônjuge, a acção pode ser intentada, em nome do ofendido, por qualquer parente
deste na linha recta ou até ao terceiro grau da linha colateral, se for
igualmente autorizado pelo conselho de família.
2.
O divórcio pode ser requerido por qualquer dos cônjuges com o fundamento da
alínea a) do artigo 1781º, com os fundamentos das alíneas b) e c) do mesmo artigo,
só pode ser requerido pelo cônjuge que invoca a ausência ou a alteração das
faculdades mentais do outro.
3.
O direito ao divórcio não se transmite por morte, mas a acção pode ser
continuada pelos herdeiros do autor para efeitos patrimoniais, nomeadamente os
decorrentes da declaração prevista no artigo 1787º, se o autor falecer na
pendência da causa; para os mesmos efeitos, pode a acção prosseguir contra os
herdeiros do réu.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1786º
(Caducidade da acção)
1.
O direito ao divórcio caduca no prazo de dois anos, a contar da data em que o
cônjuge ofendido ou o seu representante legal teve conhecimento do facto
susceptível de fundamentar o pedido.
2.
O prazo de caducidade corre separadamente em relação a cada um dos factos;
tratando-se de facto continuado, só corre a partir da data em que o facto tiver
cessado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1787º
(Declaração do cônjuge culpado)
1.
Se houver culpa de um ou de ambos os cônjuges, assim o declarará a sentença;
sendo a culpa de um dos cônjuges consideravelmente superior à do outro, a
sentença deve declarar ainda qual deles é o principal culpado.
2.
O disposto no número anterior é aplicável mesmo que o réu não tenha deduzido
reconvenção ou já tenha decorrido, relativamente aos factos alegados, o prazo
referido no artigo 1786º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO IV
Efeitos do divórcio
ARTIGO 1788º
(Princípio geral)
O
divórcio dissolve o casamento e tem juridicamente os mesmos efeitos da
dissolução por morte, salvas as exepções consagradas na lei.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1789º
(Data em que se produzem os efeitos do divórcio)
1.
Os efeitos do divórcio produzem-se a partir do trânsito em
julgado da respectiva
sentença, mas retrotraem-se à data da
proposição da acção quanto às
relações
patrimoniais entre os cônjuges.
2.
Se a falta de coabitação entre os cônjuges estiver provada no processo,
qualquer deles pode requerer que os efeitos do divórcio se retrotraiam à data,
que a sentença fixará, em que a coabitação tenha cessado por culpa exclusiva ou
predominante do outro.
3.
Os efeitos patrimoniais do divórcio só podem ser opostos a terceiros a partir
da data do registo da sentença.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1790º
(Partilha)
O
cônjuge declarado único ou principal culpado não pode na partilha receber mais
do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da
comunhão de adquiridos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1791º
(Benefícios que os cônjuges tenham
recebido ou hajam de receber)
1.
O cônjuge declarado único ou principal culpado perde todos os benefícios
recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do
casamento ou em consideração do estado de casado, quer a estipulação seja
anterior quer posterior à celebração do casamento.
2.
O cônjuge inocente ou que não seja o principal culpado conserva todos os
benefícios recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro,
ainda que tenham sido estipulados com cláusula de reciprocidade; pode renunciar
a esses benefícios por declaração unilateral de vontade, mas, havendo filhos do
casamento, a renúncia só é permitida em favor destes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1792º
(Reparação de danos não patrimoniais)
1.
O cônjuge declarado único ou principal culpado e, bem assim, o cônjuge que
pediu o divórcio com o fundamento da alínea c) do artigo 1781º, devem reparar
os danos não patrimoniais causados ao outro cônjuge pela dissolução do
casamento.
2.
O pedido de indemnização deve ser deduzido na própria acção de divórcio.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1793º
(Casa de morada da família)
1.
Pode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a
casa de morada da família, quer essa seja comum quer própria de outro,
considerando, nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o
interesse dos filhos do casal.
2.
O arrendamento previsto no número anterior fica sujeito às regras do
arrendamento para habitação, mas o tribunal pode definir as condições do
contrato, ouvidos os cônjuges, e fazer caducar o arrendamento, a requerimento
do senhorio, quando circunstâncias supervenientes o justifiquem.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Separação judicial de pessoas e bens
ARTIGO 1794º
(Remissão)
Sem
prejuízo dos preceitos desta secção, é aplicável à separação judicial de
pessoas e bens, com as necessárias adaptações, o disposto quanto ao divórcio na
secção anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º
(Reconvenção)
1.
A separação judicial de pessoas e bens pode ser pedida em reconvenção, mesmo
que o autor tenha pedido o divórcio; tendo o autor pedido a separação de pessoas
e bens, pode igualmente o réu pedir o divórcio em reconvenção.
2.
Nos casos previstos no número anterior, a sentença deve decretar o divórcio se
o pedido da acção e o da reconvenção procederem.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º-A
(Efeitos)
A
separação judicial de pessoas e bens não dissolve o vínculo conjugal, mas
extingue os deveres de coabitação e assistência, sem prejuízo do direito a
alimentos; relativamente aos bens, a separação produz os efeitos que produziria
a dissolução do casamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º-B
(Termo da separação)
A
separação judicial de pessoas e bens termina pela reconciliação dos cônjuges ou
pela dissolução do casamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1795º-C
(Reconciliação)
1.
Os cônjuges podem a todo o tempo restabelecer a vida em comum e o exercício
pleno dos direitos e deveres conjugais.
2.
A reconciliação pode fazer-se por termo no processo de separação ou por
escritura pública, e está sujeita a homologação judicial, devendo a sentença
ser oficiosamente registada.
3.
Quando tenha corrido os seus termos na conservatória do registo civil, a
reconcialiação faz-se por termo no processo de separação e está sujeita a
homologação do conservador respectivo, devendo a decisão ser oficiosamente
registada.
4.
Os efeitos da reconciliação produzem-se a partir da homologação desta, sem
prejuízo da aplicação, com as necessárias adaptações, do disposto nos artigos
1669º e 1670º.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1795º-D
(Conversão da separação em divórcio)
1.
Decorridos dois anos sobre o trânsito em julgado da sentença que tiver
decretado a separação judicial de pessoas e bens, litigiosa ou por mútuo
consentimento, sem que os cônjuges se tenham reconciliado, qualquer deles pode
requerer que a separação seja convertida em divórcio.
2.
Se a conversão for requerida por ambos os cônjuges, não é necessário o decurso
do prazo referido no número anterior.
3.
A convenção pode ser requerida por qualquer dos cônjuges, independentemente do
prazo do nº 1 deste artigo, se o outro cometer adultério depois da separação,
sendo aplicável neste caso, o artigo 1780º.
4.
A sentença que converta a separação em divórcio não pode alterar o que tiver
sido decidido sobre a culpa dos cônjuges, nos termos do artigo 1787º, no
processo de separação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
TÍTULO III
DA FILIAÇÃO
CAPÍTULO I
Estabelecimento da filiação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1796º
(Estabelecimento da filiação)
1.
Relativamente à mãe, a filiação resulta do facto do nascimento e estabelece-se
nos termos dos artigos 1803º a 1825º.
2.
A paternidade presume-se em relação ao marido da mãe e, nos casos de filiação
fora do casamento, estabelece-se pelo reconhecimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1797º
(Atendibilidade da filiação)
1.
Os poderes e deveres emergentes da filiação ou do parentesco nela fundado só
são atendíveis se a filiação se encontrar legalmente estabelecida.
2.
O estabelecimento da filiação tem, todavia, eficácia retroactiva.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1798º
(Concepção)
O
momento da concepção do filho é fixado, para os efeitos legais, dentro dos
primeiros cento e vinte dias dos trezentos que precederem o seu nascimento,
salvas as excepções dos artigos seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1799º
(Gravidez anterior)
1.
Se dentro dos trezentos dias anteriores ao nascimento tiver sido interrompida
ou completada outra gravidez, não são considerados para a determinação do
momento da concepção os dias que tiverem decorrido até à interrupção da
gravidez ou ao parto.
2.
A prova da interrupção de outra gravidez, não havendo registo do facto, só pode
ser feita em acção intentada por qualquer interessado ou pelo Ministério
Público especialmente para esse fim.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1800º
(Fixação judicial da concepção)
1.
É admitida acção judicial destinada a fixar a data provável da concepção dentro
do período referido no artigo 1798º, ou a provar que o período de gestação do
filho foi inferior a cento e oitenta dias ou superior a trezentos.
2.
A acção pode ser proposta por qualquer interessado ou pelo Ministério Público;
se for julgada procedente, deve o tribunal fixar, em qualquer dos casos
referidos no número anterior, a data provável da concepção.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1801º
(Exames de sangue e outros métodos científicos)
Nas
acções relativas à filiação são admitidos como meios de prova os exames de
sangue e quaisquer outros métodos cientificamente comprovados.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1802º
(Prova da filiação)
Salvo
nos casos especificados na lei, a prova da filiação só pode fazer-se pela forma
estabelecida nas leis do registo civil.
(Redacção do De.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Estabelecimento da maternidade
SUBSECÇÃO I
Declaração de maternidade
ARTIGO 1803º
(Menção da maternidade)
1.
Aquele que declarar o nascimento deve, sempre que possa, identificar a mãe do
registando.
2.
A maternidade indicada é mencionada no registo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1804º
(Nascimento ocorrido há menos de um ano)
1.
No caso de declaração de nascimento ocorrido há menos de um ano, a maternidade
indicada considera-se estabelecida.
2.
Lavrado o registo, deve o conteúdo do assento ser comunicado à mãe do registado
sempre que possível, mediante notificação pessoal, salvo se a declaração tiver
sido feita por ela ou pelo marido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1805º
(Nascimento ocorrido há um ano ou mais)
1.
No caso de declaração de nascimento ocorrido há um ano ou mais, a maternidade
indicada considera-se estabelecida se a mãe for o declarante, estiver presente
no acto ou nele se achar representada por procurador com poderes especiais.
2.
Fora dos casos previstos no número anterior, a pessoa indicada como mãe será
notificada pessoalmente para, no prazo de quinze dias, vir declarar se confirma
a maternidade, sob a cominação de o filho ser havido como seu; o facto da
notificação e a confirmação são averbados ao registo do nascimento.
3.
Se a pretensa mãe negar a maternidade ou não puder ser notificada, a menção da
maternidade fica sem efeito.
4.
Das certidões extraídas do registo de nascimento não pode constar qualquer
referência à menção que tenha ficado sem efeito nem aos averbamentos que lhe
respeitem.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1806º
(Registo omisso quanto à maternidade)
1.
A mãe pode fazer a declaração de maternidade se o registo for omisso quanto a
esta, salvo se se tratar de filho nascido ou concebido na constância do
matrimónio e existir perfilhação por pessoa diferente do marido.
2.
Quando a mãe possa fazer a declaração de maternidade, qualquer das pessoas a
quem compete fazer a declaração do nascimento tem a faculdade de identificar a
mãe do registado, sendo aplicável o disposto nos artigos 1803º a 1805º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1807º
(Impugnação da maternidade)
Se
a maternidade estabelecida nos termos dos artigos anteriores não for a
verdadeira, pode a todo o tempo ser impugnada em juízo pela pessoa declarada
como mãe, pelo registado, por quem tiver interesse moral ou patrimonial na
procedência da acção ou pelo Ministério Público.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Averiguação oficiosa
ARTIGO 1808º
(Averiguação oficiosa da maternidade)
1.
Sempre que a maternidade não esteja mencionada no registo do nascimento deve o
funcionário remeter ao tribunal certidão integral do registo e cópia do auto de
declarações, se as houver, a fim de se averiguar oficiosamente a maternidade.
2.
O tribunal deve proceder às diligências necessárias para identificar a mãe; se
por qualquer modo chegar ao seu conhecimento a identidade da pretensa mãe, deve
ouvi-la em declarações, que serão reduzidas a auto.
3.
Se a pretensa mãe confirmar a maternidade, será lavrado termo e remetida
certidão para averbamento à repartição competente para o registo.
4.
Se a maternidade não for confirmada mas o tribunal concluir pela existência de
provas seguras que abonem a viabilidade da acção de investigação, ordenará a
remessa do processo ao agente do Ministério Público junto do tribunal
competente, a fim de a acção ser proposta.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1809º
(Casos em que não é admitida
a averiguação oficiosa da maternidade)
A
acção a que se refere o artigo anterior não pode ser intentada:
a)
Se, existindo perfilhação, a pretensa mãe e o perfilhante forem parentes ou
afins em linha recta ou parentes no segundo grau da linha colateral;
b)
Se tiverem decorrido dois anos sobre a data do nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1810º
(Filho nascido ou concebido na constância do matrimónio)
Se,
em consequência do disposto no artigo 1808º, o tribunal concluir pela
existência de provas seguras de que o filho nasceu ou foi concebido na
constância do matrimónio da pretensa mãe, ordenará a remessa do processo ao
agente do Ministério Público junto do tribunal competente a fim de ser
intentada a acção a que se refere o artigo 1822º, neste caso é aplicável o
disposto na alínea b) do artigo anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1811º
(Valor probatório das declarações prestadas)
Sem
prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 1808º, as declarações prestadas durante
o processo a que se refere o artigo 1808º não implicam presunção de maternidade
nem constituem sequer princípio de prova.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1812º
(Carácter secreto da instrução)
A
instrução do processo é secreta e será conduzida por forma a evitar ofensa ao
pudor ou dignidade das pessoas.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1813º
(Improcedência da acção oficiosa)
A
improcedência da acção oficiosa não obsta a que seja intentada nova acção de
investigação de maternidade, ainda que fundada nos mesmos factos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO III
Reconhecimento judicial
ARTIGO 1814º
(Investigação de maternidade)
Quando
não resulte de declaração, nos termos dos artigos anteriores, a maternidade
pode ser reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho para esse
efeito.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1815º
(Caso em que não é admitido o reconhecimento)
Não
é admissível o reconhecimento de maternidade em contrário da que conste do
registo do nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1816º
(Prova da maternidade)
1.
Na acção de investigação de maternidade o filho deve provar que nasceu da
pretensa mãe.
2.
A maternidade presume-se:
a)
Quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pela pretensa mãe e
reputado como filho também pelo público;
b)
Quando exista carta ou outro escrito no qual a pretensa mãe declare
inequivocamente a sua maternidade.
3.
A presunção considera-se ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a
maternidade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1817º
(Prazo para a proposição da acção)
1.
A acção de investigação de maternidade só pode ser proposta durante a
menoridade do investigante ou nos dois primeiros anos posteriores à sua
maioridade ou emancipação.
2.
Se não for possível estabelecer a maternidade em consequência do disposto no
artigo 1815º, a acção pode ser proposta no ano seguinte à rectificação,
declaração de nulidade ou cancelamento do registo inibitório, contanto que a
remoção do obstáculo tenha sido requerida até ao termo do prazo estabelecido no
número anterior, se para tal o investigante tiver legitimidade.
3.
Se a acção se fundar em escrito no qual a pretensa mãe declare inequivocamente
a maternidade, pode ser intentada nos seis meses posteriores à data em que o
autor conheceu ou devia ter conhecido o conteúdo do escrito.
4 - Se o investigante for tratado como
filho pela pretensa mãe, sem que tenha
cessado voluntariamente esse tratamento, a acção pode ser proposta até um ano posterior à data da morte daquela; tendo
cessado voluntariamente o tratamento como filho, a acção pode ser proposta
dentro do prazo de um ano a contar da data em que o tratamento tiver cessado. *
5 - Se o investigante, sem que tenha
cessado voluntariamente o tratamento como filho, falecer antes da pretensa mãe,
a acção pode ser proposta até um ano posterior à data da morte daquele; tendo
cessado voluntariamente o tratamento como filho antes da morte deste, é
aplicável o disposto na segunda parte do número anterior. *
6 - Nos casos a que se referem os n. 4 e
5 incumbe ao réu a prova da cessação voluntária do tratamento no ano anterior à
propositura da acção. *
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
* (Lei n.º 21/98, de 12
de Maio)
ARTIGO 1818º
(Prossecução e transmissão da acção)
O
cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens ou os descendentes do
filho podem prosseguir na acção, se este falecer na pendência da causa; mas só
podem propô-la se o filho, sem a haver intentado, morrer antes de terminar o
prazo em que o podia fazer.
ARTIGO 1819º
(Legitimidade passiva)
1.
A acção deve ser proposta contra a pretensa mãe, se esta tiver falecido, contra
o cônjuge sobrevivo não separado judicialmente de pessoas e bens e também,
sucessivamente, contra os descendentes, ascendentes ou irmãos; na falta destas
pessoas, será nomeado curador especial.
2.
Quando existam herdeiros ou legatários cujos direitos sejam atingidos pela
procedência da acção, esta não produzirá efeitos contra eles se não tiverem
sido também demandados.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1820º
(Coligação de investigantes)
Na
acção de investigação de maternidade é permitida a coligação de investigantes
em relação ao mesmo pretenso progenitor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1821º
(Alimentos provisórios)
O
filho menor, interdito ou inabilitado tem direito a alimentos provisórios desde
a proposição da acção, contanto que o tribunal considere provável o
reconhecimento da maternidade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1822º
(Filho nascido ou concebido na constância do
matrimónio)
1.
Se se tratar de filho nascido ou concebido na constância do matrimónio da
pretensa mãe, a acção de investigação deve ser intentada também contra o marido
e, se existir perfilhação, ainda contra o perfilhante.
2.
Durante a menoridade do filho a acção pode ser intentada pelo marido da
pretensa mãe; neste caso deverá sê-lo contra a pretensa mãe e contra o filho e,
se existir perfilhação, também contra o perfilhante.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1823º
(Impugnação da presunção de paternidade)
1.
Na acção a que se refere o artigo anterior pode ser sempre impugnada a
presunção de paternidade do marido da mãe.
2.
Se o filho tiver sido perfilhado por pessoa diferente do marido da mãe, a
perfilhação só prevalecerá se for afastada, nos termos do número anterior, a
presunção de paternidade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1824º
(Estabelecimento da maternidade a pedido da mãe)
1.
Se se tratar de filho nascido ou concebido na constância do matrimónio e
existir perfilhação por pessoa diferente do marido da mãe, pode esta requerer
ao tribunal que declare a maternidade.
2.
No caso referido no número anterior é aplicável, com as devidas adaptações, o
disposto nos artigos 1822º e 1823º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1825º
(Legitimidade em caso de falecimento do autor ou
réus)
Em
caso de falecimento do autor ou dos réus nas acções a que se referem os artigos
1822º a 1824º, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos
artigos 1818º e 1819º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO III
Estabelecimento da paternidade
SUBSECÇÃO I
Presunção de paternidade
ARTIGO 1826º
(Presunção de paternidade)
1.
Presume-se que o filho nascido ou concebido na constância do matrimónio da mãe
tem como pai o marido da mãe.
2.
O momento da dissolução do casamento por divórcio ou da sua anulação é o do
trânsito em julgado da respectiva sentença; o casamento católico, porém, só se
considera nulo ou dissolvido por dispensa a partir do registo da sentença
proferida pelas autoridades eclesiásticas.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1827º
(Casamento putativo)
1.
A anulação do casamento civil, ainda que contraído de má fé por ambos os
cônjuges, não exclui a presunção de paternidade.
2.
A declaração de nulidade do casamento católico, transcrito no registo civil,
também não exclui essa presunção.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1828º
(Filhos concebidos antes do casamento)
Relativamente
ao filho nascido dentro dos cento e oitenta dias posteriores à celebração do
casamento, cessa a presunção estabelecida no artigo 1826º se a mãe ou o marido
declararem no acto do registo do nascimento que o marido não é o pai.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1829º
(Filhos concebidos depois de finda a coabitação)
1.
Cessa a presunção de paternidade se o nascimento do filho ocorrer passados
trezentos dias depois de finda a coabitação dos cônjuges, nos termos do número
seguinte.
2.
Considera-se finda a coabitação dos cônjuges:
a)
Na data da primeira conferência, tratando-se de divórcio ou de separação por
mútuo consentimento;
b)
Na data da citação do réu para a
acção de divórcio ou separação
litigiosa, ou
na data que a sentença fixar como a da cessação da
coabitação;
c)
Na data em que deixou de haver notícias do marido, conforme decisão proferida
em acção de nomeação de curador provisório, justificação de ausência ou
declaração de morte presumida.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1830º
(Reinício da presunção de paternidade)
Para
o efeito do disposto no nº 1 do artigo 1826º, são equiparados a novo casamento:
a)
A reconciliação dos cônjuges separados judicialmente de pessoas e bens;
b)
O regresso do ausente;
c)
O trânsito em julgado da sentença que, sem ter decretado o divórcio ou
separação judicial de pessoas e bens, pôs termo ao respectivo processo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1831º
(Renascimento da presunção de paternidade)
1.
Quando o início do período legal da concepção seja anterior ao trânsito em
julgado da sentença proferida nas acções a que se referem as alíneas a) e b) do
nº 2 do artigo 1829º, renasce a presunção de paternidade se, em acção intentada
por um dos cônjuges ou pelo filho, se provar que no período legal da concepção
existiram relações entre os cônjuges, que tornam verosímil a paternidade do
marido ou que o filho, na ocasião do nascimento, beneficiou de posse de estado
relativamente a ambos os cônjuges.
2.
Existe posse de estado relativamente a ambos os cônjuges quando se verifiquem,
cumulativamente, os seguintes requisitos:
a)
Ser a pessoa reputada e tratada como filho por ambos os cônjuges;
b)
Ser reputada como tal nas relações sociais, especialmente nas respectivas
famílias.
3.
Se existir perfilhação, na acção a que se refere o nº 1, deve ser igualmente
demandado o perfilhante.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1832º
(Não indicação da paternidade do marido)
1.
A mulher casada pode fazer a declaração do nascimento com a indicação de que o
filho não é do marido.
2.
Cessa a presunção de paternidade no caso previsto no número anterior, se for
averbada ao registo declaração de que na ocasião do nascimento o filho não
beneficiou de posse de estado, nos termos do nº 2 do artigo precedente,
relativamente a ambos os cônjuges.
3.
A menção da paternidade do marido da mãe será feita oficiosamente se,
decorridos 60 dias sobre a data em que foi lavrado o registo, a mãe não provar
que pediu a declaração a que alude o nº 2 ou se o pedido for indeferido.
4.
Sem prejuízo do disposto no nº 1, não são admissíveis no registo de nascimento
menções que contrariem a presunção de paternidade enquanto esta não cessar.
5.
Se a mãe fizer a declaração prevista no nº 1, o poder paternal só caberá ao
marido quando for averbada ao registo a menção da sua paternidade.
6.
Quando a presunção de paternidade houver cessado nos termos do nº 2, é
aplicável o disposto no artigo 1831º.
(Redacção do Dec-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1833º
(Declaração de inexistência de posse de estado)
Redacção anterior: A declaração de inexistência de posse de
estado a que se refere o nº 2 do artigo anterior é proferida em processo
especial e os seus efeitos restringem-se ao disposto naquele preceito.
(Redacção do Dec.-Lei 163/95, de 13-7)
ARTIGO 1834º
(Dupla presunção de paternidade)
1.
Se o filho nasceu depois de a mãe ter contraído novo casamento sem que o
primeiro se achasse dissolvido ou dentro dos trezentos dias após a sua
dissolução, presume-se que o pai é o segundo marido.
2.
Julgada procedente a acção de impugnação de paternidade, renasce a presunção
relativa ao anterior marido da mãe.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1835º
(Menção obrigatória da paternidade)
1.
A paternidade presumida nos termos dos artigos anteriores constará
obrigatóriamente do registo do nascimento do filho, não sendo admitidas menções
que a contrariem, salvo o disposto nos artigos 1828º e 1832º.
2.
Se o registo do casamento dos pais só vier a ser efectuado depois do registo do
nascimento, e deste não constar a paternidade do marido da mãe, será a
paternidade mencionada oficiosamente.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1836º
(Rectificação do registo)
1.
Se contra o disposto na lei não se fizer menção da paternidade do filho nascido
de mulher casada, pode a todo o tempo qualquer interessado, o Ministério
Público ou o funcionário competente promover a rectificação do registo.
2.
De igual faculdade gozam as mesmas pessoas quando tenha sido registado como
filho do marido da mãe quem não beneficie de presunção de paternidade
(Redacção do Decr.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1837º
(Rectificação, declaração de nulidade
ou cancelamento do registo)
Se
for rectificado, declarado nulo ou cancelado qualquer registo por falsidade ou
qualquer outra causa e, em consequência da rectificação, declaração de nulidade
ou cancelamento, o filho deixar de ser havido como filho Do marido da mãe ou
passar a beneficiar da presunção de paternidade relativamente a este, será
lavrado oficiosamente o respectivo averbamento, se não tiver sido ordenado pelo
tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1838º
(Impugnação da paternidade)
A
paternidade presumida nos termos do artigo 1826º não pode ser impugnada fora
dos casos previstos nos artigos seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1839º
(Fundamento e legitimidade)
1.
A paternidade do filho pode ser impugnada pelo marido da mãe, por esta, pelo
filho ou, nos termos do artigo 1841º, pelo Ministério Público.
2.
Na acção o autor deve provar que, de acordo com as circunstâncias, a
paternidade do marido da mãe é manifestamente improvável.
3.
Não é permitida a impugnação de paternidade com fundamento em inseminação
artificial ao cônjuge que nela consentiu.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1840º
(Impugnação da paternidade do filho
concebido antes do matrimónio)
1.
Independentemente da prova a que se refere o nº 2 do artigo anterior, podem
ainda a mãe ou o marido impugnar a paternidade do filho nascido dentro dos
cento e oitenta dias posteriores à celebração do casamento, excepto:
a)
Se o marido, antes de casar, teve conhecimento da gravidez da mulher;
b)
Se, estando, pessoalmente presente ou representado por procurador com poderes
especiais, o marido consentiu que o filho fosse declarado seu no registo do
nascimento;
c)
Se por qualquer outra forma o marido reconheceu o filho como seu.
2.
Cessa o disposto na alínea a) do número anterior se o casamento for anulado por
falta de vontade, ou por coação moral exercida contra o marido; cessa ainda o
disposto nas alíneas b) e c) quando se prove ter sido o consentimento ou
reconhecimento viciado por erro sobre as circunstâncias que tenham contribuído
decisivamente para o convencimento da paternidade, ou extorquido por coação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1841º
(Acção do Ministério Público)
1.
A acção de impugnação de paternidade pode ser proposta pelo Ministério Público
a requerimento de quem se declarar pai do filho, se for reconhecida pelo tribunal
a viabilidade do pedido.
2.
O requerimento deve ser dirigido ao tribunal no prazo de sessenta dias a contar
da data em que a paternidade do marido da mãe conste no registo.
3.
O tribunal procederá às diligências necessárias para averiguar a viabilidade da
acção, depois de ouvir, sempre que possível, a mãe e o marido.
4.
Se concluir pela viabilidade da acção, o tribunal ordenará a remessa do
processo ao agente do Ministério Público junto do tribunal competente para a
acção de impugnação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1842º
(Prazos)
1.
A acção de impugnação de paternidade pode ser intentada:
a)
Pelo marido, no prazo de dois anos contados desde que teve conhecimento de
circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade;
b)
Pela mãe, dentro dos dois anos posteriores ao nascimento;
c)
Pelo filho, até um ano depois de haver atingido a maioridade ou de ter sido
emancipado, ou posteriormente, dentro de um ano a contar da data em que teve
conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se não ser filho do marido
da mãe.
2.
Se o registo for omisso quanto à maternidade, os prazos a que se referem as
alíneas a) e c) do número anterior contam-se a partir do estabelecimento da
maternidade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1843º
(Impugnação antecipada)
1.
Se o registo for omisso quanto à maternidade, a acção de impugnação pode ser
intentada pelo marido da pretensa mãe no prazo de seis meses a contar do dia em
que soube do nascimento.
2.
O decurso do prazo a que se refere o número anterior não impede o marido de
intentar acção de impugnação, nos termos gerais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1844º
(Prossecução e transmissão da acção)
1.
Se o titular do direito de impugnar a paternidade falecer no decurso da acção,
ou sem a haver intentado, mas antes de findar o prazo estabelecido nos artigos
1842º e 1843º, têm legitimidade para nela prosseguir ou para a intentar:
a)
No caso de morte do presumido pai, o cônjuge não separado judicialmente de
pessoas e bens que não seja a mãe do filho, os descendentes e ascendentes;
b)
No caso de morte da mãe, os descendentes e ascendentes;
c)
No caso de morte do filho, o cônjuge não separado judicialmente de pessoas e
bens e os descendentes.
2.
O direito de impugnação conferido às pessoas mencionadas no número anterior
caduca se a acção não for proposta no prazo de noventa dias a contar:
a)
Da morte do marido ou da mãe, ou do nascimento de filho póstumo, no caso das
alíneas a) e b);
b)
Da morte do filho, no caso da alínea c).
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1845º
(Ausência)
No
caso de ausência justificada do titular do direito de impugnar a paternidade, a
acção a que se refere o artigo 1839º pode ser intentada pelas pessoas referidas
no artigo anterior, no prazo de cento e oitenta dias a contar do trânsito em
julgado da sentença.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1846º
(Legitimidade passiva)
1.
Na acção de impugnação de paternidade devem ser demandados a mãe, o filho e o
presumido pai quando nela não figurem como autores.
2.
No caso da morte da mãe, do filho ou do presumido pai, a acção deve ser
intentada ou prosseguir contra as pessoas referidas no artigo 1844º, devendo,
na falta destas, ser nomeado um curador especial; se, porém, existirem
herdeiros ou legatários cujos direitos possam ser atingidos pela procedência do
pedido, a acção não produzirá efeitos contra eles se não tiverem sido também
demandados.
3.
Quando o filho for menor não emancipado, o tribunal nomear-lhe-á curador
especial.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Reconhecimento de paternidade
Divisão I
Disposições gerais
ARTIGO 1847º
(Formas de reconhecimento)
O
reconhecimento do filho nascido ou concebido fora do matrimónio efectua-se por
perfilhação ou decisão judicial em acção de investigação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1848º
(Casos em que não é admitido o reconhecimento)
1.
Não é admitido o reconhecimento em contrário da filiação que conste do registo
de nascimento enquanto este não for rectificado, declarado nulo ou cancelado.
2.
O disposto no número anterior não invalida a perfilhação feita por algumas das
formas mencionadas nas alíneas b), c) e d) do artigo 1853º, embora ela não
produza efeitos enquanto não puder ser registada.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
Divisão II
Perfilhação
ARTIGO 1849º
(Carácter pessoal e livre da perfilhação)
A
perfilhação é acto pessoal e livre; pode, contudo, ser feita por intermédio de
procurador com poderes especiais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1850º
(Capacidade)
1.
Têm capacidade para perfilhar os indivíduos com mais de dezasseis anos, se não
estiverem interditos por anomalia psíquica ou não forem notoriamente dementes
no momento da perfilhação.
2.
Os menores, os interditos não compreendidos no número anterior e os
inabilitados não necessitam, para perfilhar, de autorização dos pais, tutores
ou curadores.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1851º
(Maternidade não declarada)
Não
obsta à perfilhação o facto de a maternidade do perfilhando não se encontrar
declarada no registo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1852º
(Conteúdo defeso)
1.
O acto de perfilhação não comporta cláusulas que limitem ou modifiquem os
efeitos que lhe são atribuídos por lei, nem admite condição ou termo.
2.
As cláusulas ou declarações proibidas não invalidam a perfilhação, mas têm-se
por não escritas.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1853º
(Forma)
A
perfilhação pode fazer-se:
a)
Por declaração prestada perante o funcionário do registo civil;
b)
Por testamento;
c)
Por escritura pública;
d)
Por termo lavrado em juízo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1854º
(Tempo da perfilhação)
A
perfilhação pode ser feita a todo o tempo, antes ou depois do nascimento do
filho ou depois da morte deste.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1855º
(Perfilhação de nascituro)
A
perfilhação de nascituro só é válida se for posterior à concepção e o
perfilhante identificar a mãe.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1856º
(Perfilhação de filho falecido)
A
perfilhação posterior à morte do filho só produz efeitos em favor dos seus
descendentes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1857º
(Perfilhação de maiores)
1.
A perfilhação de filho maior ou emancipado, ou de filho pré-defunto de quem
vivam descendentes maiores ou emancipados só produz efeitos se aquele ou estes,
ou, tratando-se de interditos, os respectivos representantes, derem o seu
assentimento.
2.
O assentimento pode ser dado antes ou depois da perfilhação, ainda que o
perfilhante tenha falecido, por alguma das seguintes formas:
a)
Por declaração prestada perante o funcionário do registo civil, averbada no
assento de nascimento, e no de perfilhação, se existir;
b)
Por documento autêntico ou autenticado;
c)
Por termo lavrado em juízo no processo em que haja sido feita a perfilhação.
3.
O registo da perfilhação é considerado secreto até ser prestado o assentimento
necessário e, sem prejuízo do disposto no número seguinte, só pode ser invocado
para instrução do processo preliminar de publicações ou em acção de nulidade ou
anulação de casamento.
4.
Qualquer interessado tem o direito de requerer judicialmente a notificação
pessoal do perfilhando, dos seus descendentes ou dos seus representantes
legais, para declararem, no prazo de trinta dias, se dão o seu assentimento à
perfilhação, considerando-se esta aceite no caso de falta de resposta e sendo
cancelado o registo no caso de recusa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1858º
(Irrevogabilidade)
A
perfilhação é irrevogável e, quando feita em testamento, não é prejudicada pela
revogação deste.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1859º
(Impugnação)
1.
A perfilhação que não corresponda à verdade é impugnável em juízo mesmo depois
da morte do perfilhado.
2.
A acção pode ser intentada a todo o tempo, pelo perfilhante, pelo perfilhado,
ainda que haja consentido na perfilhação, por qualquer outra pessoa que tenha
interesse moral ou patrimonial na sua procedência ou pelo Ministério Público.
3.
A mãe ou o filho, quando autores, só terão de provar que o perfilhante não é o
pai se este demonstrar ser verosímel que coabitou com a mãe do perfilhado no
período de concepção.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1860º
(Anulação por erro ou coacção)
1.
A perfilhação é anulável judicialmente a requerimento do perfilhante quando
viciada por erro ou coacção moral.
2.
Só é relevante o erro sobre circunstâncias que tenham contribuído decisivamente
para o convencimento da paternidade.
3.
A acção de anulação caduca no prazo de um ano, a contar do momento em que o
perfilhante teve conhecimento do erro ou que cessou a coacção, salvo se ele for
menor não emancipado ou interdito por anomalia psíquica; neste caso, a acção
não caduca sem ter decorrido um ano sobre a maioridade, emancipação ou
levantamento da interdição.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1861º
(Anulação por incapacidade)
1.
A perfilhação é anulável por incapacidade do perfilhante a requerimento deste
ou de seus pais ou tutor.
2.
A acção pode ser intentada dentro de um ano, contado:
a)
Da data da perfilhação, quando intentada pelos pais ou tutor;
b)
Da maioridade ou emancipação, quando intentada pelo que perfilhou antes da
idade exigida por lei;
c)
Do termo da incapacidade, quando intentada por quem perfilhou estando interdito
por anomalia psíquica ou notoriamente demente.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1862º
(Morte do perfilhante)
Se
o perfilhante falecer sem haver intentado a acção de anulação ou no decurso
dela, têm legitimidade para a intentar no ano seguinte à sua morte, ou nela
prosseguir, os descendentes ou ascendentes do perfilhante e todos os que
mostrem ter sido prejudicados nos seus direitos sucessórios por efeito da
perfilhação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1863º
(Perfilhação posterior a investigação judicial)
A
perfilhação feita depois de intentada em juízo acção de investigação de
paternidade contra pessoa diferente do perfilhante fica sem efeito, e o
respectivo registo deve ser cancelado, se a acção for julgada procedente.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
DIVISÃO III
Averiguação oficiosa da paternidade
ARTIGO 1864º
(Paternidade desconhecida)
Sempre
que seja lavrado registo de nascimento de menor apenas com a maternidade
estabelecida, deve o funcionário remeter ao tribunal certidão integral do
registo, a fim de se averiguar oficiosamente a identidade do pai.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1865º
(Averiguação oficiosa)
1.
Sempre que possível, o tribunal ouvirá a mãe acerca da paternidade que atribui
ao filho.
2.
Se a mãe indicar quem é o pai ou por outro meio chegar ao conhecimento do
tribunal a identidade do pretenso progenitor, será este também ouvido.
3.
No caso de o pretenso progenitor confirmar a paternidade, será lavrado termo de
perfilhação e remetida certidão para averbamento à repartição competente para o
registo.
4.
Se o presumido pai negar ou se recusar a confirmar a paternidade, o tribunal
procederá às diligências necessárias para averiguar a viabilidade da acção de
investigação de paternidade.
5.
Se o tribunal concluir pela existência de provas seguras da paternidade,
ordenará a remessa do processo ao agente do Ministério Público junto do
tribunal competente, a fim de ser intentada a acção de investigação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1866º
(Casos em que não é admitida a
averiguação oficiosa da paternidade)
A
acção a que se refere o artigo anterior não pode ser intentada:
a)
Se a mãe e o pretenso pai forem parentes ou afins em linha recta ou parentes no
segundo grau da linha colateral;
b)
Se tiverem decorrido dois anos sobre a data do nascimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1867º
(Investigação com base em processo crime)
Quando
em processo crime se considere provada a cópula em termos de constituir
fundamento para a investigação da paternidade e se mostre que a ofendida teve
um filho em condições de o período legal da concepção abranger a época do
crime, deve o Ministério Público instaurar a correspondente acção de
investigação, independentemente do prazo estabelecido na alínea b) do artigo
1866º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1868º
(Remissão)
É
aplicável à acção oficiosa de investigação de paternidade, com as necessárias
adaptações, o disposto nos artigos 1811º, 1812º e 1813º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
DIVISÃO IV
Reconhecimento judicial
ARTIGO 1869º
(Investigação da paternidade)
A
paternidade pode ser reconhecida em acção especialmente intentada pelo filho se
a maternidade já se achar estabelecida ou for pedido conjuntamente o
reconhecimento de uma e outra.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1870º
(Legitimidade da mãe menor)
A
mãe menor tem legitimidade para intentar a acção em representação do filho sem
necessidade de autorização dos pais, mas é sempre representada na causa por
curador especial nomeado pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1871º
(Presunção)
1.
A paternidade presume-se:
a)
Quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pelo pretenso pai e
reputado como filho também pelo público;
b)
Quando exista carta ou outro escrito no qual o pretenso pai declare
inequivocamente a sua paternidade;
c)
Quando, durante o período legal da concepção, tenha existido comunhão duradoura
de vida em condições análogas às dos cônjuges ou concubinato duradouro entre a
mãe e o pretenso pai;
d)
Quando o pretenso pai tenha seduzido a mãe, no período legal da concepção, se
esta era virgem e menor no momento em que foi seduzida, ou se o consentimento
dela foi obtido por meio de promessa de casamento, abuso de confiança ou abuso
de autoridade.
e) Quando
se prove que o pretenso pai teve relações sexuais com a mãe durante o
período legal de concepção. *
2.
A presunção considera-se ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a
paternidade do investigado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
* (Lei n.º 21/98, de 12
de Maio)
ARTIGO 1872º
(Coligação de investigantes)
Na
acção de investigação de paternidade é permitida a coligação de investigantes
filhos da mesma mãe, em relação ao mesmo pretenso progenitor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1873º
(Remissão)
É
aplicável à acção de investigação de paternidade, com as necessárias
adaptações, o disposto nos artigos 1817º a 1819º e 1821º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO II
Efeitos da filiação
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1874º
(Deveres de pais e filhos)
1.
Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência.
2.
O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de
contribuir, durante a vida em comum, de acordo com os recursos próprios, para
os encargos da vida familiar.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1875º
(Nome do filho)
1.
O filho usará apelidos do pai e da mãe ou só de um deles.
2.
A escolha do nome próprio e dos apelidos do filho menor pertence aos pais; na
falta de acordo decidirá o juíz, de harmonia com o interesse do filho.
3.
Se a maternidade ou paternidade forem estabelecidas posteriormente ao registo
do nascimento, os apelidos do filho poderão ser alterados nos termos dos
números anteriores.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1876º
(Atribuição dos apelidos do marido da mãe)
1.
Quando a paternidade se não encontre estabelecida, poderão ser atribuídos ao
filho menor apelidos do marido da mãe se esta e o marido declararem, perante o
funcionário do registo civil, ser essa a sua vontade.
2.
Nos dois anos posteriores à maioridade ou à emancipação o filho pode requerer
que sejam eliminados do seu nome os apelidos do marido da mãe.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO II
Poder paternal
SUBSECÇÃO I
Princípios gerais
ARTIGO 1877º
(Duração do poder paternal)
Os
filhos estão sujeitos ao poder paternal até à maioridade ou emancipação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1878º
(Conteúdo do poder paternal)
1.
Compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes,
prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que
nascituros, e administrar os seus bens.
2.
Os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade
dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares
importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1879º
(Despesas com o sustento, segurança,
saúde e educação dos filhos)
Os
pais ficam desobrigados de prover ao sustento dos filhos e de assumir as
despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos
estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros
rendimentos, aqueles encargos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1880º
(Despesas com os filhos maiores ou emancipados)
Se
no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver
completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere
o número anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu
cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se
complete.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1881º
(Poder de representação)
1.
O poder de representação compreende o exercício de todos os direitos e o
cumprimento de todas as obrigações do filho, exceptuados os actos puramente
pessoais, aqueles que o menor tem o direito de praticar pessoal e livremente e
os actos respeitantes a bens cuja administração não pertença aos pais.
2.
Se houver conflito de interesses cuja resolução dependa de autoridade pública,
entre qualquer dos pais e o filho sujeito ao poder paternal, ou entre os
filhos, ainda que, neste caso, algum deles seja maior, são os menores
representados por um ou mais curadores especiais nomeados pelo tribunal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1882º
(Irrenunciabilidade)
Os
pais não podem renúnciar ao poder paternal nem a qualquer dos direitos que ele
especialmente lhes confere, sem prejuízo do que neste código se dispõe acerca
da adopção.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1883º
(Filho concebido fora do matrimónio)
O
pai ou a mãe não pode introduzir no lar conjugal o filho concebido na
constância do matrimónio que não seja filho do seu cônjuge, sem consentimento
deste.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1884º
(Alimentos à mãe)
1.
O pai não unido pelo matrimónio à mãe do filho é obrigado, desde a data do
estabelecimento de paternidade, a prestar-lhe alimentos relativos ao período da
gravidez e ao primeiro ano de vida do filho, sem prejuízo das indemnizações a
que por lei ela tenha direito.
2.
A mãe pode pedir os alimentos na acção de investigação de paternidade e tem
direito a alimentos provisórios se a acção foi proposta antes de decorrido o
prazo a que se refere o número anterior, desde que o tribunal considere
provável o reconhecimento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO II
Poder paternal relativamente à
pessoa dos filhos
ARTIGO 1885º
(Educação)
1.
Cabe aos pais, de acordo com as suas possibilidades, promover o desenvolvimento
físico, intelectual e moral dos filhos.
2.
Os pais devem proporcionar aos filhos, em especial aos diminuídos física e
mentalmente, adequada instrução geral e profissional, correspondente, na medida
do possível, às aptidões e inclinações de cada um.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1886º
(Educação religiosa)
Pertence
aos pais decidir sobre a educação religiosa dos filhos menores de dezasseis
anos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1887º
(Abandono do lar)
1.
Os menores não podem abandonar a casa paterna ou aquela que os pais lhes
destinaram, nem dela ser retirados.
2.
Se a abandonarem ou dela forem retirados; qualquer dos pais e, em caso de
urgência, as pessoas a quem eles tenham confiado o filho podem reclamá-lo,
recorrendo, se for necessário, ao tribunal ou à autoridade competente.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1887º-A
(Convívio com irmãos e ascendentes)
Os
pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos e
ascendentes.
(Aditado pela Lei 84/95, de 31-8)
SUBSECÇÃO III
Poder paternal relativamente aos
bens dos filhos
ARTIGO 1888º
(Exclusão da administração)
1.
Os pais não têm a administração:
a)
Dos bens do filho que procedam de sucessão da qual os pais tenham sido
excluídos por indignidade ou deserdação;
b)
Dos bens que tenham advindo ao filho por doação ou sucessão contra a vontade
dos pais;
c)
Dos bens deixados ou doados ao filho com exclusão da administração dos pais.
d)
Dos bens adquiridos pelo filho maior de dezasseis anos pelo seu trabalho.
2.
A exclusão da administração, nos termos da alínea c) do número anterior, é
permitida mesmo relativamente a bens que caibam ao filho a título de legítima.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1889º
(Actos cuja validade depende de autorização do
tribunal)
1.
Como representantes do filho não podem os pais, sem autorização do tribunal:
a)
Alienar ou onerar bens, salvo tratando-se de alienação onerosa de coisas
susceptíveis de perda ou deterioração:
b)
Votar, nas assembleias gerais das sociedades, deliberações que importem a sua
dissolução;
c)
Adquirir estabelecimento comercial ou industrial ou continuar a exploração do
que o filho haja recebido por sucessão ou doação;
d)
Entrar em sociedade em nome colectivo ou em comandita simples ou por acções;
e)
Contrair obrigações cambiárias ou resultantes de qualquer título transmissível
por endosso;
f)
Garantir ou assumir dívidas alheias;
g)
Contrair empréstimos;
h)
Contrair obrigações cujo cumprimento se deva verificar depois da maioridade;
i)
Ceder direitos de crédito;
j)
Repudiar herança ou legado;
l)
Aceitar herança, doação ou legado com encargos, ou convencionar partilha
extrajudicial;
m)
Locar bens, por prazo superior a seis anos;
n)
Convencionar ou requerer em juízo a divisão de coisa comum ou a liquidação e
partilha de patrimónios sociais;
o)
Negociar transacção ou comprometer-se em árbitros relativamente a actos
referidos nas alíneas anteriores, ou negociar concordata com os credores.
2.
Não se considera abrangida na restrição da alínea a) do número anterior a
aplicação de dinheiro ou capitais do menor na aquisição de bens.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 1890º
(Aceitação e rejeição de liberalidades)
1.
Se ao filho for deixada herança ou legado, ou for feita proposta de doação que
necessite de ser aceite, devem os pais aceitar a liberalidade, se o puderem
fazer legalmente, ou requerer ao tribunal, no prazo de trinta dias, autorização
para aceitar ou rejeitar.
2.
Se, decorrido aquele prazo sobre a abertura da sucessão ou sobre a proposta de
doação, os pais nada tiverem providenciado, pode o filho ou qualquer dos seus
parentes, o Ministério Público, o doador ou algum interessado nos bens deixados
requerer ao tribunal a notificação dos pais para darem cumprimento ao disposto
no número anterior, dentro do prazo que lhes for assinado.
3.
Se os pais nada declararem dentro do prazo fixado, a liberalidade tem-se por
aceite, salvo se o tribunal julgar mais conveniente para o menor a rejeição.
4.
No processo em que os pais requeiram autorização judicial para aceitar a
herança, quando dela necessitem, poderão requerer autorização para convencionar
a respectiva partilha extrajudicial, bem como a nomeação de curador especial
para nela outorgar, em representação do menor, quando com ele concorram à
sucessão ou a ela concorram vários incapazes por eles representados.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 1891º
(Nomeação de curador especial)
1.
Se o menor não tiver quem legalmente o represente, qualquer das pessoas
mencionadas no nº 2 do artigo anterior tem legitimidade para requerer ao
tribunal a nomeação de um curador especial para os efeitos do disposto no nº 1
do mesmo artigo.
2.
Quando o tribunal recusar autorização aos pais para rejeitarem a liberalidade,
será também nomeado oficiosamente um curador para o efeito da sua aceitação.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1892º
(Proibição de adquirir bens do filho)
1.
Sem autorização do tribunal não podem os pais tomar de arrendamento ou
adquirir, directamente ou por interposta pessoa, ainda que em hasta pública, bens
ou direitos do filho sujeito ao poder paternal, nem tornar-se cessionários de
créditos ou outros direitos contra este, excepto nos casos de sub-rogação
legal, de licitação em processo de inventário ou de outorga em partilha
judicialmente autorizada.
2.
Entende-se que a aquisição é feita por interposta pessoa nos casos referidos no
nº 2 do artigo 579º.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 1893º
(Actos anuláveis)
1.
Os actos praticados pelos pais em contravenção do disposto nos artigos 1889º e
1892º são anuláveis a requerimento do filho, até um ano depois de atingir a
maioridade ou ser emancipado, ou, se ele entretanto falecer, a pedido dos seus
herdeiros, excluídos os próprios pais responsáveis, no prazo de um ano a contar
da morte do filho.
2.
A anulação pode ser requerida depois de findar o prazo se o filho ou seus
herdeiros mostrarem que só tiveram conhecimento do acto impugnado nos seis
meses anteriores à proposição da acção.
3.
A acção de anulação pode também ser intentada pelas pessoas com legitimidade
para requerer a inibição do poder paternal, contanto que o façam no ano
seguinte à prática dos actos impugnados e antes de o menor atingir a maioridade
ou ser emancipado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1894º
(Confirmação dos actos pelo tribunal)
O
tribunal pode confirmar os actos praticados pelos pais sem a necessária
autorização.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1895º
(Bens cuja propriedade pertence aos pais)
1.
Pertence aos pais a propriedade dos bens que o filho menor, vivendo em sua
companhia, produza por trabalho prestado aos seus progenitores e com meios ou
capitais pertencentes a estes.
2.
Os pais devem dar ao filho parte nos bens produzidos ou por outra forma
compensá-lo do seu trabalho; o cumprimento deste dever não pode, todavia, ser
judicialmente exigido.
(Redacção do Dec-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1896º
(Rendimento dos bens do filho)
1.
Os pais podem utilizar os rendimentos dos bens do filho para satisfazerem as
despesas com o sustento, segurança, saúde e educação deste, bem como, dentro de
justos limites, com outras necessidades da vida familiar.
2.
No caso de só um dos pais exercer o poder paternal, a ele pertence a utilização
dos rendimentos do filho, nos termos do número anterior.
3.
A utilização de rendimentos de bens que caibam ao filho a título de legítima
não pode ser excluída pelo doador ou testador.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1897º
(Exercício da administração)
Os
pais devem administrar os bens dos filhos com o mesmo cuidado com que
administram os seus.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1898º
(Prestação de caução)
1.
Sem prejuízo do disposto no artigo 1920º, os pais não são obrigados a prestar
caução como administradores dos bens do filho, excepto quando a este couberem
valores móveis e o tribunal, considerando o valor dos bens, o julgue
necessário, a pedido das pessoas com legitimidade para a acção de inibição do
exercício do poder paternal.
2.
Se os pais não prestarem a caução que lhes for exigida é aplicável o disposto
no artigo 1470º.
(Redacção do Dec-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1899º
(Dispensa de prestação de contas)
Os
pais não são obrigados a prestar contas da sua administração, sem prejuízo do
disposto no artigo 1920º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1900º
(Fim da administração)
1.
Os pais devem entregar ao filho, logo que este atinja a maioridade ou seja
emancipado, todos os bens que lhe pertençam; quando por outro motivo cesse o
poder paternal ou a administração, devem os bens ser entregues ao representante
legal do filho.
2.
Os móveis devem ser restituídos no estado em que se encontrarem; não existindo,
pagarão os pais o respectivo valor, excepto se houverem sido consumidos em uso
comum ao filho ou tiverem perecido por causa não imputável aos progenitores.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO IV
Exercício do poder paternal
ARTIGO 1901º
(Poder paternal na constância do matrimónio)
1.
Na constância do matrimónio o exercício do poder paternal pertence a ambos os
pais.
2.
Os pais exercem o poder paternal de comum acordo e, se este faltar em questões
de particular importância, qualquer deles pode recorrer ao tribunal, que
tentará a conciliação; se esta não for possível, o tribunal ouvirá, antes de
decidir, o filho maior de catorze anos, salvo quando circunstâncias ponderosas
o desaconselhem.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1902º
(Actos praticados por um dos pais)
1.
Se um dos pais praticar acto que integre o exercício do poder paternal,
presume-se que age de acordo com o outro, salvo quando a lei expressamente
exija o consentimento de ambos os progenitores ou se trate de acto de
particular importância; a falta de acordo não é oponível a terceiro de boa fé.
2.
O terceiro deve recusar-se a intervir no acto praticado por um dos cônjuges
quando, nos termos do número anterior, não se presuma o acordo do outro cônjuge
ou quando conheça a oposição deste.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1903º
(Impedimento de um dos pais)
Quando
um dos pais não puder exercer o poder paternal por ausência, incapacidade ou
outro impedimento, caberá esse exercício unicamente ao outro progenitor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1904º
(Viuvez)
Dissolvido
o casamento por morte de um dos cônjuges, o poder paternal pertence ao
sobrevivo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1905º
(Divórcio, separação judicial de pessoas e bens,
declaração de nulidade ou anulação do casamento)
1.
Nos casos de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de
nulidade ou anulação do casamento, o destino do filho, os alimentos a este
devidos e forma de os prestar serão regulados por acordo dos pais, sujeito a
homologação do tribunal; a homologação será recusada se o acordo não
corresponder ao interesse do menor, incluindo o interesse deste em manter com
aquele progenitor a quem não seja confiado uma relação de grande proximidade.
2.
Na falta de acordo, o Tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor,
incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com o progenitor a quem
não seja confiado, podendo a sua guarda caber a qualquer dos pais, ou, quando
se verifique alguma das circunstâncias previstas no artigo 1918º, a terceira
pessoa ou estabelecimento de reeducação ou assistência.
(Redacção da Lei 84/95, de 31-8)
ARTIGO 1906º
(Exercício do poder paternal em caso de divórcio,
separação judicial de pessoas e bens,
declaração
de nulidade ou anulação do casamento)
1. Desde que obtido o acordo dos pais, o
poder paternal é exercido em comum por
ambos, decidindo as questões relativas à vida do filho em condições idênticas às que vigoram para tal
efeito na constância do matrimónio.
2. Na ausência de acordo dos pais, deve o
tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que o poder paternal seja
exercido pelo progenitor a quem o filho for confiado.
3. No caso previsto no número anterior,
os pais podem acordar que determinados assuntos sejam resolvidos entre ambos ou
que a administração dos bens do filho seja assumida pelo progenitor a quem o menor tenha sido confiado.
4. Ao progenitor que não exerça o poder
paternal assiste o poder de vigiar a educação e as condições de vida do filho.
(Lei n.º 59/99, de 30 de
Junho)
ARTIGO 1907º
(Exercício do poder paternal quando o filho
é confiado a terceira pessoa ou a
estabelecimento de educação ou assistência)
1.
Quando o filho seja confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação
ou assistência, cabem a estes os poderes e deveres dos pais que forem exigidos
pelo adequado desempenho das suas funções.
2.
O tribunal decidirá a qual dos progenitores compete o exercício do poder
paternal na parte não prejudicada pelo disposto no número anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1908º
(Sobrevivência do progenitor a quem o filho não foi
confiado)
Quando
se verifique alguma das circunstâncias previstas no artigo 1918º, pode o
tribunal, ao regular o exercício do poder paternal, decidir que, se falecer o
progenitor a quem o menor for entregue, a guarda não passe para o sobrevivo; o
tribunal designará então a pessoa a quem, provisoriamente, o menor será
confiado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1909º
(Separação de facto)
As
disposições dos artigos 1905º a 1908º são aplicáveis aos cônjuges separados de
facto.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1910º
(Filiação estabelecida apenas quanto a um dos
progenitores)
Se
a filiação de menor nascido fora do casamento se encontrar estabelecida apenas
quanto a um dos progenitores, a este pertence o poder paternal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1911º
(Filiação estabelecida quanto a ambos os
progenitores não unidos pelo matrimónio)
1.
Quando a filiação se encontre estabelecida relativamente a ambos os pais e
estes não tenham contraído o matrimónio após o nascimento do menor, o exercício
do poder paternal pertence ao progenitor que tiver a guarda do filho.
2.
Para os efeitos do número anterior presume-se que a mãe tem a guarda do filho;
esta presunção só é ilidível judicialmente.
3.
Se os progenitores conviverem maritalmente, o exercício do poder paternal
pertence a ambos quando declarem, perante o funcionário do registo civil, ser
essa a sua vontade; é aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o
disposto nos artigos 1901º a 1904º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1912º
(Regulação do exercício do poder paternal)
É
aplicável ao caso previsto no artigo anterior, com as necessárias adaptações, o
disposto nos artigos 1904º a 1907º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO V
Inibição e limitações ao exercício
do poder paternal
ARTIGO 1913º
(Inibição de pleno direito)
1.
Consideram-se de pleno direito inibidos do exercício do poder paternal:
a)
Os condenados definitivamente por crime a que a lei atribua esse efeito;
b)
Os interditos e os inabilitados por anomalia psíquica;
c)
Os ausentes, desde a nomeação do curador provisório.
2.
Consideram-se de pleno direito inibidos de representar o filho e administrar os
seus bens os menores não emancipados e os interditos e inabilitados não
referidos na alínea b) do número anterior
3.
As decisões judiciais que importem inibição do exercício do poder paternal são
comunicadas, logo que transitem em julgado, ao tribunal competente, a fim de
serem tomadas as providências que no caso couberem.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1914º
(Cessação da inibição)
A
inibição de pleno direito do exercício do poder paternal cessa pelo
levantamento da interdição ou inabilitação e pelo termo da curadoria.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1915º
(Inibição do exercício do poder paternal)
1.
A requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor ou de pessoa
a cuja guarda ele esteja confiado, de facto ou de direito, pode o tribunal
decretar a inibição do exercício do poder paternal quando qualquer dos pais
infrinja culposamente os deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes,
ou quando, por inexperiência, enfermidade, ausência ou outras razões, não se
mostre em condições de cumprir aqueles deveres.
2.
A inibição pode ser total ou limitar-se à representação e administração dos
bens dos filhos; pode abranger ambos os progenitores ou apenas um deles e
referir-se a todos os filhos ou apenas a algum ou alguns.
3.
Salvo decisão em contrário, os efeitos da inibição que abranja todos os filhos
estendem-se aos que nascerem depois de decretada.
(Redacção do Dec.-Lei nº 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1916º
(Levantamento da inibição)
1.
A inibição do exercício do poder paternal decretada pelo tribunal será
levantada quando cessem as causas que lhe deram origem.
2.
O levantamento pode ser pedido pelo Ministério Público, a todo o tempo, ou por
qualquer dos pais, passado um ano sobre o trânsito em julgado da sentença de
inibição ou da que houver desatendido outro pedido de levantamento.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1917º
(Alimentos)
A
inibição do exercício do poder paternal em nenhum caso isenta os pais do dever
de alimentarem o filho.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1918º
(Perigo para a segurança, saúde,
formação moral e educação do filho)
Quando
a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação de um menor se encontrem
em perigo e não seja caso de inibição do exercício do poder paternal, pode o
tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer das pessoas
indicadas no nº 1 do artigo 1915º, decretar as providências adequadas,
designadamente confiá-lo a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação ou
assistência.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1919º
(Exercício do poder paternal
enquanto se mantiver a providência)
1.
Quando tiver sido decretada alguma das providências referidas no artigo
anterior, os pais conservam o exercício do poder paternal em tudo o que com ela
se não mostre inconciliável.
2.
Se o menor tiver sido confiado a terceira pessoa ou a estabelecimento de
educação ou assistência, será estabelecido um regime de visitas aos pais, a
menos que, excepcionalmente, o interesse do filho o desaconselhe.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1920º
(Protecção dos bens do filho)
1.
Quando a má administração ponha em perigo o património do filho e não seja caso
de inibição do exercício do poder paternal, pode o tribunal, a requerimento do
Ministério Público ou de qualquer parente, decretar as providências que julgue
adequadas.
2.
Atendendo em especial ao valor dos bens, pode nomeadamente o tribunal exigir a
prestação de contas e de informações sobre a administração e estado do
património do filho e, quando estas providências não sejam suficientes, a
prestação de caução.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1920º-A
(Revogação ou alteração de decisões)
As
decisões que decretem providências ao abrigo do disposto nos artigos 1918º a
1920º podem ser revogadas ou alteradas a todo o tempo pelo tribunal que as
proferiu, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer dos pais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO VI
Registo das decisões relativas ao
poder paternal
ARTIGO 1920º-B
(Obrigatoriedade do registo)
Serão
oficiosamente comunicadas à repartição do registo civil competente a fim de
serem registadas:
a)
As decisões que regulem o exercício do poder paternal ou homologuem acordo
sobre esse exercício;
b)
As decisões que homologuem a reconciliação de cônjuges judicialmente separados
de pessoas e bens;
c)
As decisões que façam cessar a regulação do poder paternal em caso de
reconciliação de cônjuges separados de facto;
d)
As decisões que importem a inibição do exercício do poder paternal, o suspendam
provisoriamente ou estabeleçam providências limitativas desse poder.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1920º-C
(Consequência da falta do registo)
As
decisões judiciais a que se refere o artigo anterior não podem ser invocadas
contra terceiro de boa fé enquanto se não mostre efectuado o registo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO III
Meios de suprir o poder paternal
SUBSECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 1921º
(Menores sujeitos a tutela)
1.
O menor está obrigatoriamente sujeito a tutela:
a)
Se os pais houverem falecido;
b)
Se estiverem inibidos do poder paternal quanto à regência da pessoa do filho;
c)
Se estiverem há mais de seis meses impedidos de facto de exercer o poder
paternal;
d)
Se forem incógnitos.
2.
Havendo impedimento de facto dos pais, deve o Ministério Público tomar as
providências necessárias à defesa do menor, independentemente do decurso do
prazo referido na alínea c) de número anterior, podendo para o efeito promover
a nomeação de pessoa que, em nome do menor, celebre os negócios jurídicos que
sejam urgentes ou de que resulte manifesto proveito para este.
ARTIGO 1922º
(Administração de bens)
Será
instituido o regime de administração de bens do menor previsto nos artigos
1967º e seguintes:
a)
Quando os pais tenham sido apenas excluídos, inibidos ou suspensos da
administração de todos os bens do incapaz ou de alguns deles, se por outro
título se não encontrar designado o administrador;
b)
Quando a entidade competente para designar o tutor confie a outrem, no todo ou
em parte, a administração dos bens do menor.
ARTIGO 1923º
(Carácter oficioso da tutela e da administração)
1.
Sempre que o menor se encontre numa das situações previstas nos artigos
anteriores, deve o tribunal de menores promover oficiosamente a instauração da
tutela ou da administração de bens.
2.
Qualquer autoridade administrativa ou judicial, bem como os funcionários do
registo civil, que no exercício do cargo tenham conhecimento de tais situações
devem comunicar o facto ao tribunal competente.
ARTIGO 1924º
(Órgãos da tutela e da administração)
1.
A tutela é exercida por um tutor e pelo conselho de família.
2.
A administração de bens é exercida por um ou mais administradores e, se estiver
instaurada a tutela, pelo conselho de família.
ARTIGO 1925º
(Atribuições do tribunal de menores)
1.
Tanto a tutela como a administração de bens são exercidas sob a vigilância do
tribunal de menores.
2.
Ao tribunal de menores, além de outras atribuições fixadas na lei, compete
ainda, conforme os casos, confirmar ou designar os tutores, administradores de
bens e vogais do conselho de família.
ARTIGO 1926º
(Obrigatoriedade das funções tutelares)
Os
cargos de tutor, administrador de bens e vogal do conselho de família são
obrigatórios, não podendo ninguém ser deles escusado senão nos casos expressos
na lei.
SUBSECÇÃO II
Tutela
DIVISÃO I
Designação do tutor
ARTIGO 1927º
(Pessoas a quem compete a tutela)
O
cargo de tutor recairá sobre a pessoa designada pelos pais ou pelo tribunal de
menores.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1928º
(Tutor designado pelos pais)
1.
Os pais podem nomear tutor ao filho menor para o caso de virem a falecer ou se
tornarem incapazes; se apenas um dos progenitores exercer o poder paternal, a
ele pertencerá esse poder.
2.
Quando, falecido um dos progenitores que houver nomeado tutor ao filho menor,
lhe sobreviver o outro, a designação considera-se eficaz se não for revogada
por este no exercício do poder paternal.
3.
A designação do tutor e respectiva revogação só têm validade sendo feitas em
testamento ou em documento autêntico ou autenticado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1929º
(Designação de vários tutores)
Quando,
nos termos do artigo anterior, tiver sido designado mais de um tutor para o
mesmo filho, recairá a tutela em cada um dos designados segundo a ordem da
designação, quando a precedência entre eles não for de outro modo especificada.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1930º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1931º
(Tutor designado pelo tribunal)
1.
Quando os pais não tenham designado tutor ou este não haja sido confirmado,
compete ao tribunal de menores, ouvido o conselho de família, nomear o tutor de
entre os parentes ou afins do menor ou de entre as pessoas que de facto tenham
cuidado ou estejam a cuidar do menor ou tenham por ele demonstrado afeição.
2.
Antes de proceder à nomeação de tutor, deve o tribunal ouvir o menor que tenha
completado catorze anos.
(Redacção do Dec-Lei nº 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1932º
(Tutela de vários irmãos)
A
tutela respeitante a dois irmãos caberá, sempre que possível, a um só tutor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1933º
(Quem não pode ser tutor)
1.
Não podem ser tutores:
a)
Os menores não emancipados, os interditos e os inabilitados;
b)
Os notoriamente dementes, ainda que não estejam interditos ou inabilitados;
c)
As pessoas de mau procedimento ou que não tenham modo de vida conhecido;
d)
Os que tiverem sido inibidos ou se encontrarem total ou parcialmente suspensos
do poder paternal;
e)
Os que tiverem sido removidos ou se encontrarem suspensos de outra tutela ou do
cargo de vogal de conselho de família por falta de cumprimento das respectivas
obrigações;
f)
Os divorciados e os separados judicialmente de pessoas e bens por sua culpa;
g)
Os que tenham demanda pendente com o menor ou com seus pais, ou a tenham tido
há menos de cinco anos;
h)
Aquele cujos pais, filhos ou cônjuges tenham, ou hajam tido há menos de cinco
anos, demanda com o menor ou seus pais;
i)
Os que sejam inimigos pessoais do menor ou dos seus pais;
j)
Os que tenham sido excluídos pelo pai ou mãe do menor, nos mesmos termos em que
qualquer deles pode designar tutor;
l)
Os magistrados judiciais ou de Ministério Público que exerçam funções na
comarca do domicílio do menor ou na da situação dos seus bens.
2.
Os inabilitados por prodigalidade, os falidos ou insolventes, e bem assim os
inibidos ou suspensos do poder paternal ou removidos da tutela, quanto à
administração de bens, podem ser nomeados tutores, desde que sejam apenas
encarregados da guarda e regência da pessoa do menor.
ARTIGO 1934º
(Escusa da tutela)
1.
Podem escusar-se da tutela:
a)
O Presidente da República e os membros do governo;
b)
Os bispos e sacerdotes que tenham cura de almas, bem como os religiosos que
vivam em comunidade;
c)
Os militares em serviço activo;
d)
Os que residam fora da comarca onde o menor tem a maior parte dos bens, salvo
se a tutela compreender apenas a regência da pessoa do menor, ou os bens deste
forem de reduzido valor;
e)
Os que tiverem mais de três descendentes a seu cargo;
f)
Os que exerçam outra tutela ou curatela;
g)
Os que tenham mais de sessenta e cinco anos;
h)
Os que não sejam parentes ou afins em linha recta do menor, ou seus colaterais
até ao quarto grau;
i)
Os que, em virtude de doença, ocupações profissionais absorventes ou carência
de meios económicos, não possam exercer a tutela sem grave incómodo ou
prejuízo.
2.
O que for escusado da tutela pode ser compelido a aceitá-la, desde que cesse o
motivo da escusa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
DIVISÃO II
Direitos e obrigações do tutor
ARTIGO 1935º
(Princípios gerais)
1.
O tutor tem os mesmos direitos e obrigações dos pais, com as modificações e
restrições constantes dos artigos seguintes.
2.
O tutor deve exercer a tutela com a diligência de um bom pai de família.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1936º
(Rendimentos dos bens do pupilo)
O
tutor só pode utilizar os rendimentos dos bens do pupilo no sustento e educação
deste e na administração dos seus bens.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1937º
(Actos proibidos ao tutor)
É
vedado ao tutor:
a)
Dispor a título gratuito dos bens do menor;
b)
Tomar de arrendamento ou adquirir, directamente ou por interposta pessoa, ainda
que seja em hasta pública, bens ou direitos do menor, ou tornar-se cessionário
de créditos ou outros direitos contra ele, excepto nos casos de sub-rogação
legal, de licitação em processo de inventário ou de outorga em partilha
judicialmente autorizada;
c)
Celebrar em nome do pupilo contratos que o obriguem pessoalmente a praticar
certos actos, excepto quando as obrigações contraídas sejam necessárias à sua
educação, estabelecimento ou ocupação;
d)
Receber do pupilo, directamente ou por interposta pessoa, quaisquer
liberalidades, por acto entre vivos ou por morte, se tiverem sido feitas depois
da sua designação e antes da aprovação das respectivas contas, sem prejuízo do
disposto para as deixas testamentárias no nº 3 do artigo 2192º.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 1938º
(Actos dependentes da autorização do tribunal)
1.
O tutor, como representante do pupilo, necessita de autorização do tribunal:
a)
Para praticar qualquer dos actos mencionados no nº 1 do artigo 1889º;
b)
Para adquirir bens, móveis ou imóveis, como aplicação de capitais do menor;
c)
Para aceitar herança, doação ou legado, ou convencionar partilha extrajudicial;
d)
Para contrair ou solver obrigações, salvo quando respeitem a alimentos do menor
ou se mostrem necessárias à administração do seu património;
e)
Para intentar acções, salvas as destinadas à cobrança de prestações periódicas
e aquelas cuja demora possa causar prejuízo;
f)
Para continuar a exploração de estabelecimento comercial ou industrial que o
menor haja recebido por sucessão ou doação.
2.
O tribunal não concederá a autorização que lhe seja pedida sem previamente
ouvir o conselho de família.
3.
O disposto no nº 1 não prejudica o que é especialmente determinado em relação
aos actos praticados em processo de inventário.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 1939º
(Nulidade dos actos praticados pelo tutor)
1.
São nulos os actos praticados pelo tutor em contravenção do disposto no artigo
1937º; a nulidade não pode, porém, ser invocada pelo tutor ou seus herdeiros
nem pela interposta pessoa de quem ele se tenha servido.
2.
A nulidade é sanável mediante confirmação do pupilo, depois de maior ou
emancipado, mas somente enquanto não for declarada por sentença com trânsito em
julgado.
ARTIGO 1940º
(Outras sanções)
1.
Os actos practicados pelo tutor em contravenção do disposto nas alíneas a) a d)
do nº 1 do artigo 1938º podem ser anulados oficiosamente pelo tribunal durante
a menoridade do pupilo, ou a requerimento de qualquer vogal do conselho de
família ou do próprio pupilo, até cinco anos após a sua maioridade ou
emancipação.
2.
Os herdeiros do pupilo podem também requerer a anulação, desde que o façam
antes de decorrido igual período sobre o falecimento .
3.
Se o tutor intentar alguma acção em contravenção do disposto na alínea e) do nº
1 do artigo 1938º, deve o tribunal ordenar oficiosamente a suspensão da
instância, depois da citação, até que seja concedida a autorização necessária.
4.
Se o tutor continuar a explorar, sem autorização, o estabelecimento comercial
ou industrial do pupilo, é pessoalmente responsável por todos os danos, ainda
que acidentais, resultantes da exploração.
ARTIGO 1941º
(Confirmação dos actos pelo tribunal)
O
tribunal de menores, ouvido o conselho de família, pode confirmar os actos
praticados pelo tutor sem a necessária autorização.
ARTIGO 1942º
(Remuneração do tutor)
1.
O tutor tem direito a ser remunerado.
2.
Se a remuneração não tiver sido fixada pelos pais do menor no acto de
designação do tutor, será arbitrada pelo tribunal de menores, ouvido o conselho
de família, não podendo, em qualquer caso, exceder a décima parte dos
rendimentos líquidos dos bens do menor.
ARTIGO 1943º
(Relação dos bens do menor)
1.
O tutor é obrigado a apresentar uma relação do activo e do passivo do pupilo
dentro do prazo que lhe for fixado pelo tribunal de menores.
2.
Se o tutor for credor do menor, mas não tiver relacionado o respectivo crédito,
não lhe é licíto exigir o cumprimento durante a tutela, salvo provando que à
data da apresentação da relação ignorava a existência da dívida.
ARTIGO 1944º
(Obrigação de prestar contas)
1.
O tutor é obrigado a prestar contas ao tribunal de menores quando cessar a sua
gerência ou, durante ela, sempre que o tribunal o exigir.
2.
Sendo as contas prestadas no termo da gerência, o tribunal ouvirá o ex-pupilo
ou os seus herdeiros, se tiver terminado a tutela; no caso contrário, será
ouvido o novo tutor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1945º
(Responsabilidade do tutor)
1.
O tutor é responsável pelo prejuízo que por dolo ou culpa causar ao pupilo.
2.
Quando à vista das contas o tutor ficar alcançado, a importância do alcance
vence os juros legais desde a aprovação daquelas, se os não vencer por outra
causa desde data anterior.
ARTIGO 1946º
(Direito do tutor a ser indemnizado)
1.
Serão abonadas ao tutor as despesas que legalmente haja feito, ainda que delas,
sem culpa sua, nenhum proveito tenha provindo ao menor.
2.
O saldo a favor do tutor é satisfeito pelos primeiros rendimentos do menor;
ocorrendo, porém, despesas urgentes, de forma que o tutor se não possa
inteirar, vence juros o saldo, se não se prover de outro modo ao pronto
pagamento da dívida.
ARTIGO 1947º
(Contestação das contas aprovadas)
A
aprovação das contas não impede que elas sejam judicialmente impugnadas pelo
pupilo nos dois anos subsequentes à maioridade ou emancipação, ou pelos seus
herdeiros dentro do mesmo prazo, a contar do falecimento do pupilo, se este
falecer antes de decorrido o prazo que lhe seria concedido se fosse vivo.
DIVISÃO III
Remoção e exoneração do tutor
ARTIGO 1948º
(Remoção do tutor)
Pode
ser removido da tutela:
a)
O tutor que falte ao cumprimento dos deveres próprios do cargo ou revele
inaptidão para o seu exercício;
b)
O tutor que por facto superveniente à investidura no cargo se constitua nalguma
das situações que impediriam a sua nomeação.
ARTIGO 1949º
(Acção de remoção)
A
remoção do tutor é decretada pelo tribunal de menores, ouvido o conselho de
família, a requerimento do Ministério Público, de qualquer parente do menor, ou
da pessoa a cuja guarda este esteja confiado de facto ou de direito.
ARTIGO 1950º
(Exoneração do tutor)
O
tutor pode, a seu pedido, ser exonerado do cargo pelo tribunal de menores:
a)
Se sobrevier alguma das causas de escusa;
b)
Ao fim de três anos, nos casos em que o tutor se podia ter escusado a aceitar o
cargo, se subsistir a causa da escusa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
DIVISÃO IV
Conselho de família
ARTIGO 1951º
(Constituição)
O
conselho de família é constituído por dois vogais, escolhidos nos termos do
artigo seguinte, e pelo agente do Ministério Público, que preside.
ARTIGO 1952º
(Escolha dos vogais)
1.
Os vogais do conselho de família são escolhidos entre os parentes ou afins do
menor, tomando em conta, nomeadamente, a proximidade do grau, as relações de
amizade, as aptidões, a idade, o lugar de residência e o interesse manifestado
pela pessoa do menor.
2.
Na falta de parentes ou afins que possam ser designados nos termos do número
anterior, cabe ao tribunal escolher os vogais de entre os amigos dos pais,
vizinhos ou outras pessoas que possam interessar-se pelo menor.
3.
Sempre que possível, um dos vogais do conselho de família pertencerá ou
representará a linha paterna e o outro a linha materna do menor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1953º
(Incapacidade. Escusa)
1.
É aplicável aos vogais do conselho de família o disposto nos artigos 1933º e
1934º.
2.
É ainda fundamento de escusa o facto de o vogal designado residir fora do
território continental ou da ilha adjacente em que o menor tiver residência
habitual.
ARTIGO 1954º
(Atribuições)
Pertence
ao conselho de família vigiar o modo por que são desempenhadas as funções do
tutor e exercer as demais atribuições que a lei especialmente lhe confere.
ARTIGO 1955º
(Protutor)
1.
A fiscalização da acção do tutor é exercida com carácter permanente por um dos
vogais do conselho de família, denominado protutor.
2.
O protutor deve, sempre que possível, representar a linha de parentesco diversa
da do tutor.
3.
Se o tutor for irmão germano do menor ou cônjuge de irmão germano, ou se ambos
os vogais do conselho de família pertencerem à mesma linha de parentesco ou não
pertencerem a nenhuma delas, cabe ao tribunal a escolha do protutor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1956º
(Outras funções do protutor)
Além
de fiscalizar a acção do tutor, compete ao protutor:
a)
Cooperar com o tutor no exercício das funções tutelares, podendo encarregar-se
da administração de certos bens do menor nas condições estabelecidas pelo
conselho de família e com o acordo do tutor;
b)
Substituir o tutor nas suas faltas e impedimentos, passando, nesse caso, a
servir de protutor o outro vogal do conselho de família;
c)
Representar o menor em juízo ou fora dele, quando os seus interesses estejam em
oposição com os do tutor e o tribunal não haja nomeado curador especial.
ARTIGO 1957º
(Convocação do conselho)
1.
O conselho de família é convocado por determinação do tribunal ou do Ministério
Público, ou a requerimento de um dos vogais, do tutor, do administrador de
bens, de qualquer parente do menor, ou do próprio menor, quando tiver mais de
dezasseis anos.
2.
A convocação indicará o objecto principal da reunião e será enviada a cada um
dos vogais com oito dias de antecedência.
3.
Faltando algum dos vogais, o conselho será convocado para outro dia; se de novo
faltar algum dos vogais, as deliberações serão tomadas pelo Ministério Público,
ouvido o outro vogal, quando esteja presente.
4.
A falta injustificada às reuniões do conselho de família torna o faltoso responsável
pelos danos que o menor venha a sofrer.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1958º
(Funcionamento)
1.
Os vogais do conselho de família são obrigados a comparecer pessoalmente.
2.
O conselho de família pode deliberar que às suas reuniões ou a alguma delas
assista o tutor, o administrador de bens, qualquer parente do menor, o próprio
menor, ou ainda pessoa estranha à família cujo parecer seja útil; mas, em
qualquer caso, só os vogais do conselho têm voto.
3.
De igual faculdade goza o Ministério Público.
ARTIGO 1959º
(Gratuidade das funções)
O
exercício do cargo de vogal do conselho de família é gratuito.
ARTIGO 1960º
(Remoção e exoneração)
São
aplicáveis aos vogais do conselho de família, com as necessárias adaptações, as
disposições relativas à remoção e exoneração do tutor.
DIVISÃO V
Termo da tutela
ARTIGO 1961º
(Quando termina)
A
tutela termina:
a)
Pela maioridade, salvo o disposto no artigo 131º;
b)
Pela emancipação, salvo o disposto no artigo 1649º;
c)
Pela adopção;
d)
Pelo termo da inibição do poder paternal;
e)
Pela cessação do impedimento dos pais;
f)
Pelo estabelecimento da maternidade ou paternidade.
(Redacção do Dec-Lei 496/77, de 25-11)
DIVISÃO VI
Tutela de menores confiados a
estabelecimentos
de educação ou assistência
ARTIGO 1962º
(Exercício da tutela)
1.
Quando não exista pessoa em condições de exercer a tutela, o menor é confiado à
assistência pública, nos termos da respectiva legislação, exercendo as funções
de tutor o director do estabelecimento público ou particular, onde tenha sido
internado.
2.
Neste caso, não existe conselho de família nem é nomeado protutor.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 1963º A 1966º
(Revogados pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SUBSECÇÃO III
Administração de bens
ARTIGO 1967º
(Designação do administrador)
Quando
haja lugar à instituição da
administração de bens do menor nos termos do artigo
1922º, são aplicáveis à
designação do administrador as disposições
relativas à
nomeação do tutor, salvo o preceituado nos artigos
seguintes.
ARTIGO 1968º
(Designação por terceiro)
Ao
autor de doação ou deixa em benefício de menor é lícita a designação de
administrador, mas só com relação aos bens compreendidos na liberalidade.
ARTIGO 1969º
(Pluralidade de administradores)
1.
Tendo os pais ou terceiro designado vários administradores e tendo sido
determinados os bens cuja administração compete a cada um deles, não é
aplicável o critério da preferência pela ordem da designação.
2.
O tribunal de menores pode também designar vários administradores, determinando
os bens que a cada um compete administrar.
ARTIGO 1970º
(Quem não pode ser administrador)
Além
das pessoas que a lei impede de serem tutores, não podem ser administradores:
a)
Os inabilitados por prodigalidade, os falidos ou insolventes, e bem assim os
inibidos ou suspensos do poder paternal ou removidos da tutela quanto à
administração de bens;
b)
Os condenados como autores ou cúmplices dos crimes de furto, roubo, burla,
abuso de confiança, falência ou insolvência fraudulenta e, em geral, de crimes
dolosos contra a propriedade.
ARTIGO 1971º
(Direitos e deveres do administrador)
1.
No âmbito da sua administração, o administrador tem os direitos e deveres do
tutor.
2.
O administrador é o representante legal do menor nos actos relativos aos bens
cuja administração lhe pertença.
3.
O administrador deve abonar aos pais ou tutor, por força dos rendimentos dos
bens, as importâncias necessárias aos alimentos do menor.
4.
As divergências entre o administrador e os pais ou tutor são decididas pelo
tribunal de menores, ouvido o conselho de família, se o houver.
ARTIGO 1972º
(Remoção e exoneração. Termo da administração)
São
aplicáveis ao administrador, com as necessárias adaptações, as disposições relativas
à remoção e exoneração do tutor e ao termo da tutela.
TÍTULO IV
DA ADOPÇÃO
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 1973º
(Constituição)
1.
O vínculo da adopção constitui-se por sentença judicial.
2.
O processo será instruído com um inquérito, que deverá incidir, nomeadamente,
sobre a personalidade e a saúde do adoptante e do adoptando, a idoneidade do
adoptante para criar e educar o adoptando, a situação familiar e económica do
adoptante e as razões determinantes do pedido de adopção.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25 de Novembro)
ARTIGO 1974º
(Requisitos gerais)
Redacção anterior: 1.
A adopção apenas será decretada quando apresente reais vantagens para o
adoptando, se funde em motivos legítimos, não envolva sacrifício injusto para
os outros filhos do adoptante e seja razoável supor que entre o adoptante e o
adoptando se estabelecerá um vínculo semelhante ao da filiação.
2.
O adoptando deverá ter estado ao cuidado do adoptante durante prazo suficiente
para se poder avaliar da conveniência da constituição do vínculo.
(Redacção do Dec.-Lei 185/93, de 22-5)
ARTIGO 1975º
(Proibição de várias adopções do mesmo adoptado)
Enquanto
subsistir uma adopção não pode constituir-se outra quanto ao mesmo adoptado,
excepto se os adoptantes forem casados um com o outro.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1976º
(Adopção pelo tutor ou administrador legal de bens)
O
tutor ou administrador legal de bens só pode adoptar o menor depois de
aprovadas as contas da tutela ou administração de bens e saldada a sua
responsabilidade.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1977º
(Espécies de adopção)
1.
A adopção é plena ou restrita, consoante a extensão dos seus efeitos.
2.
A adopção restrita pode a todo o tempo, a requerimento dos adoptantes, ser
convertida em adopção plena, desde que se verifiquem os requisitos para esta
exigidos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1978º
(Confiança com vista a futura adopção)
1.
1 — Com vista a futura adopção, o tribunal pode
confiar o menor a casal, a pessoa singular ou a
instituição quando não existam ou se encontrem
seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios
da filiação, pela verificação objectiva de
qualquer das seguintes situações: (Redacção
da Lei 31/2003, de 22/08)
a)
Se o menor for filho de pais incógnitos ou falecidos;
b)
Se tiver havido consentimento prévio para a adopção;
c)
Se os pais tiverem abandonado o menor;
4.
A confiança com fundamento nas situações previstas nas alíneas a), c), d) e e)
do número anterior não pode ser decidida se o menor se encontrar a viver com
ascendente, colateral até ao 3º grau ou tutor e a seu cargo, salvo se aqueles
familiares ou o tutor puserem em perigo, de forma grave, a segurança, a saúde,
a formação moral ou a educação do menor ou se o tribunal concluir que a
situação não é adequada a assegurar suficientemente o interesse do menor. *
5.
Têm legitimidade para requerer a confiança judicial do menor o Ministério
Público, o organismo de segurança social da área da residência do menor, a
pessoa a quem o menor tenha sido administrativamente confiado e o director do
estabelecimento público ou a direcção da instituição particular que o tenha
acolhido.
6 — Têm ainda legitimidade para requerer a confiança judicial do menor:
a) O candidato a adoptante seleccionado pelos serviços
competentes, quando, por virtude de anterior decisão judicial,
tenha o menor a seu cargo;
b) O candidato a adoptante seleccionado pelos serviços
competentes, quando, tendo o menor a seu cargo e reunidas as
condições para a atribuição da
confiança administrativa, o organismo
de segurança social não decida pela
confirmação da permanência do menor, depois de
efectuado o estudo da pretensão para a adopção ou
decorrido o prazo para esse efeito.
(Redacção da Lei 31/2003, de 22/08)
* (Decreto-Lei nº 120/98, de 08-05)
Decretada a confiança judicial do menor ou a medidade promoção e protecção de confiança a pessoa seleccionada para a adopção ou a instituição com vista a
futura adopção, ficam os pais inibidos do exercício do poder paternal.»
CAPÍTULO II
Adopção plena
ARTIGO 1979º
(Quem pode adoptar plenamente)
1 - Podem adoptar plenamente duas pessoas
casadas há mais de 4 anos e não separadas judicialmente de pessoas
e bens ou de facto, se ambas tiverem
mais de 25 anos.
2 - Pode ainda adoptar plenamente quem tiver mais de 30 anos ou, se o adoptando for filho do cônjuge do adoptante, mais de 25 anos.
3 — Só pode adoptar plenamente quem não tiver mais de 60 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado, mediante confiança administrativa, confiança judicial ou medida de promoção e protecção de confiança a pessoa seleccionada para a adopção, sendo que a partir dos 50 anos a diferença de idades entre o adoptante e o adoptando não poderá ser superior a 50 anos.
4 — Pode, no entanto, a diferença de idades ser superior a 50 anos quando, a título excepcional, motivos ponderosos o justifiquem, nomeadamente por se tratar de uma fratria em que relativamente apenas a algum ou alguns dos irmãos se verifique uma diferença de idades superior àquela.
5 — O disposto no n.o 3 não se aplica quando o adoptando for filho do cônjuge do adoptante.
(Redacção da Lei nº 31/2003, de 22/08)
ARTIGO 1980º
(Quem pode ser adoptado plenamente)
1
— Podem ser adoptados plenamente os menores filhos do
cônjuge do adoptante e aqueles que tenham sido confiados ao
adoptante mediante confiança administrativa, confiança
judicial ou medida de promoção e protecção
de confiança a pessoa seleccionada para a adopção.
2.
O adoptando deve ter menos de 15 anos à data da petição judicial de adopção;
poderá, no entanto, ser adoptado quem, a essa data, tenha menos de 18 anos e
não se encontre emancipado quando, desde idade não superior a 15 anos, tenha
sido confiado aos adoptantes ou a um deles ou quando for filho do cônjuge do
adoptante. *
(Redacção da Lei 31/2003, de 22/08)
* (Decreto-Lei n.º120/98, de 8-05)
ARTIGO 1981º
(Consentimento para a adopção)
1.
É necessário para a adopção o consentimento:
a)
Do adoptando maior de 12 anos; *
b)
Do cônjuge do adoptante não separado judicialmente de pessoas e bens;
c)
Dos pais do adoptando, ainda que menores e mesmo que não
exerçam o poder paternal, desde que não tenha havido
confiança judicial nem medida de promoção e
protecção de confiança
a pessoa ou a instituição com vista a futura adopção;*
d)
Do ascendente, do colateral até ao 3º grau ou do tutor, quando, tendo falecido
os pais do adoptando, tenha este a seu cargo e com ele viva. *
2
— No caso previsto no n.o 2 do artigo 1978.o, tendo a
confiança fundamento nas situações previstas nas
alíneas c), d) e e) do n.o 1 do mesmo artigo, não
é exigido o consentimento dos pais, mas é
necessário o do parente aí referido ou do tutor, desde
que não tenha havido confiança judicial nem medida de
promoção e protecçãode confiança a
pessoa ou a instituição com vista a futura
adopção.*
3 - O tribunal pode dispensar o
consentimento:
a) Das pessoas que o deveriam prestar nos
termos dos números anteriores, se estiverem privadas do uso das faculdades
mentais ou se, por qualquer outra razão, houver grave dificuldade em as ouvir;
*
b) Das pessoas referidas nas alíneas c) e
d) do n. 1 e no n.º 2, quando se
verificar alguma das situações que, nos termos das alíneas c), d) e e) do n. 1 e do n.º 2 do artigo 1978., permitiriam
a confiança judicial; *
c) Dos pais do adoptando inibidos do exercício do poder paternal, quando, passados 18 ou 6
meses, respectivamente, sobre
o trânsito em julgado
da sentença de inibição ou da que houver desatendido outro pedido,
o Ministério Público ou aqueles não
tenham solicitado o levantamento da inibição decretada pelo tribunal, nos
termos do disposto no n.º 2 do artigo 1916.º *
(Redacção do Dec.-Lei 185/93, de 22-5)
* Redacção da Lei 31/2003, de 22/08
ARTIGO 1982º
(Forma e tempo do consentimento)
1.
O consentimento reportar-se-á inequivocamente à adopção plena e será prestado
perante o juíz, que deve esclarecer o declarante sobre o significado e os
efeitos do acto.
2.
O consentimento pode ser prestado independentemente da instauração do processo de
adopção, não sendo necessária a identificação do futuro adoptante. *
3.
A mãe não pode dar o seu consentimento antes de decorridas seis semanas após o
parto.
(Redacção do Dec.-Lei 185/93, de 22-5)
* (Decreto-Lei n.º120/98, de 8-05)
ARTIGO 1983º
(Caducidade do consentimento)
O consentimento caduca se, no prazo de três anos, o menor
não tiver sido adoptado nem confiado mediante confiança
administrativa, confiança judicial ou medida de
promoção e protecção de confiança a
pessoa ou ainstituição com vista a futura
adopção.
(Redacção da Lei 31/2003, de 22/08)
ARTIGO 1984º
(Audição obrigatória)
O
juíz deverá ouvir:
a) Os filhos do adoptante maiores de 12 anos; (Decreto-Lei n.º120/98, de 8-05)
b)
Os ascendentes ou, na sua falta, os irmãos maiores do progenitor falecido, se o
adoptando for filho do cônjuge do adoptante e o seu consentimento não for
necessário, salvo se estiverem privados das faculdades mentais ou se, por
qualquer outra razão, houver grave dificuldade em os ouvir.
(Redacção do Dec.-Lei 185/93, de 22-5)
ARTIGO 1985º
(Segredo da identidade)
1.
A identidade do adoptante não pode ser revelada aos pais naturais do adoptado,
salvo se aquele declarar expressamente que não se opõe a essa revelação.
2.
Os pais naturais do adoptado podem opor-se, mediante declaração expressa, a que
a sua identidade seja revelada ao adoptante.
(Redacção do Dec.-Lei 185/93, de 22-5)
ARTIGO 1986º
(Efeitos)
1.
Pela adopção plena o adoptado adquire a situação de filho do adoptante e
integra-se com os seus descendentes na família deste, extinguindo-se as
relações familiares entre o adoptado e os seus ascendentes e colaterais
naturais, sem prejuízo do disposto quanto a impedimentos matrimoniais nos
artigos 1602º a 1604º.
2.
Se um dos cônjuges adopta o filho do outro mantêm-se as relações entre o
adoptado e o cônjuge do adoptante e os respectivos parentes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1987º
(Estabelecimento e prova da filiação natural)
Depois
de decretada a adopção plena não é possível estabelecer a filiação natural do
adoptado nem fazer a prova dessa filiação fora do processo preliminar de
publicações.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1988º
(Nome próprio e apelidos do adoptado)
1.
O adoptado perde os seus apelidos de origem, sendo o seu novo nome constituído,
com as necessárias adaptações, nos termos do artigo 1875º.
2.
A pedido do adoptante, pode o tribunal, excepcionalmente, modificar o nome
próprio do menor, se a modificação salvaguardar o seu interesse, nomeadamente o
direito à identidade pessoal, e favorecer a integração na família.
(Redacção do Dec.-Lei 185/93, de 22-5)
ARTIGO 1989º
(Irrevogabilidade da adopção plena)
A
adopção plena não é revogável nem sequer por acordo do adoptante e do adoptado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1990º
(Revisão da sentença)
1.
A sentença que tiver decretado a adopção só é susceptível de revisão:
a)
Se tiver faltado o consentimento do adoptante ou dos pais do adoptado, quando
necessário e não dispensado;
b)
Se o consentimento dos pais do adoptado tiver sido indevidamente dispensado,
por não se verificarem as condições do nº 3 do artigo 1981º;
c)
Se o consentimento do adoptante tiver sido viciado por erro desculpável e
essencial sobre a pessoa do adoptado;
d)
Se o consentimento do adoptante ou dos pais do adoptado tiver sido determinado
por coacção moral, contanto que seja grave o mal com que eles foram
ilicitamente ameaçados e justificado o receio da sua consumação;
e)
Se tiver faltado o consentimento do adoptado, quando necessário.
2.
O erro só se considera essencial quando for de presumir que o conhecimento da
realidade excluiria razoavelmente a vontade de adoptar.
3.
A revisão não será, contudo, concedida quando os interesses do adoptado possam
ser consideravelmente afectados, salvo se razões invocadas pelo adoptante
imperiosamente o exigirem.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1991º
(Legitimidade e prazo para a revisão)
1.
A revisão nos termos do nº 1 do artigo anterior pode ser pedida:
a)
No caso das alíneas a) e b), pelas pessoas cujo consentimento faltou, no prazo
de seis meses a contar da data em que tiveram conhecimento da adopção;
b)
No caso das alíneas c) e d), pelas pessoas cujo consentimento foi viciado,
dentro dos seis meses subsequentes à cessação do vício;
c)
No caso da alínea e), pelo adoptado, até seis meses a contar da data em que ele
atingiu a maioridade ou foi emancipado.
2.
No caso das alíneas a) e b) do número anterior, o pedido de revisão não poderá
ser deduzido decorridos três anos sobre a data do trânsito em julgado da
sentença que tiver decretado a adopção.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO III
Adopção restrita
ARTIGO 1992º
(Quem pode adoptar restritamente)
1 - Pode adoptar restritamente quem tiver
mais de 25 anos.
2
— Só pode adoptar restritamente quem não tiver mais
de 60 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado,
mediante confiança administrativa, confiança judicial ou
medida de promoção e protecção de
confiança a pessoa seleccionada para a adopção,
salvo se o adoptando for filho do cônjuge do adoptante.
(Redacção da Lei 31/2003, de 22/08)
ARTIGO 1993º
(Disposições aplicáveis)
1.
É aplicável à adopção restrita, com
as necessárias adaptações, o disposto nos
artigos 1980º a 1984º, 1990º e 1991º.
2.
Se o consentimento dos pais do adoptando tiver sido prestado nos termos do nº 2
do artigo 1982º e dele não resultar inequivocamente qual o tipo de adopção para
que foi concedido, entender-se-á que o foi para a adopção restrita.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1994º
(O adoptado e a família natural)
O
adoptado conserva todos os direitos e deveres em relação à família natural,
salvas as restrições estabelecidas na lei.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1995º
(Apelidos do adoptado)
O
juíz poderá atribuir ao adoptado, a requerimento do adoptante, apelidos deste,
compondo um novo nome em que figurem um ou mais apelidos da família natural.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1996º
(Direitos sucessórios e prestação de alimentos)
O
adoptado, ou seus descendentes, e os parentes do adoptante não são herdeiros
legítimos ou legitimários uns dos outros, nem ficam reciprocamente vinculados à
prestação de alimentos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1997º
(Poder paternal)
Cabe
exclusivamente ao adoptante, ou ao adoptante e ao seu cônjuge, se este for pai
ou mãe do adoptado, o exercício do poder paternal, com todos os direitos e
obrigações dos pais, salvo o disposto no artigo seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1998º
(Rendimentos dos bens do adoptado)
O
adoptante só poderá despender dos rendimentos dos bens do adoptado a quantia
que o tribunal fixar para alimentos deste.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 1999º
(Direitos sucessórios)
1.
O adoptado não é herdeiro legitimário do adoptante, nem este daquele.
2.
O adoptado e, por direito de representação, os seus descendentes são chamados à
sucessão como herdeiros legítimos do adoptante, na falta de cônjuge,
descendentes ou ascendentes.
3.
O adoptante é chamado à sucessão como herdeiro legítimo do adoptado ou de seus
descendentes, na falta de cônjuge, descendentes, ascendentes, irmãos e
sobrinhos do falecido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2000º
(Alimentos)
1.
O adoptado ou os seus descendentes são obrigados a prestar alimentos ao
adoptante, na falta de cônjuge, descendentes ou ascendentes em condições de
satisfazer esse encargo.
2.
O adoptante considera-se ascendente em primeiro grau do adoptado para efeitos
da obrigação de lhe prestar alimentos, precedendo os pais naturais na ordem
estabelecida no nº 1 do artigo 2009º; o adoptante não precede, no entanto, o
progenitor do adoptado com quem seja casado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2001º
(Reconhecimento superveniente)
Os
efeitos da adopção não são prejudicados pelo facto de vir a ser estabelecida a
filiação natural do adoptado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º
(Relação dos bens do adoptado)
1.
Nos trinta dias subsequentes à notificação da sentença que decretar a adopção,
o adoptante deve apresentar no tribunal, se este o julgar necessário, relação
dos bens do adoptado.
2.
Sempre que o adoptado, sendo menor ou incapaz, adquira novos bens ou haja
sub-rogação dos existentes, pode o tribunal exigir que seja apresentada relação
complementar.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-A
(Prestação de contas pelo adoptante)
O
adoptante deve prestar contas da sua administração sempre que o tribunal lho
exija a requerimento do Ministério Público, dos pais naturais ou do próprio
adoptado, até dois anos depois de atingir a maioridade ou ter sido emancipado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-B
(Revogação)
A
adopção é revogável a requerimento do adoptante ou do adoptado, quando se
verifique alguma das ocorrências que justificam a deserdação dos herdeiros
legitimários.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-C
(Revogação a requerimento de outras pessoas)
Sendo
o adoptado menor, a revogação da adopção pode ser decretada a pedido dos pais
naturais, do Ministério Público ou da pessoa a cujo cuidado estava o adoptado
antes da adopção, quando se verifique alguma das seguintes circunstâncias:
a)
Deixar o adoptante de cumprir os deveres inerentes ao poder paternal.
b)
Tornar-se a adopção, por qualquer causa, inconveniente para a educação ou os
interesses do adoptado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2002º-D
(Efeitos da revogação)
1.
Os efeitos da adopção cessam com o trânsito em julgado da sentença que a
revogue.
2.
Se, no caso de a revogação ser pedida pelo adoptante ou pelo adoptado, a
sentença transitar em julgado depois da morte do requerente, o adoptado e seus
ascendentes, ou o adoptante, conforme os casos, haver-se-ão por excluídos da
sucessão legítima ou testamentária, de quem requereu a revogação, e devolverão
aos herdeiros os bens recebidos e os sub-rogados no lugar destes, sem prejuízo
das disposições testamentárias do requerente posteriores ao pedido de
revogação.
3.
A doação feita ao adoptado ou a seus descendentes pelo adoptante, ou a este
pelo adoptado, caduca no caso de a revogação ter sido pedida, respectivamente,
pelo adoptante ou pelo adoptado, excepto se o doador, depois de pedida a
revogação, confirmar a liberalidade por documento autêntico ou autenticado.
(Redacção do Dec.-Lei nº 496/77, de 25-11)
TÍTULO V
DOS ALIMENTOS
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2003º
(Noção)
1.
Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e
vestuário.
2.
Os alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de
este ser menor.
ARTIGO 2004º
(Medida dos alimentos)
1.
Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e
à necessidade daquele que houver de recebê-los.
2.
Na fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o
alimentando prover à sua subsistência.
ARTIGO 2005º
(Modo de os prestar)
1.
Os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se
houver acordo ou disposição legal em contrário, ou se ocorrerem motivos que
justifiquem medidas de excepção.
2.
Se, porém, aquele que for obrigado aos alimentos mostrar que os não pode
prestar como pensão, mas tão-somente em sua casa e companhia, assim poderão ser
decretados.
ARTIGO 2006º
(Desde quando são devidos)
Os
alimentos são devidos desde a proposição da acção ou, estando já fixados pelo
tribunal ou por acordo, desde o momento em que o devedor se constituíu em mora,
sem prejuízo no disposto no artigo 2273º.
ARTIGO 2007º
(Alimentos provisórios)
1.
Enquanto se não fixarem definitivamente os alimentos, pode o tribunal, a
requerimento do alimentando, ou oficiosamente se este for menor, conceder
alimentos provisórios, que serão taxados segundo o seu prudente arbítrio.
2.
Não há lugar, em caso algum, à restituição dos alimentos provisórios recebidos.
ARTIGO 2008º
(Indisponibilidade e impenhorabilidade)
1.
O direito a alimentos não pode ser renunciado ou cedido, bem que estes possam
deixar de ser pedidos e possam renunciar-se as prestações vencidas.
2.
O crédito de alimentos não é penhorável, e o obrigado não pode livrar-se por
meio de compensação, ainda que se trate de prestações já vencidas.
ARTIGO 2009º
(Pessoas obrigadas a alimentos)
1.
Estão vinculados à prestação de alimentos, pela ordem indicada:
a)
O cônjuge ou o ex-cônjuge;
b)
Os descendentes;
c)
Os ascendentes;
d)
Os irmãos;
e)
Os tios, durante a menoridade do alimentando;
f)
O padrasto e a madrasta, relativamente a enteados menores que estejam, ou
estivessem no momento da morte do cônjuge, a cargo deste.
2
. Entre as pessoas designadas nas alíneas b) e c) do número anterior, a
obrigação defere-se segundo a ordem da sucessão legítima.
3.
Se algum dos vinculados não puder prestar os alimentos ou não puder saldar
integralmente a sua responsabilidade, o encargo recai sobre os onerados
subsequentes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2010º
(Pluralidade de vinculados)
1.
Sendo várias as pessoas vinculadas à prestação de alimentos, respondem todas na
proporção das suas quotas como herdeiros legítimos do alimentando.
2.
Se alguma das pessoas assim oneradas não puder satisfazer a parte que lhe cabe,
o encargo recai sobre as restantes.
ARTIGO 2011º
(Doações)
1.
Se o alimentando tiver disposto de bens por doação, as pessoas designadas nos
artigos anteriores não são obrigadas à prestação de alimentos, na medida em que
os bens doados pudessem assegurar ao doador meios de subsistência.
2.
Neste caso, a obrigação alimentar recai, no todo ou em parte, sobre o donatário
ou donatários, segundo a proporção do valor dos bens doados; esta obrigação
transmite-se aos herdeiros do donatário.
ARTIGO 2012º
(Alteração dos alimentos fixados)
Se,
depois de fixados os alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as
circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos
taxados ser reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas
serem obrigadas a prestá-los.
ARTIGO 2013º
(Cessação da obrigação alimentar)
1.
A obrigação de prestar alimentos cessa:
a)
Pela morte do obrigado ou alimentado;
b)
Quando aquele que os presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os
recebe deixe de precisar deles;
c)
Quando o credor viole gravemente os seus deveres para com o obrigado.
2.
A morte do obrigado ou a impossibilidade de este continuar a prestar alimentos
não priva o alimentado de exercer o seu direito em relação a outros, igual ou
sucessivamente onerados.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2014º
(Outras obrigações alimentares)
1.
À obrigação alimentar que tenha por fonte um negócio jurídico são aplicáveis,
com as necessárias correcções, as disposições deste capítulo, desde que não
estejam em oposição com a vontade manifestada ou com disposições especiais da
lei.
2.
As disposições deste capítulo são ainda aplicáveis a todos os outros casos de
obrigação alimentar imposta por lei, na medida em que possam ajustar-se aos
respectivos preceitos.
CAPÍTULO II
Disposições especiais
ARTIGO 2015º
(Obrigação alimentar relativamente a cônjuges)
Na
vigência da sociedade conjugal, os cônjuges são reciprocamente obrigados à
prestação de alimentos, nos termos do artigo 1675º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2016º
(Divórcio e separação judicial de pessoas e bens)
1.
Têm direito a alimentos, em caso de divórcio:
a)
O cônjuge não considerado culpado ou, quando haja culpa de ambos, não
considerado principal culpado na sentença de divórcio, se este tiver sido
decretado com fundamento no artigo 1779º ou nas alíneas a) ou b) do artigo
1781º;
b)
O cônjuge réu, se o divórcio tiver sido decretado com fundamento na alínea c)
do artigo 1781º;
c)
Qualquer dos cônjuges se o divórcio tiver sido decretado por mútuo
consentimento ou se, tratando-se de divórcio litigioso, ambos forem
considerados igualmente culpados.
2.
Excepcionalmente, pode o tribunal, por motivos de equidade, conceder alimentos
ao cônjuge que a eles não teria direito, nos termos do número anterior,
considerando, em particular, a duração do casamento e a colaboração prestada
por esse cônjuge à economia do casal.
3.
Na fixação do montante dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a idade e
estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e
possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação
de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos e, de modo geral, todas as
circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os
alimentos e as possibilidades do que os presta.
4.
O disposto nos números anteriores é aplicável ao caso de ter sido decretada a
separação judicial de pessoas e bens.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2017º
(Casamento declarado nulo ou anulado)
Tendo
sido declarado nulo ou anulado o casamento, o cônjuge de boa fé conserva o
direito a alimentos após o trânsito em julgado ou o averbamento da decisão
respectiva.
ARTIGO 2018º
(Apanágio do cônjuge sobrevivo)
1.
Falecendo um dos cônjuges, o viúvo tem direito a ser alimentado pelos
rendimentos dos bens deixados pelo falecido.
2.
São obrigados, neste caso, à prestação dos alimentos os herdeiros ou legatários
a quem tenham sido transmitidos os bens, segundo a proporção do respectivo
valor.
3.
O apanágio deve ser registado, quando onere coisas imóveis, ou coisas móveis
sujeitas a registo.
ARTIGO 2019º
(Cessação da obrigação alimentar)
Em
todos os casos referidos nos artigos anteriores, cessa o direito a alimentos se
o alimentado contrair novo casamento, ou se tornar indigno do benefício pelo
seu comportamento moral.
ARTIGO 2020º
(União de facto)
1.
Aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente
de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às
dos cônjuges, tem direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não
puder obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º.
2.
O direito a que se refere o número precedente caduca se não for exercido nos
dois anos subsequentes à data da morte do autor da sucessão.
3.
É aplicável ao caso previsto neste artigo, com as necessárias adaptações, o
disposto no artigo anterior.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 2021º A 2023º
(Revogados pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
LIVRO V
DIREITO DAS SUCESSÕES
TÍTULO I
DAS SUCESSÕES EM GERAL
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2024º
(Noção)
Diz-se
sucessão o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações
jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos
bens que a esta pertenciam.
ARTIGO 2025º
(Objecto da sucessão)
1.
Não constituem objecto de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se
por morte do respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei.
2.
Podem também extinguir-se à morte do titular, por vontade deste, os direitos
renunciáveis.
ARTIGO 2026º
(Títulos de vocação sucessória)
A
sucessão é deferida por lei, testamento ou contrato.
ARTIGO 2027º
(Espécies de sucessão legal)
A
sucessão legal é legítima ou legitimária, conforme possa ou não ser afastada
pela vontade do seu autor.
ARTIGO 2028º
(Sucessão contratual)
1.
Há sucessão contratual quando, por contrato, alguém renúncia à sucessão de
pessoa viva, ou dispõe da sua própria sucessão ou da sucessão de terceiro ainda
não aberta.
2.
Os contratos sucessórios apenas são admitidos nos casos previstos na lei, sendo
nulos todos os demais, sem prejuízo no disposto no nº 2 do artigo 946º.
ARTIGO 2029º
(Partilha em vida)
1.
Não é havido por sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos,
com ou sem reserva de usufruto, de todos os seus bens ou parte deles a algum ou
alguns dos presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e
os donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que
proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.
2.
Se sobrevier ou se tornar conhecido outro presumido herdeiro legitimário, pode
este exigir que lhe seja composta em dinheiro a parte correspondente.
3.
As tornas em dinheiro, quando não sejam logo efectuados os pagamentos, estão
sujeitas a actualização nos termos gerais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2030º
(Espécie de sucessores)
1.
Os sucessores são herdeiros ou legatários.
2.
Diz-se herdeiro o que sucede na totalidade ou numa quota do património do
falecido e legatário o que sucede em bens ou valores determinados.
3.
É havido como herdeiro o que sucede no remanescente dos bens do falecido, não
havendo especificação destes.
4.
O usufrutuário, ainda que o seu direito incida sobre a totalidade do
património, é havido como legatário.
5.
A qualificação dada pelo testador aos seus sucessores não lhes confere o título
de herdeiro ou legatário em contravenção do disposto nos números anteriores.
CAPÍTULO II
Abertura da sucessão e chamamento
dos herdeiros e legatários
SECÇÃO I
Abertura da sucessão
ARTIGO 2031º
(Momento e lugar)
A
sucessão abre-se no momento da morte do seu autor e no lugar do último
domicílio dele.
ARTIGO 2032º
(Chamamento de herdeiros e legatários)
1.
Aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das relações jurídicas do
falecido aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde
que tenham a necessária capacidade.
2.
Se os primeiros sucessíveis não quiserem ou não puderem aceitar, serão chamados
os subsequentes, e assim sucessivamente; a devolução a favor dos últimos
retrotrai-se ao momento da abertura da sucessão.
SECÇÃO II
Capacidade sucessória
ARTIGO 2033º
(Princípios gerais)
1.
Têm capacidade sucessória, além do Estado, todas as pessoas nascidas ou
concebidas ao tempo da abertura da sucessão, não exceptuadas por lei.
2.
Na sucessão testamentária ou contratual têm ainda capacidade:
a)
Os nascituros não concebidos, que sejam filhos de pessoa determinada, viva ao
tempo da abertura da sucessão;
b)
As pessoas colectivas e as sociedades.
ARTIGO 2034º
(Incapacidade por indignidade)
Carecem
de capacidade sucessória, por motivo de indignidade:
a)
O condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não
consumado, contra o autor da sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente,
ascendente, adoptante ou adoptado;
b)
O condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas
pessoas, relativamente a crime a que corresponda pena de prisão superior a dois
anos, qualquer que seja a sua natureza;
c)
O que por meio de dolo ou coacção induziu o autor da sucessão a fazer, revogar
ou modificar o testamento, ou disso o impediu;
d)
O que dolosamente subtraíu, ocultou, inutilizou, falsificou ou suprimiu o
testamento, antes ou depois da morte do autor da sucessão, ou se aproveitou de
algum desses factos.
ARTIGO 2035º
(Momento da condenação e do crime)
1.
A condenação a que se referem as alíneas a) e b) do artigo anterior pode ser
posterior à abertura da sucessão, mas só o crime anterior releva para o efeito.
2.
Estando dependente de condição suspensiva a instituição de herdeiro ou a
nomeação de legatário, é relevante o crime cometido até à verificação da
condição.
ARTIGO 2036º
(Declaração de indignidade)
A
acção destinada a obter a declaração de indignidade pode ser intentada dentro
do prazo de dois anos a contar da abertura da sucessão, ou dentro de um ano a
contar, quer da condenação pelos crimes que a determinam, quer do conhecimento
das causas de indignidade previstas nas alíneas c) e d) do artigo 2034º.
ARTIGO 2037º
(Efeitos da indignidade)
1.
Declarada a indignidade, a devolução da sucessão ao indigno é havida como
inexistente, sendo ele considerado, para todos os efeitos, possuidor de má fé
dos respectivos bens.
2.
Na sucessão legal, a capacidade do indigno não prejudica o direito de
representação dos seus descendentes.
ARTIGO 2038º
(Reabilitação do indigno)
1.
O que tiver incorrido em indignidade, mesmo que esta já tenha sido
judicialmente declarada, readquire a capacidade sucessória, se o autor da sucessão
expressamente o reabilitar em testamento ou escritura pública.
2.
Não havendo reabilitação expressa, mas sendo o indigno contemplado em
testamento quando o testador já conhecia a causa da indignidade, pode ele
suceder dentro dos limites da disposição testamentária
SECÇÃO III
Direito de representação
ARTIGO 2039º
(Noção)
Dá-se
a representação sucessória, quando a lei chama os descendentes de um herdeiro
ou legatário a ocupar a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a
herança ou o legado.
ARTIGO 2040º
(Âmbito da representação)
A
representação tanto se dá na sucessão legal como na testamentária, mas com as
restrições constantes dos artigos seguintes.
ARTIGO 2041º
(Representação na sucessão testamentária)
1.
Gozam do direito de representação na sucessão testamentária os descendentes do
que faleceu antes do testador ou do que repudiou a herança ou o legado, se não
houver outra causa de caducidade da vocação sucessória.
2.
A representação não se verifica:
a)
Se tiver sido designado substituto ao herdeiro ou legatário;
b)
Em relação ao fideicomissário, nos termos do nº 2 do artigo 2293º;
c)
No legado de usufruto ou de outro direito pessoal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2042º
(Representação na sucessão legal)
Na
sucessão legal, a representação tem sempre lugar, na linha recta, em benefício
dos descendentes de filho do autor da sucessão e, na linha colateral, em
benefício dos descendentes de irmão do falecido, qualquer que seja, num caso ou
noutro, o grau de parentesco.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2043º
(Representação nos casos de repúdio e incapacidade)
Os
descendentes representam o seu ascendente, mesmo que tenham repudiado a
sucessão destes ou sejam incapazes em relação a ele.
ARTIGO 2044º
(Partilha)
1.
Havendo representação, cabe a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente
respectivo.
2.
Do mesmo modo se procederá para o efeito da subdivisão, quando a estirpe
compreenda vários ramos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2045º
(Extensão da representação)
A
representação tem lugar, ainda que todos os membros das várias estirpes
estejam, relativamente ao autor da sucessão, no mesmo grau de parentesco, ou
exista uma só estirpe.
CAPÍTULO III
Herança jacente
ARTIGO 2046º
(Noção)
Diz-se
jacente a herança aberta, mas ainda não aceita nem declarada vaga para o
Estado.
ARTIGO 2047º
(Administração)
1.
O sucessível chamado à herança, se ainda não tiver aceitado nem repudiado, não
está inibido de providenciar acerca da administração dos bens, se do
retardamento das providências puderem resultar prejuízos.
2.
Sendo vários os herdeiros, é lícito a qualquer deles praticar os actos urgentes
de administração; mas, se houver oposição de algum, prevalece a vontade do
maior número.
3.
O disposto neste artigo não prejudica a possibilidade de nomeação de curador à
herança.
ARTIGO 2048º
(Curador da herança jacente)
1.
Quando se torne necessário, para evitar a perda ou deterioração dos bens, por
não haver quem legalmente os administre, o tribunal nomeará curador à herança
jacente, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer interessado.
2.
À curadoria da herança é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto
sobre a curadoria provisória dos bens do ausente.
3.
A curadoria termina logo que cessem as razões que a determinaram.
ARTIGO 2049º
(Notificação dos herdeiros)
1.
Se o sucessível chamado à herança, sendo conhecido, a não aceitar nem a
repudiar dentro dos quinze dias seguintes, pode o tribunal, a requerimento do
Ministério Público ou de qualquer interessado, mandá-lo notificar para, no
prazo que lhe for fixado, declarar se a aceita ou repudia.
2.
Na falta de declaração de aceitação, ou não sendo apresentado documento legal
de repúdio dentro do prazo fixado, a herança tem-se por aceite
3.
Se o notificado repudiar a herança, serão notificados, sem prejuízo do disposto
no artigo 2067º, os herdeiros imediatos, e assim sucessivamente até não haver
quem prefira a sucessão do Estado.
CAPÍTULO IV
Aceitação da herança
ARTIGO 2050º
(Efeitos)
1.
O domínio e posse dos bens da herança adquirem-se pela aceitação,
independentemente da sua apreensão material.
2.
Os efeitos da aceitação retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão.
ARTIGO 2051º
(Pluralidade de sucessíveis)
Sendo
vários os sucessíveis, pode a herança ser aceita por algum ou alguns deles e
repudiada pelos restantes.
ARTIGO 2052º
(Espécies de aceitação)
1.
A herança pode ser aceita pura e simplesmente ou a benefício de inventário.
2.
Têm-se como não escritas as cláusulas testamentárias que, directa ou
indirectamente, imponham uma ou outra espécie de aceitação.
ARTIGO 2053º
(Aceitação a benefício de inventário)
A
aceitação a benefício de inventário faz-se requerendo inventário judicial, nos
termos da lei de processo, ou intervindo em inventário pendente.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 2054º
(Aceitação sob condição, a termo ou parcial)
1.
A herança não pode ser aceita sob condição nem a termo.
2.
A herança também não pode ser aceita só em parte, salvo o disposto no artigo
seguinte.
ARTIGO 2055º
(Devolução testamentária e legal)
1.
Se alguém é chamado à herança, simultânea ou sucessivamente, por testamento e
por lei, e a aceita ou repudia por um dos títulos, entende-se que a aceita ou
repudia igualmente pelo outro; mas pode aceitá-la ou repudiá-la pelo primeiro,
não obstante a ter repudiado ou aceitado pelo segundo, se ao tempo ignorava a
existência do testamento.
2.
O sucessível legitimário que também é chamado à herança por testamento pode
repudiá-la quanto à quota disponível e aceitá-la quanto à legítima.
ARTIGO 2056º
(Formas de aceitação)
1.
A aceitação pode ser expressa ou tácita.
2.
A aceitação é havida como expressa quando nalgum documento escrito o sucessível
chamado à herança declara aceitá-la ou assume o título de herdeiro com a
intenção de a adquirir.
3.
Os actos de administração praticados pelo sucessível não implicam aceitação
tácita da herança.
ARTIGO 2057º
(Caso de aceitação tácita)
1.
Não importa aceitação a alienação da herança, quando feita gratuitamente em
benefício de todos aqueles a quem ela caberia se o alienante a repudiasse.
2.
Entende-se, porém, que aceita a herança e a aliena aquele que declara renunciar
a ela, se o faz a favor apenas de algum ou alguns dos sucessíveis que seriam
chamados na sua falta.
ARTIGO 2058º
(Transmissão)
1.
Se o sucessível chamado à herança falecer sem a haver aceitado ou repudiado,
transmite-se aos seus herdeiros o direito de a aceitar ou repudiar.
2.
A transmissão só se verifica se os herdeiros aceitarem a herança do falecido, o
que os não impede de repudiar, querendo, a herança a que este fora chamado.
ARTIGO 2059º
(Caducidade)
1.
O direito de aceitar a herança caduca ao fim de dez anos, contados desde que o
sucessível tem conhecimento de haver sido a ela chamado.
2.
No caso de instituição sob condição suspensiva, o prazo conta-se a partir do
conhecimento da verificação da condição; no caso de substituição
fideicomissária, a partir do conhecimento da morte do fiduciário ou da extinção
da pessoa colectiva.
ARTIGO 2060º
(Anulação por dolo ou coacção)
A
aceitação da herança é anulável por
dolo ou coacção, mas não com fundamento em
simples erro.
ARTIGO 2061º
(Irrevogabilidade)
A
aceitação é irrevogável.
CAPÍTULO V
Repúdio da herança
ARTIGO 2062º
(Efeitos do repúdio)
Os
efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão,
considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos
de representação.
ARTIGO 2063º
(Forma)
O
repúdio está sujeito à forma exigida para a alienação da herança.
ARTIGO 2064º
(Repúdio sob condição, a termo ou parcial)
1.
A herança não pode ser repudiada sob condição nem a termo.
2.
A herança também não pode ser repudiada só em parte salvo o disposto no artigo
2055º.
ARTIGO 2065º
(Anulação por dolo ou coacção)
O
repúdio da herança é anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em
simples erro.
ARTIGO 2066º
(Irrevogabilidade)
O
repúdio é irrevogável.
ARTIGO 2067º
(Sub-rogação dos credores)
1.
Os credores do repudiante podem aceitar a herança em nome dele, nos termos dos
artigos 606º e seguintes.
2.
A aceitação deve efectuar-se no prazo de seis meses, a contar do conhecimento
do repúdio.
3.
Pagos os credores do repudiante, o remanescente da herança não aproveita a
este, mas aos herdeiros imediatos.
CAPÍTULO VI
Encargos da herança
ARTIGO 2068º
(Responsabilidade da herança)
A
herança responde pelas despesas com o funeral e sufrágios do seu autor, pelos
encargos com a testamentaria, administração e liquidação do património
hereditário, pelo pagamento das dívidas do falecido e pelo cumprimento dos
legados.
ARTIGO 2069º
(Âmbito da herança)
Fazem
parte da herança:
a)
Os bens sub-rogados no lugar de bens da herança por meio de troca directa;
b)
O preço dos alienados;
c)
Os bens adquiridos com dinheiro ou valores da herança, desde que a proveniência
do dinheiro ou valores seja devidamente mencionada no documento de aquisição;
d)
Os frutos percebidos até à partilha.
ARTIGO 2070º
(Preferências)
1.
Os credores da herança e os legatários gozam de preferência sobre os credores
pessoais do herdeiro, e os primeiros sobre os segundos.
2.
Os encargos da herança são satisfeitos segundo a ordem por que vêm indicados no
artigo 2068º.
3.
As preferências mantêm-se nos cinco anos subsequentes à abertura da sucessão ou
à constituição da dívida, se esta é posterior, ainda que a herança tenha sido
partilhada; e prevalecem mesmo quando algum credor preterido tenha adquirido
garantia real sobre os bens hereditários.
ARTIGO 2071º
(Responsabilidade do herdeiro)
1.
Sendo a herança aceita a benefício de inventário, só respondem pelos encargos
respectivos os bens inventariados, salvo se os credores ou legatários provarem
a existência de outros bens.
2.
Sendo a herança aceita pura e simplesmente, a responsabilidade pelos encargos
também não excede o valor dos bens herdados, mas incumbe, neste caso, ao
herdeiro provar que na herança não existem valores suficientes para cumprimento
dos encargos.
ARTIGO 2072º
(Responsabilidade do usufrutuário)
1.
O usufrutuário da totalidade ou de uma quota do património do falecido pode
adiantar as somas necessárias, conforme os bens que usufruir, para cumprimento
dos encargos da herança, ficando com o direito de exigir dos herdeiros, findo o
usufruto, a restituição sem juros das quantias que despendeu.
2.
Se o usufrutuário não fizer o adiantamento das somas necessárias, podem os
herdeiros exigir que dos bens usufruídos se vendam os necessários para
cumprimento dos encargos, ou pagá-los com dinheiro seu, ficando neste último
caso, com o direito de haver do usufrutuário os juros correspondentes.
ARTIGO 2073º
(Legado de alimentos ou pensão vitalícia)
1.
O usufrutuário da totalidade do património do falecido é obrigado a cumprir por
inteiro o legado de alimentos ou pensão vitalícia.
2.
Incidindo o usufruto sobre uma quota-parte do património, o usufrutuário só em
proporção dessa quota é obrigado a contribuir para o cumprimento do legado de
alimentos ou pensão vitalícia.
3.
O usufrutuário de coisas determinadas não é obrigado a contribuir para os
sobreditos alimentos ou pensão, se o encargo lhe não tiver sido imposto
expressamente.
ARTIGO 2074º
(Direitos e obrigações do herdeiro em relação à
herança)
1.
O herdeiro conserva, em relação à herança,
até à sua integral liquidação e
partilha, todos os direitos e obrigações que tinha para
com o falecido, à
excepção dos que se extinguem por efeito da morte deste.
2.
São imputadas na quota do herdeiro as quantias em dinheiro de que ele é devedor
à herança.
3.
Se houver necessidade de fazer valer em juízo os direitos e obrigações do
herdeiro, e este for o cabeça-de-casal, será nomeado à herança, para esse fim,
um curador especial.
CAPÍTULO VII
Petição da herança
ARTIGO 2075º
(Acção de petição)
1.
O herdeiro pode pedir judicialmente o reconhecimento da sua qualidade
sucessória, e a consequente restituição de todos os bens da herança ou de parte
deles, contra quem os possua como herdeiro, ou por outro título, ou mesmo sem
título.
2.
A acção pode ser intentada a todo o tempo, sem prejuízo da aplicação das regras
da usucapião relativamente a cada uma das coisas possuídas, e do disposto no
artigo 2059º.
ARTIGO 2076º
(Alienação a favor de terceiro)
1.
Se o possuidor de bens da herança tiver disposto deles, no todo ou em parte, a
favor de terceiro, a acção de petição pode ser também proposta contra o
adquirente, sem prejuízo da responsabilidade do disponente pelo valor dos bens
alienados.
2.
A acção não procede, porém, contra terceiro que haja adquirido do herdeiro
aparente, por título oneroso e de boa fé, bens determinados ou quaisquer
direitos sobre eles; neste caso, estando também de boa fé, o alienante é apenas
responsável segundo as regras do enriquecimento sem causa.
3.
Diz-se herdeiro aparente aquele que é reputado herdeiro por força de erro comum
ou geral.
ARTIGO 2077º
(Cumprimento de legados)
1.
Se o testamento for declarado nulo ou anulado depois do cumprimento de legados
feito em boa fé, fica o suposto herdeiro quite para com o verdadeiro herdeiro
entregando-lhe o remanescente da herança, sem prejuízo do direito deste último
contra o legatário.
2.
A precedente disposição é extensiva aos legados com encargos.
ARTIGO 2078º
(Exercício da acção por um só herdeiro)
1.
Sendo vários os herdeiros, qualquer deles tem legitimidade para pedir
separadamente a totalidade dos bens em poder do demandado, sem que este possa
opor-lhe que tais bens lhe não pertencem por inteiro.
2.
O disposto no número anterior não prejudica o direito que assiste ao
cabeça-de-casal de pedir a entrega dos bens que deva administrar, nos termos do
capítulo seguinte.
CAPÍTULO VIII
Administração da herança
ARTIGO 2079º
(Cabeça-de-casal)
A
administração da herança, até à sua liquidação e partilha, pertence ao
cabeça-de-casal.
ARTIGO 2080º
(A quem incumbe o cargo)
1.
O cargo de cabeça-de-casal defere-se pela ordem seguinte:
a)
Ao cônjuge sobrevivo, não separado judicialmente de pessoas e bens, se for
herdeiro ou tiver meação nos bens do casal;
b)
Ao testamenteiro, salvo declaração do testador em contrário;
c)
Aos parentes que sejam herdeiros legais;
d)
Aos herdeiros testamentários.
2.
De entre os parentes que sejam herdeiros legais, preferem os mais próximos em
grau.
3.
De entre os herdeiros legais do mesmo grau de parentesco, ou de entre os
herdeiros testamentários, preferem os que viviam com o falecido há pelo menos
um ano à data da morte.
4.
Em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2081º
(Herança distribuída em legados)
Tendo
sido distribuído em legados todo o património hereditário, servirá de
cabeça-de-casal, em substituição dos herdeiros, o legatário mais beneficiado;
em igualdade de circunstâncias, preferirá o mais velho.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2082º
(Incapacidade da pessoa designada)
1.
Se o cônjuge, o herdeiro ou legatário que tiver preferência for incapaz,
exercerá as funções de cabeça-de-casal o seu representante legal.
2.
O curador é tido como representante do inabilitado para o efeito do número
anterior.
ARTIGO 2083º
(Designação pelo tribunal)
Se
todas as pessoas referidas nos artigos anteriores se escusarem ou forem
removidas, é o cabeça-de-casal designado pelo tribunal, oficiosamente, a
requerimento de qualquer
interessado,
ou a pedido do Ministério Público nos inventários em que tenha intervenção
principal.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 2084º
(Designação por acordo)
As
regras dos artigos precedentes não são imperativas; por acordo de todos os
interessados, e do Ministério Público, nos casos em que tenha intervenção
principal, podem entregar-se a administração da herança e o exercício das
demais funções de cabeça-de-casal a qualquer outra pessoa.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 2085º
(Escusa)
1.
O cabeça-de-casal pode a todo o tempo escusar-se do cargo:
a)
Se tiver mais de setenta anos de idade;
b)
Se estiver impossibilitado, por doença, de exercer convenientemente as funções;
c)
Se residir fora da comarca cujo tribunal é competente para o inventário;
d)
Se o exercício das funções de cabeça-de-casal for incompatível com o desempenho
de cargo público que exerça.
2.
O disposto neste artigo não prejudica a liberdade de aceitação da testamentaria
e consequente exercício das funções de cabeça-de-casal.
ARTIGO 2086º
(Remoção do cabeça-de-casal)
1.
O cabeça-de-casal pode ser removido, sem prejuízo das demais sanções que no
caso couberem:
a)
se dolosamente ocultou a existência de bens pertencentes à herança ou de
doações feitas pelo falecido, ou se, também dolosamente, denunciou doações ou
encargos inexistentes;
b)
Se não administrar o património hereditário com prudência e zelo;
c)
Se não cumpriu no inventário os deveres que a lei de processo lhe impuser;
d)
Se revelar incompetência para o exercício do cargo.
2.
Tem legitimidade para pedir a remoção qualquer interessado, ou o Ministério
Público, quando tenha intervenção principal.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 2087º
(Bens sujeitos à administração do cabeça-de-casal)
1.
O cabeça-de-casal administra os bens próprios do falecido e, tendo este sido
casado em regime de comunhão, os bens comuns do casal.
2.
Os bens doados em vida pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e
continuam a ser administrados pelo donatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2088º
(Entrega de bens)
1.
O cabeça-de-casal pode pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que
deva administrar e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles de acções
possessórias a fim de ser mantido na posse das coisas sujeitas à sua gestão ou
a ela restituído.
2.
O exercício das acções possessórias cabe igualmente aos herdeiros ou a terceiro
contra o cabeça-de-casal.
ARTIGO 2089º
(Cobrança de dívidas)
O
cabeça-de-casal pode cobrar as dívidas activas da herança, quando a cobrança
possa perigar com a demora ou o pagamento seja feito espontaneamente.
ARTIGO 2090º
(Venda de bens e satisfação de encargos)
1.
O cabeça-de-casal deve vender os frutos ou outros bens deterioráveis, podendo
aplicar o produto na satisfação das despesas do funeral e sufrágios, bem como
no cumprimento dos encargos da administração.
2.
Para satisfazer as despesas do funeral e sufrágios, bem como os encargos da
administração, pode o cabeça-de-casal vender os frutos não deterioráveis, na
medida do que for necessário.
ARTIGO 2091º
(Exercício de outros direitos)
1.
Fora dos casos declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no
artigo 2078º, os direitos relativos à herança só podem ser exercidos
conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros.
2.
O disposto no número anterior não prejudica os direitos que tenham sido atribuídos
pelo testador ao testamenteiro nos termos dos artigos 2327º e 2328º, sendo o
testamenteiro cabeça-de-casal.
ARTIGO 2092º
(Entrega de rendimentos)
Qualquer
dos herdeiros ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir que o cabeça-de-casal
distribua por todos até metade dos rendimentos que lhes caibam, salvo se forem
necessários, mesmo nessa parte, para satisfação de encargos da administração.
ARTIGO 2093º
(Prestação de contas)
1.
O cabeça-de-casal deve prestar contas anualmente.
2.
Nas contas entram como despesas ou rendimentos, entregues pelo cabeça-de-casal
aos herdeiros ou ao cônjuge meeiro nos termos do artigo anterior, e bem assim o
juro do que haja gasto à sua custa na satisfação de encargos da administração.
3.
Havendo saldo positivo, é distribuído pelos interessados, segundo o seu
direito, depois de deduzida a quantia necessária para os encargos do novo ano.
ARTIGO 2094º
(Gratuidade do cargo)
O
cargo de cabeça-de-casal é gratuito, sem prejuízo do disposto no artigo 2333º,
se for exercido pelo testamenteiro.
ARTIGO 2095º
(Intransmissibilidade)
O
cargo de cabeça-de-casal não é transmissível em vida nem por morte.
ARTIGO 2096º
(Sonegação de bens)
1.
O herdeiro que sonegar bens da herança, ocultando dolosamente a sua existência,
seja ou não cabeça-de-casal, perde em benefício dos co-herdeiros o direito que
possa ter a qualquer parte dos bens sonegados, além de incorrer nas mais
sanções que forem aplicáveis.
2.
O que sonegar bens da herança é considerado mero detentor desses bens.
CAPÍTULO IX
Liquidação da herança
ARTIGO 2097º
(Responsabilidade da herança indivisa)
Os
bens da herança indivisa respondem colectivamente pela satisfação dos
respectivos encargos.
ARTIGO 2098º
(Pagamento dos encargos após a partilha)
1.
Efectuada a partilha, cada herdeiro só responde pelos encargos em proporção da
quota que lhe tenha cabido na herança.
2.
Podem, todavia, os herdeiros deliberar que o pagamento se faça à custa de
dinheiro ou outros bens separados para esse efeito, ou que fique a cargo de
algum ou alguns deles.
3.
A deliberação obriga os credores e os legatários; mas, se uns ou outros não
puderem ser pagos integralmente nos sobreditos termos, têm recurso contra os
outros bens ou contra os outros herdeiros, nos termos gerais.
ARTIGO 2099º
(Remição de direitos de terceiro)
Se
existirem direitos de terceiro, de natureza remível, sobre determinados bens da
herança, e houver nesta dinheiro suficiente, pode qualquer dos co-herdeiros ou
o cônjuge meeiro exigir que esses direitos sejam remidos antes de efectuada a
partilha.
ARTIGO 2100º
(Pagamento dos direitos de terceiro)
1.
Entrando os bens na partilha com os direitos referidos no artigo anterior,
descontar-se-á neles o valor desses direitos, que serão suportados
exclusivamente pelo interessado a quem os bens couberem.
2.
Se não se fizer tal desconto, o interessado que pagar a remição tem regresso
contra os outros pela parte que a cada um tocar, em proporção do seu quinhão;
mas, em caso de insolvência de algum deles, é a sua parte repartida entre todos
proporcionalmente.
CAPÍTULO X
Partilha da herança
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 2101º
(Direito de exigir partilha)
1.
Qualquer co-herdeiro ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir partilha
quando lhe aprouver.
2.
Não pode renunciar-se ao direito de partilhar, mas pode convencionar-se que o
património se conserve indiviso por certo prazo, que não exceda cinco anos; é
lícito renovar este prazo, uma ou mais vezes, por nova convenção.
ARTIGO 2102º
(Forma)
1.
A partilha pode fazer-se extrajudicialmente, quando houver acordo de todos os
interessados, ou por inventário judicial nos termos prescritos na lei de
processo.
2.
Procede-se ainda a inventário judicial quando o Ministério Público o requeira,
por entender que o interesse do incapaz a quem a herança é deferida implica
aceitação beneficiária, e ainda nos casos em que algum dos herdeiros não possa,
por motivo de ausência em parte incerta ou de incapacidade de facto permanente,
outorgar em partilha extrajudicial.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)
ARTIGO 2103º
(Interessado único)
Havendo
um único interessado, o inventário a que haja de proceder-se nos termos do nº 2
do artigo anterior tem apenas por fim relacionar os bens e, eventualmente,
servir de base à liquidação da herança.
SECÇÃO II
Atribuições preferenciais
(Aditada pelo Dec.-Lei 496/77, de
25-11)
ARTIGO 2103º-A
(Direito de habitação da casa de morada da família
e direito de uso do recheio)
1.
O cônjuge sobrevivo tem direito a ser encabeçado, no momento da partilha, no
direito de habitação da casa de morada da família e no direito de uso do
respectivo recheio, devendo tornas aos co-herdeiros se o valor recebido exceder
o da sua parte sucessória e meação, se a houver.
2.
Salvo nos casos previstos no nº 2 do artigo 1093º, caducam os direitos
atribuídos no número anterior se o cônjuge não habitar a casa por prazo
superior a um ano.
3.
A pedido dos proprietários, pode o tribunal, quando o considere justificado,
impor ao cônjuge a obrigação de prestar caução.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2103º-B
(Direitos sobre o recheio)
Se
a casa de morada da família não fizer parte da herança, observar-se-á, com as
necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior relativamente ao recheio.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2103º-C
(Noção de recheio)
Para
os efeitos do disposto nos artigos anteriores, considera-se recheio o
mobiliário e demais objectos ou utensílios destinados ao cómodo, serviço e
ornamentação da casa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
SECÇÃO III
Colação
ARTIGO 2104º
(Noção)
1.
Os descendentes que pretendem entrar na sucessão do ascendente devem restituir
à massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes
foram doados por este: esta restituição tem o nome de colação.
2.
São havidas como doação, para efeitos de colação, as despesas referidas no
artigo 2110º.
ARTIGO 2105º
(Descendentes sujeitos à colação)
Só
estão sujeitos à colação os descendentes que eram à data da doação presuntivos
herdeiros legitimários do doador.
ARTIGO 2106º
(Sobre quem recai a obrigação)
A
obrigação de conferir recai sobre o donatário, se vier a suceder ao doador, ou
sobre os seus representantes, ainda que estes não hajam tirado benefício da liberalidade.
ARTIGO 2107º
(Doações feitas a cônjuges)
1.
Não estão sujeitos a colação os bens ou valores doados ao cônjuge do presuntivo
herdeiro legitimário.
2.
Se a doação tiver sido feita a ambos os cônjuges, fica sujeita a colação apenas
a parte do que for presuntivo herdeiro.
3.
A doação não se considera feita a ambos os cônjuges só porque entre eles vigora
o regime da comunhão geral.
ARTIGO 2108º
(Como se efectua a conferência)
1.
A colação faz-se pela imputação do valor da doação ou da importância das
despesas na quota hereditária, ou pela restituição dos próprios bens doados, se
houver acordo de todos os herdeiros.
2.
Se não houver na herança bens suficientes para igualar todos os herdeiros, nem
por isso são reduzidas as doações, salvo se houver inoficiosidade.
ARTIGO 2109º
(Valor dos bens doados)
1.
O valor dos bens doados é o que eles tiveram à data da abertura da sucessão.
2.
Se tiverem sido doados bens que o donatário consumiu, alienou ou onerou, ou que
pereceram por sua culpa, atende-se ao valor que esses bens teriam na data da
abertura da sucessão, se não fossem consumidos, alienados ou onerados, ou não
tivessem perecido.
3.
A doação em dinheiro, bem como os encargos em dinheiro que a oneraram e foram
cumpridos pelo donatário, são actualizados nos termos do artigo 551º.
ARTIGO 2110º
(Despesas sujeitas e não sujeitas a colação)
1.
Está sujeito a colação tudo quanto o falecido tiver despendido gratuitamente em
proveito dos descendentes.
2.
Exceptuam-se as despesas com o casamento, alimentos, estabelecimento e
colocação dos descendentes, na medida em que se harmonizem com os usos e com a
condição social e económica do falecido.
ARTIGO 2111º
(Frutos)
Os
frutos da coisa doada sujeita a colação, percebidos desde a abertura da sucessão,
devem ser conferidos.
ARTIGO 2112º
(Perda da coisa doada)
Não
é objecto de colação a coisa doada que tiver perecido em vida do autor da
sucessão por facto não imputável ao donatário.
ARTIGO 2113º
(Dispensa da colação)
1.
A colação pode ser dispensada pelo doador no acto da doação ou posteriormente.
2.
Se a doação tiver sido acompanhada de alguma formalidade externa, só pela mesma
forma, ou por testamento, pode ser dispensada a colação.
3.
A colação presume-se sempre dispensada nas doações manuais e nas doações
remuneratórias.
ARTIGO 2114º
(Imputação na quota disponível)
1.
Não havendo lugar à colação, a doação é imputada na quota disponível.
2.
Se, porém, não houver lugar à colação pelo facto de o donatário repudiar a
herança sem ter descendentes que o representem, a doação é imputada na quota
indisponível.
ARTIGO 2115º
(Benfeitorias nos bens doados)
O
donatário é equiparado, quanto a benfeitorias, ao possuidor de boa fé,
sendo-lhe aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos
1273º e seguintes.
ARTIGO 2116º
(Deteriorações)
O
donatário responde pelas deteriorações que culposamente tenha causado nos bens
doados.
ARTIGO 2117º
(Doação de bens comuns)
1.
Sendo a doação de bens comuns feita por ambos os cônjuges, conferir-se-á metade
por morte de cada um deles.
2.
O valor de cada uma das metades é o que ela tiver ao tempo da abertura da
sucessão respectiva.
ARTIGO 2118º
(Ónus real)
1.
A eventual redução das doações sujeitas a colação constitui um ónus real.
2.
Não pode fazer-se o registo de doação de bens imóveis sujeita a colação sem se
efectuar, simultaneamente, o registo do ónus.
SECÇÃO IV
Efeitos da partilha
ARTIGO 2119º
(Retroactividade da partilha)
Feita
a partilha, cada um dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança,
sucessor único dos bens que lhe foram atribuídos, sem prejuízo do disposto
quanto a frutos.
ARTIGO 2120º
(Entrega de documentos)
1.
Finda a partilha, são entregues a cada um dos co-herdeiros os documentos
relativos aos bens que lhe couberem.
2.
Os documentos relativos aos bens atribuídos a dois ou mais herdeiros são
entregues ao que neles tiver maior parte, com obrigação de os apresentar aos
outros interessados, nos termos gerais.
3.
Os documentos relativos a toda a herança ficam em poder do co-herdeiro que os
interessados escolherem, ou que o tribunal nomear na falta de acordo, com igual
obrigação de os apresentar aos outros interessados.
SECÇÃO V
Impugnação da partilha
ARTIGO 2121º
(Fundamento da impugnação)
A
partilha extrajudicial só é impugnável nos casos em que o sejam os contratos.
ARTIGO 2122º
(Partilha adicional)
A
omissão de bens da herança não determina a nulidade da partilha, mas apenas a
partilha adicional dos bens omitidos.
ARTIGO 2123º
(Partilha de bens não pertencentes à herança)
1.
Se tiver recaído sobre bens não pertencentes à herança, a partilha é nula nessa
parte, sendo-lhe aplicável, com as necessárias adaptações e sem prejuízo do
disposto no número seguinte, o preceituado acerca da venda de bens alheios.
2.
Aquele a quem sejam atribuídos os bens alheios é indemnizado pelos co-herdeiros
na proporção dos respectivos quinhões hereditários; se, porém, algum dos
co-herdeiros estiver insolvente, respondem os demais pela sua parte, na mesma
proporção.
CAPÍTULO XI
Alienação de herança
ARTIGO 2124º
(Disposições aplicáveis)
A
alienação de herança ou de quinhão
hereditário está sujeita às
disposições
reguladoras do negócio jurídico que lhe der causa, salvo
o preceituado nos
artigos seguintes.
ARTIGO 2125º
(Objecto)
1.
Todo o benefício resultante da caducidade de um legado, encargo ou fideicomisso
se presume transmitido com a herança ou quota hereditária.
2.
A parte hereditária devolvida ao alienante, depois da alienação, em consequência
de fideicomisso ou do direito de acrescer, presume-se excluída da disposição.
3.
Presume-se igualmente excluídos da alienação os diplomas e a correspondência do
falecido, bem como as recordações de família de diminuto valor económico.
ARTIGO 2126º
(Forma)
1.
A alienação de herança ou de quinhão hereditário será feita por escritura
pública, se existirem bens cuja alienação deva ser feita por essa forma.
2.
Fora do caso previsto no número anterior, a alienação deve constar de documento
particular.
ARTIGO 2127º
(Alienação de coisa alheia)
O
que aliena uma herança ou quinhão hereditário sem especificação de bens só
responde pela alienação de coisa alheia se não vier a ser reconhecido como
herdeiro.
ARTIGO 2128º
(Sucessão nos encargos)
O
adquirente de herança ou de quinhão hereditário sucede nos encargos
respectivos; mas o alienante responde solidariamente por esses encargos, salvo
o direito de haver do adquirente o reembolso total do que assim houver
despendido.
ARTIGO 2129º
(Indemnizações)
1.
O alienante por título oneroso que tiver disposto de bens da herança é obrigado
a entregar o respectivo valor ao adquirente.
2.
O adquirente a título oneroso ou gratuito é obrigado a reembolsar o alienante
do que este tiver despendido na satisfação dos encargos da herança e a
pagar-lhe o que a herança lhe dever.
3.
As disposições dos números anteriores são supletivas.
ARTIGO 2130º
(Direito de preferência)
1.
Quando seja vendido ou dado em cumprimento a estranhos um quinhão hereditário,
os co-herdeiros gozam do direito de preferência nos termos em que este direito
assiste aos comproprietários.
2.
O prazo, porém, para o exercício do direito, havendo comunicação para a
preferência, é de dois meses.
TÍTULO II
DA SUCESSÃO LEGÍTIMA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2131º
(Abertura da sucessão legítima)
Se
o falecido não tiver disposto válida e eficazmente, no todo ou em parte, dos
bens de que podia dispor para depois da morte, são chamados à sucessão desses
bens os seus herdeiros legítimos.
ARTIGO 2132º
(Categoria de herdeiros legítimos)
São
herdeiros legítimos o cônjuge, os parentes e o Estado, pela ordem e segundo as
regras constantes do presente título.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2133º
(Classes de sucessíveis)
1.
A ordem por que são chamados os herdeiros, sem prejuízo do disposto no título
da adopção, é a seguinte:
a)
Cônjuge e descendentes;
b)
Cônjuge e ascendentes;
c)
Irmãos e seus descendentes;
d)
Outros colaterais até ao quarto grau;
e)
Estado.
2.
O cônjuge sobrevivo integra a primeira classe de sucessíveis, salvo se o autor
da sucessão falecer sem descendentes e deixar ascendentes, caso em que integra
a segunda classe.
3.
O cônjuge não é chamado à herança se à data da morte do autor da sucessão se
encontrar divorciado ou separado judicialmente de pessoas e bens, por sentença
que já tenha transitado ou venha a transitar em julgado, ou ainda se a sentença
de divórcio ou separação vier a ser proferida posteriormente àquela data, nos
termos do nº 3 do artigo 1785º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2134º
(Preferência de classes)
Os
herdeiros de cada uma das classes de sucessíveis preferem aos das classes
imediatas.
ARTIGO 2135º
(Preferência de graus de parentesco)
Dentro
de cada classe os parentes de grau mais próximo preferem aos de grau mais
afastado.
ARTIGO 2136º
(Sucessão por cabeça)
Os
parentes de cada classe sucedem por cabeça ou em partes iguais, salvas as
excepções previstas neste código.
ARTIGO 2137º
(Ineficácia do chamamento)
1.
Se os sucessíveis da mesma classe chamados simultaneamente à herança não
puderem ou não quiserem aceitar, são chamados os imediatos sucessores.
2.
Se, porém, apenas algum ou alguns dos sucessíveis não puderem ou não quiserem
aceitar, a sua parte acrescerá à dos outros sucessíveis da mesma classe que com
eles concorram à herança, sem prejuízo do disposto no artigo 2143º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2138º
(Direito de representação)
O
disposto nos três artigos anteriores não prejudica o direito de representação,
nos casos em que este tem lugar.
CAPÍTULO II
Sucessão do cônjuge e dos
descendentes
(Epígrafe introduzida pelo Dec.-Lei
496/77, de 25-11)
ARTIGO 2139º
(Regras gerais)
1.
A partilha entre o cônjuge e os filhos faz-se por cabeça, dividindo-se a
herança em tantas partes quantos forem os herdeiros; a quota do cônjuge, porém,
não pode ser inferior a uma quarta parte da herança.
2.
Se o autor da sucessão não deixar cônjuge sobrevivo, a herança divide-se pelos
filhos em partes iguais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2140º
(Descendentes do segundo grau e seguintes)
Os
descendentes dos filhos que não puderem ou não quiserem aceitar a herança são
chamados à sucessão nos termos do artigo 2042º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2141º
(Sucessão do cônjuge, na falta de descendentes)
Na
falta de descendentes sucede o cônjuge, sem prejuízo do disposto no capítulo
seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO III
Sucessão do cônjuge e dos
ascendentes
ARTIGO 2142º
(Regras gerais)
1.
Se não houver descendentes e o autor da sucessão deixar cônjuge e ascendentes,
ao cônjuge pertencerão duas terças partes e aos ascendentes uma terça parte da
herança.
2.
Na falta de cônjuge, os ascendentes são chamados à totalidade da herança.
3.
A partilha entre os ascendentes, nos casos previstos nos números anteriores,
faz-se segundo as regras dos artigos 2135º e 2136º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2143º
(Acrescer)
Se
algum ou alguns dos ascendentes não puderem ou não quiserem aceitar, no caso
previsto no nº 1 do artigo anterior, a sua parte acresce à dos outros
ascendentes que concorram à sucessão; se estes não existirem, acrescerá à do
cônjuge sobrevivo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2144º
(Sucessão do cônjuge, na falta de
descendentes e ascendentes)
Na
falta de descendentes e ascendentes, o cônjuge é chamado à totalidade da
herança.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO IV
Sucessão dos irmãos e seus
descendentes
ARTIGO 2145º
(Regra geral)
Na
falta de cônjuge, descendentes e ascendentes, são chamados à sucessão os irmãos
e, representativamente, os descendentes destes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2146º
(Irmãos germanos e unilaterais)
Concorrendo
à sucessão irmãos germanos e irmãos consanguíneos ou uterinos, o quinhão de
cada um dos irmãos germanos, ou dos descendentes que os representem, é igual ao
dobro do quinhão de cada um dos outros.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO V
Sucessão dos outros colaterais
ARTIGO 2147º
(Outros colaterais até ao quarto grau)
Na
falta de herdeiros das classes anteriores, são chamados à sucessão os restantes
colaterais até ao quarto grau, preferindo sempre os mais próximos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2148º
(Duplo parentesco)
A
partilha faz-se por cabeça, mesmo que algum dos chamados à sucessão seja
duplamente parente do falecido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 2149º A 2151º
(Revogados pelos Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
CAPÍTULO VI
Sucessão do Estado
ARTIGO 2152º
(Chamamento do Estado)
Na
falta de cônjuge e de todos os parentes sucessíveis, é chamado à herança o
Estado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2153º
(Direitos e obrigações do Estado)
O
Estado tem, relativamente à herança, os mesmos direitos e obrigações de
qualquer outro herdeiro.
ARTIGO 2154º
(Desnecessidade de aceitação e
impossibilidade de repúdio)
A
aquisição da herança pelo Estado, como sucessor legítimo, opera-se de direito,
sem necessidade de aceitação, não podendo o Estado repudiá-la.
ARTIGO 2155º
(Declaração de herança vaga)
Reconhecida
judicialmente a inexistência de outros sucessíveis legítimos, a herança é
declarada vaga para o Estado nos termos das leis de processo.
TÍTULO III
DA SUCESSÃO LEGITIMÁRIA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2156º
(Legítima)
Entende-se
por legítima a porção de bens de que o testador não pode dispor, por ser
legalmente destinada aos herdeiros legitimários.
ARTIGO 2157º
(Herdeiros legitimários)
São
herdeiros legitimários o cônjuge, os descendentes e os ascendentes, pela ordem
e segundo as regras estabelecidas para a sucessão legítima.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2158º
(Legítima do cônjuge)
A
legítima do cônjuge, se não concorrer com descendentes nem ascendentes, é de
metade da herança.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2159º
(Legítima do cônjuge e dos filhos)
1.
A legítima do cônjuge e dos filhos, em caso de concurso, é de dois terços da
herança.
2.
Não havendo cônjuge sobrevivo, a legítima dos filhos é de metade ou dois terços
da herança, conforme exista um só filho ou existam dois ou mais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2160º
(Legítima dos descendentes do segundo grau e
seguintes)
Os
descendentes do segundo grau e seguintes têm direito à legítima que caberia ao
seu ascendente, sendo a parte de cada um fixada nos termos prescritos para a
sucessão legítima.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2161º
(Legítima do cônjuge e dos ascendentes)
1.
A legítima do cônjuge e dos ascendentes, em caso de concurso, é de dois terços
da herança.
2.
Se o autor da sucessão não deixar descendentes nem cônjuge sobrevivo, a legítima
dos ascendentes é de metade ou de um terço da herança, conforme forem chamados
os pais ou os ascendentes do segundo grau e seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2162º
(Cálculo da legítima)
1.
Para o cálculo da legítima, deve atender-se ao valor dos bens existentes no
património do autor da sucessão à data da sua morte, ao valor dos bens doados,
às despesas sujeitas a colação e às dívidas da herança.
2.
Não é atendido para o cálculo da legítima o valor dos bens que, nos termos do artigo
2112º, não são objecto de colação.
ARTIGO 2163º
(Proibição de encargos)
O
testador não pode impor encargos sobre a legítima, nem designar os bens que a
devem preencher, contra a vontade do herdeiro.
ARTIGO 2164º
(Cautela sociniana)
Se,
porém, o testador deixar usufruto ou constituir pensão vitalícia que atinja a
legítima, podem os herdeiros legitimários cumprir o legado ou entregar ao
legatário tão-somente a quota disponível.
ARTIGO 2165º
(Legado em substituição da legítima)
1.
Pode o autor da sucessão deixar um legado ao herdeiro legitimário em
substituição da legítima.
2.
A aceitação do legado implica a perda do dinheiro à legítima, assim como a
aceitação da legítima envolve a perda do dinheiro ao legado.
3.
Se o herdeiro, notificado nos termos do nº 1 do artigo 2049º, nada declarar,
ter-se-á por aceito o legado.
4.
O legado deixado em substituição da legítima é imputado na quota indisponível
do autor da sucessão; mas, se exceder o valor da legítima do herdeiro, é
imputado pelo excesso, na quota disponível.
ARTIGO 2166º
(Deserdação)
1.
O autor da sucessão pode em testamento, com expressa declaração da causa,
deserdar o herdeiro legitimário, privando-o da legítima, quando se verifique
alguma das seguintes ocorrências:
a)
Ter sido o sucessível condenado por algum crime doloso cometido contra a
pessoa, bens ou honra do autor da sucessão, ou do seu cônjuge, ou algum
descendente, ascendente, adoptante ou adoptado, desde que ao crime corresponda
pena superior a seis meses de prisão;
b)
Ter sido o sucessível condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho
contra as mesmas pessoas;
c)
Ter o sucessível, sem justa causa, recusado ao autor da sucessão ou ao seu
cônjuge os devidos alimentos.
2.
O deserdado é equiparado ao indigno para todos os efeitos legais.
ARTIGO 2167º
(Impugnação da deserdação)
A
acção de impugnação da deserdação, com fundamento na inexistência da causa
invocada, caduca ao fim de dois anos a contar da abertura do testamento.
CAPÍTULO II
Redução de liberalidades
ARTIGO 2168º
(Liberalidades inoficiosas)
Dizem-se
inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima
dos herdeiros legitimários.
ARTIGO 2169º
(Redução)
As
liberalidades inoficiosas são redutíveis, a requerimento dos herdeiros
legitimários ou dos seus sucessores, em tanto quanto for necessário para que a
legítima seja preenchida.
ARTIGO 2170º
(Proibição da renúncia)
Não
é permitida em vida do autor da sucessão a renúncia ao direito de reduzir as
liberalidades.
ARTIGO 2171º
(Ordem da redução)
A
redução abrange em primeiro lugar as disposições testamentárias a título de
herança, em segundo lugar os legados, e por último as liberalidades que hajam
sido feitas em vida do autor da sucessão.
ARTIGO 2172º
(Redução das disposições testamentárias)
1.
Se bastar a redução das disposições testamentárias, será feita
proporcionalmente, tanto no caso de deixas a título de herança como a título de
legado.
2.
No caso, porém, de o testador ter declarado que determinadas disposições devem
produzir efeito de preferência a outras, as primeiras só serão reduzidas se o
valor integral das restantes não for suficiente para o preenchimento da
legítima.
3.
Gozam de igual preferência as deixas remuneratórias.
ARTIGO 2173º
(Redução de liberalidades feitas em vida)
1.
Se for necessário recorrer às liberalidades feitas em vida, começar-se-á pela
última, no todo ou em parte; se isso não bastar, passar-se-á à imediata; e
assim sucessivamente.
2.
Havendo diversas liberalidades feitas no mesmo acto ou na mesma data, a redução
será feita entre elas rateadamente, salvo se alguma delas for remuneratória,
porque a essa é aplicável o disposto no nº 3 do artigo anterior.
ARTIGO 2174º
(Termos em que se efectua a redução)
1.
Quando os bens legados ou doados são divisíveis, a redução faz-se separando
deles a parte necessária para preencher a legítima.
2.
Sendo os bens indivisíveis, se a importância da redução exceder metade do valor
dos bens, estes pertencem integralmente ao herdeiro legitimário, e o legatário
ou donatário haverá o resto em dinheiro; no caso contrário, os bens pertencem
integralmente ao legatário ou donatário, tendo este de pagar em dinheiro ao
herdeiro legitimário a importância da redução.
3.
A reposição de aquilo que se despendeu gratuitamente a favor dos herdeiros
legitimários, em consequência da redução, é feita igualmente em dinheiro.
ARTIGO 2175º
(Perecimento ou alienação dos bens doados)
Se
os bens doados tiverem perecido por qualquer causa ou tiverem sido alienados ou
onerados, o donatário ou os seus sucessores são responsáveis pelo preenchimento
da legítima em dinheiro, até ao valor desses bens.
ARTIGO 2176º
(Insolvência do responsável)
Nos
casos previstos no artigo anterior e no nº 3 do artigo 2174º, a insolvência daqueles
que, segundo a ordem estabelecida, devem suportar o encargo da redução não
determina a responsabilidade dos outros.
ARTIGO 2177º
(Frutos e benfeitorias)
O
donatário é considerado, quanto a frutos e benfeitorias, possuidor de boa fé
até à data do pedido de redução.
ARTIGO 2178º
(Prazo para a redução)
A
acção de redução de liberalidades inoficiosas caduca dentro de dois anos, a
contar da aceitação da herança pelo herdeiro legitimário.
TÍTULO IV
DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
ARTIGO 2179º
(Noção de testamento)
1.
Diz-se testamento o acto unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe,
para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles.
2.
As disposições de carácter não patrimonial que a lei permite inserir no
testamento são válidas se fizerem parte de um acto revestido de forma
testamentária, ainda que nele não figurem disposições de carácter patrimonial.
ARTIGO 2180º
(Expressão da vontade do testador)
É
nulo o testamento em que o testador não tenha exprimido cumprida e claramente a
sua vontade, mas apenas por sinais ou monossílabos, em resposta a perguntas que
lhe fossem feitas.
ARTIGO 2181º
(Testamento de mão comum)
Não
podem testar no mesmo acto duas ou mais pessoas, quer em proveito recíproco,
quer em favor de terceiro.
ARTIGO 2182º
(Carácter pessoal do testamento)
1.
O testamento é acto pessoal, insusceptível de ser feito por meio de
representante ou de ficar dependente do arbítrio de outrem, quer pelo que toca
à instituição de herdeiros ou nomeação de legatários, quer pelo que respeita ao
objecto da herança ou do legado, quer pelo que pertence ao cumprimento ou não
cumprimento das suas disposições.
2.
O testador pode, todavia, cometer a terceiro:
a)
A repartição da herança ou do legado, quando institua ou nomeie uma
generalidade de pessoas;
b)
A nomeação do legatário de entre pessoas por aquele determinadas.
3.
Nos casos previstos no número antecedente, qualquer interessado tem a faculdade
de requerer ao tribunal a fixação de um prazo para a repartição da herança ou
do legado ou nomeação do legatário, sob a cominação, no primeiro caso, de a
repartição pertencer à pessoa designada para o efeito pelo tribunal e, no
segundo, de a distribuição do legado ser feita por igual pelas pessoas que o
testador tenha determinado.
ARTIGO 2183º
(Escolha do legado pelo onerado,
pelo legatário ou por terceiro)
1.
O testador pode deixar a escolha da coisa legada à justa apreciação do onerado,
do legatário ou de terceiro, desde que indique o fim do legado e o género ou
espécie em que ele se contém.
2.
É aplicável a este caso, com as necessárias adaptações, o disposto no nº 3 do
artigo anterior.
ARTIGO 2184º
(Testamento «per relationem»)
É
nula a disposição que dependa de instruções ou recomendações feitas a outrem
secretamente, ou se reporte a documentos não autênticos, ou não escritos e
assinados pelo testador com data anterior à data do testamento ou contemporânea
desta.
ARTIGO 2185º
(Disposições a favor de pessoas incertas)
É
igualmente nula a disposição feita a favor de pessoa incerta que por algum modo
se não possa tornar certa.
ARTIGO 2186º
(Fim contrário à lei ou à ordem pública,
ou ofensivo dos bons costumes)
É
nula a disposição testamentária, quando da interpretação do testamento resulte
que foi essencialmente determinada por um fim contrário à lei ou à ordem
pública, ou ofensivo dos bons costumes.
ARTIGO 2187º
(Interpretação dos testamentos)
1.
Na interpretação das disposições testamentárias observar-se-á o que parecer
mais ajustado com a vontade do testador, conforme o contexto do testamento.
2.
É admitida prova complementar, mas não surtirá qualquer efeito a vontade do
testador que não tenha no contexto um mínimo de correspondência, ainda que
imperfeitamente expressa.
CAPÍTULO II
Capacidade testamentária
ARTIGO 2188º
(Princípio geral)
Podem
testar todos os indivíduos que a lei não declare incapazes de o fazer.
ARTIGO 2189º
(Incapacidade)
São
incapazes de testar:
a)
Os menores não emancipados;
b)
Os interditos por anomalia psíquica.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2190º
(Sanção)
O
testamento feito por incapazes é nulo.
ARTIGO 2191º
(Momento da determinação da capacidade)
A
capacidade do testador determina-se pela data do testamento.
CAPÍTULO III
Casos de indisponibilidade relativa
ARTIGO 2192º
(Tutor, curador, administrador legal de bens e
protutor)
1.
É nula a disposição feita por interdito ou inabilitado a favor do seu tutor,
curador ou administrador legal de bens, ainda que estejam aprovadas as
respectivas contas.
2.
É igualmente nula a disposição a favor do protutor, se este, na data em que o
testamento foi feito, substituía qualquer das pessoas designadas no número
anterior.
3.
É, porém, válida a disposição a favor das mesmas pessoas, quando se trate de
descendentes, ascendentes, colaterais até ao terceiro grau ou cônjuge do
testador.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2193º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2194º
(Médicos, enfermeiros e sacerdotes)
É
nula a disposição a favor do médico ou enfermeiro que tratar do testador, ou do
sacerdote que lhe prestar assistência espiritual, se o testamento for feito
durante a doença e o seu autor vier a falecer dela
ARTIGO 2195º
(Excepções)
A
nulidade estabelecida no artigo anterior não abrange:
a)
Os legados remuneratórios de serviços recebidos pelo doente;
b)
As disposições a favor das pessoas designadas no nº 3 do artigo 2192º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2196º
(Cúmplice do testador adúltero)
1.
É nula a disposição a favor da pessoa com quem o testador casado cometeu
adultério.
2.
Não se aplica o preceito do número anterior:
a)
Se o casamento já estava dissolvido, ou os cônjuges estavam separados
judicialmente de pessoas e bens ou separados de facto há mais de seis anos, à
data da abertura da sucessão;
b)
Se a disposição se limitar a assegurar alimentos ao beneficiário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2197º
(Intervenientes no testamento)
É
nula a disposição a favor do notário ou entidade com funções notariais que
lavrou o testamento público ou aprovou o testamento cerrado, ou a favor da
pessoa que escreveu este, ou das testemunhas, abonadores ou intérpretes que
intervierem no testamento ou na sua aprovação.
ARTIGO 2198º
(Interpostas pessoas)
1.
São nulas as disposições referidas nos artigos anteriores, quando feitas por
meio de interposta pessoa.
2.
Consideram-se interpostas pessoas as designadas no nº 2 do artigo 579º.
CAPÍTULO IV
Falta e vícios da vontade
ARTIGO 2199º
(Incapacidade acidental)
É
anulável o testamento feito por quem se encontrava incapacitado de entender o
sentido da sua declaração ou não tinha o livre exercício da sua vontade por
qualquer causa, ainda que transitória.
ARTIGO 2200º
(Simulação)
É
anulável a disposição feita aparentemente a favor de pessoa designada no
testamento, mas que, na realidade, e por acordo com essa pessoa, vise a
beneficiar outra.
ARTIGO 2201º
(Erro, dolo e coacção)
É
também anulável a disposição testamentária determinada por erro, dolo ou
coacção.
ARTIGO 2202º
(Erro sobre os motivos)
O
erro, de facto ou de direito, que recaia sobre o motivo da disposição
testamentária só é causa de anulação quando resultar do próprio testamento que
o testador não teria feito a disposição se conhecesse a falsidade do motivo.
ARTIGO 2203º
(Erro na indicação da pessoa ou dos bens)
Se
o testador tiver indicado erroneamente a pessoa do herdeiro ou do legatário, ou
dos bens que são objecto da disposição, mas da interpretação do testamento for
possível concluir a que pessoa ou bens ele pretendia referir-se, a disposição
vale relativamente a esta pessoa ou a estes bens.
CAPÍTULO V
Forma do testamento
SECÇÃO I
Formas comuns
ARTIGO 2204º
(Indicação)
As
formas comuns do testamento são o testamento público e o testamento cerrado.
ARTIGO 2205º
(Testamento público)
É
público o testamento escrito por notário no seu livro de notas.
ARTIGO 2206º
(Testamento cerrado)
1.
O testamento diz-se cerrado, quando é escrito e assinado pelo testador ou por
outra pessoa a seu rogo, ou escrito por outra pessoa a rogo do testador e por
este assinado.
2.
O testador só pode deixar de assinar o testamento cerrado quando não saiba ou
não possa fazê-lo, ficando consignada no instrumento de aprovação a razão por
que o não assina.
3.
A pessoa que assina o testamento deve rubricar as folhas que não contenham a
sua assinatura.
4.
O testamento cerrado deve ser aprovado por notário, nos termos da lei do
notariado.
5.
A violação do disposto nos números anteriores importa nulidade do testamento.
ARTIGO 2207º
(Data do testamento cerrado)
A
data da aprovação do testamento cerrado é havida como data do testamento para
todos os efeitos legais.
ARTIGO 2208º
(Inabilidade para fazer testamento cerrado)
Os
que não sabem ou não podem ler são inábeis para dispor em testamento cerrado.
ARTIGO 2209º
(Conservação e apresentação do testamento cerrado)
1.
O testador pode conservar o testamento cerrado em seu poder, cometê-lo à guarda
de terceiro ou depositá-lo em qualquer repartição notarial.
2.
A pessoa que tiver em seu poder o testamento é obrigada a apresentá-lo ao
notário em cuja área o documento se encontre, dentro de três dias contados
desde o conhecimento do falecimento do testador; se o não fizer, incorre em
responsabilidade pelos danos a que der causa, sem prejuízo da sanção especial
da alínea d) do artigo 2034º.
SECÇÃO II
Formas especiais
ARTIGO 2210º
(Testamento de militares e pessoas equiparadas)
Os
militares, bem como os civis ao serviço das forças armadas, podem testar pela
forma declarada nos artigos seguintes, quando se encontrem em campanha ou
aquartelados fora do País, ou ainda dentro do País mas em lugares com os quais
estejam interrompidas as comunicações e onde não exista notário, e também
quando se encontrem prisioneiros do inimigo.
ARTIGO 2211º
(Testamento militar público)
1.
O militar, ou o civil a ele equiparado, declarará a sua vontade na presença do
comandante da respectiva unidade independente ou força isolada e de duas
testemunhas.
2.
Se o comandante quiser fazer testamento, tomará o seu lugar quem deva
substituí-lo.
3.
O testamento, depois de escrito, datado e lido em voz alta pelo comandante,
será assinado pelo testador, pelas testemunhas, e pelo mesmo comandante; se o
testador ou as testemunhas não puderem assinar, declarar-se-á o motivo porque o
não fazem.
ARTIGO 2212º
(Testamento militar cerrado)
1.
Se o militar, ou o civil a ele equiparado, souber e puder escrever, pode fazer
o testamento por seu próprio punho.
2.
Escrito e assinado o testamento pelo testador, este apresentá-lo-á ao
comandante, na presença de duas testemunhas, declarando que exprime a sua
última vontade; o comandante, sem o ler, escreverá no testamento a declaração
datada de que ele lhe foi apresentado, sendo essa declaração assinada tanto
pelas testemunhas como pelo comandante.
3.
Se o testador o solicitar, o comandante, ainda na presença das testemunhas,
coserá e lacrará o testamento, exarando na face exterior da folha que servir de
invólucro uma nota com a designação da pessoa a quem pertencer o testamento ali
contido.
4.
É aplicável a esta espécie de testamento o que fica disposto no nº 2 do artigo
antecedente.
ARTIGO 2213º
(Formalidades complementares)
1.
O testamento feito na conformidade dos artigos anteriores será depositado pelas
autoridades militares na repartição ou em alguma das repartições notariais do
lugar do domicílio ou da última residência do testador.
2.
Falecendo o testador antes de findar a causa que o impedia de testar nas formas
comuns, será a sua morte anunciada no jornal oficial, com designação da
repartição notarial onde o testamento se encontra depositado.
ARTIGO 2214º
(Testamento feito a bordo de navio)
Qualquer
pessoa pode fazer testamento a bordo de navio de guerra ou de navio mercante,
em viagem por mar, nos termos declarados nos artigos seguintes.
ARTIGO 2215º
(Formalidades do testamento marítimo)
O
testamento feito a bordo de navio deve obedecer ao preceituado nos artigos
2211º ou 2212º, competindo ao comandante do navio a função que neles é
atribuída ao comandante da unidade independente ou força isolada.
ARTIGO 2216º
(Duplicado, registo e guarda do testamento)
O
testamento marítimo é feito em duplicado, registado no diário de navegação e
guardado entre os documentos de bordo.
ARTIGO 2217º
(Entrega do testamento)
1.
Se o navio entrar em algum porto estrangeiro onde exista autoridade consular
portuguesa, deve o comandante entregar a essa autoridade um dos exemplares do
testamento e cópia do registo feito no diário de navegação.
2.
Aportando o navio a território português, entregará o comandante à autoridade
marítima do lugar o outro exemplar do testamento, ou fará entrega de ambos, se
nenhum foi depositado nos termos do número anterior, além de cópia do registo.
3.
Em qualquer dos casos declarados no presente artigo, o comandante cobrará
recibo da entrega e averbá-lo-á no diário de navegação, à margem do registo do
testamento.
ARTIGO 2218º
(Termo de entrega e depósito do testamento)
1.
A autoridade consular ou militar lavrará termo de entrega do testamento, logo
que esta lhe seja feita, e fá-lo-á depositar na repartição ou em alguma das
repartições notariais do lugar do domicílio ou da última residência do
testador.
2.
É aplicável a este caso o disposto no nº 2 do artigo 2213º.
ARTIGO 2219º
(Testamento feito a bordo de aeronave)
O
disposto nos artigos 2214º a 2218º é aplicável, com as necessárias adaptações,
ao testamento feito em viagem a bordo de aeronave.
ARTIGO 2220º
(Testamento feito em caso de calamidade pública)
1.
Se qualquer pessoa estiver inibida de socorrer-se das formas comuns de
testamento, por se encontrar em lugar onde grasse epidemia ou por outro motivo
de calamidade pública, pode testar perante algum notário, ,juíz ou sacerdote,
com observância das formalidades prescritas nos artigos 2211º ou 2212º.
2.
O testamento será depositado, logo que seja possível, na repartição notarial ou
em alguma das repartições notariais do lugar onde foi feito.
ARTIGO 2221º
(Idoneidade das testemunhas, abonadores
ou intérpretes; incapacidades)
1.
Não pode ser testemunha, abonador ou intérprete em qualquer dos testamentos
regulados na presente secção quem está impedido de o ser nos documentos
autênticos extra-oficiais.
2.
É extensivo aos mesmos testamentos, com as necessárias adaptações, o disposto
no artigo 2197º.
ARTIGO 2222º
(Prazo de eficácia)
1.
O testamento celebrado por alguma das formas especiais previstas na presente
secção fica sem efeito decorridos dois meses sobre a cessação da causa que
impedia o testador de testar segundo as formas comuns.
2.
Se no decurso deste prazo o testador for colocado de novo em circunstâncias
impeditivas, o prazo é interrompido devendo começar a contar-se por inteiro a
partir da cessação das novas circunstâncias.
3.
A entidade perante quem for feito o testamento deve esclarecer o testador
acerca do disposto no nº 1, fazendo menção do facto no próprio testamento; a
falta de cumprimento deste preceito não determina a nulidade do acto.
ARTIGO 2223º
(Testamento feito por português em país estrangeiro)
O
testamento feito por cidadão português em país estrangeiro com observância da
lei estrangeira competente só produz efeitos em Portugal se tiver sido
observada uma forma solene na sua feitura ou aprovação.
CAPÍTULO VI
Conteúdo do testamento
SECÇÃO I
Disposições gerais
ARTIGO 2224º
(Disposições a favor da alma)
1.
É válida a disposição a favor da alma, quando o testador designe os bens que
devem ser utilizados para esse fim ou quando seja possível determinar a quantia
necessária para tal efeito.
2.
A disposição a favor da alma constitui encargo que recai sobre o herdeiro ou
legatário.
ARTIGO 2225º
(Disposição a favor de uma generalidade de pessoas)
A
disposição a favor de uma generalidade de pessoas, sem qualquer outra
indicação, considera-se feita a favor das existentes no lugar em que o testador
tinha o seu domicílio à data da morte.
ARTIGO 2226º
(Disposições a favor de parentes ou herdeiros
legítimos)
1.
A disposição a favor dos parentes do testador ou de terceiro, sem designação de
quais sejam, considera-se feita a favor dos que seriam chamados por lei à
sucessão, na data da morte do testador, sendo a herança ou legado distribuído
segundo as regras da sucessão legítima.
2.
De igual forma se procederá, se forem designados como sucessores os herdeiros
legítimos do testador ou de terceiro, ou certa categoria de parentes.
ARTIGO 2227º
(Designação individual e colectiva dos sucessores)
Se
o testador designar certos sucessores individualmente e outros colectivamente,
são estes havidos por individualmente designados.
ARTIGO 2228º
(Designação de certa pessoa e seus filhos)
Se
o testador chamar à sucessão certa pessoa e seus filhos, entende-se que são
todos designados simultaneamente, nos termos do artigo anterior, e não
sucessivamente.
SECÇÃO II
Disposições condicionais, a termo e
modais
ARTIGO 2229º
(Diposições condicionais)
O
testador pode sujeitar a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário a
condição suspensiva ou resolutiva, com as limitações dos artigos seguintes.
ARTIGO 2230º
(Condições impossíveis, contrárias à lei
ou à ordem pública ou ofensivas dos bons costumes)
1.
A condição física ou legalmente impossível considera-se não escrita e não
prejudica o herdeiro ou legatário, salvo declaração do testador em contrário.
2.
A condição contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes,
tem-se igualmente por não escrita, ainda que o testador haja declarado o
contrário, salvo o disposto no artigo 2186º.
ARTIGO 2231º
(Condição captatória)
É
nula a disposição feita sob condição de que o herdeiro ou legatário faça
igualmente em seu testamento alguma disposição a favor do testador ou de
outrem.
ARTIGO 2232º
(Condições contrárias à lei)
Consideram-se
contrárias à lei a condição de residir ou não residir em certo prédio ou local,
de conviver ou não conviver com certa pessoa, de não fazer testamento, de não
transmitir a determinada pessoa os bens deixados ou de os não partilhar ou
dividir, de não requerer inventário, de tomar ou deixar de tomar o estado
eclesiástico ou determinada profissão e as cláusulas semelhantes.
ARTIGO 2233º
(Condição de casar ou não casar)
1.
É também contrária à lei a condição de que o herdeiro ou legatário celebre ou
deixe de celebrar casamento.
2.
É, todavia, válida a deixa de usufruto, uso, habitação, pensão ou outra
prestação contínua ou periódica para produzir efeito enquanto durar o estado de
solteiro ou viúvo do legatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2234º
(Condição de não dar ou não fazer)
Se
a herança ou legado for deixado sob condição de o herdeiro ou legatário não dar
certa coisa ou não praticar certo acto por tempo indeterminado, a disposição
considera-se feita sob condição resolutiva, a não ser que o contrário resulte
do testamento.
ARTIGO 2235º
(Obrigação de preferência)
O
testador pode impor ao legatário a obrigação de dar preferência a certa pessoa
na venda da coisa legada ou na realização de outro contrato, nos termos prescritos
para os pactos de preferência.
ARTIGO 2236º
(Prestação de caução)
1.
Em caso de disposição testamentária sujeita a condição resolutiva, o tribunal
pode impor ao herdeiro ou legatário a obrigação de prestar caução no interesse
daqueles a favor de quem a herança ou legado será deferido no caso de a
condição se verificar.
2.
Do mesmo modo, em caso de legado dependente de condição suspensiva ou termo
inicial, o tribunal pode impor àquele que deva satisfazer o legado a obrigação
de prestar caução no interesse do legatário.
3.
O testador pode dispensar a prestação de caução em qualquer dos casos previstos
nos números anteriores.
ARTIGO 2237º
(Administração da herança ou legado)
1.
Se o herdeiro for instituído sob condição suspensiva, é posta a herança em
administração, até que a condição se cumpra ou haja a certeza de que não pode
cumprir-se.
2.
Também é posta em administração a herança ou legado durante a pendência da
condição ou do termo, se não prestar caução aquele a quem for exigida nos termos
do artigo anterior.
ARTIGO 2238º
(A quem pertence a administração)
1.
No caso de herança sob condição suspensiva, a administração pertence ao próprio
herdeiro condicional e, se ele a não aceitar, ao seu substituto; se não existir
substituto ou este também a não aceitar, a administração pertence ao
co-herdeiro ou co-herdeiros incondicionais, quando entre eles e o co-herdeiro
condicional houver direito de acrescer, e, na sua falta, ao herdeiro legítimo
presumido.
2.
Não sendo prestada a caução prevista no artigo 2236º, a administração da
herança ou legado compete àquele em cujo interesse a caução devia ser prestada.
3.
Contudo, em qualquer dos casos previstos no presente artigo, o tribunal pode
providenciar de outro modo, se ocorrer justo motivo.
ARTIGO 2239º
(Regime da administração)
Sem
prejuízo do disposto nos artigos anteriores, os administradores da herança ou
legado estão sujeitos às regras aplicáveis ao curador provisório dos bens do
ausente, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 2240º
(Administração da herança ou legado a favor de
nascituro)
1.
O disposto nos artigos 2237º a 2239º é aplicável à herança deixada a nascituro
não concebido, filho de pessoa viva; mas a esta pessoa ou, se ela for incapaz,
ao seu representante legal pertence a representação do nascituro em tudo o que
não seja inerente à administração da herança ou do legado.
2.
Se o herdeiro ou legatário estiver concebido, a administração da herança ou do
legado compete a quem administraria os seus bens se ele já tivesse nascido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2241º
(Administração do cabeça-de-casal)
As
disposições dos artigos antecedentes não prejudicam os poderes de administração
do cabeça-de-casal.
ARTIGO 2242º
(Retroactividade da condição)
1.
Os efeitos do preenchimento da condição retrotraem-se à data da morte do
testador, considerando-se não escritas as declarações testamentárias em
contrário.
2.
É aplicável quanto ao regime da retroactividade o disposto nos nºs 2 e 3 do
artigo 277º.
ARTIGO 2243º
(Termo inicial ou final)
1.
O testador pode sujeitar a nomeação do legatário a termo inicial; mas este
apenas suspende a execução da disposição, não impedindo que o nomeado adquira
direito ao legado.
2.
A declaração de termo inicial na instituição de herdeiro, e bem assim a
declaração de termo final tanto na instituição de herdeiro como na nomeação de
legatário, têm-se por não escritas, excepto, quanto a esta nomeação, se a
disposição versar sobre direito temporário.
ARTIGO 2244º
(Encargos)
Tanto
a instituição de herdeiro como a nomeação de legatário podem ser sujeitas a
encargos.
ARTIGO 2245º
(Encargos impossíveis, contrários à lei
ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes)
É
aplicável aos encargos impossíveis, contrários à lei ou à ordem pública, ou
ofensivos dos bons costumes, o disposto no artigo 2230º.
ARTIGO 2246º
(Prestação de caução)
O
tribunal, quando o considere justificado e o testador não tenha disposto coisa
diversa, pode impor ao herdeiro ou legatário onerado pelos encargos a obrigação
de prestar caução.
ARTIGO 2247º
(Cumprimento dos encargos)
No
caso de o herdeiro ou legatário não satisfazer os encargos, a qualquer
interessado é lícito exigir o seu cumprimento.
ARTIGO 2248º
(Resolução da disposição testamentária)
1.
Qualquer interessado pode também pedir a resolução da disposição testamentária
pelo não cumprimento do encargo, se o testador assim houver determinado, ou se
for lícito concluir do testamento que a disposição não teria sido mantida sem o
cumprimento do encargo.
2.
Sendo resolvida a disposição, o encargo deve ser cumprido, nas mesmas
condições, pelo beneficiário da resolução, salvo se outra coisa resultar do
testamento ou da natureza da disposição.
3.
O direito de resolução caduca passados cinco anos sobre a mora no cumprimento
do encargo e, em qualquer caso, decorridos vinte anos sobre a abertura da
sucessão.
SECÇÃO III
Legados
ARTIGO 2249º
(Aceitação e repúdio do legado)
É
extensivo aos legados, no que lhes for aplicável, e com as necessárias adaptações,
o disposto sobre a aceitação e repúdio da herança.
ARTIGO 2250º
(Indivisibilidade da vocação)
1.
O legatário não pode aceitar um legado em parte e repudiá-lo noutra parte; mas
pode aceitar um legado e repudiar outro, contanto que este último não seja
onerado por encargos impostos pelo testador.
2.
O herdeiro que seja ao mesmo tempo legatário tem a faculdade de aceitar a
herança e repudiar o legado ou de aceitar o legado e repudiar a herança, mas
também só no caso de a deixa repudiada não estar sujeita a encargos.
ARTIGO 2251º
(Legado de coisa pertencente ao onerado ou a
terceiro)
1.
É nulo o legado de coisa pertencente ao sucessor onerado com o encargo ou a
terceiro, salvo se do testamento se depreender que o testador sabia que não lhe
pertencia a coisa legada.
2.
Neste último caso, o sucessor que tenha aceitado a disposição feita em seu
benefício é obrigado a adquirir a coisa e a transmiti-la ao legatário ou a
proporcionar-lhe por outro modo a sua aquisição, ou, não sendo isso possível, a
pagar-lhe o valor dela; e é igualmente obrigado a transmitir-lhe a coisa, se
ela lhe pertencer.
3.
Se a coisa legada, que não pertencia ao testador no momento da feitura do
testamento, se tiver depois tornado sua por qualquer título, tem efeito a disposição
relativa a ela, como se ao tempo do testamento pertencesse ao testador.
4.
Se o legado recair sobre coisa de algum dos co-herdeiros, são os outros
obrigados a satisfazer-lhe, em dinheiro ou em bens da herança, a parte que lhes
toca no valor dela, proporcionalmente aos seus quinhões hereditários, salvo
diversa declaração do testador.
ARTIGO 2252º
(Legado de coisa pertencente só em parte ao testador)
1.
Se o testador legar uma coisa que não lhe pertença por inteiro, o legado vale
apenas em relação à parte que lhe pertencer, salvo se do testamento resultar
que o testador sabia não lhe pertencer a totalidade da coisa, pois, nesse caso,
observar-se-á, quanto ao restante, o preceituado no artigo anterior.
2.
As regras do número anterior não prejudicam o disposto no artigo 1685º quanto à
deixa de coisa certa e determinada do património comum dos cônjuges.
ARTIGO 2253º
(Legado de coisa genérica)
É
válido o legado de coisa indeterminada de certo género, ainda que nenhuma coisa
deste género se encontrasse no património do testador à data do testamento e
nenhuma aí se encontre à data da sua morte, salvo se o testador fizer a
declaração prevista no artigo seguinte.
ARTIGO 2254º
(Legado de coisa não existente no espólio do
testador)
1.
Se o testador legar coisa determinada, ou coisa indeterminada de certo género,
com a declaração de que aquela coisa ou este género existe no seu património,
mas se assim não suceder ao tempo da sua morte, é nulo o legado.
2.
Se a coisa ou género mencionado na disposição se encontrar no património do
testador ao tempo da sua morte, mas não na quantidade legada, haverá o
legatário o que existir.
ARTIGO 2255º
(Legado de coisa existente em lugar determinado)
O
legado de coisa existente em lugar determinado só pode ter efeito até onde
chegue a quantidade que aí se achar à data da abertura da sucessão, excepto se
a coisa, habitualmente guardada nesse lugar, tiver sido de lá removida, no todo
ou em parte, a título transitório.
ARTIGO 2256º
(Legado de coisa pertencente ao próprio legatário)
1.
É nulo o legado de coisa que à data do testamento pertencia ao próprio
legatário, se também lhe pertencer à data da abertura da sucessão.
2.
O legado, é porém, válido se à data da abertura da sucessão a coisa pertencia
ao testador; e também o é, se a esse tempo pertencia ao sucessor onerado com o
legado ou a terceiro e do testamento resultar que a deixa foi feita na previsão
deste facto.
3.
É aplicável, neste último caso, o disposto nos nº 2 e 4 do artigo 2251º.
ARTIGO 2257º
(Legado de coisa adquirida pelo legatário)
1.
Se depois da feitura do testamento o legatário adquirir do testador, por título
oneroso ou gratuito, a coisa que tiver sido objecto do legado, este não produz
efeito.
2.
O legado também não produz efeito se, após o testamento, o legatário adquirir a
coisa, por título gratuito, do sucessor onerado ou de terceiro; se a adquirir
por título oneroso, pode pedir o que houver desembolsado, quando do testamento
resulte que o testador sabia não lhe pertencer a coisa legada.
ARTIGO 2258º
(Legado de usufruto)
A
deixa de usufruto, na falta de indicação em contrário, considera-se feita
vitaliciamente; se o beneficiário for uma pessoa colectiva, terá a duração de
trinta anos.
ARTIGO 2259º
(Legado para pagamento de dívida)
1.
Se o testador legar certa coisa ou certa soma como por ele devida ao legatário,
é válido o legado, ainda que a soma ou coisa não fosse realmente devida, salvo
sendo o legatário incapaz de a haver por sucessão.
2.
O legado fica, todavia, sem efeito, se o testador, sendo devedor ao tempo da
feitura do testamento, cumprir a obrigação posteriormente.
ARTIGO 2260º
(Legado a favor do credor)
O
legado feito a favor de um credor, mas sem que o testador refira a sua dívida,
não se considera destinado a satisfazer essa dívida.
ARTIGO 2261º
(Legado de crédito)
1.
O legado de um crédito só produz efeito em relação à parte que subsista ao
tempo da morte do testador.
2.
O herdeiro satisfará a disposição entregando ao legatário os títulos
respeitantes ao crédito.
ARTIGO 2262º
(Legado da totalidade dos créditos)
Se
o testador legar a totalidade dos seus créditos, deve entender-se, em caso de
dúvida, que o legado só compreende os créditos em dinheiro, excluídos os
depósitos bancários e os títulos ao portador ou nominativos.
ARTIGO 2263º
(Legado do recheio de uma casa)
Sendo
legado o recheio de uma casa ou o dinheiro nela existente, não se entende, no
silêncio do testador, que são também legados os créditos, ainda que na casa se
encontrem os documentos respectivos.
ARTIGO 2264º
(Pré-legado)
O
legado a favor de um dos co-herdeiros, e a cargo de toda a herança, vale por
inteiro.
ARTIGO 2265º
(Obrigação de prestação do legado)
1.
Na falta de disposição em contrário, o cumprimento do legado incumbe aos herdeiros.
2.
O testador pode, todavia, impor o cumprimento só a algum ou alguns dos
herdeiros, ou a algum ou alguns dos legatários.
3.
Os herdeiros ou legatários sobre quem recaia o encargo ficam a ele sujeitos em
proporção dos respectivos quinhões hereditários ou dos respectivos legados, se
o testador não tiver estabelecido proporção diversa.
ARTIGO 2266º
(Cumprimento do legado de coisa genérica)
1.
Quando o legado for de coisa indeterminada pertencente a certo género, cabe a
escolha dela a quem deva prestá-la, excepto se o testador tiver atribuído a
escolha ao próprio legatário ou a terceiro.
2.
No silêncio do testador, a escolha recairá sobre coisas existentes na herança,
salvo se não se encontrar nenhuma do género considerado e o legado for válido
nos termos do artigo 2253º; o legatário pode escolher a coisa melhor, a não ser
que a escolha verse sobre coisas não existentes na heraça.
3.
As regras dos artigos 400º e 542º são aplicáveis, com as necessárias
adaptações, ao legado de coisa genérica, quando não estejam em oposição com o
disposto nos números antecedentes.
ARTIGO 2267º
(Cumprimento dos legados alternativos)
Os
legados alternativos estão sujeitos ao regime, devidamente adaptado, das
obrigações alternativas.
ARTIGO 2268º
(Transmissão do direito de escolha)
Tanto
no legado de coisa genérica como no legado alternativo, se a escolha pertencer
ao sucessor onerado ou ao legatário, e um ou outro falecer sem a ter efectuado,
transmite-se esse direito aos seus herdeiros.
ARTIGO 2269º
(Extensão do legado)
1.
Na falta de declaração do testador sobre a extensão do legado, entende-se que
ele abrange as benfeitorias e partes integrantes.
2.
O legado de prédio rústico ou urbano, ou do conjunto de prédios rústicos ou
urbanos que constituam uma unidade económica, abrange, no silêncio do testador,
as construções nele feitas, anteriores ou posteriores ao testamento, e bem
assim as aquisições posteriores que se tenham integrado na mesma unidade, sem
prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 2316º.
ARTIGO 2270º
(Entrega do legado)
Na
falta de declaração do testador sobre a entrega do legado, esta deve ser feita
no lugar em que a coisa legada se encontrava ao tempo da morte do testador e no
prazo de um ano a contar dessa data, salvo se por facto não imputável ao
onerado se tornar impossível o cumprimento dentro desse prazo; se, porém, o
legado consistir em dinheiro ou em coisa genérica que não exista na herança, a
entrega deve ser feita no lugar onde se abrir a sucessão, dentro do mesmo
prazo.
ARTIGO 2271º
(Frutos)
Não
havendo declaração do testador sobre os frutos da coisa legada, o legatário tem
direito aos frutos desde a morte do testador, com exepção dos percebidos
adiantamente pelo autor da sucessão; se, todavia, o legado consistir em
dinheiro ou em coisa não pertencente à herança, os frutos só são devidos a
partir da mora de quem deva satisfazê-lo.
ARTIGO 2272º
(Legado de coisa onerada)
1.
Se a coisa legada estiver onerada com alguma servidão ou outro encargo que lhe
seja inerente, passa com o mesmo encargo ao legatário.
2.
Havendo foros ou outras prestações atrasadas, serão pagas por conta da herança;
e por conta dela serão pagas ainda as dívidas asseguradas por hipotecas ou
outra garantia real constituída sobre coisa legada.
ARTIGO 2273º
(Legado de prestação periódica)
1.
Se o testador legar qualquer prestação periódica, o primeiro período corre
desde a sua morte, tendo o legatário o direito a toda a prestação respeitante a
cada período, ainda que faleça no seu decurso.
2.
O disposto no número anterior é aplicável ao legado de alimentos, mesmo que
estes só venham a ser fixados depois da morte do testador.
3.
O legado só é exigível no termo do período correspondente, salvo se for a
título de alimentos, pois, nesse caso, é devido a partir do início de cada
período.
ARTIGO 2274º
(Legado deixado a um menor)
O
legado deixado a um menor para quando atingir a maioridade não pode ser por ele
exigido antes desse tempo, ainda que seja emancipado.
ARTIGO 2275º
(Despesas com o cumprimento do legado)
As
despesas feitas com o cumprimento do legado ficam a cargo de quem deva
satisfazê-lo.
ARTIGO 2276º
(Encargos impostos ao legatário)
1.
O legatário responde pelo cumprimento dos legados e dos outros encargos que lhe
sejam impostos, mas só dentro dos limites do valor da coisa legada.
2.
Se o legatário com encargo não receber todo o legado, é o encargo reduzido
proporcionalmente e, se a coisa legada for reivindicada por terceiro, pode o
legatário reaver o que houver pago.
ARTIGO 2277º
(Pagamento dos encargos da herança pelos legatários)
Se
a herança for toda distribuída em legado, são os encargos dela suportados por
todos os legatários em proporção dos seus legados, excepto se o testador houver
disposto outra coisa.
ARTIGO 2278º
(Herança insuficiente para pagamento dos legados)
Se
os bens da herança não chegarem para cobrir os legados, são estes pagos
rateadamente; exceptuam-se os legados remuneratórios, os quais são considerados
como dívida da herança.
ARTIGO 2279º
(Reivindicação da coisa legada)
O
legatário pode reivindicar de terceiro a coisa legada, contanto que esta seja
certa e determinada.
ARTIGO 2280º
(Legados pios)
Os
legados pios são regulados por legislação especial.
SECÇÃO IV
Substituições
SUBSECÇÃO I
Substituição directa
ARTIGO 2281º
(Noção)
1.
O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro instituído para o caso de
este não poder ou não querer aceitar a herança: é o que se chama substituição
directa.
2.
Se o testador previr só um destes casos, entende-se ter querido abranger o
outro, salvo declaração em contrário.
ARTIGO 2282º
(Substituição plural)
Podem
substituir-se várias pessoas a uma só, ou uma só a várias.
ARTIGO 2283º
(Substituição recíproca)
1.
O testador pode determinar que os co-herdeiros se substituam reciprocamente.
2.
Em tais casos se os co-herdeiros tiverem sido instituídos em partes desiguais,
respeitar-se-á, no silêncio do testador, a mesma proporção na substituição.
3.
Mas, se à substituição não forem chamados todos os restantes instituídos, ou o
for outra pessoa além deles, e nada se declarar sobre a proporção respectiva, o
quinhão vago será repartido em partes iguais pelos substitutos.
ARTIGO 2284º
(Direitos e obrigações dos substitutos)
Os
substitutos sucedem nos direitos e obrigações em que sucederiam os
substituídos, excepto se outra for a vontade do testador.
ARTIGO 2285º
(Substituição directa nos legados)
1.
O disposto na presente subsecção é aplicável aos legados.
2.
Quanto aos legatários nomeados em relação ao mesmo objecto, seja ou não
conjunta a nomeação, a substituição recíproca considera-se feita, no silêncio
do testador, na mesma proporção em que foi feita a nomeação.
SUBSECÇÃO II
Substituição fideicomissária
ARTIGO 2286º
(Noção)
Diz-se
substituição fideicomissária, ou fideicomisso, a disposição pela qual o
testador impõe ao herdeiro instituído o encargo de conservar a herança, para
que ela reverta, por sua morte, a favor de outrem; o herdeiro gravado com o
encargo chama-se fiduciário, e fideicomissário o beneficiário da substituição.
ARTIGO 2287º
(Substituição plural)
Pode
haver um só ou vários fiduciários, assim como um ou vários fideicomissários.
ARTIGO 2288º
(Limite de validade)
São
nulas as substituições fideicomissárias em mais de um grau, ainda que a
reversão da herança para o fideicomissário esteja subordinada a um
acontecimento futuro e incerto.
ARTIGO 2289º
(Nulidade da substituição)
A
nulidade da substituição fideicomissária não envolve a nulidade da instituição
ou da substituição anterior; apenas se tem por não escrita a cláusula
fideicomissária, salvo se o contrário resultar do testamento.
ARTIGO 2290º
(Direitos e obrigações do fiduciário)
1.
O fiduciário tem o gozo e a administração dos bens sujeitos ao fideicomisso.
2.
São extensivas ao fiduciário, no que não for incompatível com a natureza do
fideicomisso, as disposições legais relativas ao usufruto.
3.
O caso julgado constituído em acção relativa aos bens sujeitos ao fideicomisso
não é oponível ao fideicomissário se ele não interveio nela.
ARTIGO 2291º
(Alienação ou oneração de bens)
1.
Em caso de evidente necessidade ou utilidade para os bens da substituição, pode
o tribunal autorizar, com as devidas cautelas, a alienação ou oneração dos bens
sujeitos ao fideicomisso.
2.
Nas mesmas condições, pode o tribunal autorizar a alienação ou oneração em caso
de evidente necessidade ou utilidade para o fiduciário, contanto que os
interesses do fideicomissário não sejam afectados.
ARTIGO 2292º
(Direitos dos credores pessoais do fiduciário)
Os
credores pessoais do fiduciário não têm o direito de se pagar pelos bens
sujeitos ao fideicomisso, mas tão-somente pelos seus frutos.
ARTIGO 2293º
(Devolução da herança ao fideicomissário)
1.
A herança devolve-se ao fideicomissário no momento da morte do fiduciário.
2.
Se o fideicomissário não puder ou não quiser aceitar a herança, fica sem efeito
a substituição,e a titularidade dos bens hereditários considera-se adquirida
definitivamente pelo fiduciário desde a morte do testador.
3.
Não podendo ou não querendo o fiduciário aceitar a herança, a substituição, no
silêncio do testamento, converte-se de fideicomissária em directa, dando-se a
devolução da herança a favor do fideicomissário, com efeito desde o óbito do
testador.
ARTIGO 2294º
(Actos de disposição do fideicomissário)
O
fideicomissário não pode aceitar ou repudiar a herança nem dispor dos bens
respectivos, mesmo por título oneroso, antes de ela lhe ser devolvida.
ARTIGO 2295º
(Fideicomissos irregulares)
1.
São havidas como fideicomissárias:
a)
As disposições pelas quais o testador proíba o herdeiro de dispor dos bens
hereditários, seja por acto entre vivos, seja por acto de última vontade;
b)
As disposições pelas quais o testador chame alguém ao que restar da herança por
morte do herdeiro;
c)
As disposições pelas quais o testador chame alguém aos bens deixados a uma
pessoa colectiva, para o caso de esta se extinguir.
2.
No caso previsto na alínea a) do número anterior, são havidos como
fideicomissários os herdeiros legítimos do fiduciário.
3.
Aos fideicomissos previstos neste artigo são aplicáveis as disposições dos
artigos antecedentes; mas, nos casos das alíneas b) e c) do nº 1, o fiduciário
pode dispor dos bens por acto entre vivos, independentemente de autorização judicial,
se obtiver o consentimento do fideicomissário.
ARTIGO 2296º
(Substituição fideicomissária nos legados)
O
disposto na presente subsecção é aplicável aos legados.
SUBSECÇÃO III
Substituições pupilar e
quase-pupilar
ARTIGO 2297º
(Substituição pupilar)
1.
O progenitor que não estiver inibido total ou parcialmente do poder paternal
tem a faculdade de substituir aos filhos os herdeiros ou legatários que bem lhe
aprouver, para o caso de os mesmos filhos falecerem antes de perfazer os
dezoito anos de idade: é o que se chama substituição pupilar.
2.
A substituição fica sem efeito logo que o substituído perfaça os dezoito anos,
ou se falecer deixando descendentes ou ascendentes.
ARTIGO 2298º
(Substituição quase-pupilar)
1.
A disposição do artigo anterior é aplicável, sem destinção de idade, ao caso de
o filho ser incapaz de testar em consequência de interdição por anomalia
psíquica: é o que se chama substituição quase-pupilar.
2.
A substituição quase-pupilar fica sem efeito logo que seja levantada a
interdição, ou se o substituto falecer deixando descendentes ou ascendentes.
ARTIGO 2299º
(Transformação da substituição pupilar em
quase-pupilar)
A
substituição pupilar é havida para todos os efeitos como quase-pupilar, se o
menor for declarado interdito por anomalia psíquica.
ARTIGO 2300º
(Bens que podem ser abrangidos)
As
substituições pupilar e quase pupilar só podem abranger os bens que o
substituído haja adquirido por via do testador, embora a título de legítima.
SECÇÃO V
Direito de acrescer
ARTIGO 2301º
(Direito de acrescer entre herdeiros)
1.
Se dois ou mais herdeiros forem instituídos em partes iguais na totalidade ou
numa quota dos bens, seja ou não conjunta a instituição, e algum deles não
puder ou não quiser aceitar a herança, acrescerá a sua parte à dos outros
herdeiros instituídos na totalidade ou na quota.
2.
Se forem desiguais as quotas dos herdeiros, a parte do que não pôde ou não quis
aceitar é dividida pelos outros, respeitando- se a proporção entre eles.
ARTIGO 2302º
(Direito de acrescer entre legatários)
1.
Há direito de acrescer entre os legatários que tenham sido nomeados em relação
ao mesmo objecto, seja ou não conjunta a nomeação.
2.
É aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior.
ARTIGO 2303º
(Desoneração do encargo do cumprimento do legado)
Não
havendo direito de acrescer entre os legatários, o objecto do legado é
atribuído ao herdeiro ou legatário onerado com o encargo do seu cumprimento,
salvo se esse objecto estiver genericamente compreendido noutro legado.
ARTIGO 2304º
(Casos em que o direito de acrescer não tem lugar)
Não
há lugar ao direito de acrescer, se o testador tiver disposto outra coisa, se o
legado tiver natureza puramente pessoal ou se houver direito de representação.
ARTIGO 2305º
(Direito de acrescer entre usufrutuários)
É
aplicável ao direito de acrescer entre usufrutuários o disposto nos artigos
1442º e 2302º.
ARTIGO 2306º
(Aquisição da parte acrescida)
A
aquisição da parte acrescida dá-se por força da lei, sem necessidade de
aceitação do beneficiário, que não pode repudiar separadamente essa parte,
excepto quando sobre ela recaiam encargos especiais impostos pelo testador;
neste caso, sendo objecto de repúdio, a porção acrescida reverte para a pessoa
ou pessoas a favor de quem os encargos hajam sido constituídos.
ARTIGO 2307º
(Efeitos do direito de acrescer)
Os
herdeiros ou legatários que houverem o acrescido sucedem nos mesmos direitos e
obrigações, de natureza não puramente pessoal, que caberiam àquele que não pôde
ou não quis receber a deixa.
CAPÍTULO VII
Nulidade, anulabilidade, revogação
e caducidade dos testamentos
e disposições testamentárias
SECÇÃO I
Nulidade e anulabilidade
ARTIGO 2308º
(Caducidade da acção)
1.
A acção de nulidade do testamento ou de disposição testamentária caduca ao fim
de dez anos, a contar da data em que o interessado teve conhecimento do
testamento e da causa da nulidade.
2.
Sendo anulável o testamento ou a disposição, a acção caduca ao fim de dois anos
a contar da data em que o interessado teve conhecimento do testamento e da
causa da anulabilidade.
3.
São aplicáveis, nestes casos, as regras da suspensão e interrupção da
prescrição.
ARTIGO 2309º
(Confirmação do testamento)
Não
pode prevalecer-se da nulidade ou anulabilidade do testamento ou da disposição
testamentária aquele que a tiver confirmado.
ARTIGO 2310º
(Inadmissibilidade da proibição de impugnar o
testamento)
O
testador não pode proibir que seja impugnado o seu testamento nos casos em que
haja nulidade ou anulabilidade.
SECÇÃO II
Revogação e caducidade
(Epígrafe dada pelo Dec.-Lei 496/77,
de 25-11)
ARTIGO 2311º
(Faculdade de revogação)
1.
O testador não pode renunciar à faculdade de revogar, no todo ou em parte, o
seu testamento.
2.
Tem-se por não escrita qualquer cláusula que contrarie a faculdade de
revogação.
ARTIGO 2312º
(Revogação expressa)
A
revogação expressa do testamento só pode fazer-se declarando o testador, noutro
testamento ou em escritura pública, que revoga no todo ou em parte o testamento
anterior.
ARTIGO 2313º
(Revogação tácita)
1.
O testamento posterior que não revogue expressamente o anterior revogá-lo-á
apenas na parte em que for com ele incompatível.
2.
Se aparecerem dois testamentos da mesma data, sem que seja possível determinar
qual foi o posterior, e implicarem contradição, haver-se-ão por não escritas em
ambos as disposições contraditórias.
ARTIGO 2314º
(Revogação do testamento revogatório)
1.
A revogação expressa ou tácita produz o seu efeito, ainda que o testamento
revogatório seja por sua vez revogado.
2.
O testamento anterior recobra, todavia, a sua força, se o testador, revogando o
posterior, declarar ser sua vontade que revivam as disposições do primeiro.
ARTIGO 2315º
(Inutilização do testamento cerrado)
1.
Se o testamento cerrado aparecer dilacerado ou feito em pedaços,
considerar-se-á revogado, excepto quando se prove que o facto foi practicado
por pessoa diversa do testador ou que este não teve intenção de o revogar ou se
encontrava privado do uso da razão.
2.
Presume-se que o facto foi praticado por pessoa diversa do testador, se o
testamento não se encontrava no espólio deste à data da sua morte.
3.
A simples obliteração ou cancelamento do testamento, no todo ou em parte, ainda
que com ressalva e assinatura, não é havida como revogação, desde que possa
ler-se a primitiva disposição.
ARTIGO 2316º
(Alienação ou transformação da coisa legada)
1.
A alienação total ou parcial da coisa legada implica revogação correlativa do
legado; a revogação surte o seu efeito, ainda que a alienação seja anulada por
fundamento diverso da falta ou vícios da vontade do alheador, ou ainda que este
readquira por outro modo a propriedade da coisa.
2.
Implica, outrossim, revogação do legado a tranformação da coisa em outra, com
diferente forma e denominação ou diversa natureza, quando a transformação seja
feita pelo testador.
3.
É, porém, admissível a prova de que o testador, ao alienar ou transformar a
coisa, não quis revogar o legado.
ARTIGO 2317º
(Casos de caducidade)
As
disposições testamentárias, quer se trate da instituição de herdeiro, quer da
nomeação de legatário, caducam, além de outros casos:
a)
Se o instituído ou nomeado falecer antes do testador, salvo havendo
representação sucessória;
b)
Se a instituição ou nomeação estiver dependente de condição suspensiva e o
sucessor falecer antes de a condição se verificar;
c)
Se o instituído ou nomeado se tornar incapaz de adquirir a herança ou o legado;
d)
Se o chamado à sucessão era cônjuge do testador e à data da morte deste se
encontravam divorciados ou separados judicialmente de pessoas e bens ou o
casamento tenha sido declarado nulo ou anulado, por sentença já transitada ou
que venha a transitar em julgado, ou se vier a ser proferida, posteriormente
àquela data, sentença de divórcio, separação judicial de pessoas e bens,
declaração de nulidade ou anulação do casamento;
e)
Se o chamado à sucessão repúdiar a herança ou o legado, salvo havendo
representação sucessória.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGOS 2318º e 2319º
(Revogados pelo Dec.-Lei 497/77, de 25-11)
CAPÍTULO VIII
Testamentaria
ARTIGO 2320º
(Noção)
O
testador pode nomear uma ou mais pessoas que fiquem encarregadas de vigiar o
cumprimento do seu testamento ou de o executar, no todo ou em parte: é o que se
chama testamentaria.
ARTIGO 2321º
(Quem pode ser nomeado testamenteiro)
1.
Só pode ser nomeado testamenteiro o que tiver plena capacidade jurídica.
2.
A nomeação pode recair sobre um herdeiro ou legatário.
ARTIGO 2322º
(Aceitação ou recusa)
O
nomeado pode aceitar ou recusar a testamentaria.
ARTIGO 2323º
(Aceitação)
1.
A aceitação da testamentaria pode ser expressa ou tácita.
2.
A testamentaria não pode ser aceita sob condição, nem a termo, nem só em parte.
ARTIGO 2324º
(Recusa)
A
recusa da testamentaria faz-se por meio de declaração perante notário.
ARTIGO 2325º
(Atribuições do testamenteiro)
O
testamenteiro tem as atribuições que o testador lhe conferir, dentro dos
limites da lei.
ARTIGO 2326º
(Disposição supletiva)
Se
o testador não especificar as atribuições do testamenteiro, competirá a este:
a)
Cuidar do funeral do testador e pagar as despesas e sufrágios respectivos,
conforme o que for estabelecido no testamento ou, se nada se estabelecer,
consoante os usos da terra;
b)
Vigiar a execução das disposições testamentárias e sustentar, se for
necessário, a sua validade em juízo;
c)
Exercer as funções de cabeça-de-casal, nos termos da alínea b) do nº 1 do
artigo 2080º.
ARTIGO 2327º
(Cumprimento de legados e outros encargos)
O
testador pode encarregar o testamenteiro do cumprimento dos legados e dos
demais encargos da herança, quando este seja cabeça-de-casal e não haja lugar a
inventário obrigatório.
ARTIGO 2328º
(Venda de bens)
Para
efeitos do disposto no artigo anterior, pode o testamenteiro ser autorizado
pelo testador a vender quaisquer bens da herança, móveis ou imóveis, ou os que
forem designados no testamento.
ARTIGO 2329º
(Pluralidade de testamenteiros)
1.
Sendo vários os testamenteiros, consideram-se todos nomeados conjuntamente,
salvo se outra coisa tiver sido disposta pelo testador.
2.
Caducando por qualquer causa a testamentaria em relação a algum dos nomeados,
continuam os restantes no exercício das respectivas funções.
3.
Sendo os testamenteiros nomeados sucessivamente, cada um deles só é chamado a
aceitar ou recusar o cargo na falta do anterior.
ARTIGO 2330º
(Escusa do testamenteiro)
O
nomeado que aceitou a testamentaria só pode ser dela escusado nos casos previstos
no nº 1 do artigo 2085º.
ARTIGO 2331º
(Remoção do testamenteiro e caducidade
da testamentaria plural)
1.
O testamenteiro pode ser judicialmente removido, a requerimento de qualquer
interessado, se não cumprir com prudência e zelo os deveres do seu cargo ou
mostrar incompetência no seu desempenho.
2.
Se forem vários os testamenteiros nomeados conjuntamente e não houver acordo
entre eles sobre o exercício da testamentaria, podem ser removidos todos, ou
apenas algum ou alguns deles.
ARTIGO 2332º
(Prestação de contas)
1.
O testamenteiro é obrigado a prestar contas anualmente.
2.
Em caso de culpa, responde o testamenteiro perante os herdeiros e legatários
pelos danos a que der causa.
ARTIGO 2333º
(Remuneração)
1.
O cargo de testamenteiro é gratuito, excepto se lhe for assinada pelo testador
alguma retribuição.
2.
O testamenteiro não tem direito à retribuição assinada, ainda que atribuída sob
a forma de legado, se não aceitar a testamentaria ou for dela removido; se a
testamentaria caducar por qualquer outra causa, cabe-lhe apenas uma parte da
retribuição proporcional ao tempo em que exerceu as funções.
ARTIGO 2334º
(Intransmissibilidade)
A testamentaria não é transmissível, em vida ou por morte, nem é delegável, bem que possa o testamenteiro servir-se de auxiliares na execução do cargo, nos mesmos termos em que o procurador o pode fazer.
DECRETO-LEI Nº 47 344, de 25 de Novembro de 1966, de aprovação, no fim
Usando da faculdade conferida pela
1ª parte do nº 2º do artigo 109º da Constituição, o Governo decreta e eu
promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1º (Aprovação do Código
Civil)
É aprovado o Código Civil que faz
parte do presente decreto-lei.
Artigo 2º (Começo de vigência)
1. O Código Civil entra em vigor no
continente e ilhas adjacentes no dia 1 de Junho de 1967, à excepção do disposto
nos artigos 1841º a 1850º, que começará a vigorar somente em 1 de Janeiro de
1968.
2. O código não é, porém, aplicável
às acções que estejam pendentes nos tribunais no dia da sua entrada em vigor,
salvo o disposto nos artigos 17º e 21º do presente decreto-lei.
Artigo 3º (Revogação do direito
anterior)
Desde que principie a vigorar o
novo Código Civil, fica revogada toda a legislação civil relativa às matérias
que esse diploma abrange, com ressalva da legislação especial a que se faça
expressa referência.
Artigo 4º (Remissões para o Código
de 1867)
Todas as remissões feitas em
diplomas legislativos para o Código Civil de 1867 consideram-se feitas para as
disposições correspondentes do novo código.
Artigo 5º (Aplicação no tempo)
A aplicação das disposições do novo
código a factos passados fica subordinada às regras do artigo 12º do mesmo
diploma, com as modificações e os esclarecimentos constantes dos artigos
seguintes.
Artigo 6º (Pessoas colectivas)
As disposições dos artigos 157º a
194º do novo Código Civil não prejudicam as normas de direito público contidas
em leis administrativas.
Artigo 7º (Interdições)
Os dementes, surdos-mudos ou
pródigos que tenham sido total ou parcialmente interditos do exercício de
direitos, ou venham a sê-lo em acções pendentes, mantêm o grau de incapacidade
que lhes tiver sido ou vier a ser fixado na sentença ou que resultar da lei
anterior.
Artigo 8º (Privilégios creditórios
e hipotecas legais)
1. Não são reconhecidos para o
futuro, salvo em acções pendentes, os privilégios e hipotecas legais que não
sejam concedidos no novo Código Civil, mesmo quando conferidos em legislação
especial.
2. Exceptuam-se os privilégios e
hipotecas legais concedidos ao Estado ou a outras pessoas colectivas públicas,
quando se não destinem à garantia de débitos fiscais.
Artigo 9º (Sociedades universais e
familiares)
Às sociedades universais e
familiares constituídas até 31 de Maio de 1967 serão aplicáveis, até à sua
extinção, respectivamente, as disposições dos artigos 1243º a 1248º e 1281º a
1297º do Código Civil de 1867.
Artigo 10º (Arrendamentos em Lisboa
e Porto)
Enquanto não for revista a situação
criada em Lisboa e Porto pela suspensão das avaliações fiscais para o efeito da
actualização de rendas dos prédios destinados a habitação, mantém-se o regime
excepcional da Lei nº 2030, de 22 de Junho de 1948, quanto a esses
arrendamentos.
Artigo 11º (Parceria agrícola)
Ao contrato de parceria agrícola
são aplicáveis, para o futuro, as disposições que regulam o arrendamento rural.
Artigo 12º (Foros do Estado)
Na determinação do quantitativo do
laudémio nos foros do Estado, para efeitos do disposto no artigo 1517º do novo
Código Civil, atender-se-á ao valor dos respectivos prédios que resulte da
matriz.
Artigo 13º (Anulação do casamento)
1. Os casamentos civis celebrados
até 31 de Maio de 1967 não podem ser declarados nulos ou anulados, se para tal
não houver fundamento reconhecido tanto pela lei antiga como pela nova lei
civil, a não ser que já esteja pendente, naquela data, a respectiva acção.
2. O disposto nos artigos 1639º a
1646º do novo código é aplicável às acções que forem intentadas depois de 31 de
Maio de 1967, sem prejuízo do que, relativamente aos prazos, prescreve o artigo
297º do mesmo diploma.
Artigo 14º (Efeitos do casamento )
O disposto nos artigos 1671º a
1697º do novo código é aplicável aos casamentos celebrados até 31 de Maio de
1967, mas em caso algum serão anulados os actos praticados pelos cônjuges na
vigência da lei antiga, se em face desta não estiverem viciados.
Artigo 15º (Regime de bens)
O preceituado nos artigos 1717º a
1752º só é aplicável aos casamentos celebrados até 31 de Maio de 1967 na medida
em que for considerado como interpretativo do direito vigente, salvo pelo que
respeita ao nº 2 do artigo 1739º.
Artigo 16º (Doações para casamento
e entre casados. Separação e divórcio)
1. Sem prejuízo da regra
estabelecida no nº 2 do artigo 2º deste decreto-lei, são aplicáveis aos
casamentos celebrados até 31 de Maio de 1967 as disposições do novo Código
Civil relativas à caducidade das doações para casamento, às doações entre
casados, à separação dos cônjuges ou dos seus bens e ao divórcio.
2. Não pode, no entanto, ser
decretada a separação judicial de pessoas e bens ou o divórcio de cônjuges
casados até 31 de Maio de 1967 com fundamento em facto que não seja relevante
segundo a lei vigente à data da sua verificação.
Artigo 17º (Conversão da separação
em divórcio)
O disposto no artigo 1793º é
aplicável nas acções pendentes e nos processos findos à data da entrada em
vigor do novo Código Civil.
Artigo 18º (Impugnação da legitimidade)
1. Até 31 de Outubro de 1967 pode o
marido da mãe intentar acção de impugnação da paternidade, com fundamento em
qualquer dos factos referidos nas alíneas c) e d) do artigo 1817º do novo
Código Civil, relativamente ao filho nascido antes da entrada em vigor deste
diploma, com prejuízo do disposto no artigo 1818º.
2. Dentro do mesmo prazo serão
recebidos nos tribunais de menores os requerimentos a que se refere o artigo
1820º, seguindo-se os demais termos da impugnação oficiosa, desde que o filho
tenha menos de catorze anos de idade à data da apresentação do requerimento.
Artigo 19º (Acções de investigação
de maternidade ou paternidade ilegítima)
O
facto de se ter esgotado o
período a que se refere o nº 1 do artigo 1854º
não impede que as acções de
investigação
de maternidade ou paternidade ilegítima sejam propostas
até 31 de Maio de 1968,
desde que não tenha caducado antes, em face da
legislação anterior, o direito
de as propor.
Artigo 20º (Filhos adulterinos)
Os assentos secretos de perfilhação
de filhos adulterinos, validamente lavrados ao abrigo da legislação vigente,
tornar-se-ão públicos mediante averbamento oficioso, sempre que sejam passadas
certidões do respectivo registo de nascimento.
Artigo 21º (Tutela e curatela)
As disposições do novo Código Civil
relativas à tutela e à curatela são aplicáveis às tutelas e curatelas
instauradas até 31 de Maio de 1967; porém, os tutores e os curadores já
nomeados manter-se-ão nos seus cargos enquanto deles não se escusarem ou
enquanto não forem removidos ou exonerados.
Artigo 22º (Declaração de nulidade
ou anulação de testamento ou de disposições testamentárias)
Os testamentos anteriores a 31 de
Maio de 1967 e as disposições testamentárias neles contidas só podem ser
declarados nulos ou anulados, por vício substancial ou de forma, se o
respectivo fundamento for também reconhecido pelo novo Código Civil, salvo se a
acção já estiver pendente naquela data.
Artigo 23º (Testamentaria)
As atribuições do testamenteiro são
as que lhe forem fixadas pela lei vigente à data da feitura do testamento.
Publique-se e cumpra-se como nele
se contém.
Paços do Governo da República, 25
de Novembro de 1966. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES TOMAZ - António de Oliveira
Salazar - António Jorge Martins da Mota Veiga - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo
Rodrigues dos Santos Júnior - João de Matos Antunes Varela - Ulisses Cruz de
Aguiar Cortês - Joaquim da Luz Cunha - Fernando Quintanilha Mendonça Dias -
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - Eduardo de Arantes e Oliveira -
Joaquim Moreira da Silva Cunha - Inocêncio Galvão Teles - José Gonçalo da Cunha
Sottomayor Correia de Oliveira - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João
Gonçalves de Proença - Francisco Pereira Neto de Carvalho.
Para ser presente à Assembleia Nacional.